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6 1 INTRODUÇÃO Atualmente, com as inovações tecnológicas, a evolução e o crescimento vertiginoso do comércio eletrônico, que estão provocando uma verdadeira revolução no nosso cotidiano, os aplicadores do Direito estão encontrando sérias dificuldades em solucionar problemas decorrentes destas novas realidades, inexistentes no passado. Neste contexto, o crescimento galopante do uso na internet tem originado calorosas discussões, especificamente no que diz respeito à natureza jurídica dos serviços prestados pelos provedores de acesso à internet, que estão entre as várias manifestações de consumo geradoras de conflito de competência tributária entre os Estados Membros e os Municípios. Pelo fato de tais serviços envolverem expressiva receita, despertam o interesse das fazendas estaduais e municipais, que disputam acirradamente a competência para tributá-los, suscitando entendimentos diversos e até mesmo contrários por parte, tanto dos doutrinadores do Direito, quanto da jurisprudência. Existem doutrinadores, dentre eles, o tributarista Marco Aurélio Greco, que defendem a incidência do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre os provedores, entendendo que os mesmos constituem-se como prestação de serviços de comunicação. Já os municípios defendem tratar-se de fato jurídico tributável pelo Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN), por entenderem configurarse como prestação de serviço não comunicacional. Há ainda aqueles, como Ives Gandra da Silva Martins e Francisco de Assis Alves, que entendem que os serviços prestados pelos provedores se constituem em serviços de valor adicionado, não se sujeitando à cobrança do ICMS, e por não constarem da lista de serviços da lei complementar 116/2003, não estão também sujeitos ao ISS. Do confronto entre estas correntes surge o nosso questionamento: É possível ao município enquadrar os serviços prestados pelos provedores de acesso à internet, em um dos itens existentes na lista de serviços, anexa à Lei Complementar 116/2003?

7 No presente trabalho, trataremos de analisar as correntes acima referidas, à luz da jurisprudência e da doutrina. Tal investigação é fundamental para que possamos identificar corretamente o núcleo do aspecto material da hipótese de incidência de cada um desses impostos referidos, em relação aos serviços de provimento de acesso à internet. Analisando os artigos 155, inciso II e 156, inciso III, da Magna Carta, que dispõem respectivamente sobre a competência tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, percebemos que, relativamente ao enquadramento dos serviços prestados pelo provedor de acesso à internet, o ponto de controvérsia reside na correta identificação do que vem a ser a expressão serviços de comunicação e serviços de qualquer natureza. A solução desta controvérsia possibilitará, sem dúvida, determinar a qual ente federativo pertence a competência tributária; se ao Estado ou ao Município.

8 2 COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA 2.1 Considerações Iniciais O Estado Federal Brasileiro é composto por vários entes públicos dotados de autonomia política, quais sejam: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Torna-se necessário haver justa repartição de receitas tributárias entre estes entes, de modo que se busque a convivência harmoniosa entre os mesmos. No caso brasileiro, é a Constituição Federal que delimita a repartição de competência dos entes políticos, os quais são entidades isônomas, o que leva a considerar que nenhum deles pode subjugar a autonomia dos demais. A igualdade e a autonomia entre os entes federados são imprescindíveis para que exista harmonia entre estes, impedindo que um ente usurpe a competência do outro. Portanto, existe apenas diferenciação de competência, que obviamente deverá ser observada por todas as pessoas políticas, não existindo, pois, hierarquia entre as leis federais, estaduais e municipais. Nas palavras de Kelsen: O fundamento de validade de uma norma apenas pode ser a validade de uma outra norma. Uma norma que representa o fundamento de validade de uma outra norma é figurativamente designada como norma superior, por confronto com uma norma que é, em relação a ela, a norma inferior. 1 Conclui-se das sábias palavras, que somente haverá hierarquia no ordenamento jurídico, quando uma norma extrai da outra seu fundamento de validade. Caso contrário, não haverá hierarquia entre as leis ordinárias federais, estaduais e municipais, no ordenamento jurídico brasileiro, mas sim diferentes âmbitos de competências. Não se pode olvidar aqui do posicionamento de ilustres doutrinadores, como é o caso de Ives Gandra da Silva Martins que assim entende: 1 KELSEN, Hans. Teoria pura do direito, 4ª Edição, Coimbra: Armênio Amado, 1976, p. 267

9 Tenho para mim, nada obstante o argumento dos que assemelham a competência comum à concorrente, que há uma diferença de grau hierárquico, a saber: na competência comum, nenhum ente federativo está hierarquicamente subordinado, em sua ação, à atuação do outro, enquanto na competência concorrente, a da União prevalece sobre a dos Estados e a dos Estados sobre a dos Municípios. 2 Em que pese o entendimento do ilustre doutrinador, entendemos que existem no ordenamento jurídico brasileiro diferentes âmbitos de competências, subordinados às normas constitucionais, que são de grau superior às de nível legal. A autonomia, característica primordial do federalismo, influencia diretamente na repartição de competência tributária no Brasil. O Estado Federativo brasileiro possui uma característica própria que o diferencia do Estado Federado clássico, qual seja, a inserção dos Municípios na estrutura federativa nacional. Cabe ressaltar aqui, que o município não é parte essencial do federalismo, mas a Constituição Brasileira de 1988 o tratou como ente federativo, conferindo-lhe o poder de instituir uma verdadeira Constituição Municipal. O constituinte também concedeu aos municípios competência para instituir, em caráter privativo, todos os tributos (impostos, taxas e contribuição de melhoria), outorgando-lhe a tão almejada autonomia financeira, condição fundamental para se alcançar a independência da pessoa jurídica de direito público interno. Dotados de autonomia legislativa e financeira, os municípios se auto - sustentam, não se sujeitando aos repasses de recursos dos Estados-Membros. Por outro lado, cabe evidenciar que há aqueles que não concordam que o Município é um ente federativo, entre eles o ilustre Prof. Roque Antônio Carrazza: Convém dizermos que, embora o art. 1º da CF estabeleça que a República brasileira é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios [...], estes não integram a Federação, isto é, não fazem parte do pacto federal.[...]os Municípios não influem, nem muito menos decidem, no Estado Federal. Dito de outro modo, não participam da formação da vontade jurídica nacional. Realmente, não integram o Congresso, já que não possuem representantes nem no Senado (Casa dos Estados), nem na Câmara dos Deputados (Casa do Povo). 3 2 MARTINS. Comentários à Constituição do Brasil, São Paulo: Saraiva, 1988, v.1, p.2. 3 CARRAZZA. Curso de Direito Constitucional Tributário, 9ºedição, revista e ampliada, Malheiros, p.113.

