PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS CEATEC



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Transcrição:

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS CEATEC ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE DEGRADAÇÃO E RECUPERAÇÃO AMBIENTAL URBANA EM SUB-BACIAS URBANAS E PERIURBANAS INTEGRANTES DE MANANCIAIS REGIONAIS Relatório de Análise da recuperação urbana e ambiental de assentamentos regularizáveis na área de mananciais do abc paulista. CAMPINAS Março de 2005

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE CAMPINAS CEATEC ANÁLISE DAS CONDIÇÕES DE DEGRADAÇÃO E RECUPERAÇÃO AMBIENTAL URBANA EM SUB-BACIAS URBANAS E PERIURBANAS INTEGRANTES DE MANANCIAIS REGIONAIS Relatório de Análise da recuperação urbana e ambiental de assentamentos regularizáveis na área de mananciais do abc paulista Laura Machado de Mello Bueno Doutora Resumo A pesquisa Análise das condições de degradação e recuperação ambiental em sub-bacias urbanas e periurbanas integrantes de mananciais regionais foi realizada de setembro de 2003 a janeiro de 2005 com apoio da PUC-Campinas e é integrado ao Grupo de Pesquisa do CEATEC Água no meio Urbano e à linha de Pesquisa do Mestrado em urbanismo do CEATEC Gestão Urbana. A degradação e a recuperação ambiental em sub-bacias urbanas e periurbanas de mananciais em regiões metropolitanas são analisadas. São analisados casos de assentamentos populares irregularmente implantados na área de proteção dos mananciais da Grande São Paulo (bacia hidrográfica do reservatório Billings). As prefeituras e associações de moradores realizaram ações de educação, desenvolvimento econômico comunitário, gestão e obras de recuperação e compensação ambiental e de adequação urbana, com acompanhamento do Ministério Público e Secretaria Estadual de Meio ambiente. Através de obras de saneamento ambiental e complementação da urbanização, controle urbano procura-se minimizar os impactos negativos ocorridos. Foram aplicadas soluções inovadoras de adaptação de tecnologias para drenagem e tratamento de esgotos. A análise é baseada em indicadores sócioambientais, urbanísticos, biológicos, físico-químicos e elaboração de avaliações e mapas temáticos. Ao final são apresentadas conclusões e recomendações quanto ao aprimoramento das ações. Abstract Palavras-chave: Mananciais, recuperação ambiental, adequação urbana, assentamentos precários, habitação, saneamento ambiental, avaliação, gestão urbana 2

SUMÁRIO 1. Apresentação 2. Objeto e objetivos da pesquisa 3. Introdução 4. Resultados 5. Conclusões 6. Recomendações 7. Referências Bibliográficas ANEXOS 3

1. APRESENTAÇÃO Esse Relatório de Análise da recuperação urbana e ambiental de assentamentos regularizáveis na área de mananciais do abc paulista é resultado da pesquisa Análise das condições de degradação e recuperação ambiental em sub-bacias urbanas e periurbanas integrantes de mananciais regionais foi realizada de setembro de 2003 a janeiro de 2005 com apoio da PUC-Campinas e é integrado ao Grupo de Pesquisa do CEATEC Água no meio Urbano e à linha de Pesquisa do Mestrado em urbanismo do CEATEC Gestão Urbana São analisados casos de assentamentos populares irregularmente implantados na área de proteção dos mananciais da Grande São Paulo (bacia hidrográfica do reservatório Billings), onde foram aplicadas soluções inovadoras de adaptação de tecnologias para desenho urbano, drenagem e controle de poluição difusa. A análise é baseada em indicadores sócioambientais, urbanísticos, biológicos, físico-químicos e elaboração de avaliações e mapas temáticos. Ao final são apresentadas conclusões e recomendações quanto ao aprimoramento das ações. O Laboratório de Geoprocessamento do CEATEC deu todo o apoio técnico para a pesquisa, (inclusive orientação e treinamento à aluna Laura Batista da Silva) elaborar o georreferenciamento das informações de campo, com a orientação técnica de Rafael.Pinto. O Laboratório de saneamento Ambiental deu apoio técnico para a fundamentação do uso de análises de água, através do prof. Lélio Massai e da enga. Juliana Palhares. Concluiu-se não pertinente elaborar as análises, devido a operação ainda inicial das ETEs. Mas a partir desta reflexões foi gerado um relatório específico. (ANEXO) Trabalharam diretamente na pesquisa os estudantes Joana Gabos e Joana Ribeiro, de fevereiro a junho de 2004, Laura Batista Silva, de agosto de 2004 a janeiro de 2005, alunas da FAU, e Pedro Cauê Mello Rosa Monteiro, da FCB, de novembro de 2004 a janeiro de 2005. As duas primeiras auxiliaram na revisão bibliográfica. Laura executou comigo todos os trabalhos de campo e de tabulação. Pedro elaborou a interpretação das fotografias áreas das duas sub bacias mapas. Todos foram remunerados pela pesquisadora. A concepção metodológica da pesquisa e os aprimoramentos efetuados foram apresentados ao Grupo de Trabalho da Fundação João Pinheiro, de Belo horizonte, responsável pelo 4

