A lei e a ordem da polícia e da justiça burguesa



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1 Notícias Online Editorial Serra: um governo voltado para a repressão à população Iniciado em 2 de dezembro de 2003 Quinta-feira, 9 de agosto de 2007 Segunda-feira - 24 de Dezembro de 2007 Nesta Edição edição: 8 n 1345 n 1345 matérias www.pco.org.br - Um jornal diário dos trabalhadores em defesa do socialismo na Internet n 1482 Análise Política Semanal Turbilhão no mercado financeiro: feliz 2008, com recessão e inflação A crise do mercado imobiliário norte-americano e de empréstimos subprime arrastou bancos, fundos de investimento e grandes investidores para uma espiral de crise que, aliada à desaceleração da economia norte-americana e a já prevista recessão são as linhas gerais do desenvolvimento do próximo período de crise do capitalismo pág. 2 Nacional Nesta semana, em Causa Operária A lei e a ordem da polícia e da justiça burguesa O caso do garoto Carlos Rodrigues Júnior, que foi torturado e assassinado por policiais dentro de sua própria casa é mais uma prova de que a repressão no Brasil está dirigida contra a população pobre. Leia nesta edição a cobertura completa e mais... História Internacional pág. 3 História Chile 100 anos do massacre de Santa Maria de Iquique Um dos maiores massacres contra a classe operária da América Latina cumpre o seu centenário em meio ao esquecimento e à falta de acesso sobre este episódio por parte do grande público, principalmente para a classe operária livros Internacional pág. 4 Como hoje Até 1907, os operários do salitre já possuíam uma longa história de greves contra seus patrões Os mineiros do salitre chegavam a trabalhar uma carga horária de oito a dez horas por dia - jornada que perdura até hoje - sob elevadas temperaturas no verão e no frio absoluto durante o inverno pág.5 Crise do regime Premie da Índia propõe criação de força especial para combater a guerrilha Temendo um ascenso revolucionário das massas impulsionado pelos diversos grupos guerrilheiros, a Índia quer investir nas forças de repressão para manter o regime burguês pág.6 Ditadura Dom Cappio encerra greve de fome após STF ceder à ditadura civil de Lula O bispo iniciou seu protesto quando o presidente Lula desconsiderou a decisão do STF (Superior Tribunal Federal) proibindo as construções da transposição do rio São Francisco pág.7 Revolução Russa A Revolução Russa nas artes e na cultura Acompanhando a onda revolucionária que toma conta da Rússia czarista, artistas das mais diversas tendências estão promovendo sua própria revolução, expandindo como nunca antes as barreiras das artes plásticas e colocando-se na linha de frente da vanguarda artística mundial pág.7

2 Nacional Análise Política Semanal Turbilhão nomercado financeiro: feliz 2008, com recessão e inflação A crise do mercado imobiliário norte-americano e de empréstimos subprime arrastou bancos, fundos de investimento e grandes investidores para uma espiral de crise que, aliada à desaceleração da economia norte-americana e a já prevista recessão são as linhas gerais do desenvolvimento do próximo período de crise do capitalismo A opinião dos analistas econômicos da burguesia é unânime: a crise dos empréstimos subprime teve efeitos devastadores no mercado financeiro. Mais ainda, uma recessão está por vir, acompanhada da desvalorização do dólar e da fuga de capitais. Pode-se dizer que, de certa forma, o balanço do ano de 2007 permanecerá em aberto após a virada do ano. A conta de anos de acúmulo de empréstimos podres e da especulação do mercado financeiro começará a ser cobrada efetivamente em 2008. Os banqueiros e investidores já estão se antecipando e procuram rapidamente enxugar o mercado de empréstimos, suspendendo linhas de crédito, fechando fundos de investimento e tomando medidas que não deixaram ao imperialismo outra alternativa senão inverter dinheiro dos bancos centrais dos EUA e da Europa para cobrir a demanda e dar aos banqueiros fôlego para continuar operando. O tamanho da conta final não está claro. Mas a maior parte das estimativas coloca a marca para os calotes dos tomadores de empréstimos subprime norte-americanos entre 200 e 300 bilhões de dólares. Sensivelmente, com uma quantia tão grande, os bancos estão administrando a dor em parcelas. Na terça-feira, 20 de dezembro, Bear Stearns foi o último banco de Wall Street a chegar aos aproximadamente 40 bilhões de dólares de prejuízo em seus empréstimos. O banco sofreu uma depreciação de 1,9 bilhões de dólares no último trimestres devido à sua exposição a débitos infectados pelo subprime e uma perda de 854 milhões de dólares, sua primeira em qualquer trimestre da sua história No dia anterior [o banco] Morgan Stanley anunciou suas próprias más notícias, uma depreciação abaladora de 9,4 bilhões de dólares no último trimestre. Isso fez com que Morgan Stanley anunciasse também sua primeira perda em um trimestre também, neste caso cerca de 4 bilhões de dólares. Os empréstimos entre bancos foram comprometidos pela falta de confiança que a quebradeira geral despertou. Veículos de Investimento Estruturado e de administração permitiram auxiliar os bancos a manter os investimentos subprime fora de seus balancetes para que desta maneira não fosse necessário gastar capital em caso de problemas. Agora que eles [estes fundos de investimento] azedaram, os bancos estão tendo que enfrentar perdas enormes. Mas embora as revelações das perdas estejam acontecendo, nenhum banco está certo de que garantias os outros bancos têm (The Economist, 21/12/2007) O último sinal da disposição do imperialismo mundial em fiar as relações entre bancos e o mercado financeiro foi dado pelo Banco Central Europeu, que prometeu dispor de 350 bilhões de euros (500 bilhões de dólares) para garantir liquidez aos bancos durante as festas de final de ano. Tudo em jogo Contrariando as tendências que permitiam ao grande capital imperialista dominar a economia e deixar o controle sobre os mercados de ações e créditos nas mãos do capital financeiro, uma ala do governo norte-americano tomou a iniciativa e tentou apresentar uma saída própria para a crise: uma intervenção do Banco Central norte-americano para impor regras às transações neste mercado. O presidente do Federal Reserve [o banco central norte-americano] Ben S. Bernanke tomou medidas para restabelecer a reputação do banco central após ter sido culpado por deputados por falhar ao conter a crise das hipotecas subprime, anunciando regras para controlar os empréstimos abusivos. Os diretores do Fed propuseram unanimemente banir as hipotecas subprime que não possuírem documentos de comprovação de renda e eliminar a maior parte das multas de pré-pagamento. Os planos, anunciados ontem [20 de dezembro] após uma revisão de seis meses, também tornam aqueles que oferecem empréstimos responsáveis por determinar se seus tomadores de empréstimos podem pagar suas hipotecas mesmo depois que as baixas taxas de juros iniciais expirarem (Bloomberg, 21/12/2007). A medida foi bem recebida pelo congresso norte-americano. Apesar de o Fed ter capacidade de intervir nas negociações de crédito desde 1994, o banco central norte-americano ainda não o tinha feito. A crise repercute internacionalmente O balanço feito pelos economistas londrinos dos efeitos da crise do mercado subprime norteamericano não é dos mais animadores. A experiência anterior com o período recessivo dos anos 80 e 90 permitiu à equipe de