UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL MARCOS ROBERTO JOHANN O VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL



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Transcrição:

0 UNIJUI - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL MARCOS ROBERTO JOHANN O VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL IJUÍ (RS) 2011

1 MARCOS ROBERTO JOHANN O VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia. UNIJUÍ Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DCJS Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais. Orientadora : MSc. Ester Eliana Hauser IJUÍ (RS) 2011

2 MARCOS ROBERTO JOHANN O VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL Trabalho final do curso de graduação em Direito aprovada pela Banca Examinadora abaixo subscrita, como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em Direito e a aprovação no componente curricular de trabalho de curso UNIJUI Universidade Regional do Noroeste do Esta do Rio Grande do Sul DCSJ Departamento de Ciências Jurídicas Ijuí, 01 de dezembro de 2011 Ester Eliana Hauser MSc. - UNIJUI Patrícia Borges Moura MSc - UNIJUI

Dedico este trabalho a minha esposa Ana Maria Citadin Johann, e também a minha linda filhinha Luiza Isabel Citadin Johann, pelo amor, carinho e compreensão imensuráveis, a mim dedicados, assim, pude com êxito concluir mais esta tarefa, nesta longa trajetória acadêmica. 3

4 AGRADECIMENTOS A Deus, pelo sopro da vida, salvação, benção e graça, ajudando-me em todos os momentos, pois tudo poço naquele que me fortalece. A minha orientadora professora Ester Eliana Hauser, pela sua dedicação e disponibilidade, indispensáveis na elaboração deste trabalho. A todos os policiais civis, que mesmo enfrentando as adversidades da profissão, conseguem com feitos heróicos cumprir sua missão. Por derradeiro, a instituição Polícia Civil da qual tenho a honra de pertencer, a todos muito obrigado.

Provas constituem os olhos do processo, o alicerce sobre o qual se ergue toda a dialética processual. Sem provas idôneas e válidas, de nada adianta desenvolverem-se aprofundados debates doutrinários e variadas vertentes jurisprudenciais sobre temas jurídicos, pois a discussão não terá objeto. Fernando Capez 5

6 RESUMO O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise doutrinária do Inquérito Policial, procedimento administrativo elaborado pela Polícia Judiciária, não com exclusividade, visando à apuração do fato delituoso e à definição de sua autoria, tendo como escopo fornecer elementos para eventual ação penal. Trata-se de procedimento de natureza inquisitiva em que nem sempre são observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, por meio do qual são realizados atos investigativos formadores de provas na fase pré-processual. Busca analisar em que medida os elementos colhidos na fase investigativa, cujo sistema é inquisitivo irão adentrar no processo criminal, que tem base acusatória. Discute se as provas colhidas durante a elaboração do Inquérito Policial, principalmente aquelas não-repetíveis, como é o caso das periciais, possuem relevância no conjunto probatório, formador do convencimento do julgador, capaz de no seu livre convencimento proferir uma decisão condenatória em desfavor do réu. Palavras-Chave: Inquérito Policial. Prova. Valor Probatório. Processo Penal.

7 ABSTRACT The present research monograph makes a doctrinal analysis of the police inquiry, administrative procedure established by the Judicial Police, not exclusively, aimed at determination of the criminal fact and the definition of his own, having as elements provide scope for possible prosecution. This procedure is inquisitive nature which are not always observed the constitutional principles of contradictory and full defense, by which acts are performed trainers investigative evidence in the pre-trial. It aims to analyze to what extent the elements gathered in the investigative phase, which is inquisitive system will enter the criminal case, which is based accusatory. Discusses whether the evidence gathered during the preparation of the police inquiry, especially those non-repeatable, such as the expert, have relevance in the whole evidence, the conviction of former judge, able to deliver on its free conviction a conviction to the detriment of defendant. Keywords: Police Inquiry. Proof. Probative value. Criminal Procedure.

