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Sou Helena Maria Ferreira de Morais Gusmão, Cliente NOS C , Contribuinte Nr e venho reclamar o seguinte:

Transcrição:

- Então, pai, há alguma notícia importante nos jornais? - Nada de especial. Há muitas notícias sobre a política nacional e internacional e algumas curiosidades. Se quiseres, depois deixo-te ler. - Tu sabes que eu não gosto de ler jornais. Gosto mais de ver televisão, de ouvir rádio e de ler e ver livros de banda desenhada. - Fazes bem. Na tua idade é isso que os jovens gostam de ver e ouvir. Mas é importante que te habitues a ler jornais e revistas, porque dão um tipo de informação de que vais necessitar para teres uma opinião mais sólida sobre as COIsas. - Mas os jornais e as revistas que tu lês quase só falam de política, - Isso, em parte, é verdade. A informação está muito assente na política e sobretudo na política feita pelos partidos. - E não achas que isso cansa um bocado? - És capaz de ter razão. Nunca tinha pensado nisso. A política vive essencialmente dos partidos, mas também

se pode fazer política fora dos partidos, principalmente quando há, nos países, uma forte tradição de Cidadania. - Já me disseste que não é, infelizmente, o caso de Portugal. Porquê? - Por várias razões. Uma delas é esta: a Cidadania, tal como hoje a encaramos, só se fortaleceu neste século e Portugal viveu quase 50 anos em ditadura, entre 1926 e o 25 de Abril de 1974. - O que é que isso tem a ver com a Cidadania? - Ora, tem tudo a ver. Em ditadura não existem as liberdades fundamentais de associação, de expressão e organização em partidos. Portanto, as pessoas ficam privadas de tudo aquilo que lhes permite serem cidadãs para além de serem indivíduos. - Então durante esses anos todos não houve Cidadania? - Praticamente não houve. As pessoas tinham medo de dizer o que pensavam nos locais de trabalho e nos lugares públicos, pois podiam ser presas se dissessem mal do regime. Era costume dizerem-se frases como esta: «A minha política é o trabalho». Isso significava que as pessoas tinham medo da política e até mesmo da palavra «política». Ora, num país onde se tem medo da política também não há democracia e se não há democracia também não há liberdade. - Ó pai, mas já passaram tantos anos... - Isso é verdade, mas sabes que estas situações deixam marcas profundas durante muitos anos. No fundo, é um

problema de mentalidade. Eu próprio nasci e fiz-me adulto durante a ditadura e ainda me lembro bem de como as coisas se passavam. - Mas ao fim de todos estes anos as pessoas já devem ter perdido o medo, ou achas que não? - Sim, perderam o medo de tomar posições políticas e de dizerem o que pensam, mas continuam a ter medo da autoridade em geral. - Mas medo como? - Olha, por exemplo, há muita gente ainda hoje que tem medo de dizer a um polícia que ele não está a proceder bem ou de protestar numa Repartição de Finanças, receando que aquele que usa a farda ou que tem o poder de a prejudicar a possa deixar numa situação pouco agradável. - Mas ainda há gente assim? - Há e bastante, sobretudo nas terras de província onde os hábitos e as mentalidades mais antigos deixaram raízes muito profundas. - Mas isso tem de mudar. - Claro que tem de mudar e tem que ser a tua geração e as seguintes a garantirem isso. A Administração Pública é paga com o dinheiro dos nossos impostos e existe para nos servir. Por isso não devemos ter medo dela, tenha a forma ou a farda que tiver. O indivíduo, perante a Administração Pública, é antes de mais nada um cidadão ou uma cidadã e

também um cliente, e os clientes devem ser bem atendidos nos serviços que eles próprios pagam com o seu dinheiro. Em contrapartida, devemos cumprir os nossos deveres para com o Estado, por exemplo, pagando os impostos a tempo e respeitando as leis que regem a vida colectiva. - Nunca tinha pensado no assunto dessa maneira, mas estou completamente de acordo contigo. Há dias, o pai de um colega meu recebeu um papel do tribunal a mandá-lo lá ir e acho que ele ficou cheio de medo porque não sabia para que era e só dizia ao filho que não tinha feito mal nenhum. - Estás a ver, é esse tipo de receio que um cidadão não pode nem deve ter desde que tenha a consciência tranquila e saiba que não praticou nenhum acto que tenha prejudicado outras pessoas ou destruído os seus bens. - Agora começam a aparecer programas de televisão onde as pessoas vão denunciar as injustiças que lhes fizeram. Isso é bom, não é? - É muito bom, mas não chega. A televisão faz isso é, ao fazê-lo, também presta um serviço público, mas muitas vezes entra nesse caminho só para aumentar as audiências, ou seja, para ter mais espectadores e vender mais tempo de publicidade. - O que é que se pode fazer então para as pessoas serem mais cidadãs?

