SP - Região tem casarões recheados de histórias Donos de imóveis e Conselhos do Patrimônio Histórico ajudam a conservar moradias e antigas casas de fazenda do período do auge da cafeicultura. Casarão da família Nicolielo, de Pederneiras, construído entre 1925 e 1929, é preservado pelos proprietários. Foto: Douglas Reis A região de Bauru foi rica na época do café. Nesse período os senhores, donos de grande propriedades plantadores do ouro negro, vieram para ficar ou só para acompanharem as colheitas durante temporadas. Os barões do café como eram conhecidos construíram casas-sedes nas fazendas e usaram mão de obra e engenheiros estrangeiros, a maioria italianos. Esses imóveis nos dias atuais são tidos como casarões, graças ao tamanho e a
imponência dentro das cidades. Alguns são preservados pelos próprios donos ou foram tombados pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). Algumas cidades preservam a história por meio de sua arquitetura. É o caso de Jaú, onde há pelo menos 400 prédios históricos preservados. O município incentiva a preservação da história, beneficiando aqueles que preservam com descontos na cobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O palacete mais antigo da área urbana foi construído em 1888. Em Pederneiras (26 quilômetros de Bauru), uma professora adquiriu e doou para o filho um casarão construído entre 1925 e 1929. O imóvel tem cravado muitas histórias da família Nicolielo. Foi ali que o boiadeiro José Nicolielo criou seus sete filhos. Ele era sogro da professora que conservou e agora o filho dela conserva os detalhes da arquitetura. É uma obra rara com mármore de Carrara. Um dos casarões da cidade de Dois Córregos (73 quilômetros de Bauru) tem marcas importantes da história do município. Foi nele que nasceram os primeiros moradores fora de suas casas. Isso porque o casarão da década de 40 foi comprado por um médico que atendia a Companhia Paulista de Estrada de Ferro. A atuação dele fez com que as parturientes deixassem de ter filhos em casa e os partos passaram a ser realizados na clínica. Atualmente, o casarão é conservado pela proprietária que mora em São Paulo e mantém uma pessoa na cidade que cuida não só dele, mas também de um outro que está alugado. O casarão da esquina, como é conhecido, se transformou em uma casa para que a dona se hospede na cidade. Um grupo escolar rural de Arealva (41 quilômetros de Bauru) está passando por reformas e não por restauração. Mesmo assim a fachada e algumas características históricas estão sendo
mantidas para preservar a história. No distrito de Vitoriana, em Botucatu, um casarão que é conhecido como a Casa do Conde de Serra Negra está preservado por uma família de Piracicaba. Já a Casa Grande da Fazenda Lageado é tombada e hoje abriga o Museu do Café. Na parte mais antiga de Botucatu (100 quilômetros de Bauru) há inúmeros casarões mantidos pelos moradores ou proprietários. O prédio dos Correios manteve a fachada histórica e modernizou o interior para atender as necessidades atuais. Professora preserva casa de 1925 Professora de história da arte Eunice Maria Nicolielo em frente do casarão que doou para o seu filho. Foto: Douglas Reis A professora de história da arte Eunice Maria Furlani Nicolielo, moradora de Pederneiras, é uma dessas raras pessoas que preservam a história sem depender do Poder Público. Um
casarão construído entre os anos de 1925 e 1929 que foi do sogro dela continua na família. Ela comprou o imóvel e doou para o filho que mora fora. Nas paredes da casa os detalhes que fazem toda a diferença estão conservados. O casarão fica na rua Belmiro Pereira O-32, na área central da cidade. Foi construído por Michel Neme, um fazendeiro de café. Na época do construção, o café era o motor propulsor da economia da região. Neme tinha três fazendas grandes por aqui e vivia na casa. O imóvel tem um quarto conjugado com um cômodo (quarto) de criança e mais dois quartos, são quatro ao todo. Um banheiro que hoje já não é mais o original. Naquele tempo usava apenas um banheiro. Três salas na frente com pintura barroca no gesso. Copa e cozinha com azulejo bisotê. A casa é toda acabada em mármore de Carrara. A crise do café quase que obrigou o proprietário a vender o casarão, comenta a professora. Ele ficou financeiramente afetado com a crise e vendeu a casa para o meu sogro, que era o José Nicolielo, um boiadeiro. Meu sogro tinha fazenda de gado. Ele foi o morador que mais viveu na casa. Nela criou os sete filhos dele. Ele deixou a casa por herança para um cunhado meu. Eu a comprei e doei para o meu filho. O filho da professora mora próximo do Estado do Pará. Ele é agropecuarista e vem sempre para cá. Quando vem, fica na casa. Os móveis originais da casa, o meu cunhado levou embora antes de vendê-la, eram de madeira maciça. Tinha uma cristaleira maravilhosa. Meu sogro comprou a casa de porteira fechada, como eles diziam. A família Neme tirou só as roupas de dentro dos móveis e as louças da cristaleira. José Nicolielo comprou a cristaleira vazia, mas não deixou assim. Ele foi comprar louças na cidade de Campinas. Encheu a cristaleira de louças. Essas peças ficaram com meu cunhado. Atualmente o imóvel está mobiliado. Usei móveis que eram de meu pai que são bons, mas nem tanto quanto os originais da casa.