analistas econômicos da rede britânica BBC tecer os seguintes comentários: Os dados mostram que o balanço do déficit de pagamentos (a medida mais abrangente da nossa posição no comércio internacional) está pior do que já esteve antes. Ganhamos menos do que o resto do mundo e gastamos no resto do mundo 5,7% do nosso produto interno. Colocado de outra maneira, nossos gastos durante o verão foram mantidos apenas por que estrangeiros nos emprestaram quase 6% do nosso PIB. Mais chocante, isto significa que nosso balanço de déficit de pagamentos está maior agora, em termos proporcionais, do que o dos EUA. (Faz tempo que não podíamos dizer isso). O déficit dos EUA encolheu de 5,6% do seu PIB no primeiro trimestre deste ano, para 4,9% no terceiro. A única ocasião em que nosso débito estava tão alto foi no terceiro trimestre de 1989. A boa notícia então era que o déficit caiu logo em seguida. A má notícia é que ele foi corrigido com a ajuda de uma profunda recessão (BBC, 20/12/2007). Mudança de convicções O imperialismo norte-americano procura manter o controle sobre todas as participações de empresas estrangeiras na sua indústria e sobre o capital financeiro. Pelo menos, essa era a política até a segurança e a saúde financeira dos fundos de investimento norte-americanos entrarem em uma situação crítica. Como medida para obter mais proteção dos efeitos negativos da quebra do mercado subprime, o sistema bancário está disposto a aceitar a participação do capital que antes recusava. Ainda segundo a revista The Economist, os EUA nem sempre foram receptivos a investimentos estrangeiros. No verão de 2005 CNOOC, a companhia estatal de petróleo da China, vendeu uma participação à Unocal, uma companhia petrolífera da Califórnia após o rosnar de políticos de todos os matizes sobre o perigo que isto representaria à segurança nacional dos EUA. Mais tarde no mesmo ano, uma firma capitalizada pelo governo de Dubai foi forçada a abrir mão de um negócio em que adquiriria uma parcela dos portos norte-americanos após uma reação similar. Segundo os analistas da pró-

3 pria burguesia imperialista, o desespero parece ter dosado as atitudes com relação a aceitar dinheiro da China e do Golfo Pérsico. A preocupação dos economistas burgueses está, claro, voltada a resguardar o sistema financeiro internacional do imperialismo do abalo que a recessão prevista para os próximos anos certamente irá causar. ( ) Se o enxugamento do crédito se ampliar e tomar um empréstimo se tornar mais difícil, não apenas para o mercado imobiliário, mas em outras áreas do mercado de débitos (como propriedades comerciais ou cartões de crédito) os fundos do mercado financeiro terão muito mais dificuldade para emprestar aos bancos. Mais ainda, uma recessão nos EUA e na Europa poderia ampliar estes problemas tanto quanto causar problemas por si só. O acerto de contas final pode acabar sendo muito doloroso (The Economist, 21/12/2007). Os banqueiros e grandes investidores estão preocupados em encontrar uma alternativa para o enxugamento do mercado de capitais previsto para os próximos anos. Uma das alternativas apontadas pelo jornal britânico Financial Times foi a criação de um novo fundo de investimento estruturado para competir com fundos de investimentos estatais no Oriente Médio e na Ásia, que passaram a cumprir o papel de atravessadores dos créditos podres do subprime revertendo dinheiro a companhias nos EUA e na Europa. O esforço provavelmente poderá ser capitaneado pelo Fundo de Investimento Público da Arábia Saudita, que possui instruções de investir apenas internamente. Anteriormente, a riqueza do petróleo saudita ia em parte para o banco central do reino, a Autoridade Monetária da Arábia Saudita, e parte para os cofres da família real (Financial Times, 21/ 12/2007). Na mesma medida em que os bancos e fundos de investimento retiram seu capital do mercado financeiro, procuram clientes que ofereçam garantias mais seguras de que manterão seus compromissos. Juntamente com isso, as agências que qualificam o crédito disponível no mercado passarão a uma reclassificação e o aumento do rigor quanto à verificação da capacidade de pagamento dos tomadores de empréstimos. No entanto, o governo e o banco central, que já intercederam para garantir a sobrevivência de bancos e financeiras dedicadas ao mercado subprime de empréstimos imobiliários, podem temer, segundo a avaliação do Financial Times, a pressão por auxílio em outras áreas. Uma vez que o governo ajudou os proprietários de imóveis, ele abriu um precedente. Ele ajudará outras categorias de tomadores de empréstimos quando o mercado começar a sentir a pressão do reajuste das taxas de juros para os assim chamados alt- A, ou tomadores de empréstimos prime, dos quais se espera uma leva para 2010 ou 2011?. A proposta de criação de um novo fundo de investimento estruturado, nem bem amadureceu, e já foi descartada pelos maiores bancos de Wall Street. Os acontecimentos ultrapassaram os esforços [para criar o fundo]. Quando começaram a reunir ações, os bancos já estavam enfrentando seus próprios problemas (The Wall Street Journal, 22/12/2007). Sem tempo para contornar a crise, que tem sua expressão mais clara no excesso de débitos assumidos por diversos bancos e entidades de crédito relacionadas ao mercado subprime, nem o Fed, nem o governo norte-americano que tomou a iniciativa de impulsionar a criação deste novo fundo, já fracassado, o imperialismo norte-americano se vê cada vez mais desamparado diante da iminente recessão. As tentativas de adiar o efeito bola de neve da crise do subprime sobre outras áreas do mercado financeiro e sobre a economia real, isto é, a indústria e o comércio, estão fracassando, uma após a outra. As medidas recessivas têm sido evitadas a todo custo, da mesma forma que a inflação. O resfriamento da economia por um lado, e as tendências inflacionárias de outro, tendem a encontrar a parcela da população que pagará com seu suor pela crise: a classe operária. É este efeito que a burguesia imperialista tenta evitar a todo custo, pois enquanto a crise é desviada para mercados secundários como o latino-americano e o sul-asiático, ainda é possível manter em relativa estabilidade as relações entre a classe operária do país mais industrializado do mundo e sua burguesia. O que vem sendo evitado a todo o custo é exatamente o momento em que a crise atingir um dos centros nervosos do capitalismo mundial. Os dados e o paulatino avanço da crise neste ano mostram que este momento está cada vez mais próximo. O balanço do ano é claro: ao contrário das previsões otimistas sobre o caráter passageiro ou localizado da crise, esta mostra-se agora como uma crise geral, prolongada e profunda. A crise, que é acompanhada pela crise política em vários países como uma sombra, é o resumo da amarga política imperialista da segunda metade dos anos 80 e dos anos 90 e encerra todo um esforço do imperialismo de contornar a crise capitalista geral e histórica, não uma mera crise conjuntural, que se abriu nos anos 70 com a liquidação do sistema monetário baseado no dólar fixo e com a recessão generalizada de 74-76. Estas tentativas buscaram conter as tendências revolucionárias que se formaram como um grande cataclismo político nos anos 70 e 80. Agora, as portas da crise se abrem de par em par após uma longa agonia de 10 anos da política imperialista. Atividades do PCO Nesta semana, em Causa Operária A lei e a ordem da polícia e da justiça burguesa O caso do garoto Carlos Rodrigues Júnior, que foi torturado e assassinado por policiais dentro de sua própria casa é mais uma prova de que a repressão no Brasil está dirigida contra a população pobre. Leia nesta edição a cobertura completa e mais... O turbilhão no mercado financeiro já anuncia qual a perspectiva para o próximo ano: recessão e inflação. Leia nesta edição o balanço do ano, as análises e comentários dos economistas burgueses e as perspectivas colocadas para o mercado financeiro extremamente debilitado pela crise dos empréstimos imobiliários subprime e o efeito desencadeado em instituições de crédito de todo o mundo. 