10 De qualquer modo, indubitavelmente, os Municípios ocupam posição privilegiada na atual Carta Constitucional, sendo elevados à categoria de ente federativo, dotados de autonomia político-administrativa e financeira, com atribuição de respectiva competência tributária. 2.2 Conceito Competência tributária é a atribuição dada pela Carta Magna aos entes políticos, concedendo-lhes a faculdade de instituir e cobrar tributos, observados os limites impostos pelos ditames constitucionais. Nas palavras de Roque Antônio Carrazza: Noutro dizer, competência tributária é a habilitação ou, se preferirmos, a faculdade potencial que a Constituição confere a determinadas pessoas, para que tributem. Obviamente, quem pode tributar (criar unilateralmente o tributo, a partir de faculdades constitucionais) pode, igualmente, aumentar a carga tributária (agravando a alíquota ou a base de cálculo do tributo, ou ambas), diminuí-la (adotando o procedimento inverso), ou até, suprimi-la, por intermédio da não-tributação pura e simples ou do emprego do mecanismo jurídico das isenções. O que queremos dizer é que quem pode tributar, pode também aumentar o tributo, minorá-lo, isentá-lo no todo ou em parte, ou não tributar, observadas, sempre, obviamente, as diretrizes constitucionais. Tudo vai depender de uma decisão política, a ser tomada pela própria entidade tributante. 4 Para o Prof. Sacha Calmon Navarro Coelho existem três aspectos relevantes na repartição de competências tributárias: o primeiro é o fundamento do poder de tributar - as pessoas políticas titulares; o segundo, o tributo e suas espécies - como reparti-los; e o terceiro, a repartição das competências pela natureza dos fatos jurígenos. Vejamos, pois, seus ensinamentos: Em primeiro lugar, verifica-se que várias são as pessoas políticas exercentes do poder de tributar e, pois, titulares de competências impositivas: a União, os Estados-Membros, o Distrito Federal e os Municípios. Entre eles será repartido o poder de tributar. Todos recebem diretamente da Constituição, expressão da vontade geral, as suas respectivas parcelas de competência e, exercendo-as, obtêm as receitas necessárias à consecução dos fins institucionais em função dos quais existem (discriminação de rendas tributárias). O poder de tributar, 4 CARRAZZA. ICMS, 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 26.

11 originariamente uno por vontade do povo (Estado Democrático de Direito) é dividido entre pessoas políticas que formam a Federação. Em segundo lugar, verifica-se que o tributo é categoria genérica que se reparte em espécies: impostos, taxas e contribuições de melhoria. Constatase a assertiva pela análise do próprio discurso constitucional. Diz a Constituição que a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios poderão instituir (poder-faculdade) os seguintes tributos; a) impostos; b) taxas, de polícia e de serviços públicos; e c) contribuições de melhoria pela realização de obras públicas benéficas. A tarefa do constituinte, portanto, centra-se na repartição entre as diversas pessoas políticas de parcelas de competências para instituírem as três espécies tributárias antes mencionadas. Para tanto, terá que observar princípios técnicos na estatuição das regras de repartição, sem o quê não seria possível partir e ordenar harmonicamente o poder de tributar, originariamente uno. Em terceiro lugar, verifica-se que, ao mencionar as espécies do tributo, o constituinte declina expressamente os fatos jurígenos que podem servir de suporte à instituição de taxas (exercício regular do poder de polícia e prestação de serviços específicos e divisíveis) e das contribuições de melhoria (realização de obras públicas benéficas). No que tange aos impostos, no entanto, o constituinte não declina, no art. 145, fatos jurígenos genéricos autorizativos da instituição dos mesmos pelos legisladores das diversas ordens de governo. 5 Conclui o renomado professor afirmando que: As taxas e as contribuições de melhoria são atribuídas às pessoas políticas, titulares do poder de tributar, de forma genérica e comum, já os impostos, de forma privativa e discriminada. Como corolário lógico temos que os impostos são enumerados pelo nome e discriminados na Constituição um a um. São nominados e atribuídos privativamente, portanto, a cada uma das pessoas políticas, enquanto as taxas e as contribuições de melhoria são indiscriminadas, são inominadas e são atribuídas em comum às pessoas políticas. 6 Isto posto, nos deteremos à competência privativa, atribuída aos estados e municípios, que é própria dos impostos e recai sobre fatos determinados e específicos. Com efeito, a Constituição Federal, com relação aos impostos, traçou a regra-matriz da incidência, destinando a cada ente político a competência para instituir determinados impostos de forma exclusiva. Para cada imposto, há a descrição de somente uma hipótese de incidência, que é a descrição abstrata do fato na lei. 5 COELHO. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 8º edição, revista a atualizada de acordo com o Código Civil de 2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 71-72. 6 COELHO. Curso de Direito Tributário Brasileiro, 8º edição, revista a atualizada de acordo com o Código Civil de 2002. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 71-72.

