O OLHAR DE ALUNOS E ALUNAS DE UM COLÉGIO NOTURNO, ARACAJU-SE, SOBRE A PROSTITUTA OU GAROTA DE PROGRAMA NA ESCOLA



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Transcrição:

O OLHAR DE ALUNOS E ALUNAS DE UM COLÉGIO NOTURNO, ARACAJU-SE, SOBRE A PROSTITUTA OU GAROTA DE PROGRAMA NA ESCOLA Introdução Claudete Martins Santos [1] Mônica Ismerim Barreto [2] Maria Inêz Oliveira Araújo [3] A sexualidade sempre existiu e esteve presente em todos os lugares, em todas as épocas e em todos os segmentos sociais. Foi força propulsora de muitas civilizações, incomodou se fez presente no discurso de várias instituições, inclusive políticas e religiosas.também, sofreu repressões e regulamentações em suas práticas. Ela está relacionada com na dependência a cultura em que os sujeitos estejam inseridos, como diz Rodrigues (1980, p. 11) viver em sociedade é viver sob a dominação dessa lógica e as pessoas se comportam segundo as exigências dela, muitas vezes sem que disso tenham consciência. Werebe (1998, p. 16), diz que cada sociedade organiza a divisão social e sexual do trabalho. A distribuição dos empregos pela população regulamenta as uniões conjugais, as responsabilidades paternas, as funções domésticas. E assim se fixam os papéis sexuais. Ariès (2006) relata que grande parte das mulheres do século XVII não teve acesso à instrução. Mesmo entre as classes mais ricas, poucas eram as que sabiam ler e escrever. Vasconcelos (2005) diz que para alguns críticos do século XIX, no Brasil, as mulheres não deveriam exercer nenhuma função fora do lar, portanto, a educação das mesmas deveria ser limitada ao máximo. Em outro trabalho citado por essa autora é colocado que as mulheres não necessitariam de uma maior escolarização, pois as mesmas seriam intelectualmente inferiores. A desconfiança quanto ao que poderia acontecer às mulheres caso recebessem instrução semelhante aos homens é citada por Nunes (2001). Segundo essa autora, os homens tinham certa desconfiança quanto ao que poderia ser feito pelas mulheres que se apropriassem de uma maior escolarização. Isto pode ser observado na fala de Luccock (apud NUNES, 2001, p. 9) para quem as mulheres deveriam ater-se nas suas leituras apenas aos livros de orações e tampouco deveriam escrever, a fim de que não fizessem um mau uso da arte. 1 Universidade Federal de Sergipe 2 Secretaria de Estado da Educação 3 Universidade Federal de Sergipe 1

Segundo Andrade (2004) permitir o acesso à educação às mulheres faria com que elas pudessem ter uma consciência de seus direitos e, assim adquirirem argumentos para reivindicá-los. Durante muitos séculos as mulheres ficaram circunscritas ao ambiente doméstico. Não era aceito que estas ocupassem o espaço público. Dessa forma, o único trabalho admitido para elas no espaço público era a prostituição. Portanto, conforme assinala Sullerot (apud NUNES, 2001, p. 5), o trabalho da mulher parecia ser a causa da prostituição, já que qualquer mulher, fora de sua casa, era, em potência, mulher sem valor. A mulher só tem valor, portanto, se estiver submetida ao domínio de um homem, e para que esta não tivesse idéias impróprias à sua condição, sua escolarização deveria ser mínima. Assim sendo, observa-se que as mulheres tiveram pouco acesso a escolarização. Tal fato só muda no século XIX (FREITAS, 2003). Porém, quando se fala de mulheres prostitutas a escolarização ainda é muito baixa. Entender o porquê é o objetivo dessa pesquisa, e se existem motivos que impeçam as mesmas de freqüentarem a escola, quais são eles. A PROSTITUTA A sociedade a criou, a elevou, como as prostitutas sagradas, primeiras prostitutas da história cuja importância residia num ritual da fertilidade e estava relacionado à fecundidade, principalmente da agricultura. A própria sociedade (patriarcal) a excluiu e estigmatizou quando disse que o ato sexual prazeroso era ilícito (ROBERTS, 1998). Da antiguidade à Idade Média, as prostitutas eram necessárias por vários motivos, entre eles: para abrandar os desejos masculinos dos solteiros e com isso preservar a honra das mulheres solteiras e casadas; como forma de evitar a homossexualidade, acreditando que se os homens tivessem contato sexual precocemente com mulheres não apresentariam os distúrbios da homossexualidade. O próprio Santo Agostinho dizia que se as prostitutas forem expulsas da sociedade, tudo estará desorganizado em função dos desejos (RICHARDS, 1993 p. 123). Outra observação também foi feita na época: "A prostituta na sociedade é como o esgoto no palácio. Se se tirar o esgoto, o palácio inteiro será contaminado" (RICHARDS, 1993, p.123). 2

