UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA EDUCAÇÃO FAED DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DH



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Transcrição:

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA UDESC CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E DA EDUCAÇÃO FAED DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA DH Camila Serafim Daminelli Helena Gabriela Moellmann Gasparini Patricia Ventura Tâmyta Rosa Fávero MISTÉRIOS DE UMA PASTA AZUL: UM ESTUDO SOBRE DOCUMENTOS DIVERSOS DO ACERVO PESSOAL DA FAMÍLIA BOITEUX (SÉCULOS XIX E XX) Florianópolis - SC 2008

Camila Serafim Daminelli Helena Gabriela Moellmann Gasparini Patricia Ventura Tâmyta Rosa Fávero MISTÉRIOS DE UMA PASTA AZUL: UM ESTUDO SOBRE DOCUMENTOS DIVERSOS DO ACERVO PESSOAL DA FAMÍLIA BOITEUX (SÉCULOS XIX E XX) Trabalho de Conclusão da Disciplina de Prática Curricular de Patrimônio Cultural II, do Curso de História do Centro de Ciências Humanas e da Educação - FAED Coordenadora Geral de Estágio: Prof a. Dr a. Cristiani Bereta da Silva Professoras: Profª Drª Janice Gonçalves Prof a. Dr a. Maria Teresa santos Cunha FLORIANÓPOLIS - SC 2008

AGRADECIMENTOS Agradecemos primeiramente à coordenação do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, que nos permitiu a realização da pesquisa no acervo e a utilização do corpus documental para a produção de nosso projeto. Além da dedicação da bibliotecária Patrícia Régis que se manteve atenciosa e paciente, respondendo a nossas indagações. Agradecemos imensamente pelo carinho e observações pertinentes de nossa professora orientadora Maria Teresa, transferindo-nos seu conhecimento e auxílio. À professora Janice e a todos os docentes que ministraram disciplinas até o momento, que além de toda a assistência que nos disponibilizam diante de nossas dúvidas e questionamentos, transpassam seus saberes e impulsionam nossas caminhadas como historiadores e historiadoras que seremos.

RESUMO Este presente trabalho resultou da pesquisa feita para a disciplina Prática Curricular: Patrimônio Cultural II, no acervo pessoal da Família Boiteux, depositado no Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, por doação da própria família. Desta forma, teve como objetivos a preservação do corpus documental, a partir da digitalização, higienização e organização, facilitando assim, a procura e o acesso documentos por pessoas interessadas em realizar qualquer tipo de pesquisa histórica. E por fim, a divulgação do acervo e do próprio Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina. PALAVRAS-CHAVE: Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, Patrimônio Cultural, Acervo Pessoal, Família Boiteux, Intervenção.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Imagem 1...26 Imagem 2...26 Imagem 3...26 Figura 1 - Nova pasta com os documentos nela acondicionados...58 Figura 2 - Pasta aberta com documentos...58 Figura 3 - Documentos...59 Figura 4 - Documento sendo analisado...59 Figura 5 - Transcrição e acondicionamento dos documentos...60 Figura 6 - Campo de Estágio...60

SUMÁRIO INTRODUÇÃO...07 1. TRAGETÓRIA DE ESTÁGIO...08 2. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO ESTÁGIO...13 2.1. DE FAMOSOS E NÃO FAMOSOS FAZ-SE A HISTÓRIA: OS OUTROS PERSONAGENS E OS DOCUMENTOS MISTERIOSOS DA FAMÍLIA BOITEUX...14 2.2. NAS MARGENS DE DOCUMENTOS: A COMPOSIÇÃO DO IMAGINÁRIO DE UMA PASTA AZUL NO ACERVO DA FAMÍLIA BOITEUX SÉCULOS XIX E XX (INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SANTA CATARINA)...22 2.3. JOSÉ ARTHUR BOITEUX E A PASTA AZUL: DOCUMENTOS PARA GUARDAR...29 2.4. PRÁTICA E EXPERIÊNCIA: OS ENTRAVES DO JOVEM HISTORIADOR DIANTE DA PESQUISA HISTÓRICA...40 CONSIDERAÇÕES FINAIS...47 REFERÊNCIAS...48 ANEXO...51 1 PROJETO...51 2 IMAGENS...58