12 2.3 Competência privativa dos Municípios Pelo fato de nossa Carta Constitucional ter discriminado a norma-padrão de incidência de cada exação, não pode o legislador ao exercitar a competência tributária, fugir desta determinação pré-traçada pela Constituição. Cabe aqui a indagação: o que vem a ser hipótese de incidência? De um modo geral, podemos dizer que hipótese de incidência é a descrição abstrata do fato na lei. Valemo-nos das palavras de Hugo de Brito Machado, para melhor defini-la: A expressão hipótese de incidência designa com maior propriedade a descrição, contida na lei, da situação e suficiente ao nascimento da obrigação tributária, enquanto a expressão fato gerador diz da ocorrência, no mundo dos fatos, daquilo que está descrito na lei. A hipótese é simples descrição, abstrata, enquanto o fato é concretização da hipótese. 7 Conclui-se, portanto, que cada hipótese de incidência é única, diferenciada e provoca o nascimento de uma obrigação tributária específica. Assim, prestar serviços é uma hipótese de incidência, enquanto que prestar serviços de comunicação é outra hipótese, ambas distintas, que, quando concretizadas (ocorrência do fato gerador), dão nascimento a obrigações tributárias de pagar imposto diferenciadas, ou seja, no primeiro caso, sobre serviços ( ISSQN) e no segundo, sobre circulação de mercadorias e serviços( ICMS). Segundo o ilustre professor Sacha Calmon, podemos extrair quatro aspectos mais relevantes da hipótese de incidência. São eles: pessoal, ligado à pessoa envolvida com o fato jurígeno: material, nuclear, diz respeito ao fato propriamente dito: ser proprietário, ter renda; espacial, define as coordenadas espaciais ligadas ao fato e finalmente o aspecto temporal, relacionado com as coordenadas de tempo, sendo possível determinar-se o momento da ocorrência. 8 Especificamente para este trabalho, importa o aspecto material da hipótese de incidência, que, uma vez ocorrido vai gerar a obrigação de pagar determinado tributo, ICMS ou ISSQN. 7 MACHADO, H. B. Curso do Direito Tributário, 18º edição, revista, atualizada e ampliada; Malheiros, p. 59. 8 COELHO. Teoria geral do tributo e da exoneração tributária. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. p 116-117.

13 Especialmente, com relação a este último imposto, o mesmo foi atribuído aos municípios, através da Constituição Federal de 1988, que em seu art. 156, inciso III, dispõe que compete aos municípios instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no seu art. 155, II, definidos em lei complementar. Com relação à primeira parte do inciso III, à qual nos deteremos, que assim expressa: serviços de qualquer natureza não compreendidos no seu art. 155, II, não resta dúvidas que o Município pode tributar todo e qualquer serviço, exceto os de comunicação, de transporte interestadual e intermunicipal. Neste ponto, faz-se necessário um maior aprofundamento da compreensão do termo serviço, o que faremos no próximo item, para atingirmos a correta determinação da abrangência do campo material da competência privativa dos municípios, concedida pela Carta Constitucional. 2.3.1 CONCEITO DE SERVIÇOS Os arts. 71 a 73 do Código Tributário Nacional foram revogados pelos arts. 8º a 12 do Decreto-Lei nº 406 de 31/12/1968. Especificamente, com relação ao termo serviço, o mesmo está contido no art. 8º que assim dispõe: Art. 8º - O imposto de competência dos Municípios, sobre serviços de qualquer natureza, tem como fato gerador a prestação, por empresa ou profissional autônomo, com ou sem estabelecimento fixo, de serviço constante na lista anexa. Pelo disposto no final do artigo supracitado, constatamos que não houve uma definição do termo serviço ; simplesmente remeteu-se à lista anexa ao decreto (atualmente com redação dada pela Lei Complementar nº 116/2003, que revogou a Lei Complementar nº 56/87). Examinando as leis acima citadas, verificamos que, em nenhum momento, a lei complementar definiu o que vem a ser serviço, apenas instituiu uma vasta lista de serviços passíveis de tributação pelo ISSQN.

14 Diante do exposto, é imprescindível que se busque na doutrina um conceito eficaz do termo serviço. Passaremos, pois, a arrolar algumas definições. Segundo Bernardo Ribeiro de Moraes: Serviço é a atividade realizada, da qual não resulta um produto material industrial ou agrícola. Para a ciência econômica, a atividade que interessa é a que se dirige para a produção de bens econômicos (criação de bens úteis), que podem ser tanto bens materiais como bens imateriais. Levandose em conta esse resultado da atividade sob forma de bem imaterial, chegamos ao conceito de serviço. Este pode ser conceituado como o produto da atividade humana destinada à satisfação de uma necessidade (transporte, espetáculo, consulta médica), mas que não se apresenta sob a forma de bem material. 9 O professor Aires Fernandino Barreto assim se explicita: É serviço a prestação de esforço humano a terceiros, com conteúdo econômico, em caráter negocial, sob regime de direito privado, tendente à obtenção de um bem material ou imaterial. 10 A ilustre professora Misabel Derzi nos ensina: A doutrina e a jurisprudência extraem da Constituição as seguintes características da hipótese de incidência do ISSQN: 1. a prestação de serviços configura uma utilidade(material ou imaterial),como execução de obrigação de fazer e não de dar coisa; 2. deve ser prestada a terceiro, excluindo-se os serviços que a pessoa executa em seu próprio benefício, como o transporte de mercadoria de um estabelecimento a outro da mesma pessoa; 3. executado sem vínculo de subordinação jurídica, mas em caráter independente, razão pela qual excluem-se os serviços prestados pelos empregados a seus empregadores e pelos servidores públicos; 4. deve ser habitual, e não meramente eventual; 5. assim como ser objeto de circulação econômica, executado com o objetivo de lucro, excluindo-se os serviços gratuitos ou de cortesia, beneficentes ou a preços baixos, como alimentação servida a empregados gratuitamente ou a preço de custo; 6. finalmente, o serviço deve ser prestado em regime de direito privado(por pessoa física ou jurídica, empresa pública ou sociedade de economia mista);se público, haverá imunidade, exceto para aquele serviço dado em concessão ou permissão a terceiros. 11 9 MORAES. Doutrina e prática do imposto sobre serviços, p. 84. 10 BARRETO. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 5, p. 78. 11 DERZI. In:BALEEIRO. Direito tributário brasileiro, p. 491.