100 anos do massacre de Santa Maria de Iquique Um dos maiores massacres contra a classe operária da América Latina, ocorrido em 1907 no Chile, cumpre o seu centenário em meio ao esquecimento e à falta de acesso sobre este episódio por parte do grande público. Leia nesta edição o resgate histórico e a cobertura completa. Reveillon do PCO: Com certeza o público certo para nós Leia nesta edição a entrevista com Willy Verdaguer, baixista e compositor que fundou juntamente com outros músicos latinoamericanos o grupo Raíces de América, que se apresentará na festa de Reveillon do PCO neste ano. A Revolução Russa nas artes e na cultura Leia nesta edição a primeira parte de um artigo dividido em três partes sobre o desenvolvimento

4 das artes plásticas na época da Revolução Russa de 1917. Adquira já o seu exemplar do jornal Causa Operária e fique por dentro do que está acontecendo no País, no mundo, no movimento operário e estudantil e diversos temas. Leia, apóie e divulgue a imprensa operária e independente dos patrões e do governo. Fortaleça o trabalho do jornal Causa Operária, faça já sua assinatura e receba em casa, todas as semanas, o seu exemplar. Entre em contato: tel. 11-5584- 9322, assinaturas@pco.org.br História Chile 100 anos do massacre de Santa Maria de Iquique Um dos maiores massacres contra a classe operária da América Latina cumpre o seu centenário em meio ao esquecimento e à falta de acesso sobre este episódio por parte do grande público, principalmente para a classe operária O episódio mais sangrento da história do movimento operário chileno, o massacre de Santa Maria de Iquique, no extremo Norte do Chile, na província de Taracapá, completa 100 anos. Foi no dia 21 de dezembro de 1907 que o governo presidido por Pedro Montt (1906-1910) destacou o Exército e a Marinha para exterminar os operários do salitre - dentre homens, mulheres e crianças - que reivindicavam apenas aumento salarial e melhores condições de trabalho ante a uma situação precária existente até hoje. Foram fuzilados na Escola Domingo Santa Maria, na cidade portuária de Iquique, mais de cinco mil operários, dentre chilenos, bolivianos, peruanos e argentinos. Porém, até hoje não se sabe o número exato do massacre. O governo chileno, na época, sob forte censura à imprensa, admitiu os números de cento e vinte seis mortos e cento e trinta e cinco feridos, mas não há dúvida de que a cifra é bem maior, tamanha foi a selvageria usada para sufocar o movimento dos trabalhadores. Comandados pelo general Roberto Silva Renard, chefe da Primeira Divisão e Comandante Geral das Armas de Tarapacá, este sob as ordens do ministro do Interior Rafael Segundo Sotomayor Gaete, as tropas militares chilenas foram mobilizadas para sufocar a greve geral dos operários que trabalhavam nas minas de salitre. No dia 10 de dezembro daquele ano, os operários cruzaram os braços da salitreira de San Lorenzo. A partir daí a greve se ampliou para outras jazidas, incluindo Peru, Argentina e Bolívia, transformando-se rapidamente no maior movimento grevista do País até então. Milhares de trabalhadores grevistas de San Antonio chegaram a Iquique, concentrando-se no hipódromo da cidade, no dia 16 de dezembro. Os operários esperavam que o governo local pudesse intermediar suas reivindicações com as propostas patronais. No entanto, além de não haver nenhuma proposta dos patrões, o governo enviou para Iquique vários regimentos vindos de Valparaíso. Do dia 16 ao 18, militares não pararam de chegar, encurralando os trabalhadores que estavam alojados na Escola Domingo Santa Maria e na praça Pedro Montt. No dia 19, chegou à cidade o coronel Sinforoso Ledesma, acompanhado do general Roberto Silva Renard e do intendente titular, Carlos Eastman Quiroga. Os trabalhadores, no entanto, continuavam a chegar em Iquique. Estima-se que no dia 21, mais de 13 mil operários estavam reunidos na praça Manuel Montt e na Escola Santa Maria. Os trabalhadores do oro blanco As oficinas salitreiras funcionavam a pleno vapor quando se teve notícia do início de uma greve dos trabalhadores de Alto San Antonio, na província de Tarapacá, conhecida por gigantescas greves operárias que vinham se organizando no anarcosindicalismo. Já em 1904, a Comissão Consultora das Províncias de Taracapá e Antofagasta, presidida pelo ministro do Interior, Rafael Errázuriz Urmeneta, redigiu um documento reconhecendo o perigo de manter os trabalhadores sob um grau tão profundo de exploração: Não se deve passar desapercebido que encontramos em frente um mal-estar efetivo que se reflete de maneira ostensiva nas relações entre os empresários e os assalariados, e que este mal-estar resultará conseqüências sociais e políticas de caráter perigoso se não forem adotadas medidas eficazes e imediatas (Portal PiensaChile). A crise econômica impulsionou naquele momento um grande ascenso de greves que vai de 1903 a 1907: a desvalorização da moeda fez cair a taxa de câmbio do peso chileno de 18 a 7 centavos de libra esterlina, levando a uma forte alta dos alimentos. Apesar da degradação do seu nível de vida e das duras condições de trabalho, as reivindicações dos operários do salitre da Província de Taparacá, no final de 1907, são bastante moderadas. Reivindicam serem pagos em moeda legal e não em bônus. Emitidos pelas empresas, estes últimos só podem ser trocados pelos produtos disponíveis nos armazéns (pulperías) destas mesmas empresas, com preços maiores que os do mercado livre (Le Monde diplomatique, dezembro de 2007). Outras reivindicações acompanhavam esta demanda básica e elementar: estabilidade dos salários através de um padrão de câmbio fixo de 18 pence (peniques) de libra por um peso; proteção ao trabalho perigoso; escolas noturnas financiadas pelos patrões; em algumas categorias pedia-se aumento emergencial de salário para compensar a desvalorização monetária (idem). Cantata de Santa María de Iquique Autor: Luis Advis Intérprete: Quilapayún (introdução) Señoras y señores, Senhoras e senhores, venimos a contar, Viemos contar, aquéllo que la historia aquilo que a história no quiere recordar. não quer recordar. Pasó en el Norte Grande, Aconteceu no Norte Grande fue Iquique la ciudad, Foi na cidade de Iquique, mil novecientos siete marcó fatalidad. 1907 foi marcado pela fatalidade Allí al pampino pobre mataron por matar Alí o pampino pobre mataram por matar. Seremos los hablantes, diremos la verdad, Seremos porta-vozes, diremos a verdade verdad que es muerte amarga de obreros del salar. verdade que é morte amarga de operários do salitre Recuerden nuestra historia de duelo sin perdón, Recordem nossa história de dor sem perdão, por más que el tiempo pase no hay nunca que olvidar. por mais que o tempo passe nunca se deve esquecer. Ahora les pedimos que pongan atención. Agora lhe pedimos que prestem atenção.