7 INTRODUÇÃO O presente relatório final de estágio refere-se ao projeto Mistérios de uma pasta azul: um estudo sobre documentos diversos do acervo pessoal da família Boiteux (séculos XIX e XX), desenvolvido junto à disciplina de Prática Curricular: Patrimônio Cultural, sob orientação das professoras Janice Gonçalves e Maria Teresa Santos Cunha. O projeto, desenvolvido no segundo semestre de 2008, teve como objetivo principal intervir na conservação e divulgação de parte da documentação da família Boiteux, presente no Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina (IHGSC). Nas vivências do campo de estágio, o contato com a documentação e seus diferentes contextos, fez com que reflexões surgissem acerca do processo que envolve a entrega de bens como Patrimônio Histórico para a sociedade, e no que diz respeito à escolha de quais memórias históricas devem ser preservadas ou não. A construção do IHGSC evidencia o interesse das elites, das redes político-familiar-empresariais no início do século em Santa Catarina, que desejavam construir a História da sua cidade sob o julgo da sua própria experiência nela. Estas redes, trataram de realizar operações, símbolos de memória, construídos e constantemente celebrados. Com destaque para a família Boiteux, na formação de um espaço de estudo e pesquisa para construir uma História Catarinense, já que o fundador do IHGSC, José Arthur Boiteux, mostrou-se sempre presente nas políticas e criações patrimoniais da cidade de Desterro, atual Florianópolis. A intervenção de universidades, no caso, do curso de História, nos acervos históricos torna-se um importante meio para a divulgação, produção de conhecimento e pesquisa acerca dos muitos conteúdos que constituem parte destes acervos. Desta forma, estes espaços de memória tornam-se importantes objetos de estudo das mentalidades e experiências que são vivenciados no processo de historiar.

8 1. TRAJETÓRIA DO ESTÁGIO Iniciando o quarto semestre do curso de História na Universidade do Estado de Santa Catarina, estávamos ansiosas para iniciar a disciplina Prática Curricular: Patrimônio Cultural, que seria ministrada durante o ano de 2008. Seria nosso primeiro contato com o ofício do/a historiador/a., se não a primeira ida aos arquivos, a primeira oportunidade de intervir nas fontes, a fim de diminuir a ação do tempo para que sobrevivessem o quanto mais possível. Desta forma, o desejo do grupo era trabalhar com documentos antigos, fragmentos escritos n outros tempos, reflexo de suas mentalidades. No primeiro semestre da disciplina e após a formação dos grupos, dentre as inúmeras instituições que foram colocadas como possíveis campos de estágio Casa da Memória, IPESC, arquivo Municipal entre outros, optamos pelo Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina IHGSC por este ser um espaço local de uma instituição de âmbito nacional, o IHGB, e por concebê-lo como um campo de múltiplas possibilidades. As ministrantes da disciplina, as professoras Janice Gonçalves e Maria Teresa Santos Cunha, afirmaram que no local teríamos várias surpresas e que encontraríamos fontes históricas das mais diversas, como fotografias, cartas, jornais, e muito papel velho. Antes do final do semestre, os três grupos que tinham optado pelo IHGSC como campo de estágio, participaram de uma visita ao local, onde teriam o primeiro contato com o acervo e conheceriam a pessoa que iria auxiliar o trabalho dentro do acervo, Patricia Régis da Silva 1. Durante a visita ao estágio, conhecemos a biblioteca do Instituto, lócus do contato direto com os documentos. Neste momento, foram mostrados aos grupos, parte do acervo da Família Boiteux, o qual seria disponibilizado para as pesquisas da disciplina pudessem ser feitas. Este acervo histórico havia sido doado pela própria família no ano de 1989, possuindo mais de 40.000 documentos de natureza diversa, sendo constituído por cartas, telegramas, documentos relacionados à política, recortes de jornais, fotografias, entre outros. Tendo sido, José Arthur Boiteux, um dos idealizadores do IHGSC, acreditamos que tais documentos tenham sido doados ao Instituto com o intuito de manter a 1 Formada em Biblioteconomia, é responsável pelo funcionamento da biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, onde trabalha como voluntária. Pessoa muito prestativa e amiga, que nos orientou e instruiu de forma ímpar.