desenvolvimento de indicadores de qualidade de vida urbana para o Ministério das Cidades. Seus resultados relativos a São Bernardo do Campo estão sendo apresentados e incorporados ao Projeto de saneamento ambiental em andamento na área, pela Prefeitura, dentro do Programa PAT PROSANEAR, do governo federal. O ISA - Instituto Sócioambiental nos convidou para apresentar ao seu corpo técnico os resultados da pesquisa, consubstanciado neste Relatório de Análise da recuperação urbana e ambiental de assentamentos regularizáveis na área de mananciais do abc paulista. 5

2. OBJETO E OBJETIVOS DA PESQUISA Os casos estudados situam-se na bacia hidrográfica do reservatório Billings, na região metropolitana de são Paulo. As obras foram promovidas pelas prefeituras municipais de São Bernardo do Campo e Santo André. Propusemo-nos a verificar se houve resultados positivos em relação à adequação urbana melhorou a qualidade de vida urbana dos moradores? A vida humana está mais sustentável? O local está mais saudável e seguro para a vida humana? e em relação à recuperação ambiental Melhoraram as condições para produção de água do manancial? Os contaminantes que chegam à represa diminuíram? A tendência de ampliação das ocupações irregulares e predatórias diminuiu? Procurou-se averiguar os resultados alcançados pelas ações de adequação urbana e ambiental nos dois assentamentos precários e irregulares em área de proteção de mananciais. 6

3. INTRODUÇÃO 3.1. Aspectos históricos e regionais Os dois casos estudados encontram-se na bacia hidrográfica do reservatório Billings, na região sul da Grande São Paulo. A Região metropolitana de São Paulo, institucionalizada em 1975, reúne características contrastantes. Área com maior concentração de riqueza e atividade econômica do Brasil, apresenta também os mais graves problemas de concentração da pobreza e degradação ambiental, especialmente a relacionada à água. A região do Grande ABC é uma das principais áreas industriais de São Paulo, com municípios importantes e grande concentração de população de baixa renda e onde, nas últimas décadas, houve grande crescimento de assentamentos irregulares que não tem serviços de saneamento básico. O reservatório Billings foi formado com o represamento do rio Grande, afluente do rio Pinheiros (principal afluente do Alto Tietê) e rio das Pedras, que verte para a Serra do Mar. A represa foi construída para regularização de vazão para a hidrelétrica de Edgard de Sousa, ou Parnaíba, no rio Tietê, assim como havia sido construída em 1912, a represa Guarapiranga. Em 1925 a Cia de Eletricidade Light aprovou o Projeto Serra, construindo a Usina hidrelétrica Henry Borden, para produção de energia para a indústria paulista, no alto da Serra do Mar, através da mudança de curso do rio Pinheiros, que passou a receber água do rio Tietê e acionar as turbinas através do vertedouro no reservatório Billings (rio das Pedras). Assim, o reservatório Billings tornou-se o receptor das águas dos rios que passam pelas áreas urbanizadas da capital e cidades próximas. Segundo BUENO, 1994: 74 Nessa época a urbanização estava ainda distante da bacia hidrográfica deste reservatório. Entretanto, a aprovação do Projeto Serra, que permitiria à Light canalizar o rio Pinheiros e sanear as terras de sua várzea, iria proporcionar uma grande expansão da ocupação urbana em direção a sul. Como foram construídos para produção de energia elétrica, e não para abastecimento de água, à época não foram desapropriadas as terras das suas bacias, providência que era tomada nos mananciais da capital. Segundo BUENO, 1994,:74 essa mudança da estratégia de obtenção de água bruta desapropriação e uso exclusivo de águas para abastecimento vai sendo quebrada em função da expansão urbana, que por um lado 7