8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO...09 1 A PERSECUÇÃO PENAL E O INQUÉRITO POLICIAL COMO INSTRUMENTO E INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR...12 1.1 A Persecução Penal no Brasil; Objetivos e Etapas...12 1.1.1 Investigação Preliminar...15 1.1.2 O Processo Penal...17 1.2 Os Sistemas Processuais e as Garantias Processuais Penais na Constituição Brasileira de 1998...20 1.2.1 Sistemas Processuais Acusatório, Inquisitivo e Misto...21 1.2.2 As Garantias Constitucionais do Processo Penal...25 1.3 A Investigação Preliminar Através do Inquérito Policial...30 1.3.1 Conceito, Natureza e Finalidade do Inquérito Policial...30 1.3.2 Orgão encarregado: A Polícia Judiciária...36 1.3.3 Procedimento do Inquérito Policial...38 2 A PROVA PROCESSUAL PENAL E O VALOR DO INQUÉRITO POLICIAL...42 2.1 A Prova no Processo Penal...42 2.1.1 Conceito e Função da Prova...44 2.1.2 Princípios da Prova...47 2.1.3 Principais espécies de Prova...49 2.1.4 A Gestão da Prova...55 2.2 Provas Repetíveis e Irrepetíveis...59 2.2.1 O Valor Probatório do Inquérito Policial...63 CONCLUSÃO...70 REFERÊNCIAS...75

9 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como tema de análise o valor probatório do Inquérito Policial. Busca-se, por meio dele, verificar em que medida os atos produzidos na investigação preliminar, mais especificamente durante o inquérito policial, podem ser valorados no âmbito do processo judicial. Tomando como referência a Constituição Brasileira de 1988, que consagrou garantias penais e processuais, entre elas, o direito de não produzir provas contra si mesmo, o contraditório e a ampla defesa, busca-se analisar se as provas produzidas durante a investigação preliminar criminal, que tem caráter inquisitório, podem respaldar sentenças condenatórias ou absolutórias prolatadas no processo penal correspondente. O homem mediante o contrato social, e a definição do que se conhece por Estado, abre mão do poder de fazer justiça com as próprias mãos a favor deste ente imaginário, que agora detém a legitimidade para punir os infratores das normas codificadas, usando para tanto métodos de aflição a dignidade da pessoa humana, meios que na concepção de Estado contemporâneo não há mais aplicabilidade, tendo por objetivo a busca da prova. Historicamente este poder punitivo foi exercido de forma arbitrária, com a utilização de tais métodos. Exemplo disso é a Lei de Talião, com a aplicação do olho por olho, dente por dente. Também na sociedade medieval, em que a tortura era o meio de punição mais utilizado, quando o Clero imperou, e, juntamente com o Estado, protagonizou a famosa Inquisição Medieval, não se visualizava nenhum

10 respeito à dignidade dos homens. Os fatos eram apurados de forma inquisitória e sumária, levando muitas vezes o investigado à pena capital. Apesar da evolução do mundo, do reconhecimento do homem como cidadão e da afirmação dos direitos humanos, métodos ultrajantes continuaram sendo usados como meio de produção de provas. Num passado pouco distante, a aflição do corpo do investigado era utilizada para se obter confissões, delações e outras provas ilícitas que levavam a condenação e também à morte. No Brasil, como também em diversos países do mundo, utilizaram-se tais meios durante os períodos de ditadura militar, com completo desrespeito aos direitos da pessoa humana, com julgamentos realizados a margem da lei. Com o advento da Constituição de 1988, ocorreu à democratização do Estado Brasileiro, o reconhecimento de vários direitos fundamentais da pessoa humana, a constitucionalização das leis infraconstitucionais. Isto exige que todas as normas sejam interpretadas à luz da Carta Magna, pois esta deixa de ser apenas um instrumento político, disciplinando a relação entre o indivíduo e o Estado, passando a ser fonte normativa. Neste sentido, os órgãos que compõem o Estado têm o dever realizar suas atividades a partir da inspiração introduzida pela Constituição, não havendo mais espaço para abusos e atos ilícitos. Tais preceitos também devem ser observados pelas autoridades responsáveis pela investigação preliminar criminal, mesmo que o procedimento ainda vigente seja o Inquérito Policial e tenha cunho inquisitorial. Este deve buscar a prova lícita, sem vício, capaz de gerar no julgador confiança ao prolatar sua sentença, sendo ela condenatória ou absolutória. O mundo de hoje anda ao girar de motores e corre pelos fios da tecnologia, e nele o crime se tem ampliado, estruturado na forma de empresas e evoluído para a esfera do ambiente virtual. Diante desta realidade questiona-se: como demonstrar que durante a investigação criminal foram observadas as normas estipuladas pela Constituição, mesmo sendo o procedimento da investigação preliminar de tipo inquisitorial, visando a sustentabilidade de uma futura denúncia por parte do Ministério Público ou à vítima no caso de queixa-crime?