15 Dos conceitos acima transcritos, concluímos que a prestação de serviços pressupõe a execução da obrigação de fazer, deve ser prestada a terceiro, em regime de direito privado e, para que ocorra, deve haver circulação econômica. Na prestação de serviços, alguém coloca sua atividade a serviço de outrem, mediante remuneração; portanto, prestar serviço é prestar atividade; é prática de ato pelo devedor para atender ao credor da obrigação de fazer, da qual não decorre entrega de bem material. O ISSQN não incide sobre a prestação em si; para que a prestação de serviço seja tributada, ela tem que gerar um resultado economicamente apreciável para o tomador, o que nos permite concluir que o resultado é um requisito imprescindível da própria prestação. Sem ele, não pode haver incidência do ISSQN, conforme afirma Alessandra Brandão Teixeira. 12 É importante ressaltar que o aspecto material do ISSQN vem sofrendo sensíveis modificações. Para uma parcela da doutrina, o fundamento da utilidade passa a ter um peso maior do que a atividade de prestar serviços ou a obrigação de fazer. Neste sentido, vejamos o que nos ensina Marco Aurélio Greco: O mundo moderno tem mostrado que a atividade não é mais o único elemento relevante para definir os valores das negociações realizadas. Se olhar do ângulo do produtor levou à identificação da atividade exercida como elemento relevante (inclusive para fins de tributação), olhar do ângulo do cliente leva ao surgimento de uma outra figura, que é a utilidade.muito freqüentemente, as pessoas se dispõem a pagar determinada remuneração não pela natureza ou dimensão da atividade exercida pela outra pessoa mas, principalmente, pela utilidade que vão obter. O valor não está mais apenas na atividade do prestador, mas também na utilidade obtida pelo cliente. Diante desta realidade, utilizar o conceito de serviço (como expressivo de uma atividade) para fins de qualificação da matéria tributável é, também, deixar à margem da tributação significativa parcela da atividade econômica exercida no mercado e que é formada pelo fornecimento de utilidades, no mais das vezes imateriais e que resultam de atividades novas, não alcançadas pelo conceito tradicionalmente utilizado. Por isso, sem prejuízo dos avanços que a interpretação pode trazer, entendo pertinente uma alteração da norma constitucional atributiva de competência tributária relativa a serviços para substituir o conceito de serviço pelo de utilidade, mais consentâneo com a realidade atual, inclusive tecnológica. 13 12 TEIXEIRA. O ISSQN e a Importação de Serviços. Renovar, 2008, p.163. 13 GRECO. Internet e Direito. São Paulo: Dialética, 2000, p. 55.

16 Para o renomado autor, é preciso adequar o conceito de serviços à nova realidade econômica e tecnológica, para que fatos que configurem manifestações de capacidade contributiva não sejam excluídos da tributação, por não se enquadrarem ao conceito tradicional de serviço ligado à obrigação de fazer. Percebemos que os conceitos da obrigação de fazer não são suficientes para conceituar serviços. A obrigação de fazer está diretamente ligada à obrigação de dar ; entretanto, para diferenciá-la é preciso que se descubra qual o núcleo preponderante da obrigação, ou seja, em que o tomador estava interessado quando procurou o prestador do serviço. Se o foco era a prestação do serviço propriamente dita, a entrega da coisa ou do produto do serviço é simplesmente uma conseqüência da obrigação de fazer. Outro fato a ser considerado é a utilidade obtida pelo tomador, que justificará o pagamento do valor do serviço ao prestador. 2.4 Competência privativa dos Estados O artigo 155, II, da Carta Constitucional preceitua que: Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: operações relativas à circulação de mercadorias e sobre a prestação de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior. As Leis Complementares nº 87/96, conhecida como lei Kandir, e 102/2000 também dispõem sobre o ICMS, bem como as leis e decretos estaduais instituidores do tributo nos Estados-Membros, sendo que no estado de Minas Gerais o referido imposto é regulado pela Lei Estadual nº 6.763 de 26 de dezembro de 1975, pelo Decreto nº 43.080 de 13 de dezembro de 2002, atualizado pelo Decreto nº 43.537 de 14 de agosto de 2003 - Regulamento do ICMS/MG. Roque Antônio Carrazza entende que a sigla ICMS engloba pelo menos cinco impostos diferentes, são eles: a) imposto sobre operações mercantis (operações relativas à circulação de mercadorias); b) o imposto sobre serviços de transporte interestadual e intermunicipal; c) o imposto sobre serviços de comunicação; d) o imposto sobre produção, importação, circulação, distribuição ou consumo de lubrificantes e combustíveis líquidos e gasosos e de energia elétrica, e e) o imposto sobre a extração, circulação, distribuição ou consumo de minerais.

17 Dizemos diferentes, porque estes tributos têm hipóteses de incidências e bases de cálculo diferentes. 14 Neste trabalho, tendo em vista os objetivos propostos, nos deteremos especificamente na análise do imposto sobre serviços de comunicação, que é o cerne da questão relativa aos provedores de acesso à internet. 2.4.1 Serviços de Comunicação Dicionário Aurélio: Temos abaixo a definição do termo comunicação, de acordo com o "s.f. 1. Ato ou efeito de comunicar(-se). 2. Ato ou efeito de emitir, transmitir e receber mensagens por meio de métodos e/ ou processos convencionados, quer através da linguagem falada ou escrita, quer de outros sinais, signos ou símbolos, quer de aparelhamento técnico especializado, sonoro e/ou visual. 3. P. ext. A ação de utilizar os meios necessários para realizar tal comunicação. 4. P. ext. A mensagem recebida por esses meios. (...)". 15 Temos ainda que: Comunicação é derivada do latim communicatio, de communicare (tornar comum). 16 A Constituição Federal de 1988 repartiu as competências tributárias entre os entes federativos, cabendo aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre prestações de serviços de comunicações, ainda que as prestações se iniciem no exterior, conforme disposto no seu art. 155, II. A Lei Kandir, Lei Complementar nº 87/96, preceitua em seu art 2º, III, o seguinte: Art. 2º. O imposto (ICMS) incide sobre: (...). 14 CARRAZZA. ICMS, ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.32-33. 15 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Aurélio século XXI: dicionário da língua portuguesa, 3ª ed., Rio de janeiro: Nova Fronteira, 1999. 16 SILVA, De Plácido e.vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 377.