compromete os mananciais e, por outro lado, aumenta a demanda de água, aliada ao desenvolvimento de técnicas de desinfecção e tratamento da água, como a introdução da obrigatoriedade da cloração (de 1926). A expansão urbana e crescimento econômico de São Paulo a partir dos anos 30 se deveram primordialmente à oferta de energia proporcionada pelo Projeto Serra. Ao mesmo tempo, este projeto fez com que a visão sobre os recursos hídricos de São Paulo privilegiasse a produção energética, em detrimento do saneamento básico e preservação da vida aquática. São Paulo, que em 1900 tinha 239 820 habitantes (OSEKI, 1991), apresenta em 1950 2198096 habitantes (FIBGE). Os municípios do ABC também crescem, integrando e constituindo a metrópole. Nos anos 40 a barragem de Pirapora, no rio Tietê, foi alteada, aumentando a produção de energia elétrica em Henry Borden e também a ocorrência de enchentes no rio Tietê. Os rios Pinheiros e Tietê foram canalizados, suas várzeas e meandros aterrados e urbanizados. A separação dos esgotos das águas pluviais foi menosprezada, sendo esses dois rios os receptores de esgotos. O reservatório então foi sendo contaminado por efluentes domésticos e industriais. Em 1956 a governo estadual construiu uma barragem separando o braço do rio Grande do corpo principal da represa, garantindo assim a qualidade da água para abastecimento e retirando água para abastecer parte do ABC. A partir dos anos 70, com a ampliação das alternativas de energia elétrica com Itaipu, a Usina Henry Borden torna-se menos importante. Ao mesmo tempo, a deterioração das águas do reservatório, começa a incomodar a população, já que agora as terras em torno da represa forma urbanizadas. Em 1970 a Grande São Paulo (constituída como região metropolitana em 1975 por lei federal, com 37 municípios) apresenta 8139730 habitantes, e em 1980 12588439. A crescente falta de água na metrópole faz com que o recém constituído Sistema Metropolitano de Planejamento proponha e consiga a aprovação na Assembléia Legislativa, da Legislação de Proteção dos Mananciais leis 898/1975 e 1172/1976 e decreto estadual 9714/1977. Na área protegida inclui-se a bacia do reservatório Billings. 8

Mas o processo de urbanização já havia comprometido boa parte do território das bacias protegidas com usos inadequados à proteção dos mananciais. Em 1950 havia sido criado o Distrito Industrial de Jurubatuba, nome do canal que liga o reservatório Billings ao rio Pinheiros. A via Anchieta consolidou o parque industrial do ABC e a ligação com o Porto de Santos. Na mesma época é criada a cidade Dutra, grande loteamento popular na região sul de São Paulo e nos anos 70 o conjunto habitacional Bororé, às margens do reservatório. A lei de proteção dos mananciais causou a desvalorização das terras protegidas, que se tornaram desinteressantes para o mercado imobiliário formal, seja residencial, seja para atividades econômicas. A ausência de fiscalização adequada, aliada às grandes taxas de crescimento demográfico, especialmente da população mais pobre, proporcionou condições para o grande crescimento da habitação irregular e precária na região. 3.2. A questão habitacional nos mananciais Billings e a ação dos municípios A região associa dois grandes problemas e passivos social e ambiental - pois a preservação da água é direito difuso, enquanto o direito ao acesso à moradia e serviços é um direito social. Desde os anos 70 foram implantados loteamentos com pouca infra-estrutura, muitas vezes conseguida das prefeituras através dos movimentos das associações de moradores. Ao mesmo tempo, muitas favelas foram crescendo, conforme a Figura x, especialmente nos terrenos públicos destes loteamentos. A democratização do país, que possibilitou a eleição direta dos prefeitos da região e a aproximação das populações locais às prefeituras deu-se em um contexto macro-econômico difícil, quando ocorre- (anos 80 principalmente) a recessão econômica com forte impacto na indústria automobilística e sua cadeia produtiva, com as demissões em massa e fechamento de indústrias, com transferência 9