11 A pretensão é tentar demonstrar a necessidade da manutenção do procedimento investigativo, buscando seu aperfeiçoamento e modernização, frente ao que ocorre com o crime, pois, apesar de toda a evolução já referida e a renovação do ordenamento jurídico, pouca coisa inovou-se na peça investigativa. Para discutir tais questões a metodologia utilizada foi o método dedutivo e a revisão bibliográfica, sendo que o trabalho está estruturado em dois capítulos. No primeiro capitulo, são apresentadas as distintas etapas da persecução penal no Brasil, com enfoque especial para o inquérito policial, um dos principais instrumentos de investigação preliminar. Também são apresentadas as principais características dos sistemas processuais acusatório, inquisitivo e misto, bem como as garantias constitucionais do processo penal consagradas na Constituição Brasileira de 1988, com o objetivo de avaliar como tais garantias repercutem nas distintas etapas da persecução penal. No primeiro capítulo também é discutida a questão da persecução penal, levando-se em consideração o surgimento do poder punitivo do Estado, seu objetivo e etapas, bem como a importância da investigação preliminar para a produção de elementos que possam dar sustentabilidade a segunda parte da persecução penal, qual seja, denúncia por parte do Ministério Público. Ainda, no corpo do primeiro capitulo, é analisado o procedimento de investigação preliminar através do inquérito policial, sua conceituação, natureza e finalidade, além do órgão encarregado pela sua elaboração, com atenção voltada à Polícia Judiciária, bem como no procedimento adotado. O segundo capítulo aborda, inicialmente, os aspectos gerais das provas no processo penal e os princípios que as regem, em especial os previstos na Constituição Federal. Nele são analisadas as principais espécies de prova, a questão atinente à gestão da prova judicializada, bem como o valor probatório dos atos produzidos durante a investigação criminal, em especial aquelas elaboradas no Inquérito Policial.

12 1 A PERSECUÇÃO PENAL E O INQUÉRITO POLICIAL COMO INSTRUMENTO DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR Desde os primórdios da humanidade, o ser humano teve a necessidade de organizar-se em sociedade, pois a vida em isolamento não faz parte de sua natureza. Este viver em sociedade envolve muitas questões sociais, políticas, culturais, econômicas, comportamentais, criminais entre tantas outras. Em relação ao crime, este não lesa somente direitos individuais, pois a sua ocorrência perturba a harmonia e estabilidade da sociedade em geral, trazendo em seu bojo, a insegurança. Assim, incumbe ao Estado manter a paz social, e na busca do bem estar comum, este trouxe para si o direito de punir, o qual tem seu marco inicial na investigação preliminar. 1.1 A persecução penal no Brasil: objetivos e etapas O convívio numa sociedade deve ser organizado, entrando em cena a figura do Estado que vem, através de normas próprias, regular as relações entre os cidadãos. No âmbito penal o Estado age regulando as ações ou omissões dos indivíduos, disciplinando condutas e as tipificando, ou seja, referindo quais de fato contrariam a lei penal, porquanto atingem aos bens mais caros do cidadão, e apontando as suas penalidades, uma das tarefas essenciais do Estado é regular a conduta dos cidadãos por meio de normas objetivas sem as quais a vida em sociedade seria praticamente impossível. (MIRABETE, 2003, p. 23). Assim também se posiciona Fernando da Costa Tourinho Filho (2003, p. 9): Dos bens ou interesses tutelados pelo estado (por meio das normas), uns existem cuja violação afeta sobremodo as condições de vida em sociedade. O direito à vida, à honra, à integridade física são exemplos. Tais bens e muitos outros e muitos outros são tutelados pelas normas penais, e sua violação é que chama ilícito penal ou infração penal. O ilícito penal atenta, pois, contra os bens mais caros e importantes da vida social.

