Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) no estado de São Paulo

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Transcrição:

Resumo Q8: Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) no estado de São Paulo Elaborado por Maria Fernanda Trientini e Rodrigo Muñoz Rivera Com contribuições dos grupos e do professor A política pública no campo agroalimentar se fundou, notadamente desde os anos 1960, sobre o referencial de modernização da agricultura. Entre 1964 e 1984, as decisões políticas autoritárias favoreceram a integração crescente da agricultura nos circuitos industriais e financeiros. A partir dos anos 1980, a ação pública dirigida à modernização se ajustou cada vez mais ao referencial de mercado, ancorado na visão liberal do comércio agrícola e do papel do Estado. No ano de 1995, é implantado o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), marcado pelo referencial modernizador, orientado aqui para a transformação da agricultura familiar. O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) nasceu em 2003 no âmbito do programa Fome Zero, voltado para assegurar segurança alimentar. Dessa maneira, integrando apoio à agricultura familiar e ajuda alimentar às famílias desfavorecidas, o PAA revela uma série de inovações em termos do acesso aos mercados públicos pelos agricultores familiares. Para se beneficiar do programa, o agricultor deve corresponder aos critérios do Pronaf. Ademais, a aquisição dos alimentos deve responder aos objetivos do programa de abastecer populações em situação de insegurança alimentar. Além disso, os preços praticados devem ser compatíveis àqueles praticados nos mercados regionais. Convém destacar que o programa tem particularmente o objetivo de favorecer a organização social, o que leva a uma diversidade de arranjos no nível de sua gestão local. Por outro lado, o PAA visa propiciar o aumento das margens de valor agregado embolsado pelos agricultores. O artigo analisado trata da implementação PAA no estado de São Paulo com ênfase em dois casos: o primeiro caso no assentamento periurbano denominado Milton Santos, situado na região metropolitana de Campinas, onde se encontram lado a lado um tecido urbano em crescimento permanente e a monocultura de cana-de-açúcar em escala industrial. No segundo caso, a análise se refere a dois assentamentos (Antônio Conselheiro e Margarida Alves) situados em Mirante do Paranapanema, na região do Pontal, longe dos grandes centros urbanos. Tal região é marcada por grandes zonas de pastagens degradadas convertidas gradualmente para o cultivo de cana-deaçúcar. O estudo em contraste dos dois casos permite evidenciar as mudanças provocadas pela adesão ao PAA em sua modalidade Compra Direta da Agricultura Familiar com Doação Simultânea (DS-PAA). A análise sobre a implantação do PAA salienta particularmente as modificações da lógica produtiva e alimentar das famílias assentadas, considerando a noção de multifuncionalidade da