Figura 3.1 Núcleos de favela existentes na região do Grande ABC 1 10

11

1: Compreende os municípios: Santo André, São Bernardo do Campo, Ribeirão Pires, Diadema e Mauá. Fonte: Denaldi, 2003 Na tabela 3.1 abaixo vê-se que em todos os municípios a população favelada aumentou no período de 1991 a 1996. Destaque-se também que a participação da população favelada aumentou, em relação ao total da população de todos os municípios. 12

TABELA 3.1 Evolução da população residente em favelas na região do Grande ABC³ Regiões 1991¹ 1996² Pop. total Pop.Favela %Pop.Fav. Pop. total Pop.Favela %Pop.Fav. Diadema 305.289 62.016 20,3% 323.116 77.678 24,0% Mauá 294.631 38.930 13,2% 342.909 60.805 17,7% S. André 615.112 53.985 8,8% 624.820 65.011 10,4% S. Bernardo 566.330 80.139 14,2% 660.396 123.903 18,8% R. Pires 85.035 351 0,4% 97.550 1.035 1,1% Grande ABC 1.886.397 235.421 12,6% 2.048.791 328.432 16,0% 1: Censo Demográfico 1991 2: Contagem da População 1996 IBGE 3: Compreende os municípios: Santo André, São Bernardo do Campo, Ribeirão Pires, Diadema e Mauá. 4: Incluem-se as favelas urbanizadas e sem urbanização. Fonte: Tabela 10 Denaldi, 2003 dados básicos IBGE Tabela 3.2 População residente em favelas na região do Grande ABC 1 em 2000 Regiões Favelas No. Núcleos População % Pop. Total Diadema 203 110.629 30,98% Mauá 122 76.718 21,11% S. André 139 119.803 18,45% S. Bernardo 99 142.133 20,21% R. Pires 3 1.302 1,25% Grande ABC 566 450.586 19,14% 1: Compreende os municípios: Santo André, São Bernardo do Campo, Ribeirão Pires, Diadema e Mauá. Fonte: Tabela 13 Denaldi, 2003 dados básicos Prefeituras da região do Grande ABC Além do crescimento de favelas, a região também foi palco de um crescente número de loteamentos clandestinos ou irregulares. Em relação especificamente à área de proteção dos mananciais, os dois municípios de nosso interesse especial São Bernardo do Campo e Santo André, tem realidades bastante diferentes. São Bernardo do Campo é o maior município em termos de área e população, bem como com grande território, historicamente vinculado à ocupação humana na bacia hidrográfica 13