9 memória da família e seu prestígio junto à tradição, e história da capital do estado de Santa Catarina Assim também, objetivando a conservação desses documentos tão preciosos para os pesquisadores das humanidades, como provavelmente fazia parte do pensamento de José A. Boiteux, um historiador de ofício. Três opções de documentos foram dadas aos grupos. A primeira delas eram alguns cadernos com recortes de jornais de Henrique Boiteux, com artigos próprios. A segunda opção, uma série de fotos que haviam pertencido à família Boiteux, onde era necessária uma intervenção de limpeza além de identificação das pessoas presentes nas fotos. A terceira e última opção estava dentro de uma grande pasta azul, onde se encontravam documentos antigos que pertenceram a família Boiteux. Prontamente escolhemos a pasta azul. Percebemos que continham documentos do século XIX e XX, mas saímos deste primeiro contato com os documentos praticamente sem nenhuma informação a seu respeito. O próximo passo seria a criação de um projeto para ser executado no segundo semestre da disciplina, sendo que deveríamos ter um foco de pesquisa, para saber o que desejávamos com os documentos. Assim, para a criação do projeto, necessitávamos estar cientes da natureza dos documentos que estavam guardados na pasta. Neste sentido, iniciamos a digitalização da primeira parte dos documentos para a produção do projeto. Após uma breve análise desses documentos, já digitalizados, havia a necessidade de uma limpeza, pois estavam há muito tempo guardados, apenas enrolados com papel arroz. Processos de higienização e devido acondicionamento, poderiam fazer os documentos sobreviverem por mais tempo. A digitalização, além de possibilitar o acesso aos conteúdos dos documentos sem que fossem manuseados, facilitaria também, a pesquisa e a procura de eventuais pesquisadores. Outra prioridade seria a catalogação dos documentos encontrados de maneira que fossem facilmente encontrados. Colocamos como outro objetivo, a transcrição dos documentos, na medida em que pudessem ser identificados, pois, como a forma de escrita e a caligrafia dos indivíduos presentes nos documentos eram muito diferentes de hoje, por muitas vezes demoraríamos a entender o que estava escrito. Finalmente, como produto deste estágio, nos propusemos a criar um folder, que teria como objetivo divulgar o acervo do IHGSC, assim como a própria Instituição, pois como foi possível perceber, poucas pessoas sabem ou até conhecem o Instituto e seu acervo riquíssimo, e com tanta coisa por fazer.