Atualmente a casa contém camas de madeira maciça, coisa rara nos nossos dias. Eu coloquei sala de jantar, estofados e mobiliei os quartos. Uma outra parte dos móveis de meu pai levei para a fazenda. Imóveis históricos de Jaú estão inventariados por Conselho Cultural Imóvel histórico da cidade de Jaú. Foto: Divulgação A cidade de Jaú (47 quilômetros de Bauru) conserva casarões, verdadeiros palacetes da época dos barões do café. A maioria deles é conservado pelos próprios donos e seus herdeiros. A edificação urbana mais antiga ainda em pé data de 1888. Foi residência de Constantino Gonçalves Fraga, 10º prefeito da cidade e o primeiro eleito pela Câmara de Vereadores em 15 de janeiro de 1908. Mandato que perdurou até 14 de janeiro de 1909. Ele foi reeleito em 15 de janeiro de 1909 até 13 de dezembro de 1910, de acordo com informações de Ricardo Dal Bó,
responsável pelo Departamento de Patrimônio Histórico do município. Ele explica que, todo proprietário que conserva em bom estado o imóvel que fez parte da história da cidade, conta com o benefício oferecido pela prefeitura. O munícipe tem 50% de desconto no pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). O acervo tem mais de 400 prédios. Todos inventariados pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Conppac). A lei é clara tem que ter a conservação e preservação. Bom estado é sinônimo de boa estrutura, a estética sem alterações, tem que ter pelo menos um número significativo de ornamentos e não pode perder a característica original. Em função do benefício e da consideração que os moradores têm com a história, há muitos prédios preservados. Os palacetes remetem ao auge no café na região. Grupo escolar mais antigo de Arealva passa por reforma
Grupo Escolar Rural de Arealva está passando por reformas. Foto: Divulgação O imóvel mais antigo da cidade de Arealva, o Grupo Escolar Rural do município está passando por reformas, mas a preservação está sendo feita, garante o engenheiro civil da prefeitura, Robson Faria Prestes. Segundo ele, não é uma restauro, afinal o prédio não está tombado e restauração necessita de profissional técnico. Estamos reformando o imóvel que estava praticamente caindo. Estamos preservando o máximo possível. Na arquitetura não mexemos em nada. Substituímos o reboco que estava em péssimo estado. O prédio do grupo foi construído na década de 50. É uma construção bem antiga. Atualmente o imóvel abriga o almoxarifado da prefeitura. O prédio foi dividido. Parte é usado pelo almoxarifado e outra pela Secretaria da Educação. Pretendemos montar um museu e um auditório. O prédio hoje ocupado pela prefeitura também é bem antigo. Foi um banco. Tem vários semelhantes em várias cidades do Estado de São Paulo. Aqui no Centro da cidade tem casas antigas da década de 30 e 40 que ainda estão em pé. Fazenda Lageado é Museu do Café
Casarão onde atualmente é a Fazenda Lageado, da Unesp de Botucatu, foi tombado pelo Condephaat. Foto: Divulgação O conjunto arquitetônico da Fazenda Lageado foi tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arquitetônico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) e a casa grande fez parte do primeiro núcleo de tombamento com interesse histórico. É a antiga casa de uma fazenda que começa sua história por volta de 1870, há 140 anos. Já passou por reformas. Atualmente existe uma preocupação no sentido de dar andamento ao projeto de restauro. Ainda não temos o valor do investimento a ser gasto. Quem nos assessora nesse sentido é um arquiteto da cidade que tem uma empresa em São Paulo. Ele é responsável pela equipe que está coordenando o restauro da estação ferroviária daqui, comenta o professor Eduardo Candeias. Como o imóvel está tombado, a palavra reforma está fora de cogitação, afirma Candeias. Ele abriga o Museu do Café. A
casa ainda conserva algumas estruturas originais da época da construção. Algumas reformas foram feitas para adaptar o imóvel para a Faculdade de Agronomia. Aqui funcionou por um período a diretoria e parte da administração da instituição estudantil. João Carlos Figueroa diz que toda a fazenda foi preservada. Foto: Malavolta Jr. O historiador João Carlos Figueiroa enfatiza que a casa sede da Fazenda Lageado era o coração da propriedade. Toda a fazenda foi preservada. É a memória das antigas propriedades de café. Durante um longo período essa área foi grande produtora de café. Existem outros casarões, nenhum deles é tombado oficialmente. Estamos observando uma tendência gradativa dos proprietários em preservar a fachada desses imóveis. Segundo ele, na avenida Floriano Peixoto é possível ver um desses casarões. Outro, enorme foi preservado por uma empresa. Hoje é a sede central dos Correios. A parte externa