do reservatório. É o berço do novo movimento sindicalista brasileiro e, ao mesmo tempo, com uma política local historicamente fortemente envolvida com a viabilização das grandes empresas e de caráter populista. Santo André tem seu território seccionado pelo braço rio Grande do reservatório para se ir ao seu trecho sul é necessário passar por São Bernardo ou por Ribeirão Pires e Mauá. A área foi sempre considerada fora de Santo André, havendo litígios com os vizinhos sobre as divisas. Devido à existência da tomada d água, e às dificuldades de acesso, a ocupação de seu território em mananciais é bem menor. Tabela 3.3 Área e população dos municípios dentro da Área de Proteção dos Mananciais -2000 municípios São Bernardo do Campo Santo André População total 703177 649331 População em mananciais 195 000 31155 % 27,7 4,79 Área total (km2) 407,10 174,38 Área em Mananciais 212,94 96 % 52,3 55 Fonte: municípios O período de redemocratização brasileira foi também o período de ascensão do movimento ambientalista como importante ator político. No contexto regional, destaca-se a questão dos mananciais, particularmente da recuperação do Reservatório Billings. A poluição de suas águas foi fator de grande desvalorização, não só das terras para novos investimentos industriais e empreendimentos imobiliários, mas também de todo um sistema de usos do solo ligado à segunda residência e lazer clubes, regatas, restaurantes. O reconhecimento do reservatório como manancial por lei estadual, desde 1975, apesar do recebimento contínuo das águas poluídas da região metropolitana, fez crescer essa mobilização. Em 1982 a floração de algas cianofíceas, altamente tóxicas, amplia a campanha contra o bombeamento de águas dos rios Pinheiros e Tietê para o reservatório. Após inúmeras campanhas populares levadas pelo movimento ambientalista, é incluído um artigo na Constituição Estadual (1988) programando o fim do bombeamento para 1993. 14

O importância da questão ambiental fez também mudar o comportamento dos poderes públicos estaduais. A fiscalização da lei de proteção dos mananciais foi transferida da Emplasa para a Secretaria de estado do Meio Ambiente, com a criação do DUSM Diretoria de uso do solo metropolitano. A polícia florestal foi transformada em Polícia Florestal e dos mananciais e começou a operar uma nova forma de fiscalização no âmbito estadual. Houve inclusive tentativas de integração do controle do desmatamento e poluição (estadual) e parcelamento urbano e edificação (municipal), infelizmente ainda dificultadas pela partidarização dos governos estadual e municipais. Os graves problemas de falta de água no sistema adutor metropolitano operado pela SABESP, com constantes rodízios de água, inclusive em bairros nobres da capital reforçaram a efetivação de medidas para despoluir os mananciais e controlar a expansão urbana predatória nestas áreas. Ao mesmo tempo ampliaram-se os estudos (do setor públicos e das universidades, constatando a inadequação do modelo de uso e controle do solo da lei estadual, que não deixou alternativas de uso economicamente viáveis e não criou medidas de compensação aos municípios pela falta de fontes de receita. Segundo o modelo de desenvolvimento usual da região, os municípios - fora de mananciais obtiverem receitas crescentes com a ampliação da coleta do IPTU e com a industrialização e crescimento do setor de serviços, que resulta em crescente transferência de ICMS. A omissão municipal à fiscalização do parcelamento e edificação ilegais, por outro lado, mobilizou os ambientalistas, que mobilizou o Ministério Público. Ao mesmo tempo, os movimentos de moradia ampliavam suas reivindicações para a regularização dos assentamentos existentes e, sobretudo, acesso aos serviços públicos. Assim, os municípios passaram a procurar formas de atender essas demandas e, ao mesmo tempo, revisar a postura omissa em relação aos mananciais. Ao mesmo tempo, o governo estadual reviu a postura de tratar como inexistente as ocupações clandestinas e irregulares, destacando-se a gestão de Fábio Feldmann na SMA. Esse secretário, antigo militante ambientalista de renome nacional, assinou um decreto proibindo as empresas estaduais SABESP e ELETROPAULO de fazer ligações e serviços básicos sem anuência prévia dos municípios, que são responsáveis legalmente pelo uso e ocupação do solo. As prefeituras, 15