10 No primeiro dia de estágio do segundo semestre da disciplina, em 2008/02, fomos conversar sobre a utilização do espaço do Instituto, pois este é bastante limitado, não comportando os três grupos ao mesmo tempo. Desta forma decidimos que, enquanto um grupo utilizava o scanner, os outros grupos ficariam analisando os documentos nos outros dois espaços da biblioteca no Instituto. Para agilizar a pesquisa, decidimos dividir, entre o grupo, os documentos digitalizados no primeiro semestre, e começarmos a transcrevê-los. Na semana seguinte, iniciamos o estágio, analisando os documentos que estavam na pasta, também tiramos fotos de como se encontravam no momento em que iniciamos o estágio. Dividimos-nos com fim de otimizar o tempo e facilitar o trabalho de identificação sobre a natureza dos documentos, para posteriormente fazermos um levantamento do trabalho das quatro integrantes e termos a noção geral do que tratavam. A respeito dessa primeira análise, percebemos que os documentos continham muitas cartas recebidas por José A. Boiteux, assim como inúmeros traslados, recibos de dívidas, notas de compra-venda e empréstimo de serviços de escravos. Passamos cerca de três ou quatro encontros observando os documentos e anotando as especificidades de cada um, na medida em que conseguíamos identificar o que estava escrito. No final do mês de Agosto, nós e outros colegas que cursavam a disciplina de História do Brasil IV, fizemos uma viagem de estudos para o Rio de Janeiro, na última sexta-feira do mês, o que nos impossibilitou de comparecer no Instituto para realizarmos o estágio. Já em Setembro, voltamos a digitalizar os documentos, mas desta vez, tivemos alguns problemas. Na primeira vez em que digitalizamos os documentos, eles eram pequenos e couberam no scanner. Este equipamento suportava apenas documentos de tamanho padrão, A4. Assim, digitalizamos os documentos pequenos, e depois passamos a digitalizar os maiores. A digitalização dos documentos constituiu a parte mais demorada do estágio. Tínhamos, muitas vezes, dificuldades de manusear os documentos, por estarem deteriorados, ou até mesmo por serem grandes demais o scanner. Assim, tivemos que tomar todo o cuidado possível durante o manuseio dos documentos, além de ter em mente que a digitalização dos documentos poderia prejudicá-los pela quantidade de luz que o scanner emitia, pois dependendo da quantidade de luz emitida, o mesmo poderá se tornar quebradiço, frágil, chegando a perder a cor. Mas era inviável fotografar todos os

11 documentos, pois levaríamos o dobro do tempo que tínhamos para a realização desta tarefa. O processo de digitalização dos documentos durou mais tempo do que tínhamos em mente. Assim, gostaríamos de explicitar, um ponto importante e positivo que percebemos durante o estágio, era o fato de que tudo que precisávamos e que estava ao alcance da bibliotecária, Patrícia, nos foi disponibilizado. Durante todo o estágio, ocorreram inúmeros imprevistos quanto a presença do grupo nas sextas-férias. Houve dias em que nem todas as integrantes do grupo puderam estar presentes, tanto por problemas pessoais, familiares, de saúde, e também pelos feriados. E para que o trabalho não ficasse prejudicado, íamos transcrevendo, na medida do possível e do entendimento, os documentos que já haviam sido digitalizados. Em relação à transcrição, por muitas vezes ficou inviável pela quantidade de trabalhos e tarefas que tínhamos além desta disciplina. Após a finalização da digitalização dos documentos, começamos a pensar nos temas a serem desenvolvidos nos ensaios, e quais temas seriam pesquisados, agora individualmente. Desta forma, passamos muitas sextas-feiras fazendo pesquisas, utilizando os documentos e bibliografia relacionada aos temas, que foram possíveis de encontrar, no próprio Instituto, alguns relacionadas ao IHGSC e à Família Boiteux. Em Novembro, começamos a nos programar para iniciarmos o armazenamento dos documentos, para que eles fossem o mínimo possível manuseados. Pensamos em não intervir no corpo físico dos documentos, até mesmo pelo fato de não sabermos quais técnicas deveriam ser utilizadas para o devido reparo; adotamos a postura de não ir além de uma higienização simples. Neste sentido, podemos dizer que a falta de uma disciplina, que nos auxiliasse na preservação efetiva dos documentos, assim como o entendimento do que havia escrito neles, fez com que o nosso trabalho no Instituto perdesse alguns quesitos. Após a higienização, armazenamos os documentos dentro de pastas plásticas, utilizando papel com PH neutro, afim de preservar os documentos ali armazenados. Desta forma, colocamos os papéis dentro dos plásticos das pastas, com o intuito de separá-los uns dos outros. Nos documentos que estavam mais danificados, foi colocado papel-arroz para uma maior conservação. Entretanto, muitos documentos ficaram sem o papel-arroz, envoltos duplamente pelo papel de PH neutro. Isso não ameaça a integridade física dos documentos, mas por questões estéticas, o papel arroz seria o ideal, por possibilitar a visualização, uma vez que é translúcido. O que abre espaço para