13 Ainda nas palavras de Hidejalma Muccio (2000, p. 38): Ao se corporificarem na lei as condutas autorizadas e as proibidas, o cidadão tem a faculdade de realizar o comportamento permitido e de se abster da prática daquele que é vedado, ditando o direito objetivo às atividades lícitas, e ao mesmo tempo, os limites aos poderes e faculdades do cidadão, que está obrigado pelo dever de respeito aos direitos alheios ou do estado. Assim, se alguém desobedece a esse comando, lesando direito alheio, frustrando o fim perseguido pelo Estado, que é a garantia da paz, da tranqüilidade social, da convivência harmônica, fica sujeito à coação desse Estado. Neste sentido as normas são instituídas para regulamentar a convivência entre as pessoas, conforme declina Júlio Fabbrini Mirabete (2003, p. 23, grifo do autor): Esse conjunto de normas, denominado direito objetivo, exterioriza a vontade do Estado quanto à regulamentação das relações sociais, entre indivíduos, entre organismos do Estado ou entre uns e outros. Disso Resulta que é lícito um comportamento que está autorizado ou não está vedado pelas normas jurídicas [...] Mas o direito objetivo, ao mesmo tempo em que possibilita as atividades lícitas, é um sistema de limites aos poderes e faculdades do cidadão, que está obrigado pelo dever de respeito aos direitos alheios ou do Estado. Quem se afasta do imperativo das regras jurídicas fica submetido à coação do Estado pelo descumprimento de seus deveres, eis que seriam inócuas as normas se não estabelecessem sanções para aqueles que as desobedecem. Criadas as normas, o Direito Penal objetivo, pode ocorrer o descumprimento de alguma regra e isso legitima ao Estado exercer o direito de punir, impondo sanções. Porém, conforme preceituado na legislação, não é livre esse poder ou direito de punir, não há discricionariedade ao Estado para fazer valer o poder punitivo, quando aplicar ao infrator as medidas cabíveis. (MIRABETE, 2003). Nessa hipótese, em que se lesa, ou põe em perigo direito que interessa à própria sociedade, o Estado, cuja finalidade é a consecução do bem comum, investido por isso no direito de punir (jus puniendi), institui sanções penais contra o infrator. Esse direito de punir do Estado, entretanto, não é arbitrário, mas sim delimitado [...] é previsto na Constituição Federal de 1988: não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (art. 5º, XXXIX). (MIRABETE, 2003, p. 24). Para Tourinho Filho (2003, p. 10, grifo do autor): Ninguém desconhece que a prática de infrações penais transtorna a ordem pública, e a sociedade é a principal vítima e, por isso mesmo, tem o direito

14 de prevenir e reprimir aqueles atos que são lesivos à sua existência e conservação [...] Como a sociedade, assim entendida, é uma entidade abstrata, a função que lhe cabe, de reprimir as infrações penais, pertence em mãos do Estado, que a realiza por meio dos seus órgãos competentes [...] O jus puniendi pertence, pois ao estado, como uma das expressões mais características da sua soberania [...] Surge, assim, com a prática da infração penal, a pretensão punitiva [...] A pretensão punitiva surge, pois, no momento em que o jus puniendi in abstracto se transfigura no jus puniendi inconcreto. Em suma, tem-se então o Estado como ente responsável pela criação das normas que irão tipificar as condutas, disciplina aquelas que são autorizadas e também as que são vedadas e, caso ocorra à infração penal, há a imposição das sanções correspondentes. Entretanto, o direito de punir deve ser exercido de forma limitada, pois ninguém suportaria viver num estado em que o titular do direito de punir pudesse exercê-lo desenfreadamente. (TOURINHO FILHO, 2003, p. 11). Em tal aspecto o poder punitivo não é livre, e o próprio Estado delimitou-o. Neste viés Muccio (2000, p. 39) assevera: Concluí-se, pois que o estado, não pode punir ao seu alvedrio, antes é necessário existir uma norma que diga constituir infração penal esta ou aquela conduta, autorizando-o a infligir à pena àquele que a transgredir. O princípio da reserva legal não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal [...] inserto na Constituição Federal (art. 5º, XXXIX), reproduzido no art. 1º do Código Penal, constitui a primeira limitação ao direito de punir do Estado. Surgindo ao ente estatal o direito de punir, deflagrando a pretensão punitiva através da lide penal, gerando o conflito de interesses, culminará no devido processo legal. Praticado um fato que, aparentemente ao menos, constitui um ilícito penal, surge o conflito de interesses entre o direito de punir do Estado e o direito de liberdade da pessoa acusada de praticá-lo [...] Assim, no Estado moderno a solução do conflito de interesses, especialmente no campo penal, se exerce através da função jurisdicional do Estado no que se denomina processo. (MIRABETE, 2002, p. 26). Para a satisfação da pretensão punitiva o Estado vale-se da persecução penal. Através dela busca-se identificar a existência do fato criminoso, bem como sua autoria, impondo-se, por meio do devido processo legal, a sanção penal ao autor declarado culpado. A persecução penal é dividida em duas etapas, a primeira