por sua vez, não podiam liberar as ligações para parcelamentos e edificações feitos em desacordo com a lei dos mananciais. Quebrou-se assim o círculo vicioso da ocupação clandestina ou irregular dos mananciais. A criou-se assim uma crise social e política desde famílias carentes a empreendedores inescrupulosos pressionavam os prefeitos, que pressionavam o governo estadual. Estava criado um ambiente político para que ocupantes, proprietários, políticos municipais, ambientalistas e políticos estaduais sentassem à mesma mesa para discutir o que fazer com os mananciais metropolitanos. Em 1995 uma comissão para revisar a lei estadual foi criada pelo governo do Estado, coordenada pela sma e com participação da CETESB, DAEE, SABESP, ELETROPAULO, EMPLASA, CDHU, Secretaria de Economia e Planejamento e Procuradoria Geral do Estado. A comissão organizou diversos debates com os municípios, população e ambientalistas. O resultado desse trabalho foi a aprovação da Lei Estadual 9866 em 1997. Essa lei adota a bacia hidrográfica como unidade de planejamento e gestão, define que todas unidades de gerenciamento de recursos hídricos do Estado (criadas pela lei estadual 7663/1991) deverão elaborar e fazer aprovar na Assembléia Legislativa leis de proteção e recuperação dos mananciais. Nas áreas de proteção e recuperação dos mananciais (APRM) devem ser delimitadas as áreas de intervenção, definindo-se três tipos: Áreas de restrição à ocupação, com recursos ambientais em boa conservação e que sejam definidas de preservação permanente, além das já definidas por outras leis estaduais ou federais, Áreas de ocupação dirigida, que podem ter atividades humanas controladas, desde que mantidas as condições produção de água em qualidade e quantidade necessárias e Áreas de recuperação ambiental, que, estando dentro das áreas de mananciais, tem uso e ocupação que comprometem a qualidade ou quantidade de água e precisam receber ações para correção das condições ambientais. Essa lei apresenta também a característica de fortalecer os instrumentos de planejamento e gestão, através de um dispositivo de que sejam feitos planos de desenvolvimento e proteção 16

ambiental (PDPA) antes de se estabelecer as APRM. Essas, por sua vez, devem ser elaboradas a partir de leis específicas para cada sub-bacia dos mananciais. A lei 9866 também previa a possibilidade de, na Região Metropolitana de São Paulo, ser elaborado um Plano Emergencial de Recuperação dos mananciais, para execução de obras nas situações em que as condições ambientais e sanitárias apresentem riscos de vida e à saúde pública ou comprometam a utilização dos mananciais para fins de abastecimento.(artigo 47). Analisando-se a situação estadual verifica-se que esse processo somente se iniciou na Grande São Paulo, onde foram criados os sub-comitês e iniciou-se a elaboração da legislação para as sub-bacias Billings e Guarapiranga. No restante do Estado nenhum comitê de recursos hídricos implementou a lei 9866. Desde 2004 o projeto de lei da Guarapiranga está para ser votado na Assembléia, que alegava que precisariam ser criados os Conselhos regionais de desenvolvimento previstos na lei, que deveriam analisar as propostas, além do dos sub-comitês e do CONSEMA. O projeto de lei para a Billings está em elaboração. Nesse meio tempo, foi aprovada uma outra lei estadual - chamada de Lei Trípoli - que possibilita a regularização de assentamentos existentes desde que sejam adquiridos e congelados terrenos com cobertura vegetal significativa, em área suficiente para chegar aos parâmetros da lei de 1975, que continua em vigor. A crítica a essa lei, aprovada facilmente na Assembléia, enquanto outros projetos, como a cobrança pelo uso da água está em compasso de espera, é que esse dispositivo somente viabiliza a regularização de empreendimentos em que o proprietário tem condição econômica, e não penaliza a irregularidade praticada por presunção de impunidade. Por outro lado, a lei não encaminha soluções para os problemas de habitação social existentes. No final dos anos 80 o governo estadual desenvolveu dois grandes programas de obras e de gestão para os reservatórios Billings e Guarapiranga (esse mais estratégico para a Sabesp, pois responsável por cerca de 30% do abastecimento da GSP à época). De fato a SABESP já havia começado a executar obras de recuperação através do Programa de Saneamento Ambiental do Reservatório Guarapiranga, aprovado em 1992 pelo CONSEMA e pelo Banco Mundial, que financiou 50 % dos recursos. Esse programa foi 17