12 uma possível futura intervenção por parte do IHGSC, na colocação das folhas de papelarroz nos documentos faltantes. Para a identificação dos documentos, fizemos uma legenda individual, resultado de horas de análise dos documentos, dando prioridade às datas, locais, quem assina o documento ou quem ele cita. A título de conclusão, descobrimos, após está minuciosa análise aos documentos, e também auxiliado por nossas pesquisas individuais, que muitos deles, das décadas de 30 a 50 do século XIX, pertenciam aos antepassados da Família Boiteux. Também entendemos que muitos dos documentos que José Arthur Boiteux guardou, foram escritos antes mesmo de seu nascimento, ou das possíveis relações estabelecidas com as pessoas tratadas nos documentos. Essas questões cujas respostas ainda estão enevoadas aumentaram nosso interesse em pesquisar os inúmeros motivos que levaram tais documentos a serem preservados, e por que não, nossa sede em manter sua vida útil, como patrimônio histórico e cultural que estejam dispostos à construção de conhecimentos.

13 2. DESCRIÇÃO E ANÁLISE DO ESTÁGIO Durante a pesquisa feita no Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, nos deparamos com inúmeras indagações acerca dos documentos da pasta azul. Desta forma, cada uma se deteve em pesquisa o mais lhe foi interessante, resultando assim em quatro ensaios, onde cada um possui certa ligação, relacionados ao acervo e ao patrimônio cultural.

14 2.1. DE FAMOSOS E NÃO FAMOSOS FAZ-SE A HISTÓRIA: OS OUTROS PERSONAGENS E OS DOCUMENTOS MISTERIOSOS DA FAMÍLIA BOITEUX por Camila Serafim Daminelli 2 (...) todas aquelas vidas, que estavam destinadas a passar ao lado de todo o discurso e desaparecer sem nunca terem sido ditas, não puderam deixar traços breves, incisivos, enigmáticos muitas vezes senão em virtude de seu contato momentâneo com o poder. (...) Afinal, não será um dos traços fundamentais da nossa sociedade o fato de o destino tomar aqui a forma da relação como poder? (...) Nas palavras breves e estridentes que vão e que vêm entre o poder e as existências mais inessenciais, é sem dúvida aí que essas últimas encontram o único momento que alguma vez lhes foi concedido; é o que lhes dá, para atravessarem o tempo, o pouco de fulgor, o breve clarão que as tráz até nós. 3 Michel Foucault Desconhecidos e suas experiências nas entrelinhas dos famosos. Quem são os infames, que teriam a existência destinada a lembrança de seu encontro com o poder? Analisando os documentos do acervo pessoal da Família Boiteux, deparei-me com uma multiplicidade de indivíduos que tiveram suas vidas marcadas por relações com essa família. Mas qual a natureza dessas relações que mantiveram com seus membros? Em que densidade e a que nível suas vidas se encontraram? Esse ensaio busca refletir sobre a identidade desses indivíduos ocultos pela ação do tempo e subesquecidos por seu contato com os afamados. Os documentos da pasta azul, quando do nosso contato primeiro, estavam sem qualquer especificação, nada sabíamos sobre eles senão que foram doados pela família em 1989. O trabalho realizado nos possibilita agora classificá-los em 3 grandes grupos: documentos político-partidários e/ou de ordem estatal; translados de imóveis, escravos/as, e documentos de natureza patrimonial, incluindo diplomas; e cartas pessoais, na sua maioria destinadas a José Arthur Boiteux, solicitações a instituições como a Presidencia da Província e a Igreja 4. Todos esses documentos citam 2 Acadêmica da 5ª fase do curso de História da Universidade do Estado de Santa Catarina. 3 FOUCAULT, Michel. O que é um autor? 4ª ed. Passagens, 2002. p. 98-99. 4 Confeccionei tabelas simples, para anexá-las aos documentos visando facilitar o encontro de temáticas afins por possíveis pesquisadores. Ver anexo 1.