Outros teólogos diziam que a prostituição evitava males maiores, tais como a sodomia 4 e o assassinato. Tomás de Chobham (apud RICHARDS, 1993, p.123), argumentou que: as prostitutas devem ser incluídas entre os assalariados. Com efeito, elas alugam seus corpos e fornecem mão-de-obra. Se se arrependerem, podem guardar os lucros da prostituição para propósitos caridosos. Mas, se elas se prostituem por prazer e alugam seus corpos de modo a obter deleite, isso então não é trabalho, e o salário é tão vergonhoso quanto o ato. Assim, a prostituta foi vista como algo que a sociedade não pode prescindir, mas que não deve estar em contato direto com as senhoras de família. Era colocada à parte, tolerada. Elas representavam no imaginário das demais pessoas a personificação do mal. Essa forma marginalizada de perceber a prostituta, segundo Pereira et al (2006) vem sofrendo mudanças. Fonseca (2005 p. 1 apud PEREIRA et al, 2006 p.3) diz que Hoje, um número crescente de prostitutas é gente comum e está mais próxima de nós do que se imagina. Pode ser aquela pacata vizinha, uma colega de faculdade ou aquela balconista bonitinha. Esses autores indicam também que com o advento do celular e da internet, entre outras formas de comunicação, o comportamento das prostitutas tem sofrido modificações. Os sites e weblogs têm facilitado a relação cliente/prostituta. A maioria das garotas de programa entrevistadas por esses autores (87%) indicam não ter sofrido preconceito por serem garotas de programa, o que, conforme os mesmos apontam para uma maior aceitação da prostituição como um trabalho. Relatam ainda que as garotas não ficam constrangidas quando precisam revelar sua profissão, o que sugere uma mudança em relação ao preconceito que antigamente existia. A prostituição vem assim, adquirindo novas formas e denominações, como é o caso do termo garoto (a) de programa, que é um novo rótulo para a prostituição. Estes, de forma diversa daquelas prostitutas pobres que saíam às ruas para conseguirem um cliente, garotas e garotos de programa têm no máximo trinta anos, uma aparência bem atraente e nem sempre são de uma classe social baixa. (PICAZIO, 1999 p. 67). Muitos freqüentam uma escola ou universidade e o que ganham serve para pagar seu luxo, como, viagens, carros de luxo e roupas de marca. Para eles, essa atividade é uma forma de ganho rápido. Valorizam demasiadamente o corpo e com o tempo o uso de drogas é evidente (PICAZIO, 1999). SEXUALIDADE E ESCOLA 4 Sodomia relação sexual fora dos padrões tidos como normais, entre indivíduos do mesmo sexo ou de sexos diferentes, ou ainda entre pessoas e animais (LUFT, 1996). 3