implementado parcialmente, pois com as mudanças nos governos municipais e estaduais, acabou-se por privilegiar as metas de obras, sem vinculação com o monitoramento da qualidade da água, previsto inicialmente, e não foram desenvolvidos os instrumentos de gestão (participação, fiscalização e controle). Estudos recentes sobre o resultado de ações do Programa Guarapiranga em contexto semelhante ao de nossa pesquisa, (evento organizado pelo Labhab da FAU USP em 2002) apresentam as três principais dificuldades para controle e sustentabilidade das obras executadas: 1. aumento populacional como fiscalizar atividades, parcelamento, uso e ocupação do solo e como ampliar a cidadania, através de serviços e assistência técnica em reforma licenciáveis; 2. Controle das ligações clandestinas de esgoto, água, drenagem e lançamento de lixo; 3. desmatamento Em 1998 foi aprovado pelo Decreto Estadual 43022 o Plano Emergencial de Recuperação dos Mananciais, que indicou os locais, nas diversas sub-bacias onde poderiam ser feitas obras de saneamento ambiental para diminuir a degradação das águas. Essas obras, entretanto, não garantem a regularização urbanística ou edilícia das ocupações existentes. Os dois estudos de caso desta pesquisa foram incluídos na programação de obras do Plano Emergencial. Em paralelo, desenvolveu-se o Plano de Proteção da Billings, com uma previsão de implantação de 18 anos pelo governo estadual, o que fez mobilizar os municípios para inversões próprias, sem esperar apoio do Tesouro Estadual. A gestão regional dos recursos hídricos é feita pela UGRHI Alto Tietê, que se organizou sob a forma de sub-comitês. Em 2003 o governo estadual criou a Agência do Alto Tietê, único Comitê Estadual onde isso ocorreu.um dos mais atuantes sub-comitês do Alto Tietê é justamente o do reservatório Billings. 18

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Figura 3.2 Localização da região do Jardim Pinheirinho (Bacia do Alvarenga) e do Parque Andreense (rio Grande a montante da captação) ( Fonte Programa de Recuperação Ambiental Billings) Apesar da conurbação e integração econômica existentes, a gestão metropolitana em São Paulo é bastante frágil e quase inexistente, havendo atualmente apenas uma empresa estadual EMPLASA, que desenvolve estudos estatísticos e presta serviços específicos. No Grande ABC, entretanto, os municípios tiveram a iniciativa de criar o Consócio Intermunicipal do Grande ABC, desde 1990, buscando compartilhar o encaminhamento de soluções para os problemas comuns, como gestão de resíduos sólidos e recuperação econômica após o impacto da reestruturação produtiva, principalmente a ocorrida no setor automobilístico. Em 1998 foi criada a Agência de Desenvolvimento do Grande ABC. 20

4. RESULTADOS A seguir são apresentados os resultados da pesquisa. Organizamos as informações e análises obtidas quanto à situação de cada município em relação ao problema socioambiental em área de mananciais, suas estratégias para enfrentamento do problema, em uma perspectiva histórica, até chegar à caracterização da política atual, programas e projetos para seu enfrentamento. Após, são apresentados os dados do estudo de caso, desde os levantamentos realizados através de entrevistas e análises de documentos, até os resultados da pesquisa de campo. 4.1. Os municípios e suas estratégias 4.1.1. São Bernardo Campo O município de São Bernardo do Campo tem suas origens no século 18. Inicialmente uma vila dentro de Santo André, constituiu-se município em 1889, na República, perdeu a autonomia durante a ditadura de Vargas, restabelecendo-a em 1944. Desenvolveu-se principalmente neste período, com a implantação da indústria automobilística. O reservatório Billings tem 75,82 km, ou 18,06% da área do município. O município tem 407,01 km 2, sendo 52% dentro da área de proteção dos mananciais. Sua população em 2000 era de 703177 habitantes e contava com 195 mil pessoas morando em 2000 nas áreas de mananciais. A região do município protegida legalmente como mananciais foi ocupada no século 19 recebendo tropas de No final daquele século implantou-se um núcleo colonial de migrantes italianos. Nos anos 60 recebeu investimentos de atividades de apoio às montadores de veículos, com grandes pátios para caminhões-cegonha e depósitos. A partir dos anos 70 foi palco de intensa ocupação por chácaras. A promulgação da lei de mananciais coincidiu com fases de crescente poluição do corpo principal da Billings, devido à necessidade de verter água para prevenir enchentes, com esgotos e lixo. Houve assim uma desvalorização, que facilitou o processo de implantação de loteamentos clandestinos e, assim como favelas em terrenos públicos. Os loteamentos eram promovidos 21