5 Neste momento, o governo de Germán Riesco passava por uma enorme crise política por causa da guerra de 1891. Os trabalhadores do Norte salitreiro estavam completamente desamparados por leis trabalhistas e morriam aos montes por causa dos altos riscos nas minas. Mesmo com a advertência da Comissão, o governo parecia não estar tão preocupado com a movimentação dos operários do setor de maior renda para a economia chilena. Paralisações ou greves em cidades como Iquique e Pisagua, traziam graves prejuízos para o mercado de exportação do chamado ouro branco. Em 1906 assumiu o presidente Pedro Montt, que somente fez aprofundar a crise econômica do País com a desvalorização do papel moeda. Um ano depois, os salitreiros faziam uma nova greve, paralisando várias minas e batizando o movimento de greve dos 18 peniques. Os trabalhadores das minas de Alto San Antonio marcharam até Iquique, levando bandeiras do Chile, Peru, Bolívia e Argentina, para abrir negociações em torno de suas demandas aos patrões através do governo. Ao chegar na cidade, pararam no Clube Hípico para descansar da marcha pelo deserto. Cada vez mais operários se juntavam à greve e vinham de todos os lugares da região de Tarapacá. Muitos chegavam nos trens pertencentes às empresas salitreiras. A cidade ficou completamente paralisada e a massa se alojava também na escola Santa Maria. A imprensa local tratava os operários com respeito e dizia que a situação era tranqüila, até a chegada do Intendente titular Carlos Eastman e do general Roberto Silva Renard. A esta altura, enquanto o governo prometia negociações com os patrões, a cidade fora totalmente sitiada e cercada pelos militares. O general Silva Renard ordenou que os trabalhadores abandonassem a escola Santa Maria e a praça Manuel Montt, caso contrário, dispararia contra a multidão desarmada. Foi o que aconteceu. Duas metralhadoras pesadas e inúmeros soldados armados de fuzis dispararam contra homens, mulheres e crianças desarmados e sem defesa. Os muros da escola, feitos de madeira, não impediam as balas. Era o fim da greve, o fim de uma fermentação revolucionária dos trabalhadores chilenos, que voltariam ainda a ser vítimas de outros crimes igualmente monstruosos durante a ditadura de Augusto Pinochet quase 70 anos depois. Um número desconhecido de operários mortos em poucas horas Enquanto o movimento pedia uma negociação com os patrões com a intermediação do governo, os donos das minas diziam que negociariam somente se o trabalho fosse retomado. Ordens expressas vindas diretamente de Santiago ordenavam que os trabalhadores deixassem a escola e a praça e voltassem imediatamente para o trabalho nas usinas. Mas os grevistas se recusaram, pois já sabiam que se voltassem a trabalhar, suas reivindicações não seriam atendidas, como das vezes anteriores. A tensão aumentou ainda mais quando seis operários foram mortos ao tentarem ir embora de Iquique. Era o início da matança premeditada pelos militares e pelo governo. No dia seguinte, 21 de dezembro, foram realizados os funerais dos operários. Logo em seguida, os militares fizeram um ultimato, ordenando que os trabalhadores deixassem a escola e se encaminhassem para o hipódromo, como se o ultimato fosse uma chance de sobrevivência. Na verdade, já estavam condenados à morte. Mas os trabalhadores não confiavam nos militares e novamente se negaram a sair da escola e seus arredores. Sabiam que seriam mortos no Clube Hípico. Os jornais publicaram então um decreto de Estado de Sítio em nome do intendente Eastman. O Silva Renard e o coronel Sinforoso Ledesma estavam encarregados de dissolver a greve naquele momento e disseram ao comitê de greve que se os trabalhadores não abandonassem a escola, abririam fogo. Os operários estavam enfurecidos com a morte de seis companheiros e só desejavam uma condição de vida decente. Todos se negaram a ir embora. Foi então que, às 15h45, as armas começaram a atirar, derrubando dezenas de trabalhadores que estavam nas primeiras fileiras. A multidão partiu desesperada em direção aos soldados numa tentativa insana de parar a saraivada de balas, mas cada vez mais trabalhadores iam caindo durante o trajeto. Os militares iam avançando até entrar nas dependências da escola. Aos trabalhadores não restavam outra alternativa senão se esconder pelo pátio e nas salas de aula. Os soldados arrombavam as portas e disparavam contra centenas de homens, mulheres e crianças que gritavam em pavor, dor e histeria. Da mesma forma que começaram a atirar, os soldados finalmente soltaram seus dedos do gatilho. A visão era a de uma chacina gigantesca, com pilhas de cadáveres encharcados no chão vermelho de sangue. O terror não havia acabado para a minoria que sobreviveu. Estes não sabiam mais se talvez seria melhor estar no meio daquela pilha do que ser levado pelos militares. Todos foram levados à força para o hipódromo, onde também muitos outros foram mortos. O governo assustado com a sua própria obra sangrenta impôs uma completa censura à imprensa e tratou de providenciar a volta dos sobreviventes aos seus locais de origem o mais rapidamente possível. Os patrões, após o massacre de Santa Maria, resolveram dar algumas concessões mínimas aos operários mineiros, receando que o movimento grevista tivesse uma nova retomada. Muito pouco se produziu para documentar e marcar na história este assassinato em massa. As poucas iniciativas são hoje em dia raridade e estão longe do grande público, principalmente da classe operária, devido ao esforço por rasgar esta página da história. Existem algumas obras literárias, poéticas, teatrais e musicais sobre o massacre, como o livro Resenha histórica de Tarapacá, de Carlos Alfaro Calderón e Miguel Bustos, publicado em 1935. Talvez a obra de mais fácil acesso hoje em dia seja a gravação realizada pelo grupo chileno Quilapayún, em 1970, composta por Luis Advis, que retrata através de ritmos folclóricos nacionais a história do massacre de Santa Maria de Iquique. O massacre da Escola Santa Maria é um símbolo, mas apenas um dos incontáveis exemplos da ferocidade com que a classe dominante em toda a América Latina, a serviço do opressor estrangeiro, sempre tratou os povos e os trabalhadores dos seus países e continua até os dias de hoje. Que a classe operária brasileira e latino-americana nunca se esqueça de quem são eles e do que eles são capazes. Há 100 anos... como hoje Até 1907, os operários do salitre já possuíam uma longa história de greves contra seus patrões Os mineiros do salitre chegavam a trabalhar uma carga horária de oito a dez horas por dia - jornada que perdura até hoje - sob elevadas temperaturas no verão e no frio absoluto durante o inverno. Os operários não tinham acesso a água potável, luz, ventilação adequada e eram obrigados a carregar o salitre da forma mais bárbara. Muitos morriam asfixiados pelo pó ou intoxicados. Morriam também em explosões nas minas ou eram mutilados pelas rudimentares máquinas usadas para se extrair o salitre. Mesmo sob condições deploráveis, os trabalhadores recebiam constantemente castigos físicos e não recebiam seus salários irri-