Todas as questões da sexualidade são expressas pelos alunos na escola e em todas as faixas etárias, quer seja em suas atitudes, nas portas dos banheiros ou em sua convivência social com os demais. Cabe à escola desenvolver ação crítica, reflexiva e educativa. Querendo ou não ela intervém, até quando não é a sua intenção. As atitudes daqueles que formam o grupo social escolar, as vestes e até mesmo uma professora grávida estimula a curiosidade e inquietação dos menores (BRASIL, 2001) Dessa forma observamos que a sexualidade e suas expressões sempre estiveram presentes no ambiente escolar, mesmo que de forma velada. Segundo Foucault (2006) para as crianças, que até o século XVII vivenciavam uma sexualidade livre, esta começou a ser vigiada, e se procurou analisar e controlar sua prática. Falar sobre sexo de forma livre, a partir de então se tornou mais difícil. Foucault coloca que não se proibiu que se falasse sobre sexo, porém fala-se dele de uma outra forma, são outras pessoas que o fazem com outros objetivos. As palavras passaram a ser vigiadas pelas novas regras de decência. Foram estabelecidos rígidos limites de onde e como se podia falar de sexo. A nova ordem exigia que o tema não fosse abertamente pronunciado, e, senão houve um o silêncio total sobre o mesmo, a circunspeção e a reserva foram a tônica dessa fala (FOUCAULT, 2006). A atividade sexual, mais do que nunca, passou a ser regulamentada e controlada. Como exigir que a atividade sexual se restrinja à procriação como uma atividade natural (ou da natureza) se a sexualidade é algo construído e que cada sociedade apresenta suas peculiaridades? Como indica Reich (1977) se os seres humanos tivessem relação sexual apenas visando a procriação, deveríamos fazer sexo poucas vezes em nossa vida, apenas o suficiente para conseguirmos o número de filhos que pretendemos. As prostitutas, que praticam o sexo que não visa reprodução - à maternidade que é considerado um estado especial para a mulher - sofrem com discriminações e exclusões. Tanto que, embora identificada como a mais antiga das profissões, é negado o status profissional à atividade de prostituta. (BRASIL, 2002 p. 11). Uma das representações sociais mais recorrentes sobre a prostituta é a que a atividade desenvolvida por esta é um meio de sobrevivência, realizada principalmente por mulheres que não conseguem outra forma de inserção no mercado de trabalho e se valem de seu corpo como meio de subsistência. A necessidade econômica justificaria a sujeição a uma atividade ultrajante e humilhante. A conformação da atividade do sexo comercial na lógica meramente econômica 4

sustenta, assim, uma possível tolerância social, já que retira do sujeito a culpa por sua permanência nesse negócio. (BRASIL, 2002 p. 12). Baseado nessa representação é que diversos setores sociais procuram levar às prostitutas capacitações que as qualifique para outras atividades profissionais. (BRASIL, 2002) Existe outra representação social da prostituta, a que a vê como um ser imerso em lascívia, insaciável, pecaminoso e pernicioso à moral e aos bons costumes (BRASIL, 2002 p.12). Segundo esse documento, essa segunda representação social surge quando a prostituta não abandona sua atividade, por melhor que sejam os esforços para melhorar sua vida financeira. O estigma da prostituição torna invisível a realidade concreta de quem se prostitui. Barbará (2007) acredita que tornar visível essa realidade consista em eficaz estratégia de reversão do processo de estigmatização que sofrem as prostitutas. De excluídas dos ambientes comuns a pessoas de 'boa família' hoje se fazem presente em escolas e universidades. São meninas e meninos de classe média que se utilizam da prostituição não para obter a subsistência, mas para melhorar seu padrão de vida e pagar seus estudos. A escola tem agora um novo personagem, que traz para seu interior outras formas de entender o mundo e se relacionar com ele, fato este que nos faz refletir quanto à preparação dessas instituições para abrigálos. É nesse contexto que realizamos um levantamento das concepções prévias de alunas e alunos, do curso noturno de uma escola municipal de Aracaju, sobre a presença da prostituta ou garota de programa na escola, com o objetivo de identificar possíveis fatores que possam interferir no processo de escolaridade das mesmas. METODOLOGIA Dessa forma, para alcançarmos o objetivo, foram aplicados questionários compostos de 7 perguntas a 21 alunas e alunos do Ensino Médio, na faixa etária de 16 a 30 anos, do curso noturno, do Colégio Estadual Tobias Barreto, localizada no Centro, em Aracaju, Sergipe. Neste trabalho nos deteremos apenas nas seguintes questões: - Existe diferença entre prostituta e garota de programa? 5