15 repetidamente algumas famílias desconhecidas, a saber: Jacques, da Silveira, Roza, de Jesus, Medeiros, Martins 5. Um primeiro olhar sobre os referidos documentos sugerem que tenham sido guardados como documentos históricos, pois estão situados do início do século XIX a meados do XX. Mas uma análise mais cuidadosa, não deixa de intrigar: sobretudo parecem documentos fiscais, do porto, de compra e venda de imóveis, de escravos... podem ter sido confiados a alguém da família, ou podem, indiretamente lhe dizer respeito. São hipóteses que o historiador pode levantar previamente à investigação, embora não se possa precisar os motivos da guarda tendo em vista que eles são vestígios. Surpreendentemente, em meio á pesquisa sobre a origem desses documentos e buscando dar respostas ao questionamento inicial desse ensaio, que seria entender que conjunto de documentos é esse, e quem são os seus protagonistas, me deparei com um dado que muda inevitavelmmente a problemática inicial dessa pesquisa, uma vez que esperava tratar de pessoas pertencentes à camadas menos abastadas, que não estariam inseridas nas redes político-familiares de Desterro, ou nos entraves do poder. Contudo meu achado, a árvore genealógica da família Boiteux, demonstra que os desconhecidos presentes nesses documentos, são, na verdade, familiares da família Boiteux em algum grau, principalmente indivíduos da primeira geração que se instalou no Brasil e seus descendentes. Os personagens não estão muito distantes temporalmente de José Arthur Boiteux, mas são seus antecedentes sanguíneos por parte da família da mãe, ou seja, nenhum deles tem o sobrenome Boiteux, herdado por seu pai, o qual, de acordo com nossas práticas culturais, é o que deve prevalecer e ser transmitido às gerações seguintes. O primeiro grupo de documentos faz referência mais de uma vez aos seguintes personagens: Antonio Jacques da Silveira, Manoel Ribeiro de Medeiros, Bernardina Roza de Jesus, Ambrósia Rufina de Medeiros Jacques, entre outros. São na sua maioria translados, ou seja, notificações de compra e venda de imóveis, que citam seus vendedores e a quem passam a pertencer. O que descobriu-se, então, é que se tratam de documentos que dizem respeito ao patrimônio material da família e suas ramificações 5 Fiz um levantamento geral dos nomes que assinam ou são citados nos documentos, que resultou numa lista que também pode ser anexada a pasta dos documentos. Ver anexo 2.

16 em outras famílias, que tiveram como guardião, José Arthur Boiteux, homem de curiosidade aguçada, jornalista, historiador, e ainda, por que não, um colecionador. De acordo com a descrição que Philipp Blom faz do colecionador, podemos levantar algumas questões a respeito da prática de guardar: Cada coleção é um teatro de memória, uma dramatização e uma mise-emscène de passados pessoais e coletivos, de uma infância relembrada e de uma lembrança após a morte. Ela garante a presença dessas lembranças por meio dos objetos que a evocam. É mais do que uma presença simbólica: é uma transubstanciação 6. Perdendo seu valor de uso, esses documentos podem ser inseridos na categoria coleção, são hoje, e ainda no momento em que foram guardados por José Arthur Boiteux, objetos semióforos, como diz Regina Abreu 7. Não sendo coisas úteis, sua existência garante a importância de quem os guarda, e delega para si lugares favoráveis na hierarquia social, uma vez que lhes delega méritos, inseridos na tradição da sociedade em que vivem. E porque então a família resolve se desfazer deles? Marques e Silveira 8, argumentam que a doação de acervos particulares aos arquivos sugere o desejo da permanência de experiências do passado no presente, que vai ao encontro do desejo de construção de uma versão particular da História. Ou seja, doar contribuiria mais para garantir um lugar ao sol para a família na História, do que mantê-los uardados, como itens de coleção. Diante de tal descoberta, aparece a oportunidade de reflexão acerca do quão rica pode ser a análise de uma árvore genealógica, concebendo-a como uma fonte densa a respeito da história das sociedades, e que possibilita reflexões maiores sobre sua composição étnica e cultural, a partir das informações que constam nela, como local e data de nascimento e óbito dos indivíduos. Podem ser importantes também para 6 BLOM, Philipp. Ter e manter: uma história íntima de colecionadores e coleções. Rio de Janeiro: Record, 2003. p. 219. 7 ABREU, Regina. Um homem semiófaro e seus objetos semiófaros. In: A fabricação do imortal: memória, história e estratégias de consagração no Brasil. Rio de Janeiro, Rocco, Lapa, 1996. 8 BAHIA, Eliana Maria; CORREA, Carlos Humberto P. (Carlos Humberto Pederneiras). UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Perfil de Jose Arthur Boiteux : um construtor da cultura catarinense. 1994. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas.