foi preservada e a interna, modernizada. Eles contrataram uma equipe de engenheiros que preservou o casarão. Ele tem dois andares e é de 1898. Candeias ressalta que, no miolo antigo da cidade existem várias casas sendo preservadas pelos próprios proprietários. Eles mantêm a fachada como era e reformam por dentro. Tem muitos casarões. São do começo do século, casas de 1903/1905. Tem um que está sendo restaurado e fica numa região extremamente movimentada da cidade. Pertenceu a uma família muito tradicional da cidade. Quem está restaurando é a própria família. Ele lembra que, com autorização, o dono do imóvel pode manter a fachada que tem mais representatividade histórica. Moderniza o interior. Tem muitas aqui que o proprietário mantém. Tem um casarão que fica numa avenida, no miolo da cidade. Pertence à família Denucci. Eles tinham uma estrutura muito forte de atividade profissional e financeira. Eles estão restaurando esse prédio. O trabalho é realmente de restauro que é diferente de reforma. É um trabalho diferente. Com muito cuidado buscando a cor original, detalhes de acabamento é um verdadeiro restauro. Pode se estender por dois anos. A hora que esse prédio está restaurado as pessoas vão olhar como se ele estivesse sido feito naquele momento. O antigo prédio que abrigou o fórum vai abrigar a Pinacoteca do Estado. A casa do Conde A casa do Conde de Serra Negra fica no distrito de Vitoriana, em Botucatu. Ele pertence a uma família de Piracicaba que tinha propriedades rurais em Botucatu, lembra Eduardo Candeias. O irmão dele era o dono da Fazenda Lageado. Eram dois irmãos que tinham propriedades na região. O conde foi um grande produtor de café. Chegou a possuir 15 propriedades nos Estados do Rio de Janeiro e de São Paulo, com
dois milhões de pés de café. Foi considerado um dos mais ricos produtores paulistas. A fazenda de Botucatu chamava-se Villa Victória, hoje fazenda do Conde Serra Negra. Dois Córregos tem várias casas que mantêm a fachada original A cidade de Dois Córregos hoje famosa por conta da grande plantação de macadâmia surgiu da parada de tropeiros que vinham de Minas Gerais na primeira metade do século XIX. O município possui vários prédios com características do final do século XX, apogeu da cultura cafeeira. Um deles foi construído por volta de 1912 e mantém sua fachada. Os proprietários dos dois casarões moram em São Paulo, um deles é mantido como casa de hospedagem dos descendentes de Trajano Alves, um comerciante. A outra, está alugada e acolhe o ambulatório da Usina da Barra. O administrador das propriedades, Roberto Gonçalves da Cruz Jr., conta que ambos passaram por reforma e restauros. O casarão que serve de residência é de 1912/13. O corpo da casa, o esqueleto do imóvel pode ser mais antigo. Ela foi ampliada. Não há registros da data da construção. O casarão da esquina, como é conhecido é recheado de histórias bacanas. Na década de 40 foi comprado por um médico e o imóvel se transformou em uma clínica geral. Esse médico atendia pacientes da Companhia Paulista de Estrada de Ferro. Pessoas de toda a região eram atendidas aqui. Até então, as mulheres de Dois Córregos davam a luz em casa, mas a abertura da clínica mudou o panorama dos nascimentos. A clínica era um mini hospital. Tinha sala de cirurgia. Os partos passaram a ser feitos ali. Tem um anexo, prédio que foi construído depois. Hoje ele é alugado para a Câmara Municipal. Nas reformas que foram feitas algumas coisas foram modificadas no anexo. Quando a clínica acabou, o então comerciante Trajano Alves
comprou o imóvel. Ele é o pai dos atuais proprietários. Ali ele abriu uma porta e desenvolveu o seu comércio. Quando fizemos o restauro, retiramos a porta e voltamos os janelões de madeira. As janelas internas são originais da época. Foram restauradas. A outra casa fica ao lado dessa da esquina. É antiga também. Foi reformada. Abrigou uma clínica médica também. A fachada foi preservada. Em seu interior é mais moderna, tem até vidro blindex. Hoje ela é um ambulatório. Por Rita de Cássia Cornélio Fonte original da notícia: JCNET.com.br