18 III - prestações onerosas de serviços de comunicação, por qualquer meio, inclusive a geração, a emissão, a recepção, a transmissão, a retransmissão, a repetição e a ampliação de comunicação de qualquer natureza. Pela simples leitura do dispositivo legal acima transcrito, percebemos que o ICMS incide sobre a prestação onerosa do serviço de comunicação e não sobre a comunicação em si; portanto, a hipótese de incidência do referido imposto está em prestar um serviço de comunicação. Transcreveremos aqui as sábias palavras de Roque Carrazza a respeito da hipótese de incidência do ICMS nos serviços de comunicação: Noutras palavras, o serviço de comunicação tributável por meio de ICMS exige, preliminarmente, a colocação à disposição do usuário dos meios e modos necessários à transmissão e recepção de mensagens. E, depois, é claro, que a comunicação se complete (ou, pelo menos, que esteja potencialmente apta a completar-se) porque, afinal, o que se tributa, no caso, não é a simples contratação do serviço. De fato, o ICMS sobre serviços de comunicação - como, de resto, qualquer imposto que nasce da prestação de serviços (ug. o ISS) - só incide depois de concreta (real, efetiva) prestação de serviços. 17 Hugo de Brito Machado também se pronuncia, ressaltando o seguinte: Na publicidade, por exemplo, quem torna público sem dúvida está comunicando. Está fazendo comunicação. Mas, a comunicação, em si mesma, não é que sofre a incidência do ICMS. Tal incidência é sobre o serviço de comunicação. (...) È claro que a palavra comunicação tem sentido amplíssimo, no qual se encartam as informações, as manifestações de idéias e pensamentos em geral, por palavras, gestos e por qualquer outro meio, ainda que se trate de transmissão apenas unilateral. Não é neste sentido, porém, que a palavra está no texto do art. 155, inciso II, da Constituição Federal." 18 É importante salientar que só serão tributáveis os serviços de comunicação prestados sob regime de direito privado e em caráter negocial, tendo em vista que conforme art. 150, VI, a, o serviço público é imune. Neste sentido, Roque Carrazza explicita: O ICMS em questão não incide sobre o auto-serviço de comunicação (empresa que transmite mensagens, escritas, orais, televisivas, etc.para suas filiais), o serviço de comunicação sem conotação econômica (filantrópica, 17 CARRAZZA. ICMS, ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 133. 18 MARTINS, Ives Gandra da Silva (coord).tributação na internet.são Paulo: Revista dos Tribunais. Centro de Extensão Universitária, 2001. (Pesquisas tributárias; nova série n.7)

19 familiar, mera cortesia, hobby, como o realizado pelo radioamador) e o serviço de comunicação que empregado presta a seu empregador. 19 Os serviços de comunicação têm suscitado intensas discussões, especificamente no que diz respeito aos provedores de acesso à internet, provocando uma verdadeira guerra fiscal entre Estados e Municípios em torno da tributação destes serviços. A questão se resume em saber se os provedores de acesso à internet prestam, ou não, serviços de comunicação. 19 CARRAZZA. ICMS, ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 134.

20 3 A TRIBUTAÇÃO DOS PROVEDORES DE ACESSO À INTERNET 3.1 O surgimento da internet e o seu funcionamento Conceitualmente, faz-se necessário o entendimento do que vem a ser o vocábulo internet. Semanticamente, significa interligação de redes ( inter de interligação e net de network, ou rede). Na definição da enciclopédia Larousse Cultural, internet é uma poderosa rede internacional de computadores que, por meio de diferentes tecnologias de comunicação e informática, permite a realização de atividades como correio eletrônico, grupos de discussões, computação de longa distância, transferência de arquivos, lazer, compras, etc. Internet é "o nome genérico que designa o conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o software e os dados contidos nestes computadores" segundo a Portaria 148, de 31 de maio de 1995, do Ministério das Comunicações, que aprovou a Norma 004/95. A internet, portanto, é um conjunto de redes interligadas, de abrangência mundial, que vem apresentando desenvolvimento vertiginoso, com crescimento surpreendente de usuários em todo o mundo. Inicialmente, os computadores eram utilizados apenas para processamento e armazenamento de informações. Com a evolução tecnológica foi possível o desenvolvimento dos primeiros terminais interativos, interligando circuitos de comunicação através do acesso a um computador central, que passou a processar informações e dados eletrônicos. Já em 1970, surgiram os mini e microcomputadores, e, os PCs - personal computers, graças, principalmente, ao aprimoramento dos chips eletrônicos. Sobre a evolução da Internet, temos o seguinte:

21 O embrião da Internet surgiu de uma pequena rede experimental de computadores criada em 1969 pela Advanced Research Projects Agency (Arpa) do Departamento de Defesa dos EUA, para permitir a partilha de recursos computacionais, tais como: bancos de dados, computadores de alto desempenho e dispositivos gráficos, entre os pesquisadores e fornecedores contratados pelo Departamento. Logo ela passou a ser usada também como meio de cooperação entre os participantes do projeto, possibilitando o uso de correio eletrônico, dentre outros serviços. Em 1980, essa rede experimental foi dividida em outras duas: a Arpanet, para pesquisa civil com fins militares, e a Milnet, com fins exclusivamente militares. A interligação dessas redes foi chamada de Defense Advanced Research Projects Agency Internetwork nome que foi abreviado posteriormente para INTERNET. A expansão dessa nova rede estimulou o surgimento de diversas redes descentralizadas nos EUA, tais como: UUCP, CSNET, BITNET, etc.". 20 Nas palavras de Fugimi Yamashita: A Internet começou como um subproduto da guerra fria, patrocinado pelo governo americano nos idos de 1968, mais especificamente pelo Departamento de Defesa. A Internet era, naquela época, denominada Arpanet (Advanced Researc Project Agency Network) e servia como uma ferramenta de comunicação destinada a auxiliar a comunidade científica e de defesa a compartilhar informações e a conduzir pesquisas, através da comunicação em rede, e fornecia uma infra-estrutura de comunicação nacional alternativa em caso de ataque nuclear. 21 É por intermédio das redes que os computadores passaram a se intercomunicar. A interligação dessas redes é possibilitada pela utilização das linhas dos sistemas telefônicos que usam cabos de cobre e fibras óticas, via satélite ou via rádio. O conceito de internet é assim explicitado por Joseph f. Ruth Jr.: Internet é uma rede de várias redes que utilizam uma mesma linguagem (TCP/IP_Transmission Control Protocol / Internet Protocol) e que são conectadas por pontes (infovias) e que dividem espaços com nomes e endereços em comum. 22 Esta linguagem própria (TCP/IP_Transmission Control Protocol / Internet Protocol) utilizada pela internet é que a diferencia da telefonia fixa e móvel, pois nesta, a transmissão de informações ocorre continuamente, enquanto naquela, as informações são desmembradas em partes, e a mensagem só é considerada 20 Disponível em: <http//www.torque.com.br/internet/index.htm> Acesso em: 07 mar. 2009. 21 YAMASHITA. Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, n. 22, p.39-40. 22 RUTH JR.apud YAMASHITA.Cadernos de Direito Tributário e Finanças Públicas, n. 22, p. 39.

