ESTUDO DO PONTO DE ENTUPIMENTO DE FILTRO A FRIO E ESTABILIDADE OXIDATIVA EM MISTURAS DE BIODIESIES DE PALMA/SOJA E CUPUAÇU/SOJA Manoella da Silva Cavalcante* (IC), Leyvison Rafael Vieira da Conceição (PQ), Juliana de Jesus Rocha Pardauil (PQ), Rafael R. C. Bastos (IC), Geraldo Narcíso da Rocha Filho (FQ), José Roberto Zamian (FQ). *manoella.cavalcante@hotmail.com Laboratório de Catálise e Oleoquímica - LCO, Faculdade de Química - FQ. Universidade Federal do Pará - UFPA. 1. INTRODUÇÃO Desde a revolução industrial no século 19, a matriz energética mundial tem tido como base os combustíveis fósseis, porém com a relativa escassez desses combustíveis, aliada a elevada emissão de poluentes gerada pela sua combustão, ao alto custo e à instabilidade das principais regiões produtoras, tem tornado as pesquisas sobre energia renovável cada vez mais atrativas. Nos últimos 15 anos, ésteres metílicos e etílicos de ácidos graxos têm assumido grande importância nas pesquisas sobre a utilização de óleos vegetais e gorduras animais, atuando como combustível substituto ou aditivo ao diesel de petróleo, com desempenho muito próximo ao diesel não exigindo modificações nos motores diesel. Dentre estes, destaca-se o biodiesel, nome dado a ésteres alquílicos de ácidos graxos desde que atendam certos parâmetros de qualidade que no Brasil é regulamentada pela resolução 7 da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Dentre as análises realizadas para o controle da qualidade do biodiesel, a estabilidade oxidativa é de fundamental importância, pois o biodiesel quando comparado ao diesel, possui maior susceptibilidade a oxidação quando estocado por um longo período 1. A oxidação é um processo degradativo que ocorre quando o oxigênio atmosférico ou aquele que está dissolvido no biodiesel reage com ésteres insaturados presentes. As reações químicas envolvidas no processo de oxidação são muito complexas e geram, em seus estágios mais avançados, produtos sensorialmente inaceitáveis. Esse processo
de oxidação pode ser favorecido e intensificado pela incidência de luz, que atua como catalisador 2. A estabilidade oxidativa é a resistência à oxidação sob determinadas condições 1 ; ela é expressa como o período de tempo requerido para alcançar o ponto em que o grau de oxidação aumenta abruptamente. Este tempo chamado de período de indução, normalmente expresso em horas, pode ser determinado por um método padrão utilizando equipamentos automáticos, sendo os mais conhecidos o Rancimat e o OSI. Outra análise importante é o ponto de entupimento de filtro a frio (PEFF), que determina a maior temperatura em que o biodiesel não flui por um filtro-tela padronizado, ou leva mais de 60 segundos para passar pelo mesmo. O intervalo do ponto de entupimento de filtro a frio deve estar entre 0 a 12 C 3, sendo que pode haver variação do PEFF do biocombustível conforme a região e a época do ano 4. O presente trabalho estudou o ponto de entupimento de filtro a frio e a estabilidade oxidativa em blends de biodiesel de cupuaçu e palma em soja, visando avaliar qual proporção para misturas levam essas propriedades a valores dentro do regulamentado pela ANP. 2. MATERIAL E MÉTODOS Os biodieseis de cupuaçu, palma e soja foram obtidos a partir da reação de transesterificação através da rota metílica com razão molar de 6:1 álcool/óleo e catálise homogênea (hidróxido de potássio) 1% em relação a massa do óleo. A reação de transesterificação ocorre de acordo com a figura abaixo. Figura 1. Reação de transesterificação de um óleo vegetal
A caracterização físico-química das amostras de biodieseis foi realizada pelos métodos especificados pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP): Ponto de Fulgor (ASTM D93); Massa Específica (ASTM D4052); Viscosidade Cinemática (ASTM D445), Índice de Acidez (EN 14104). As blends foram preparadas em concentrações de 5% a 90% de cupuaçu em soja e palma em soja com agitação de uma hora. A estabilidade Oxidativa foi determinada utilizando-se um Rancimat, modelo 743 da marca Metrohm, de acordo com a norma EN 14112. O Ponto de Entupimento de Filtro a Frio foi determinado de acordo a norma ASTM D 6371, utilizando-se um Ponto de Entupimento de Filtro a Frio, modelo AFP- 102 da marca Tanaka. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A tabela 1 apresenta os resultados das análises físico-químicas para caracterização do biodiesel metílico de cupuaçu, palma e soja. Observa-se que os biodieseis estão de acordo com as especificações estabelecidas pela ANP (RESOLUÇÃO 7/2008). Tabela 1. Propriedades físico-químicas do biodiesel metílico de cupuaçu e soja e limites ANP Propriedades RANP N 07/2008 B100 soja B100 Cupuaçu B100 Palma Massa Específica a 20 C, (kg/m 3 ). 850-900 878,4 883,3 880 Viscosidade Cinemática, (mm 2 /s). 3,0-6,0 3,76 4,8 4,5 Ponto de Fulgor, ( C). 100,0 190 99,0 151 Índice de Acidez, (mg KOH/g). 0,50 0,40 0,20 0,40 Os resultados da análise de estabilidade oxidativa (período de indução; PI) das blends e dos B100 produzidos estão apresentados na tabela 2 e 3. Tabela 2. Período de indução e Ponto de entupimento de filtro a frio das blendas e B100 de cupuaçu e soja Amostras PI (h) PEFF ( C) Biodiesel de soja 2,0-2