- Tanta coisa! Olha, por exemplo, deve reduzir-se o peso que a burocracia tem nas nosssa vidas. - A buro... quê? - A burocracia! - E o que é isso de burocracia? - É o poder do papel e do carimbo sobre as pessoas. Os assuntos demoram meses e às vezes anos nas repartições públicas e nos tribunais até serem resolvidos. Há papel e carimbo a mais, apesar de, nos últimos anos, já se terem abolido muitas medidas antiquadas que só serviam para complicar a vida das pessoas. Depois, sabes, quem tem um carimbo e o poder de escrever «sim» ou «não» pensa que tem um grande poder e usa-o, ou melhor, muitas vezes abusa dele só para mostrar que manda muito. E há uma tradição antiga em Portugal que é a de se criarem dificuldadesna Administração Pública para depois se poderem vender favores, e isso tem que acabar. - O que é que se está a fazerparaque essa situaçãomelhore? - Estão a fazer-se coisas importantes. Hoje há «lojas do cidadão» que facilitam o acesso das pessoas a informações fundamentais e a documentos importantes para as suas vidas, que tornam mais rápida a constituição de empresas e a resolução de assuntos que há algum tempo atrás podiam levar, como te disse, meses ou anos. - Achas então que estamos no bom caminho?

- Acho que sim, mas ainda vai levar tempo, porque é um problema de mentalidades e as mentalidades levam gerações a ser mudadas. - E lá temos de novo o problema da Cidadania. - Precisamente, estamos de novo e sempre perante o problema da Cidadania, porque se as pessoas desconfiam dos poderes públicos e os acham injustos e pouco eficazes vão- -se afastando da Cidadania, ou seja, da participação. - Mas queres então dizer que a democracia é participação? - Isso mesmo. A democracia é, acima de tudo, participação. - Mas participação como? - De várias formas. O cidadão é aquele que sabe que tem o direito e o dever de ajudar a tomar o seu país melhor e mais moderno e que sabe também que, para que isso aconteça, tem que participar, isto é, tem que fazer ouvir a sua voz, a sua opinião, formando associações, exigindo aos sindicatos que defendam os seus interesses, lutando para que não se destrua' a qualidade ambiental, para que se respeite a diferença, para que se proteja o património, para que os que menos têm não sejam excluídos só porque são pobres ou estão doentes. - E isso tudo é a Cidadania? - Tudo isso é a Cidadania. Quando as pessoas se desinteressam e deixam de participar e de intervir, acham que os

assuntos devem ser resolvidos pelos serviços públicos e não por elas. Esse desinteresse e essa falta de participação podem ameaçar a própria vida democrática. - Desculpa, mas não estou a ver como. - Imagina esta situação: na tua escola tu decides não participar em nada e ficas à espera que os outros resolvam tudo, pensando que assim é mais cómodo e mais rápido. Depois descobres que te enganaste porque quando todos ajudam, respeitando as regras democráticas, as soluções vão muito mais ao encontro dos interesses da maioria. - E o que é que isso tem a ver com a vida de um país como o nosso? - Tem tudo a ver. Num país onde as pessoas não participam na vida pública; limitando-se a votar, se é que votam, é mais fácil deixar que tudo fique nas mãos de meia dúzia de iluminados. Foi assim que nasceram várias ditaduras em todo o mundo ao longo das últimas décadas. Quem fica de fora das coisas deixa sempre espaço para que alguém decida por si. Quando isso acontece, a democracia enfraquece como um corpo sem resistências e acaba por adoecer gravemente. - E tu achas que nós temos alguns sinais dessa doença? - Não temos, mas podemos vir a ter. -Como? - Olha, nos actos eleitorais que há em Portugal é muito elevado o número das pessoas que estão desinteressadas da