17 fornecer dados sobre os arranjos familiares que as elites estabelecem via casamentos, com fim por exemplo, de manter o patrimônio familiar em grupos fechados 9. O segundo grupo de documentos, que classifiquei como de ordem política, partidária ou admnistrativa, contem também fotocópias que acredito ser de arquivos ultramarinos portugueses e que tratam do território do hoje estado de Santa Catarina, desde os tempos coloniais. Walter Fernando Piazza, em seu estudo histórico-analítico do Instittuto Histórico e Geográfico de Santa Catarina, nos faz crer que estes documentos são resultado de uma viagem que José Arthur teria feito em nome do IHGSC. Ele diz que, em 1897, Como resultado imediato desse desiderato o Governo do Estado de Santa Catarina utilizou o 1º Secretário do Instituto, José Arthur Boiteux, para, em Lisboa, nos arquivos daquela Capital européia, procurar documentos que se prendem á questão de limites entre este Estado e o Paraná 10 Os desenhos, rascunhos para monumentos também parecem se relacionar com o papel que José Arthur Boiteux exerceu no IHGSC, já que, segundo Piazza, ele seria um entusiasta da cultura, a serviço se um Instituto que se prontifica a ser espaço de estudo, pesquisa e escrita da história catarinenense. Sendo o templo de grande parte do saber referente ao estado, parece plausível crer que dentro dele se pensavam os lugares de memória de que fala Pierre Nora 11, nos quais entrariam os monumentos históricos, erguidos a fim de lembrar a sociedade de uma história, elaborada e que se deseja fazer lembrar. Ainda nesse grupo, encontram-se atas de reuniões do partido republicano, discusões que entendiam como centrais 12, bem como diplomas de deputados eleitos, relação de votantes e outros documentos expedidos do diretório do partido (a qual José Henrique Boiteux era membro). Já no primeiro contato com os documentos, percebemos que dentre todos, apenas as cartas estavam devidamente separadas e organizadas. Viemos a tomar 9 No período dessa pesquisa, descobri também que o historiador catarinense Walter Piazza é filho de Romeu Boiteux Piazza, o que torna inevitável não pensar sobre a construção de uma História catarinense contada pelas próprias elites que reivindicam uma ligação naturalizada entre si e o estado. 10 PIAZZA, Walter F. Instituto Histórico e Geográfico de Santa Catarina: estudo histórico-analítico 1896-1996. Florianópolis: co-ed. UDESC IHGSC, 1996. p. 13. 11 NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. In: Projeto História. São Paulo: PUC, n. 10, Dezembro de 1993. 12 Como é o caso das discussões a respeito da mandioca, que resulta em artigos que Henrique Boiteux escreve aos jornais.