agricultura, que é indissociável daquela de desenvolvimento sustentável. Nessa perspectiva, foram tomadas em conta dimensões em torno da geração de renda, segurança alimentar, vitalidade do tecido social rural e preservação ambiental, permitindo igualmente efetuar uma avaliação do PAA sob a ótica do referencial de circuitos curtos de proximidade (CCP). Para tal propósito, é preciso apresentar brevemente o protótipo ideal do referencial de CCP. Trata-se de uma construção sobre quatro pilares: 1. Sociedade; 2. Meio-Ambiente; 3. Economia; 4. Produtos. 1. O primeiro pilar é fundado sobre a ideia de assegurar um acesso mais equilibrado aos alimentos, de aumentar a solidariedade entre os agricultores, de encorajar a tomada de decisão cooperativa e de suprimir pressões corporativas; 2. O segundo pilar se refere ao desejo de preservação da biodiversidade, da qualidade da água e dos solos, bem como preservação das relações ecológicas como um todo; 3. O terceiro pilar se associa à promoção da ética (graças à propagação de um quadro de interação mais justo e transparente) e da autonomia em relação ao modelo industrial (com vistas, em primeiro lugar, a favorecer um modo de vida saudável e viável; em segundo lugar, a aumentar o valor agregado retido com os produtores; em terceiro lugar, a incentivar a negociação de preços justos e, enfim, melhor regular a concorrência); 4. O quarto pilar, dos produtos, se ancora na vontade de aumentar a oferta de produtos frescos e saudáveis (sem contaminantes, aditivos e tratamentos químicos), defendendo as tradições dos territórios, visando melhorar a saúde pública e o acesso aos alimentos para as famílias mais carentes. Descrição da área de estudo O assentamento Milton Santos estende-se sobre 104 hectares e é composto por 68 famílias, dispondo cada uma de parcela de um hectare. A área restante é destinada à instalação de equipamentos coletivos e à proteção da natureza, considerando as áreas de preservação permanente (APP) e a reserva legal, como previsto no Código Florestal. A maior parte das famílias assentadas no Milton Santos residia anteriormente nas periferias das cidades de Americana, Limeira e Campinas. Mas convém observar que se trata de famílias migrantes que vieram de outros estados (Paraná, Mato Grosso, Pernambuco, Paraíba, Ceará ou Sergipe) à procura de melhores condições de vida em grandes cidades. Os itinerários dessas famílias revelam múltiplas tentativas com vistas a fugir de situações de precariedade, as quais se associam sobretudo a um sentimento de insegurança. Assim, o assentamento constitui antes de tudo um meio para encontrar mais segurança em termos das vidas familiar e profissional.

No estudo no Pontal, o foco recaiu sobre os assentamentos Margarida Alves e Antônio Conselheiro. O primeiro se situa a 28 km do centro urbano de Mirante do Paranapanema. Instalado em 2006, o PA Margarida Alves ocupa uma área de 1.203 ha, onde 91 famílias residem e produzem. A maioria delas dispõe de infraestrutura básica (moradia, eletricidade, estradas), mas o abastecimento de água em termos de quantidade e qualidade não é suficiente para assegurar plenamente a produção agrícola. Por outro lado, a paisagem do assentamento é principalmente composta de um quadro monótono de pastagens erodidas, com pontuais casas e seus quintais que, apesar de não apresentarem muitas árvores, podem ser vistos nessas circunstâncias como lugares importantes de biodiversidade. O segundo assentamento, Antonio Conselheiro, foi implantado em 2000, em área de 1.078 ha, onde 63 famílias foram instaladas. Distancia-se 11 km de Teodoro Sampaio e 57 km de Mirante do Paranapanema. Tratando-se de um assentamento um pouco mais antigo, observa-se que as cercanias das casas são mais arborizadas, dispondo de pomar, o que permite ter a impressão de uma maior diversidade produtiva, reforçada notadamente pela existência de cultivos de mandioca e café. Contudo, predominam igualmente aqui pastos degradados, onde quase não há árvores. Os impactos do PAA sob a ótica do referencial dos circuitos curtos de proximidade DIMENSÃO SOCIAL No que se refere ao assentamento Milton Santos, os produtos alimentares adquiridos pelo DS-PAA são destinados a instituições de assistência social situadas em quatro municípios de seus arredores. Os dados sobre os beneficiários revelam que: 97% deles afirmam receber uma alimentação em quantidade e qualidade satisfatórias; 66% deles afirmam conhecer a origem dos alimentos, o que melhora a imagem dos assentados na região. Assim, é possível identificar, graças ao Programa, um processo embrionário de reconhecimento por parte dessa população vulnerável do papel da atividade agrícola local. DIMENSÃO AMBIENTAL Em termos ambientais, o DS-PAA incita uma diversificação na produção, o que modifica os sistemas produtivos nos assentamentos. Ademais, convém destacar que o Programa prevê uma valoração dos produtos alimentares orgânicos ou agroecológicos. No caso estudado, os assentados ainda não recebem esse valor adicional, mas essa possibilidade favorece ações e planejamentos com vistas a alcançar um reconhecimento agroecológico. A propósito, é muito comum a confusão entre alimento orgânico e alimento agroecológico. Porém existe uma grande diferença entre estes dois tipos de alimentos. A agroecologia estuda as relações produtivas entre o homem e a natureza. Ela é mobilizada para propor projetos buscando a sustentabilidade ecológica, social, econômica, cultural,