- Já ouviu falar se na escola que você estuda existem alunas que são prostitutas ou garotas de programa? Se existem, como é a relação dos colegas com elas? Como alternativas à essa pergunta foram dadas as seguintes opções: igual aos outros colegas; igual para a maioria dos meninos, mas diferente com as meninas; igual para a maioria das meninas, mas diferente com os meninos; diferente dos outros colegas. a escola? de programa? - Você acredita que existam motivos que impeçam as alunas que se prostituem de freqüentar - Você teria vergonha de conversar com alunas que se acredita serem prostitutas ou garota - O que você faria se descobrisse que uma amiga sua é prostituta ou garota de programa? Como alternativas à essa pergunta foram dadas as seguintes opções: continuaria com a amizade do mesmo jeito; continuaria com a amizade, mas não andaria sozinha com ela; falaria com ela, mas não iria ficar mais tão próximo a ela; não falaria mais com ela. - O que você faria se descobrisse que uma parente sua é prostituta ou garota de programa? Como alternativas à essa pergunta foram dadas as seguintes opções: continuaria com a amizade do mesmo jeito; continuaria com a amizade, mas não andaria sozinha com ela; falaria com ela, mas não iria ficar mais tão próximo a ela; não falaria mais com ela. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados obtidos para a primeira questão foram: 16 alunos consideraram que não existe diferença entre prostituta e garota de programa, o que indica o desconhecimento dos mesmos sobre esse termo. Tal fato pode ocorrer pelo fato desse termo ser novo, conforme nos diz Picazio (1999) e ainda não ter sido apropriado por todos. Sobre a segunda questão: Já ouviu falar se na escola que você estuda existem alunas que são prostitutas ou garotas de programa? Responderam negativamente 18 alunos e alunas. Quando questionados se existem motivos que impeçam as alunas que se prostituem de freqüentar a escola, 15 responderam não, o que demonstra uma maior aceitação das prostitutas no ambiente escolar conforme nos mostra Pereira et al (2006) e Fonseca (apud PEREIRA et al, 2006) 6

ao afirmarem que está ocorrendo uma mudança de comportamento, não só das profissionais do sexo, como também das pessoas em geral. A grande maioria dos alunos e alunas (20) disse que não têm vergonha de conversar com alunas que se acredita serem prostitutas ou garotas de programa, fato esse que demonstra a desmarginalização da prostituição, o que está em consonância com o que nos diz Pereira et al (2006). Questionados se continuariam a amizade se descobrissem que sua amiga é prostituta ou garota de programa, 09 dos 10 alunos e 6 alunas disseram que continuariam com a amizade do mesmo jeito; um aluno não respondeu e as outras alunas (02) disseram que continuariam com a amizade, mas não andaria sozinha com ela; e (03) falaria com ela, mas não iria ficar mais tão próximo a ela. Se fosse uma parenta, 09 alunos disseram que continuariam com a amizade do mesmo jeito e um continuaria com a amizade, mas não andaria sozinho com ela; 06 alunas disseram que continuariam com a amizade do mesmo jeito, 02 disseram que continuariam com a amizade, mas não andaria sozinha com ela e 03 disseram que falaria com ela, mas não iria ficar mais tão próximo a ela. Apesar da diferença entre as respostas dos alunos e alunas, percebe-se a idéia da desmarginalização da prostituição, mesmo porque, como diz Lewis Diana (apud ROBERTS, 1998), existe um número crescente de mulheres ingressando no comércio do sexo, mesmo que em tempo parcial, e, geralmente, são estudantes de nível médio ou superior. Elas se utilizam dessa atividade como um trampolim para seus objetivos futuros (ROBERTS, 1998). CONSIDERAÇÕES FINAIS O papel da prostituta não mudou muito durante o tempo, mas a forma como é vista, sim. As instituições políticas, sociais e religiosas impunham normas, restrições às suas vidas. Mesmo condenando-a, excluindo-a, em determinados momentos da história, essas mesmas instituições financiavam a prostituição, dessa forma até hoje ela existe e a depender da região, em grande escala. Segundo Roberts (1998), a nossa história nos diz que é impossível erradicar a prostituição e que numa sociedade onde as pessoas têm que vender o seu trabalho para sobreviver é inevitável que homens e mulheres continuem vendendo seus corpos. A análise dos dados nos permite perceber que, apesar do estigma da prostituta, a maioria dos alunos não demonstra preconceito para com a presença das prostitutas ou garotas de programa na escola. Enquanto que as alunas se dividem em continuar com a amizade e se afastarem delas. A 7