18 conhecimento que existe um estudo sobre esses conjunto de correspondências, que resultou em um trabalho de conclusão do curso de História, na UFSC. Tal grupo de documentos, as cartas pessoais destinadas a José Arthur Boiteux, tem como remetentes José Otávio Correia Lima, e Dakir Parreiras. O primeiro, é escultor formado no Rio de Janeiro, apadrinhado por José Arthur. Nas cartas José Otávio pede para Boiteux que lhe forneça oportunidade de produzir monumentos artísticos para a capital do estado, se valendo do prestígio desse membro da elite, tanto junto ao governo, quanto em instituições como o IHGSC. Dakir Parreiras se corresponde com José Arthur Boiteux por motivos semelhantes. Eles dialogam sobre a viabilidade de bustos e monumentos a serem erguidos em alguns pontos da cidade de Florianópolis; Boiteux também solicita a Parreiras quadros de indivíduos e momentos que julga impostantes na história do estado. Parreiras lhe dá informações a respeito de preços e materiais a serem utilizados, bem como lhe comunica o andamento da produção dos trabalhos. Pretendi dar luz inicial aos documentos e personagens desconhecidos e suas relções com a família Boiteux. Eis em parte o mistério da pasta azul desvendado: ela guarda mais do que comprovações do patrimônio material da família e de como foi construído ao longo das gerações, ela é também fragmento da experiência de uma rede familiar e suas ações na dinâmica da cidade. Contudo, entre suas linhas ainda há muito o que ser interpretado e entendido, seu mistério está longe de ser esgotado.

19 Referências ABREU, Regina. Um homem semiófaro e seus objetos semiófaros. In: A fabricação do imortal: memória, história e estratégias de consagração no Brasil. Rio de Janeiro, Rocco, Lapa, 1996. BAHIA, Eliana Maria; CORREA, Carlos Humberto P. (Carlos Humberto Pederneiras). Perfil de Jose Arthur Boiteux : um construtor da cultura catarinense. 1994. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas. BLOM, Philipp. Ter e manter: uma história íntima de colecionadores e coleções. Rio de Janeiro: Record, 2003. FOUCAULT, Michel. O que é um autor? 5ª ed. Passagens, 2002. 160 p. MARQUES, Rita de Cássia; SILVEIRA, Anny Jaqueline Torres da. Por trás das coleções: uma experiência com acervos da História da Saúde. Disponível em: http://www.ilea.ufrgs.br/episteme/portal/pdf/numero20/episteme20_artigo_marques_silv eira.pdf NORA, Pierre. Entre Memória e História: a problemática dos lugares. In: Projeto História. São Paulo: PUC, n. 10, Dezembro de 1993. PIAZZA, Walter Fernando. Instituto Histórico e Geográfioco de Santa Catarina: estudo histórico-analítico 1896-1996. Florianópolis: co-ed. UDESC IHGSC, 1996.117 p.

20 Anexo 1 Documentos grandes: Natureza do documento Quantidade Translado de imóveis e terras 17 Translado de escravos/as 9 Outros Translados 3 Alforria de escravos/as 4 Documentos partidários/ eleitorais 6 Cartas pessoais, ofícios e correspondências estatais 5 Documentos administrativos 13 Solicitações/ Retificações/ Reivindicações 9 Documentos de ordem patrimonial/ contabilidade familiar 10 Declarações de dívida 3 Fotocópias 3 Contabilidade estatal de obras e monumentos 8 Documentos pequenos: Natureza do Documento Quantidade Patrimônio e contabilidade familiar 8 Tratam de Monumentos e bustos 15 Escravos 2 Propriedade 2 Finanças 7 Documentos Eleitorais 2 Cartas pessoais 6 Documentos Institucionais 1 Tratam Obras e quadros 4 Anexo 2 Nomes que assinam os documentos ou que são citados por eles: Jesus Pinto Manoel Ribeiro de Medeiros Antonio Jacques da Silveira Alferes Wichenhagem Conselheiro Barão Nogueira da Gama Américo Silvado Conselheiro Joaquim Raymundo de Lamore Conde e da Condessa d Eu Manoel Mafra Rufina de Medeiros Jacques Joaquim Monteiro Jacques Simão Bithancourt Antônio Araújo João de Almeida Antonio Matos Jeronymo Coelho Leão Velloso Coronel Manoel Pinto de Lemos