éticas e política. Aqueles que defendem a agroecologia se opõem ao agronegócio. As práticas agroecológicas se ajustam à pequena propriedade e à utilização da mão de obra familiar. A agroecologia se funda em sistemas produtivos diversos e complexos, que são adaptados às condições locais e em redes regionais e distribuição de alimentos. O alimento orgânico pode ser agroecológico ou não. Trata-se daquele que não recebeu aplicação de produtos químicos sintéticos e não tem como origem sementes geneticamente modificadas. Mas não incorpora necessariamente todas as dimensões de sustentabilidade. Para serem agroecológicos, os alimentos orgânicos devem em princípio ser cultivados de forma a considerar todas as tais dimensões sustentáveis. DIMENSÃO ECONÔMICA No assentamento Milton Santos, 50 agricultores se inscreveram em projeto no âmbito do DS/PAA em 2012, fornecendo alimentos cujo valor foi de R$ 214.997,76. Esses produtos foram destinados a cerca de 9.000 pessoas em estado de insegurança alimentar. O PAA fornece assim a principal fonte de remuneração das famílias, onde 82% das famílias vendiam mais da metade de seus produtos no âmbito do programa. No Pontal, as famílias assentadas praticam atividades agrícolas e não agrícolas conforme as oportunidades. Nestas circunstâncias, o trabalho fora do lote torna-se cada vez mais importante. Um emprego no setor sucro-alcooleiro pode ser visto como uma das únicas soluções para permanecer em meio rural, notadamente para os jovens. Nesse quadro, o PAA oferece perspectivas convincentes para evitar o crescimento do proletariado rural. Com efeito, um objetivo central do programa consiste em assegurar aumento da renda aos agricultores graças à garantia da compra de seus produtos com preço justo. Também, a diminuição da dependência do Programa Bolsa Família (PBF) constitui um fenômeno importante provocado pela adesão ao DS-PAA. A renda obtida com as vendas dos produtos alimentares graças a esse dispositivo permite aos agricultores sair de tal programa de amparo às famílias em dificuldade. Portanto, o PAA oferece uma solução de renda oriunda da produção no lugar de um benefício da assistência social. DIMENSÃO DOS PRODUTOS No assentamento Milton Santos, o PAA favorece claramente uma produção diversificada, o que permite aos interlocutores assentados mencionar muitas vezes uma melhora importante no plano alimentar das famílias 1. De fato, a alimentação de uma camada importante dos assentados se 1 A propósito da questão nutricional das famílias assentadas, estudos sobre isótopos permitem realizar avaliações sobre a alimentação dos indivíduos. Uma avaliação socioeconômica e nutricional efetuada no assentamento São Sebastião, em Pirambu no Sergipe, revela que 44,7% dos adultos estão com excesso de peso. Segundo os autores deste estudo, tal fenômeno está relacionado com as mudanças no perfil nutricional da população brasileira. A redução do problema de déficit alimentar, é acompanhada de uma preferência por alimentos industrializados, que são mais calóricos e menos nutritivos. Formatado: Fonte: 9 pt