6 sórios em dinheiro. No lugar, recebiam vales que podiam ser trocados em postos autorizados pelos proprietários das minas. A classe operária chilena recebia inevitavelmente a influência da luta da classe operária em todo mundo, que também sofria dos mesmos abusos e eram submetidos a condições subumanas de trabalho. Cada vez mais se ouvia falar na união consciente dos trabalhadores para conquistarem seus direitos. E ainda que não tivessem detonado as revoluções mexicana (1910) e russa (1917), a classe operária chilena já acumulava centenas de greves na primeira década do século XX. Foram mais de 200 greves entre 1902 e 1908, sendo metade delas só nos setores salitreiras. Conhecida como a Greve dos 18 peniques, iniciada no dia 10 de dezembro e concluída com um massacre, os trabalhadores reivindicavam apenas necessidades imediatas, como a aceitação do pagamento em dia dos vales ou a substituição por dinheiro, melhoria das condições de trabalho, escolas noturnas para os operários e permissão para visitas, uma vez que os operários eram proibidos de sair das oficinas e de receberem visitas. O nome penique refere-se à moeda britânica, a libra esterlina, que é dividida pela unidade não decimal penny, no plural pence, em português e espanhol penique. Os mineiros reivindicavam, além do pagamento dos salários em moeda corrente do país e não em bônus, que o salário em pesos fosse padronizado pela libra (o que hoje chamaríamos de dolarização do salário) para que não se desvalorizasse, ou seja, reivindicavam que fosse 18 peniques independentemente da taxa de câmbio entre o peso chileno e a libra esterlina britânica, uma forma de escala móvel de salários. Em 1890, 52% das rendas obtidas em exportação vinham do comércio do salitre, e quase 60% da exploração salitreira estava nas mãos de estrangeiros, especialmente ingleses. A figura do inglês Thomas North, dono da companhia distribuidora de água potável, de quinze oficinas salitreiras, quatro ferrovias, proprietário do Banco de Tarapacá e Londres e da companhia distribuidora de alimentos, é emblemática e simbólica do predomínio inglês nos negócios chilenos (...) Em 1907, a participação do salitre chegaria a 44% das rendas chilenas com exportação, rendas essas advindas dos impostos aduaneiros, já que todo o negócio de exploração, produção e transporte do salitre estavam em mãos estrangeiras (La Insignia/asCcientia). Em 1907, a exploração do salitre empregava cerca de 110 mil operários em todo o Chile, sendo que muitos eram de nacionalidade peruana ou boliviana. As regiões desérticas do Tarapacá até Antofogasta são muito ricas em reservas salitreiras. Os ingleses possuíam o monopólio do salitre, sendo os verdadeiros donos das minas desde a vitória do Chile em sua guerra limítrofe contra a Bolívia e o Peru, entre 1879 e 1883. Até 1924 o salitre foi a principal fonte alimentadora da economia chilena, que dependia do investimento estrangeiro. A desvalorização do salitre foi decaindo paulatinamente. Em 1929 já representava 23% da exportação nacional. A queda dos preços do nitrato no mercado internacional foi dando lugar aos poucos a exploração do cobre. Hoje, Iquique é um dos principais portos do Norte Chileno por onde passa, também, boa parte do comércio internacional boliviano vindo de Oruro. Internacional Crise do regime Premie da Índia propõe criação de força especial para combater a guerrilha Temendo um ascenso revolucionário das massas impulsionado pelos diversos grupos guerrilheiros, a Índia quer investir nas forças de repressão para manter o regime burguês e sua política pró-imperialista O primeiro-ministro da Índia, Manmohan Singh, disse em uma entrevista na sexta-feira que o maior problema para a segurança nacional é a permanente ameaça da guerrilha dominar o País. Vale especificar que a ameaça mencionada pelo premie se dirige diretamente contra o Estado e o regime burguês em um país chave não só para a Ásia, mas para todo o mundo. Singh destacou a insurgência naxalita, o PCI-ML (Partido Comunista da Índia- Marxista Leninista), grupo rebelde que atua desde a década de 60 principalmente nas regiões remotas do país. Os naxalitas chegaram inclusive a instituir administrações locais em áreas libertadas em vários Estados indianos. Ele propôs a criação de uma força especial para combater os vários grupos guerrilheiros do chamado corredor vermelho, uma faixa que começa na região central da Índia, passando pela costa Leste até o Norte, na fronteira com o Nepal. Só os naxalitas contam com forte influencia em 13 dos 28 estados da Índia, principalmente nas comunidades camponesas e indígenas. Disse no passado que o extremismo esquerdista era o maior desafio individual de segurança para o Estado indiano. E ele continua sendo. Não tem um dia em que não ocorra um incidente provocado pelo extremismo esquerdista. Eles estão alvejando meticulosamente todos os aspectos da atividade econômica, afirmou o premie (Tribuna da Imprensa, 22/12/2007). Dentre os variados grupos rebeldes, que vão desde grupos que se consideram comunistas até grupos separatistas e islâmicos, centenas de pessoas morrem em atentados todo o ano. Uma das últimas ações ocorreu no estado de Chattisgarh, Leste da Índia, onde militantes naxalitas tomaram uma prisão e libertaram outros rebeldes. O mesmo grupo realizou em março um atentado a bomba contra um posto policial no mesmo estado, matando 49 agentes. Visando estabilizar a região, Índia e China realizaram nesta semana pela primeira vez manobras militares conjuntas. Na quarta-feira passada, 100 soldados de cada exército participam de uma operação de nove dias na província de Yunnan, Sudoeste da China. A China e a Índia são importantes vizinhos e os dois maiores países em desenvolvimento do mundo. Devemos manter a paz, estabilidade e tranqüilidade na região fronteiriça e devemos impedir que ela se torne um obstáculo para o desenvolvimento das relações bilaterais disse o porta-voz da Chancelaria chinesa, Qin Gang (Idem), reiterando a importância política dos dois países para o mundo e para a dominação imperialista na região. Leia e assine o jornal CAUSA OPERÀRIA Informações: Rua Miguel Stéfano, nº 349, Saúde, São Paulo, Capital, CEP 04301-010 (11) 5584-9322