22 recebida quando todos os formação. pacotes chegam, possibilitando integralmente a sua Para que estes "pacotes" eletrônicos de dados possam ser encaminhados de um computador a outro, devem conter obrigatoriamente no seu formato o endereço IP e o "port number" do computador remetente e do computador de destino e o conteúdo dos dados. Outro elemento indispensável, além desses é o número de seqüência dos dados ("sequence number"), para poderem ser rearrumados assim que os diversos "pacotes" de mensagens alcancem o computador de destino. Estas mensagens serão transmitidas através de cabos óticos, satélites, cabos metálicos e antenas que constituem os backbones, que estão ligados a outros backbones de outros países. Os backbones podem ser entendidos como um conjunto de roteadores conectados por canais de transmissão de grande volume de dados. 23 Neste sentido, transcreveremos a lição de Marco Aurélio Greco, que aponta quatro elementos que constituem a Internet: a) conjunto de dispositivos ligados - nesta categoria encontram-se os computadores, roteadores etc.que, embora não estejam todos diretamente ligados a todos os outros,encontram-se conectados de forma que todos podem, em princípio, acessar ou enviar mensagens a todos os demais (se não diretamente, pelo menos indiretamente através dos demais); b) meio físico que liga os dispositivos entre si;nesta categoria incluem os cabos, os satélites, etc.; c) determinada linguagem que permite aos equipamentos entenderem as instruções e procedimentos a serem realizados;e d) endereço lógico que indica a posição que cada um dos componentes tem no conjunto da rede como um todo.tratando-se de uma rede formada por equipamentos, cada equipamento deve possuir um endereço lógico (não é um endereço físico) que permite que ele seja encontrado e reconhecido pelos demais dispositivos da rede.uma vez encontrado e reconhecido, isto viabiliza a transmissão de informações de um endereço para outro endereço. 24 Percebemos, portanto, que a internet, através de uma linguagem de computadores, agregou um novo valor e utilidade à comunicação existente anteriormente. 23 GRECO. Internet e Direito, p.129. 24 GRECO. Internet e Direito, p. 127.

23 3.2 Provedor de acesso e provedor de informações É importante fazer a distinção entre estes dois tipos de provedores para melhor compreendermos a tributação propriamente dita dos provedores de acesso à internet, bem como os sujeitos desta obrigação. Nas palavras de José Eduardo Soares de Melo 25, o serviço de provedor de acesso consiste na disponibilização ao usuário dos meios necessários para a conexão à internet, ou seja, um conjunto de redes, os meios de transmissão e comutação, roteadores, equipamentos e protocolos necessários à comunicação entre computadores, bem como o software e os dados contidos nestes computadores. Portanto, um usuário necessita estar conectado a um provedor de acesso para corresponder com outros usuários ou ter acesso a informações por eles transmitidas. Tais acessos no Brasil são providos principalmente pelas empresas de telefonia como, por exemplo, Velox -Telemar e Speedy -Telefônica e empresas de televisão a cabo. Existem também os provedores de acesso que fornecem conteúdo (fornecimento de conta de e-mail, página pessoal ou empresarial na Internet, banco de dados etc) como, por exemplo, UOL, Terra, IG, etc. Tais empresas cobram do usuário pelo fornecimento destes serviços adicionados. Vejamos os ensinamentos de Alexandre Atheniense sobre o assunto: Entre todas as maneiras acima citadas, a mais trivial para se conectar a Internet consiste em procurar um provedor para que seja criada uma conta, de forma a possibilitar acesso de seu escritório ou residência. Neste instante será gerado um endereço eletrônico, para que seja possível usar o seu correio, contendo seu nome vinculado ao do provedor de acesso. A partir daí, cada provedor irá oferecer telefones locais para onde cada computador deverá se conectar, utilizando um programa para navegação (browser), normalmente distribuídos gratuitamente pelos seus fabricantes (os mais conhecidos são o Explorer e o Netscape). [...]. Provedores de Acesso são instituições que se conectam à Internet por meio de um ou mais acessos dedicados e disponibilizam acesso a terceiros a partir de suas instalações. Esses acessos dedicados normalmente são a um provedor de backbone, ou mesmo a outro provedor de acesso de maior 25 MELO. ICMS, ISS - Comunicação Eletrônica. Revista de DireitoTributário, Malheiros, São Paulo, n. 78, p. 258-259, set-dez-2000.

24 porte, sendo que a disponibilização a terceiros pode ser feita através de uma ou mais formas de acesso especificadas anteriormente. Provedores de informações são instituições que disponibilizam informações através da Internet. O seu acesso à Internet é também do tipo dedicado, em geral a um provedor de acesso, e as informações são disponibilizadas por meio de programas-servidores, tais como FTP gophere e WWW, podendo estar organizadas em bases de dados locais ou distribuídas pela Internet. 26 Concluímos, portanto, que o provedor de informações é aquele que alimenta, abastece ou provê a rede com informações e o provedor de acesso é aquele que possibilita a conexão do usuário à rede mundial de computadores. Diante de tão elucidativos ensinamentos, entendemos estar compreendida a natureza jurídica dos serviços prestados pelo provedor de acesso à Internet, o que nos permite adentrarmos no campo propriamente dito da tributação desta manifestação de consumo. 3.3 A tributação do provedor de acesso à Internet Serviços de comunicação ou de valor adicionado? Como sabemos, a tributação desse serviço gera muita controvérsia, tanto na doutrina como na Jurisprudência brasileiras, ficando de um lado, os Estados e o Distrito Federal defendendo a tributação de tal serviço pelo ICMS, por entenderem tratar-se de serviços de comunicação, e do outro lado se posicionam os Municípios, defendendo a tributação, pela via do ISSQN, por entenderem ser um serviço de valor adicionado ao serviço de telecomunicação. Trata-se da interpretação dos artigos 60 e 61 da Lei nº 9.472 - Lei Geral de Telecomunicações - LGT, que dispõe sobre a organização dos serviços de telecomunicações e preceitua a definição e os limites de atuação dos provedores de acesso, tendo sido promulgada em 16/07/97. O art. 60 da LGT dispõe que Serviço de telecomunicação é o conjunto de atividades que possibilita a oferta de telecomunicação. O parágrafo 1º do referido artigo explica: 26 ATHENIENSE. Internet e o Direito, p. 32, 39.