enriquece, incorporando principalmente legumes, ovos, frangos, verduras e frutas. Os assentados afirmam constantemente que suas escolhas produtivas se associam simultaneamente às necessidades de autoconsumo e de entrega de produtos no âmbito do PAA. Enfim, os produtos distribuídos, conforme a lógica do PAA, encorajam a diversificação do consumo alimentar das famílias urbanas em dificuldade. Para concluir, é oportuno mencionar que o desenvolvimento do PAA ocorreu de forma intensa até o ano de 2012, com recursos crescentes a uma taxa média de 17% ao ano. Entretanto, o programa chegou a um patamar de estabilidade do número de agricultores participantes logo no quarto ano de sua existência. Desde 2013, a quantidade de participantes cai drasticamente, como também seus recursos. A explicação para tal fenômenos se refere a mudanças nas regras para o recebimento dos recursos pelos municípios implementadas pelo MDS, o que dificulta seu acesso. Os quadros abaixo permitem caracterizar o programa e sua evolução. Quadro 1 - Das modalidades do PAA Programa Descrição CPR-Doação: Compra da Agricultura Familiar com Doação Simultânea Visa atender as populações em situação de insegurança alimentar por meio da doação de alimentos produzidos pelos agricultores familiares organizados coletivamente, para que entreguem sua produção diretamente nas instituições municipais beneficiadas. CPR-Estoque: Formação de Estoque pela Disponibiliza recursos para que as Agricultura Familiar organizações de agricultores familiares adquiram produtos e formem estoques para posterior comercialização. CDAF: Compra Direta da Agricultura Familiar Permite a aquisição de alimentos para a distribuição ou formação de estoques públicos pelo Governo Federal PAA-Leite: Apoio à Produção para o Consumo do Leite Assegura o consumo de leite pelas famílias em situação de insegurança alimentar nos estados do Nordeste e norte de Minas Gerais, mediante a aquisição do produto com garantia de preço CDLAF: Compra Direta Local da Agricultura Familiar Adquire produtos da agricultura familiar para abastecimento dos equipamentos públicos de alimentação como Restaurantes populares e Cozinhas Comunitárias e Banco de Alimentos. Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, 2012. Um fato interessante de percebermos é que muitos assentamentos produzem frutas,legumes e hortaliças,ou seja,alimentos extremamente saudáveis,porém estes praticamente são destinados em sua maioria para comercialização,não agregando benefícios à dieta dos próprios assentados.

Figure 1. Recursos destinados (milhões de Reais) ao PAA. 900000000 800000000 700000000 600000000 500000000 400000000 300000000 200000000 100000000 0 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Fonte: Governo do Brasil (2015). Figure 2. Número de agricultores beneficiários do PAA. 200000 180000 160000 140000 120000 100000 80000 60000 40000 20000 0 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Fonte: Governo do Brasil (2015).

Figure 3. Toneladas de alimentos adquiridos no PAA. 200000 180000 160000 140000 120000 100000 80000 60000 40000 20000 0 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Fonte: Governo do Brasil (2015). Referências CONAB. Agricultura familiar. Disponível em: http://www.conab.gov.br/conteudos.php?a=1125, acesso em: 17 de maior de 2015. MINISTÉRIO DE DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO. Cartinlha sobre a agricultura familiar. Disponível em:http://www.mda.gov.br/sitemda/sites/sitemda/files/user_arquivos_64/cartilha_paa_final.p df, acesso em: 17 de maior de 2015. MARIOTO, A; HESPANHOL, R. A. M. Desenvolvimento rural, novas ações para velhos problemas: PAA. Disponível em: http://www.lagea.ig.ufu.br/xx1enga/anais_enga_2012/eixos/1155_1.pdf, acesso em: 17 de maior de 2015. GOVERNO DO BRASIL. Plataforma de indicadores. Disponível em: http://pgi.gov.br/pgi/indicador/pesquisar/filtrar?textolivre=&numeropaginacorrente=1&campoorden acao=&abaselecionada=0&hiddentematica=4&hiddenclassificacao=204878&esconderindicadores =false&esconderpaineis=false&enablecolarvorefiltros=&enablecolcesto=&dat_indicador_ultimaat ualizacao=&dsc_indicador_primeirareferencia=#, acesso em: 17 de maior de 2015.

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