7 Nacional Ditadura Dom Cappio encerra greve de fome após STF ceder à ditadura civil de Lula O bispo iniciou seu protesto quando o presidente Lula desconsiderou a decisão do STF (Superior Tribunal Federal) proibindo as construções da transposição do rio São Francisco Após 23 dias em greve de fome, o bispo de Barra na Bahia D. Luiz Flávio Cappio, declarou o seu fim após desmaiar e ser internado no Hospital Memorial Petrolina (PE). O anúncio foi feito durante a missa campal realizada pelo bispo de Juazeiro d. José Geraldo, em frente à capela de São Francisco em Sobradinho (BA). O bispo ficou mais de dois dias internado e recebeu alta apenas neste sábado. Segundo o médico Klauss Finkam, que acompanhou o protesto, não há riscos de seqüelas, embora seu estado seja delicado. O bispo iniciou seu protesto quando o presidente Lula desconsiderou a decisão do STF (Superior Tribunal Federal) proibindo as construções da transposição do rio São Francisco. As obras para da transposição do rio são as maiores já realizadas pelo presidente Lula. A estimativa de gastos até 2010 é de R$ 4,5 bilhões, e consiste em cerca de 700 quilômetros de canais de concreto levando parcela da água do rio para quatro estados nordestinos. Embora, em seguida o STF tenha mudado a sua posição em relação à transposição fica patente neste fato o próprio funcionamento do Estado, e ilusória divisão de poderes entre executivo, legislativo e judiciário. Segundo as declarações de Lula, ele não cederia de modo algum às pressões do bispo, mesmo com riscos à sua saúde, pois segundo ele Se o Estado cede, o Estado acaba. E o Estado precisa funcionar. Entretanto, a pressão do bispo neste sentido esconde a verdadeira pressão, através da proibição, realizada pelo STF. Ou seja, Lula desnuda frente a todos que o Estado, não é constituído pelos três poderes, mas simplesmente por um: o executivo. Pois segundo ele, o executivo não pode ceder ao STF, senão deixaria de funcionar. Assim o STF não faria parte do Estado. Mas apenas o Executivo, e pode-se dizer ainda, o próprio Lula. Eis a lógica destas afirmações de Lula. Tal como um dos principais monarcas absolutistas franceses, conhecido como o rei Sol, Lula nos diz que o Estado sou eu. A crise cada vez mais eminente no país, a divisão da burguesia, o avanço da classe operária, embora lento e gradual, destrói o verniz democrata e torna cada vez mais límpida a ditadura existente no país. Cultura O desenvolvimento das artes plásticas na época da Revolução Russa A Revolução Russa nas artes e na cultura Acompanhando a onda revolucionária que toma conta da Rússia czarista, artistas das mais diversas tendências estão promovendo sua própria revolução, expandindo como nunca antes as barreiras das artes plásticas e colocando-se na linha de frente da vanguarda artística mundial, naquele momento em plena ebulição O surgimento da cultura russa Embora a cultura na Rússia remonte ao início do século VI, a arte naquele país tomou um caráter nacional apenas por volta do século X, época em que o império russo converteu-se à religião cristã e voltou-se à influência européia. Junto com o cristianismo, chega à Rússia uma nova estética, e acompanhando a construção de centenas de igrejas pelo país, vieram também seus adornos, afrescos e ícones bizantinos. Com o decorrer dos séculos, o estilo de Bizâncio, que havia sido tomado como exemplo, foi gradualmente adaptado ao gosto popular russo, e tomou inúmeras formas diferentes, dada a grande extensão de seu território. Durante cerca de nove séculos, os objetos e ícones religiosos foram quase que exclusivamente, as únicas formas de arte conhecidas pela população russa. No entanto a situação começou a se modificar rapidamente a partir do século XVIII, durante o reinado do czar Pedro, O Grande. Graças ao seu progressista plano de modernização e industrialização do país, o Império Russo aproximou-se novamente dos países mais desenvolvidos da Europa, brindo-se à sua influência, tanto tecnológica, quanto cultural. Principalmente nas grandes cidades, como na capital São Petersburgo, começaram a aparecer grandes palácios no estilo europeu, decorados com os temas mais modernos da pintura da época. Eram retratos, paisagens, naturezas mortas, e posteriormente, temas históricos, mitológicos e bíblicos. Essas novas influências foram decisivas no desenvolvimento da cultura russa e transformou radicalmente o rumo que as artes plásticas tomariam. Essa linha de desenvolvimento permaneceu praticamente ininterrupta até a derrubada do regime czarista com a revolução russa de 1917. Tendências do século XIX: Do Romantismo ao Realismo Um dos primeiros incentivos ás artes na Rússia do século XVIII, foi a fundação da Academia de Belas Artes em São Petesburgo, destinada à formação de arquitetos, escultores e pintores. Após cerca de um século de imenso incentivo às artes, o início do século XIX já contava com a existência de grandes complexos arquitetônicos, além de mestres de primeiro plano na pintura, como os românticos Karl Briullov e Ivan Aivazovski. Se a segunda metade do século XVIII e início de XIX foi dominada pela influência do romantismo, a partir da segunda década do século XIX, a crise do regime czarista promoveu uma modificação significativa no cenário das artes. Após a derrota das tropas de Napoleão no interior da Rússia em 1812, os servos, que representavam a parcela mais explorada da população, após verem-se na posição de libertadores da Rússia, começam a se mobilizar ativamente no sentido de sua libertação, que é conseguida em 1861. Esse ascenso no processo revolucionário,que atinge um de seus picos no século XIX, como assassinato do czar Alexandre II em 1881, se traduz no terreno artístico com o deslocamento de interesses dos pintores, assim como dos escritores, poetas e músicos para a esfera social, ou seja, passam a refletir a revolução em curso no país. É nesse período que surge a melhor literatura russa, de Puchkin a Gógol. Também é a época do

8 compositor Tchaikóvski e dos grandes balés russos. Na pintura, a modificação de interesses se materializou com o surgimento dos chamados pintores realistas. Movimento similar ao francês mas que desenvolveu uma linguagem própria. O foco de suas preocupações era o retrato da vida tal qual se apresentava, sem nenhuma tentativa de encobrimento, embelezamento ou idealização. As obras mais representativas desse período são quadros cruciais como Os barqueiros do rio Volga de iliá Riépin e Os Caçadores de Vasíli Pierov, que era também amigo do escritor Fiódor Dostoievski e pintou seu retrato mais famoso. Como é comum no mundo das artes, diversas tendências artísticas coexistiram durante todo o século XIX. Paralelamente aos pintores realistas, comprometidos em retratar a vida difícil da população camponesa trabalhadora, chamando atenção para os graves problemas sociais do país e exigindo uma modificação política, existiam também, não poucos pintores, que apesar de seu brilhantismo, viviam completamente alheios à realidade social da maioria do país. Suas obras eram dedicadas a retratar a beleza da vida em todas as suas manifestações, e independentemente dos estilos específicos, essas obras ficaram conhecidas na Rússia como arte de salão