25 Telecomunicação é a transmissão, emissão ou recepção, por fio, radioeletricidade, meios ópticos ou qualquer outro processo eletromagnético, de símbolos, caracteres, sinais imagens, nós, ou informações de qualquer natureza. Serviço de valor adicionado, segundo o artigo 61, é: "Art. 61. Serviço de valor adicionado é a atividade que acrescenta, a um serviço de telecomunicações que lhe dá suporte e com o qual não se confunde, novas utilidades relacionadas ao acesso, armazenamento, apresentação, movimentação ou recuperação de informações. 1º. Serviço de valor adicionado não constitui serviço de telecomunicações, classificando-se seu provedor como usuário do serviço de telecomunicações que lhe dá suporte, com os direitos e deveres inerentes a essa condição. 2º. É assegurado aos interessados o uso das redes de serviços de telecomunicações para prestação de serviços de valor adicionado, cabendo à Agência, para assegurar esse direito, regular os condicionamentos, assim como o relacionamento entre aqueles e as prestadoras de serviço de telecomunicações." Dos artigos acima transcritos, percebemos somente a definição de telecomunicação, não há conceito para serviço de comunicação. Entretanto, concordamos com o entendimento de Helena de Araújo Lopes Xavier que afirma o seguinte: os dois conceitos não se encontram, portanto,numa relação de gênero e espécie,mas numa relação de mera interseção ou sobreposição parcial. Trata-se de realidades secantes pois, por um lado, só a comunicação entre dois sujeitos que, para se realizar, careça de prestação, por terceiro de serviços de transmissão, emissão e recepção envolve uma prestação de serviços de comunicação;e, por outro lado,simetricamente, só as atividades de telecomunicações que assegurem e se esgotam na transmissão, emissão e recepção, têm por escopo o estabelecimento de uma relação comunicativa,e constituem pois a prestação de um serviço de comunicação. 27 Com base no texto legal, art 61 da LGT, temos que o provedor de acesso à Internet presta serviço de valor adicionado, sendo usuário do serviço de telecomunicação, mas não se confunde com este. Vejamos as definições dadas pela Portaria nº 148/95, do Ministério das Comunicações que complementa o entendimento: 27 XAVIER. Revista Dialética de Direito Tributário n. 72, p. 81.

26 Serviço de valor adicionado: serviço que acrescenta a uma rede preexistente de um serviço de telecomunicações, meios ou recursos que criam novas utilidades específicas, ou novas atividades produtivas, relacionadas com o acesso, armazenamento, movimentação e recuperação de informações; Serviço de conexão à Internet (SCI): nome genérico que designa o serviço de valor adicionado que possibilita o acesso à Internet a usuários e provedores de serviços de informações." Relativamente ao tema, vejamos o que afirma Roque Antonio Carrazza: A regra-matriz deste ICMS é, pois, prestar serviços de comunicação. Não é simplesmente realizar a comunicação. [...]. Note-se que o ICMS não incide sobre a comunicação propriamente dita, mas sobre a relação comunicativa, isto é, a atividade de, em caráter negocial, alguém fornecer, a terceiro, condições materiais para que a comunicação ocorra. Isto é feito mediante a instalação de microfones, caixas de som, telefones, rádio transmissores, etc. Tudo, enfim, que faz parte da infra-estrutura mecânica, eletrônica e técnica necessárias à comunicação. O serviço de comunicação tributável por meio de ICMS se perfaz com a só colocação à disposição do usuário dos meios e modos aptos à transmissão e recepção de mensagens. Embora o sistema seja arcaico, um serviço de pombo-correio posto à disposição de uma pessoa (física ou jurídica), para a transmissão ou recepção de mensagens, pode perfeitamente ser tributado por meio de ICMS. [...]. Situação diversa ocorre quando a pessoa (física ou jurídica) mantém em funcionamento o sistema de comunicação consistente em terminais, centrais, linhas de transmissão, satélites, etc. Agora, sim: há uma relação negocial entre o prestador e o usuário, que possibilita, a este último, a comunicação. È o quando basta para que o ICMS incida. Mesmo que o usuário mantenha os equipamentos desligados. 28 Pelo acima exposto, concluímos que o ICMS incide sobre o serviço de comunicação e não na comunicação em si e que o serviço de comunicação só se completa com a disponibilização ao usuário dos meios e modos aptos à transmissão e recepção de mensagens. Portanto, claro está que os provedores de acesso à internet não prestam serviços de comunicação e não realizam o transporte de sinais de telecomunicações; eles apenas fornecem os meios de acesso e não a 28 CARRAZZA. ICMS, p.115-116.

27 comunicação, uma vez que realizam serviço de valor adicionado. Eles acrescentam uma utilidade ao serviço de comunicação preexistente, o que não pode ser considerado como uma nova comunicação, até porque eles dependem da infraestrutura das empresas de telecomunicações já existentes, para prestarem seus serviços. Vejamos o que nos ensina Paulo de Barros Carvalho: O serviço de conexão à Internet, por si só, não possibilita a emissão, transmissão ou recepção de informações, deixando de enquadrar-se, por isso, no conceito de serviço comunicacional. Para ter acesso à Internet, o usuário deve conectar-se a um sistema de telefonia ou outro meio eletrônico, e, este sim, estaria em condições de prestar o serviço de comunicação, ficando sujeito à incidência do ICMS. O provedor, portanto, precisa de uma terceira pessoa que efetue esse serviço, servindo como canal físico, para que, desse modo, fique estabelecido o vínculo comunicacional entre o usuário e a Internet. È esse canal físico (empresa de telefonia ou outro meio comunicacional) o verdadeiro prestador de serviço de comunicação, pois é ele quem efetua a transmissão, emissão e recepção de mensagens. A atividade exercida pelo provedor de acesso à Internet configura, na realidade, um serviço de valor adicionado, pois aproveita um meio físico de comunicação preexistente, a ele acrescentando elementos que agilizam o fenômeno comunicacional. 29 O XXVI Simpósio Nacional de Direito Tributário, em torno do tema "Tributação na Internet", coordenado pelo Professor Ives Gandra da Silva Martins, em outubro de 2001, na cidade de São Paulo, concluiu em plenário e em comissões formadas por ilustres tributaristas, publicadas no Boletim de Direito Municipal n. 1, ed. 2002, o seguinte: Serviços de comunicação, para fins de ICMS, são serviços de transmissão de mensagens entre pessoas, por determinado veículo, a título oneroso. A competência para definir quais são os serviços de telecomunicações é da União Federal, que, ao editar a Lei Geral de Telecomunicações, de forma compatível com a Constituição Federal, excluiu os serviços prestados pelos provedores. As atividades desenvolvidas entre os provedores de acesso e os usuários da Internet realizam-se, também, mediante a utilização dos serviços de telecomunicações, sendo ambos, portanto, usuários dos serviços de telecomunicação. Logo, a atividade exercida pelos provedores de acesso em relação a seus clientes não se confunde nem com os serviços de telecomunicação, nem com os serviços de comunicação. Tal atividade não está sujeita a ICMS e, por não constar da lista de serviços, também não se sujeita ao ISS" (72 X 3). 29 CARVALHO. Dialética, nº 73, p.102.