visão da prostituição como um mal, perdura, embora seja observada em um grupo pequeno, e nessa pesquisa observou-se que há um número maior de mulheres com preconceito à prostituta em relação aos homens. Elas não querem a aproximação por temerem serem difamadas ou se prostituirem também. Ter certeza que esse estilo de vida é ruim, e que a prostituta ou garota de programa só pode querer sair o mais rápido possível, é um fato. Se ela não sair, mesmo tendo oportunidades, vai sofrer críticas das mais diversas, pois só se aceita uma forma válida de viver a sexualidade a do casal monogâmico. Sair fora desse padrão é se expor à reprovação social. Dessa forma, é necessário continuar a investigação do por que da ausência da prostituta na escola, o porquê da baixa escolaridade, segundo pesquisadores, encontrada na maioria delas. REFERÊNCIAS ANDRADE, Cristiane Pinto. Concepções sobre a diversidade de Orientações sexuais veiculadas nos livros didáticos e paradidáticos de Ciências e Biologia. (Dissertação de Mestrado) Universidade Federal da Bahia. Mestrado em Ensino de Ciências, 2004. ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 2006. BARBARÁ, Anna Maria & DASPU. As Meninas da Daspu. Novas Idéias. Teresópolis. 2007. BRASIL, Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Coordenação Nacional de DST e AIDS. Profissionais do Sexo: Documento Referencial para ações de Prevenção das DST e da AIDS. Série Manuais nº 47. Brasília. 2002. BRASIL, 2001) BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: pluralidade cultural: orientação sexual / Ministério da Educação. Secretaria da Educação Fundamental. 3.ed. - Brasília: A Secretaria, 2001. FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: a vontade de saber. 12ª ed. Tradução Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Graal. Rio de Janeiro. 2006. FREITAS, Anamaria Gonçalves Bueno de. Educação, trabalho e ação política: sergipanas no início do século XX. Campinas-SP, 2003. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação, 2003. 8

NUNES, Aparecida Maria. Uma História Mal Contada: a imagem da mulher nas publicações populares. In: XXIV Congresso Brasileiro da Comunicação. Campo Grande, Mato Grosso do Sul 2001. PEREIRA, Fernando Ohhir et al. Turismo de Negócios e Prostituição: Estudo Multi-casos com Garotas de Programa em uma Média Cidade Mineira. Anais do Encontro luso-brasileiro de estratégia, 2006. Disponível em: <http://www.pablo.prof.ufu.br/artigos/slade2.pdf> Acesso em: 17 maio 2008. PICAZIO, Cláudio. Sexo Secreto: temas polêmicos da sexualidade.: Edições GLS. São Paulo. 1999. REICH, Wilhelm. A Revolução Sexual. Tradução: Ary Blaustein. Zahar. São Paulo. 1977. RICHARDS, Jeffrey. Sexo, Desvio e Danação: As Minorias na Idade Média. Tradução de Marco Antonio Esteves da Rocha e Renato Aguiar. Jorge Zahar. Rio de Janeiro. 1993. ROBERTS, Nickie. As Prostitutas na História. Tradução de Magda Lopes. Rosa dos Tempos. Rio de Janeiro. 1998. RODRIGUES, José Carlos. Tabu do Corpo. Achiamé. Rio de Janeiro. 1980. TAYLOR, Timothy. A Pré-História do Sexo: quatro milhões de anos de cultura sexual. Campus. Rio de Janeiro. 1997. VASCONCELOS, Naumi. Os dogmatismos Sexuais. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra, 1971. WEREBE, Maria José Garcia. Sexualidade, Política e Educação. Autores Associados. São Paulo. 1998. 9