devido o seu caráter elitizado. Tais obras, que se proliferavam à margem da pintura realista e social, em finais do século XIX, provocavam o desprezo das novas gerações de artistas. À arte de salão, esses jovens proclamavam a necessidade de se retratar a verdade, porém este retrato da verdade também passava longe das pintura realista vigente. Consideravam que a pintura figurativa, tal qual era concebida, havia atingido um ponto de esgotamento, e além do mais, o surgimento das novas tecnologias, em particular da fotografia, havia libertado a pintura da necessidade de retratar fielmente a realidade, e buscavam, assim como os impressionistas franceses, novos caminhos para o desenvolvimento das artes plásticas. A renovação da cultura russa no início século XX Essa busca pelo verdadeiro se manifestou num primeiro momento, através de uma pequena elite, que iniciou a publicação da revista O mundo da arte, cujo primeiro número apareceu em 1897, e logo a seguir se consolidou como um grupo artístico com o mesmo nome. Encabeçavam este grupo figuras como o Serguéi Diaguilév, que consolidaria seu nome posteriormente como organizador das famosas temporadas de balé russos com o famoso Nijinski; e o artista plástico, crítico e historiador de arte, Aleksandr Benois. Abertos à cultura mundial, os participantes do grupo reintroduziram na Rússia o interesse pelo Ocidente organizando exposições de artistas tanto russos, quanto europeus, além de diversas exposições buscando a revalorização da cultura russa dos séculos anteriores. Umas das principais contribuições do grupo foi em termos de publicações. Foram lançados livros destacando a cultura dos mais diversos países, renovando o interesse dos mais variados aspectos da vida cultural, tais como o teatro, a música, as artes plásticas, em publicações freqüentemente ilustradas. Uma das mais bem sucedidas atuações do grupo foi no teatro, elaborando concepções inovadoras tanto na cenografia, quanto nas músicas, performances e figurinos das peças. Diaghilev reuniu em torno de si, nomes como o dos pintores Lev Blazsk e Nikolai Rerikh, dos compositores Korsakov e Stravinski e bailarinos como Nijinski, que revolucionaram o teatro e o balé da época. Significativas tambem foram as novas concepções de construção pictórica dos espetáculos, que chamavam de pinturas em movimento e através de talentosos artistas plásticos, unificaram os cenários e figurinos das peças. Entraram para a história, montagens de peças como a A Sagração da Primavera e Petruchka de Stravinsky. A atividade do O Mundo da Arte se mostrou de grande importância para a renovação cultural que estava por vir, pois os primeiros germes da vanguarda russa começaram a se formar ao redor desse movimento. Graças à grande movimentação revolucionária que se processava no interior da sociedade russa, os incentivos culturais promovidos principalmente pelo movimento O Mundo da arte, mas não só ele, encontraram terreno fértil para se desenvolver na virada do século XX. A liberdade na escolha de temas, estilos e gêneros de criação demonstrada pelos participantes do grupo promoveu uma grande integração com diversos artistas, mesmo que estes muitas vezes não concordassem com a estética do grupo. Paralelamente às suas atividades, deve-se ressaltar a importância de grandes patronos das artes que promoveram um gigantesco intercâmbio cultural entre o que existia de mais moderno nas pinturas russa e européia. Eram homens como o magnata dos caminhos de ferro Savva Mamontov, ou Ivan Morozov, que adquiriu e expôs na Rússia dezenas de quadros de Monet, Cézanne e Gaugin. Outro audacioso colecionador russo era Sergei Shchukin, que nos primeiros anos do século XX visitou Paris constantemente e levou para serem exibidos em seu país mais de cinqüenta quadros de Picasso e Matisse. A reação vanguardista O interesse geral dos artistas modernistas europeus pela arte arcaica e primitiva, destacadamente os ícones africanos, transformaram-se, dentro da Rússia, em um renovado interesse pelas suas próprias tradições folclóricas, que eram riquíssimas. Como resultado disso, alguns dos integrantes do grupo Mundo da arte, entre eles Filip Maliávin e Nikolai Rérikh, aprofundaram-se nos estudos da vida simples de seu povo e ao terminar suas viagens, Maliávin pinta em 1900, toda uma série de camponesas vestindo típicas roupas coloridas. A ausência de requinte no tratamento e o frenesi do movimento e das combinações cromáticas, já denotam uma profunda influência do movimento fauvista sobre o pintor, mas com uma agressividade já estranha aos seus colegas franceses. Um quadro que pode ser considerado o apogeu da aceitação do fauvismo entre os pintores russos, seria o quadro Meninos de Kuzmá Pietrov Vódkin, executado em 1911. Em uma exposição de 1910, o pintor Larionov funda o grupo O valete de Ouros, com uma estética aproximada dos pintores expressionistas, e caracterizada pelo interesse pelo primitivismo popular russo. Retratava figuras humanas repletas de deformações, cores planas, e um forte impacto visual. Inovadores também são os retratados, que começaram a ser interpretados sob um ponto de vista absolutamente inovador para a arte russa. Os artistas estavam mais preocupados com a atmosfera da época, o estilo e a sensação que a figura representada causava do que com sua semelhança física, chamando atenção à intensidade de suas cores. Essa estética brutal rapidamente se popularizou entre os círculos mais avançados de pintores russos. Um dos mais brilhantes representantes dessa tendência na vanguarda russa foi Marc Chagall. Após retornar à Rússia, vindo de Paris, onde havia travado contato com o círculo de artistas do poeta Apollinaire, Chagall fica impressionado com a desolação do país, que vivia os horrores da primeira guerra, com as ruas repletas de flagelados, feridos em macas, mulheres em pânico e todo o tipo de miséria humana. As mazelas da guerra estão representadas em cada um de seus trabalhos dos anos de 1914 e 1915. Apesar da grande variedade das obras, observa-se a unidade estilística de Chagall. Unindo características cubistas, expressionistas, e sua influência das artes primitivas russas, a obra de Chagall não tem paralelo. Com um certo tom surrealista anos antes do surgimento do surrealismo, uma de suas obras mais representativas é Eu e a Aldeia, de 1911, retratando Vitebsk, sua cidade natal. O primitivismo é marcante em todos os artistas russos desse período, que rapidamente também incorporavam todos os desenvolvimentos por que a pintura européia passava e encontraram grande aceitação, mesmo que por um breve período, o impressionismo, o fauvismo e o expressionismo. O futurismo, apesar de ter influenciado em grande parte os círculos literários, não encontrou grande expressão na pintura, exceto em experimentos isolados de Kasimir Malevitch e Natalia Gontcharova.