política e do que ela ajuda a resolver. Esse desinteresse é um mau sintoma e é principalmente sinal de uma Cidadania fraca. - Mas eu, logo que tenha idade, vou votar. - Espero bem que sim e tudo farei para que tal aconteça, embora nunca te vá dizer onde deves votar. - Porquê? - Porque uma das formas mais importantes de Cidadania é precisamente o respeito pela liberdade de decisão dos outros. Posso dar-te todas as informações de que precisares na altura própria, mas nunca te direi: «Vota desta maneira ou daquela porque eu quero». - E tu achas que esse desinteresse também é dos jovens? - É de pessoas de várias idades. No entanto, há muitos jovens que se abstêm porque a política não lhes diz nada. - Então e de que forma é que lhes há-de dizer alguma coisa? - Só há um caminho. - Qual é? - É aumentar o grau de Cidadania dos jovens! - E há algum aparelho para medir esse grau? - Não, não existe nenhum «cidadanómetro», que é o nome que poderíamos dar a esse aparelho que nem sequer existe. Mas, se existisse, iria avaliar certamente se os jovens participam na vida associativa das suas escolas, se pertencem a grupos de defesa do ambiente ou a outros, porque é dessa

forma que se impede o desinteresse de matar a Cidadania e de afastar as pessoas da vida política. E repara que se pode ser um cidadão muito activo e participativo sem se ter qualquer actividade política. - Pai, tu estás contente com a tua Cidadania? - Ora aí está uma excelente pergunta. Para te dizer a verdade, podia estar mais. Já houve uma época da minha vida em que tive uma grande actividade, mas agora dá-me com frequência a preguiça e deixo-me ficar em casa a ler um livro, umjornal ou a ver televisão. E esse não é o melhor caminho. Por isso, respondo-te francamente que a minha Cidadania podia ser mais activa e com a tua ajuda tenho a certeza que há-de ser mais. Tenho opinião sobre aquilo que se passa à minha volta, mas, às vezes, fico em casa em vez de ir participar juntando-me a quem defenda as mesmas opiniões que eu. O maior inimigo da Cidadania, para além da falta de informação, da ignorância e do medo, é a preguiça de intervir. E eu tenho que contrariar a minha, até porque o facto de uma pessoa ter mais idade nunca é razão para cruzar os braços ou para desistir de ser cidadão. - Tu tens-me estado a dizer que a verdadeira Cidadania depende de uma maior participação. -É verdade. - Mas como é que pode haver maior participação se as pessoas têm tão pouco tempo livre para participar, já que

passam tanto tempo nos engarrafamentos, a tratar dos filhos e a resolver outros problemas das suas vidas? - Acho que essa é uma pergunta muito inteligente e muito oportuna e penso mesmo que esse é um dos grandes problemas da democracia e da Cidadania. As pessoas cada vez têm menos tempo e cada vez precisam de mais tempo. - Mas, por outro lado, pai, nunca houve tantos telemóveis e tanta gente a usar a Internet. Isso quer dizer que as pessoas podem estar mais próximas umas das outras, mesmo estando longe. - Tens razão com essa observação, mas a melhoria do acesso à informação e à comunicação avançada não resolve os problemas fundamentais da Cidadania. As pessoas podem comunicar mais facilmente umas com as outras, e, ao mesmo tempo, continuarem isoladas e sem respostas. Para te dizer a verdade, eu não acredito numa Cidadania electrónica. Talvez lá cheguemos, mas ainda é muito cedo para dizer se isso será possível. O que eu penso e espero é que estes novos meios que tu já dominas tão bem devem ajudar as pessoas a. melhorarem a qualidade da sua Cidadania. No fundo, a tecnologia pode servir para que as pessoas se conheçam melhor e estejam mais conscientes dos problemas que há para resolver em conjunto. - Queres dizer que estamos a viver uma revolução? - Acho que estamos a viver várias revoluções.

- E quais são? - Estamos a viver a revolução informática, a revolução genética, a revolução tecnológica e, contudo, já ninguém fala de revoluções políticas. A palavra revolução deixou de ter um significado político e isso não é bom nem para a política nem para a Cidadania. - Porquê? - Porque quer dizer que aumentou o desinteresse das populações pela política e que o seu interesse está cada vez mais concentrado noutros aspectos da vida e da realidade. - E isso é mau para a Cidadania? - Eu acho que sim, mas espero, sinceramente, estar enganado. O tempo o dirá.

A CIDADANIA EXPLlCADA AOS JOVENS... E AOS OUTROS I JOSÉ JORGE LETRIA ; IL. ANDRÉ LETRIA AUTOR(ES): Letria, José Jorge, 1951-; Letria, André, 1973-, il. EDiÇÃO: 3a ed PUBLICAÇÃO: Lisboa: Terramar, 2003 DESCR. FfsICA: 85, [2] p. : il. ; 20 em COLECÇÃO: Caminhos da liberdade; 8 ISBN: 972-710-270-0