Blend(S/C) 5% 2,9 0 Blend(S/C) 10% 3,9 2 Blend(S/C) 20% 4,4 6 Blend(S/C) 30% 5,0 10 Blend(S/C) 40% 5,7 13 Blend(S/C) 50% 6,7 16 Blend(S/C) 60% 8,5 17 Blend(S/C) 70% 11,6 19 Blend(S/C) 80% 14,8 21 Blend(S/C) 90% 22,1 23 Biodiesel cupuaçu 72,0 34 Tabela 3. Período de indução e Ponto de entupimento de filtro a frio das blendas e B100 de palma e soja Amostras PI (h) PEFF ( C) Biodiesel de soja 2,0-2 Blend(P/S) 5% 3,9-1 Blend(P/S) 10% 4,1 0 Blend(P/S) 20% 4,8 2 Blend(P/S) 30% 5,5 3 Blend(P/S) 40% 5,7 6 Blend(P/S) 50% 6,9 7 Blend(P/S) 60% 7,9 11 Blend(P/S) 70% 8,6 12 Blend(P/S) 80% 9,5 12,5 Blend(P/S) 90% 12,5 14 Biodiesel palma 19,0 16 O aumento da porcentagem do B100 de cupuaçu e palma em B100 de soja aumenta consideravelmente a estabilidade oxidativa das blends. Em relação as blends de cupuaçu/soja e palma/soja observou-se que o B100 de cupuaçu teve maior influência, tanto na estabilidade oxidativa quanto no ponto de entupimento de filtro a frio. Essa disparidade deve-se aos diferentes perfis em ácidos graxos do óleo de palma e da manteiga de cupuaçu. A manteiga de cupuaçu e o óleo de palma apresentam uma grande quantidade de ácidos graxos saturados que são menos suscetíveis a oxidação. A manteiga de cupuaçu é composta basicamente por ácido esteárico (C18:0) e ácido palmítico (C16:0) 5, enquanto o óleo de palma de constituído por ácido palmítico(c18:0) e ácido oléico(c18:1). O óleo de soja possui mais de 70% de ácidos graxos insaturados, majoritariamente, ácido oléico C18:1 e ácido linoléico C18:2, em sua composição 6.
O período de indução do biodiesel metílico de soja (2,0 h) não atende as especificações da ANP que é de no mínimo 6 horas. De acordo com a tabela 2 e 3 e a figura 2 e 3, a estabilidade oxidativa apresenta-se aceitável segundo as especificações da ANP a partir da blend(c/s) 50% e blend(p/s) 50% com período de indução de 6,73 h e 7,0 h, respectivamente. A Tabela 2 e 3 relacionam também os valores de ponto de entupimento de filtro a frio (PEFF) para as blends de biodiesel cupuaçu/soja, palma/soja e dos B100 de cupuaçu, palma e soja. O valor do PEFF para o biodiesel de cupuaçu foi de 34 C, muito acima dos limites especificados pela ANP, enquanto que o biodiesel de soja e palma foi de -2 C e 16 C, respectivamente, mantendo-se dentro das especificações oriundas da resolução do órgão regulamentador (ANP). O ponto de entupimento de filtro a frio também está intimamente relacionado com a composição do biodiesel, pois ésteres graxos saturados tendem a formar cristais a temperaturas mais altas o que pode causar entupimento de filtros e injetores nos motores. Como o biodiesel de cupuaçu e palma é rico em ésteres graxos saturados, quando aumenta-se a porcentagem deste nas blendas ocorre a elevação do ponto de entupimento. Os valores do PEFF apresentam-se de acordo com as normas da ANP quando a percentagem de biodiesel de cupuaçu está abaixo de 70%. Já as blends de palma/soja apresentaram-se dentro das especificações para esta propriedade físico-química. Assim, as blendas que atendem as especificações estabelecidas pela ANP em relação ao ponto de entupimento de filtro a frio e estabilidade oxidativa são as blends de 50%, 60% e 70% para cupuaçu/soja e 50%, 60%, 70%, 80% e 90% para palma/soja. 4. CONCLUSÃO Os resultados mostram que pode-se melhorar propriedades físico-químicas de biodiesel, como por exemplo a estabilidade oxidativa e ponto de entupimento
de filtro a frio de biodieseis produzindo-se mistura de biodieseis, e neste caso diminuindo a necessidade de antioxidantes e de aditivos anticongelantes. REFERÊNCIAS 1. Biodiesel Standard; Resolução ANP no 7, Diário Oficinal da União, Brasil, 2008, 20/3/2008. 2. Biodiesel Standard; ASTM D6751, USA, 2002. 3. Canacki, M.; Bioresour. Technol. 2007, 98, 183. 4. KNOTHE, G; KRAHL, J; GERPEN, J. V; RAMOS, L, P. Manual de biodiesel, 2005. 5. Pantoja, S. S; Estudo comparativo das propriedades do biodiesel obtido a partir de óleos vegetais com diferentes graus de insaturação. 2010. 6. Sousa, M. M. F.; Estudo da estabilidade oxidativa em blends de biodiesel. 2010.