9 Entretanto, a estética modernista que encontrou na Rússia um terreno mais fértil, com desdobramentos próprios, foi o cubismo, que funcionou como trampolim para uma série de artistas que procuravam um estilo próprio. Desenvolveram a partir daí, movimentos já bastante independentes dessas estéticas. Kandinski: um desenvolvimento isolado Enquanto que o cubismo foi a chave para a conquista da abstração para a maioria dos artistas na primeira década do século XX, Vassíli Kandinsky foi uma exceção quase isolada desta regra, mas de extraordinária influência internacional. O próprio artista descreve qual foi o momento em que descobriu o potencial da não-objetividade: Regressava de meus esboços, encerrado em meus pensamentos quando, ao abrir a porta do estúdio, vi-me de repente diante de um quadro de beleza indescritível e incandescente. Perplexo detive-me olhando-o. O quadro carecia de tema, não descobria objeto algum identificável e era composto por brilhantes manchas de cor. Finalmente me cerquei mais e só então reconheci o que aquilo era realmente: meu próprio quadro, posto de lado sobre o cavalete... Uma coisa se evidenciou: que a objetividade, a descrição de objetos, não era necessária em minhas pinturas, e na realidade, as prejudicava. Dois anos depois, em 1910, ele executou uma aquarela sem nenhuma referência figurativa ou alusão à realidade exterior, esta obra é considerada a primeira obra de arte abstrata moderna. Kandinski havia abandonado sua carreira jurídica para dedicar-se à pintura ainda em finais do século XIX. Se formou em Munique, que em sua época era um dos mais efervescentes centros criativos do modernismo. Portador de um forte misticismo, o pintor acreditava que o movimento de renovação da arte deveria vir do irracionalismo oriental e nórdico, em oposição ao racionalismo artístico ocidental. O problema central para Kandinski era se a forma e a cor, libertadas de qualquer propósito representativo, poderiam ser conjugadas dentro de uma linguagem simbólica, puramente expressiva e completamente abstrata, como a música. Em seu livro Do espiritual na arte, publicado em 1912, ele expõe essas idéias. Sua busca por uma arte que pudesse se comunicar diretamente com a alma do espectador, sem subterfúgios figurativos, simplesmente pela força e ritmo das cores. Apesar da busca pela abstração ser uma ambição compartilhada por diversos artistas vanguardistas, a obra de Kandinski guarda uma diferença fundamental às abstrações de seus contemporâneos. Enquanto que tanto os abstracionistas cubistas da Seção dourada, quanto o holandês Piet Mondrian, e russos como Kasimir Malevitch rumavam para a abstração geométrica, rigorosamente fria e intelectual; Kandinski executava um estilo que poderia ser classificado como expressionismo abstrato, marcadamente espontâneo irracional e intuitivo. Embora a grande corrente abstrata se encaminhasse para o abstracionismo geométrico, após a segunda guerra, a expressividade de Kandinski encontraria eco na chamada Escola de Nova Iorque e seu principal expoente, Jackson Pollock. A influência do cubismo na Rússia: uma primeira síntese, o rayonismo Certamente existiu um cubismo próprio na Rússia que marcou a produção de figuras importantes como Malevitch, Larionov, Popova e Gontcharova. Mas a experiência do cubismo foi, todavia, apenas relativamente útil para os russos. Promovendo a destruição da forma convencional do objeto e a substituição da ilusão tridimensional pela pluridimensionalidade dos volumes cubistas, esta estética permitiu aos artistas vanguardistas, o necessário grau de liberdade que precisariam para seguirem seus próprios caminhos. Em um curtíssimo espaço de tempo, porém, essa liberdade artística já não parecia suficientemente inovadora. Em diversos lugares do mundo, e particularmente na Rússia, muitos artistas eram da opinião de que, uma vez que o objeto havia sido finalmente destronado enquanto tema, deveria ser eliminado. É baseado em uma opinião desse tipo que em 1913, Larionov desenvolve o rayonismo, um desdobramento radical do cubismo que previa uma desmaterialização mais completa do objeto, com formas espaciais obtidas pelo cruzamento de raios refletidos de diferentes objetos, percebidos fora do tempo e do espaço. Este movimento foi criado por Larionov e Gontcharova, que por um breve período lideraram a nascente vanguarda russa. Ambos nasceram no mesmo ano e foram igualmente influenciados tanto pela arte moderna do Ocidente como pelo primitivismo dos ícones russos e pela arte folclórica. Seguindo influências do cubismo e do futurismo, tentaram efetuar a síntese desses movimentos através do rayonismo. Eu seu primeiro manifesto, é claro o tom agressivo futurista: Proclamamos que o gênio de nosso tempo é: calças, casacos, sapatos, bondes, lotações, aviões, trens, magnificentes navios... Negamos que a individualidade tenha qualquer valor numa obra de arte... Viva o nacionalismo! Vamos de mão dadas com os pintores de casas... Aqui começa a verdadeira libertação das artes: uma vida que atua somente com as leis da pintura como uma entidade independente. Todavia, no ano seguinte, os dois pintores deixaram o país como desenhistas do balé de Diaghilev. Nunca mais pisaram em solo russo, nem participaram dos anos vitais que se seguiriam. Marxismo, Política, Artes, Socialismo, Ecologia, História, Literatura, Mulheres, Negros etc. Livros novos e usados Fitas VHS Pôsteres Bótons Camisetas CD s DVD s LIVRARIA do PCO em São Paulo ENDEREÇO - Rua Miguel Stéfano, nº 349, bairro Saúde, São Paulo, Capital, CEP 04301-010. TELEFO- NE - (11) 5589-6023 INTERNET www.pco.org.br/livraria. 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