com a participação dos proprietários da gleba, que vendiam para imobiliárias e, nos anos 80 para ocupantes, através de associações. Muitas dessas associações foram organizadas com o apoio dos sindicatos da região e de parlamentares locais. A Prefeitura tinha uma posição dúbia em relação às irregularidades. Não implementava a fiscalização prévia ou no começo dos assentamentos e posteriormente, a partir de solicitações de moradores e vereadores, passava a fazer obras viárias, colocava água, e ia fazendo pequenas melhorias, incentivando indiretamente o prosseguimento das ocupações irregulares. A impunidade e falta de agilidade da fiscalização e da justiça fizeram com que fossem construídos mais de 60 empreendimentos como esse em São Bernardo do Campo, até 1992. Como exemplos das graves conseqüências sócio-ambientais destacamos o Parque dos Químicos, loteamento executado em terrenos de declividade altíssima, com algumas ruas de execução impossível e diversas casas em risco e insalubres, devido a falta de insolação e à infiltração por nascentes existentes dentro das quadras. O Bairro Nova Patente, com características semelhantes, tem o agravante de ter sido parcialmente implantado em terreno anteriormente utilizado como bota fora de indústrias da região, constatando-se através de laudo do IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas que os moradores estão com riscos graves à saúde. Figura 4.1 Residências no Parque dos Químicos e Bairro Nova Patente 22

A ação do Ministério Público Estadual no município, fez iniciar-se um a nova fase. Quando nomeada, a Promotora do Meio Ambiente de S.Bernardo, Rosângela Staurenghi, em 1995, visitou os chefes do Executivo municipal, conscientizando-os de que eram legalmente responsáveis pelos danos ambientais causados pela ocupação irregular do solo, já que tinham a responsabilidade de fiscalização e poder de polícia para tal. Em abril de 1996 começou a ser vendido na forma de frações ideais de área, o Jardim Falcão, localizado no Bairro dos Alvarengas. Foi feita a abertura de ruas sem a prévia aprovação do Município, caracterizando um loteamento clandestino situado em área de proteção de manancial. O Ministério Público promoveu o inquérito civil e a ação civil pública 1 e, em fevereiro de 1997, foi pedida a paralisação imediata da ocupação irregular da área através da demolição das casas e a remoção das famílias, como também a proibição da venda de lotes, de novos desmatamentos e de remoção da cobertura vegetal que descaracterize a vocação da área: de proteção de mananciais. Os compradores resistiram ao embargo e demolição. Por isso foi chamada a Polícia Militar para garantir a ordem pública. Na época, houve quando espaço na mídia para o caso, com o posicionamento de diversos políticos locais contra ou a favor da ação da Justiça, explicitando-se a conivência de políticos e líderes locais com os proprietários. Os proprietários e loteadores da gleba foram obrigados a promover a restituição da gleba ao estágio anterior, com completa recomposição do complexo ecológico atingido; recomposição do terreno e recobrimento do solo com vegetação, desassoreamento dos corpos d água, nascentes; cursos d água prejudicados; recomposição da vegetação nas áreas de preservação permanente. Aos compradores que foram lesados foi solicitada na justiça a restituição integral do valor pago, bem como as demais despesas efetuadas. Hoje a gleba tem um estudo para a implantação do Parque Escola Museu de Meio Ambiente. 1 Segundo a promotora, os donos das áreas e loteadores ofenderam três ordens de interesse distintas: ambiental porque infringe as leis de proteção a mananciais; urbanística porque infringe a Lei 6766/79 que dispõe sobre padrões urbanísticos mínimos e à própria organização urbanística do Município que não teve a oportunidade de analisar da adequação do loteamento no seu Plano Diretor; e dos consumidores regulada pelo Código de Defesa do Consumidor artigos 81, 82, incisos I e 91. 23