28 A maioria dos autores do livro intitulado Tributação na Internet (Revista dos Tribunais, 2001) são contrários à tributação, pelos Estados, das operações dos provedores de acesso, conforme alguns trechos abaixo transcritos: Hugo de Brito Machado assim se pronuncia: A expressão serviço de comunicação, no art. 155, inciso II, da Constituição Federal, significa a atividade remunerada, de colocar à disposição de terceiro, mediante remuneração, meios ou instrumentos para que ocorra a comunicação, como tal entendida a ação bilateral, ou multilateral, em que informações ou dados são enviados de um sujeito a outro, ou a outros, e daquele ou daqueles a estes, em verdadeira interação. Não pode ser aplicada ao provedor de acesso à Internet porque este não disponibiliza meios e condições necessários e suficientes a que se realiza a comunicação. Para que se realize a comunicação fazem-se indispensáveis outros meios, aos quais o provedor simplesmente acrescenta instrumentos que tornam mais fácil, ou mais rápida a comunicação. 30 Na lição de Sacha Calmon Navarro Coelho: Referida lei não cita, em momento algum, os serviços prestados pelos provedores de acesso à Internet. Entretanto diz claramente que o serviço de valor adicionado não se confunde com o serviço de telecomunicação. Este serviço apenas oferece aos provedores de acesso à Internet o suporte necessário para que o serviço de valor adicionado seja prestado, ou seja, o primeiro é um dos componentes no processo de produção do último. O serviço de valor adicionado que não se confunde com os serviços de comunicação ou telecomunicação, não podem ser objeto de tributação pelo ICMS (art. 155, II da C.F.) 31 Newton De Lucca coaduna com essa opinião e dispõe: Os provedores de acesso à Internet classificam-se como prestadores de serviço de valor adicionado, pois se utilizam da rede de telecomunicações que lhes dá suporte para acrescentar novas utilidades relacionadas ao acesso (art. 61, 1º e 2º). O serviço de valor adicionado ex vi legis não é considerado serviço de comunicação. 32 Não poderia deixar de registrar aqui, entretanto, entendimento diverso, do qual discordamos, representado por Marco Aurélio Greco, que defende a idéia da tributação pelo ICMS do serviço prestado pelos provedores de acesso à Internet, por considerá-lo um serviço de comunicação, conforme sua explicitação: Entendo que o serviço prestado pelo provedor de acesso à Internet configura um serviço de comunicação, estando abrangido pelo âmbito de incidência do ICMS de competência estadual. 30 Tributação na Internet, Revista dos Tribunais, 2001 p. 84/91. 31 Tributação na Internet, Revista dos Tribunais, 2001 p.102/112. 32 Tributação na Internet, Revista dos Tribunais, 2001 p.132/139.

29 A primeira razão apóia-se na concepção de serviço em função do tipo de atividade exercida, ou seja, colocando a tônica no prestador de serviço. Desta ótica, serviço de comunicação está ligado ao fornecimento de um meio para que alguém transmita mensagens. Ora, o provedor de acesso fornece um meio diferente, um ambiente especial (segunda camada) que não se confunde como ambiente que o serviço de telefonia proporciona (primeira camada). Telefonia é meio físico apenas, Internet é meio lógico superposto ao físico; um é fluxo contínuo, o outro é em pacotes; um se dá mediante conexão constante enquanto o outro pelo melhor caminho possível, etc. Ou seja, o serviço prestado pelo provedor é de viabilizar um ambiente específico de transmissão de mensagens com características próprias para que haja a comunicação entre terceiros. A segunda razão apóia-se na concepção de serviço como utilidade obtida, ou seja, colocando a tônica no usuário. Desta ótica, a utilidade proporcionada pelo provimento de acesso é permitir a transmissão de mensagens, é permitir que as pessoas se comuniquem, viabilizando um sistema de comunicação cuja utilidade está na flexibilidade das conexões, multiplicidade de caminhos, agilidade na obtenção de informações, facilidade de transmissão, etc. Podese dizer que a utilidade obtida pelo usuário em relação à operadora de telefonia é obter uma conexão em certo local, a utilidade obtida pelo provimento de acesso é a conexão com todo o mundo. Portanto, também da ótica do usuário, o provimento viabiliza utilidades novas consistentes numa comunicação cercada de características peculiares. 33 O renomado tributarista assevera que o provedor de acesso à Internet disponibiliza um meio distinto de transmissão de mensagens se comparado com o serviço de telefonia, atribuindo, a este, novas características, o que não lhe permite enquadrá-lo como serviço de comunicação, até porque não se trata de um novo sistema de comunicação independente do que já existe. É o que ocorre, por exemplo, com a Internet a cabo (sistema de conexão via banda larga), que é serviço que as empresas de telefonia colocam à disposição de seus clientes, objetivando uma maior rapidez no processo de transmissão de dados, mas que não se confunde com o serviço de telefonia, nem tampouco sobrevive sem o mesmo. Concluímos, portanto, que apenas o serviço de telefonia constitui um serviço de comunicação tributado pelo ICMS; os serviços dos provedores de acesso à internet não são serviços de comunicação, sendo afastada a hipótese de incidência do ICMS sobre os mesmos. São, assim, serviços de valor adicionado, passíveis de tributação pela via do ISSQN. 33 GRECO.Internet e Direito, p.133-34.