15 desenvolvida pela polícia judiciária denominada investigação preliminar, no âmbito de inquérito policial, e a segunda pelo Ministério Público, enquanto titular da ação penal, e excepcionalmente, pela vítima. Neste itinerário ensina Mirabete (2003, p. 73, grifo do autor): Para que se proponha a ação penal, entretanto, é necessário que o Estado disponha de um mínimo de elementos probatórios que indiquem a ocorrência de uma infração e de sua autoria. O meio mais comum, embora não exclusivo, para a colheita desses elementos é o inquérito policial [...] cabe à polícia judiciária, exercida pelas autoridades policiais, a atividade destinada à apuração das infrações penais e da autoria por meio do inquérito policial, preliminar ou preparatório da ação penal. À soma dessa atividade investigatória com a ação penal promovida pelo Ministério Público ou ofendido se dá o nome de persecução penal (persecutio criminis) [...] Persecução penal significa, portanto, a ação de perseguir o crime. Ministra Muccio (2000, p. 167-168, grifo do autor): À investigação da infração penal e de sua autoria, medida preparatória da ação penal (processo), dá-se o nome de persecutio criminis. Implica em perseguir o crime, em desvendá-lo. Na persecutio criminis o objetivo e ter a prova da ocorrência do delito, da sua autoria, enfim, das provas preliminares [...] A persecução penal se compõe, portanto, de duas fases distintas: a primeira, que é preparatória da ação penal, de caráter preliminar e informativo, que se revela com a persecutio criminis, e a segunda, que é a própria ação penal. Tendo em mente que o Judiciário precisa de elementos para fazer valer a pretensão estatal relativa ao cometimento de algum ilícito penal, é que surgem outros órgãos que vão lhe auxiliar nesta demanda, os quais além de muitas atribuições que lhes são inerentes possuem também a tarefa relacionada a persecução penal. 1.1.1 Investigação preliminar A investigação preliminar é essencial para a futura ação penal, e consequentemente ao processo. É o momento de colher os elementos de uma infração penal, tendo como objetivo a definição de autoria e materialidade

16 delituosas. Assim, para que se proponha a ação penal, entretanto, é necessário que o Estado disponha de um mínimo de elementos que indiquem a ocorrência de uma infração penal e de sua autoria. (MIRABETE, 2003, p. 73). Para Aury Lopes Jr. (2008, p. 207-208): A investigação preliminar é uma peça fundamental para o processo penal [...] é absolutamente imprescindível, pois um processo penal sem a investigação preliminar é um processo irracional, uma figura inconcebível segundo a razão e os postulados básicos do processo penal constitucional [...] Não se deve começar um processo penal de forma imediata. Em primeiro lugar deve-se preparar, investigar e reunir elementos que justifiquem o processo ou não-processo. É um grave equívoco que primeiro se acuse, para depois investigar e ao final julgar. Neste viés a investigação preliminar é um conjunto de atividades realizadas por órgãos estatais, os quais sintonizados, associados entre si, a partir de uma notícia-crime, tendo cunho prévio e com natureza meramente preparatória em relação ao processo penal, busca averiguar a autoria e circunstâncias do fato denunciado como criminoso, sendo sua finalidade justificar o processo ou nãoprocesso. (LOPES JR., 2008). A investigação preliminar não tem como fundamento a pena e tampouco a satisfação de uma pretensão acusatória. Não faz em sentido próprio justiça, senão que tem como objetivo imediato garantir a eficácia do funcionamento da justiça [...] A investigação preliminar é o primeiro degrau da escada e, através dela, se chegará a uma gradual concreção do sujeito passivo. Com base nos elementos fornecidos pela investigação preliminar, serão realizados esses diferentes juízos, de valor imprescindível para chegar ao processo ou não processo. Se pêra a instauração da investigação preliminar basta existir a possibilidade, para a adoção de medidas cautelares e a admissão da ação penal é necessário um grau maior de segurança: é imprescindível um juízo de probabilidade da autoria e da materialidade. (LOPES JR., 2008, p. 210-212, grifo do autor). Como já explicitado, a investigação preliminar é início da persecução penal que por sua vez tem como fundamento as normas constitucionais, assim por consequência a investigação em tela não deve-se afastar das mesmas normas. (LOPES JR., 2008). O ponto de partida da investigação preliminar é a notitia criminis e, por conseqüência, o fumus commissi delicti. Essa conduta delitiva é geralmente, praticada de forma dissimulada, oculta, de índole secreta, basicamente por dois motivos: pra não frustrar os próprios fins do crime e para evitar a pena

17 como efeito jurídico. Por isso, o autor do delito buscará ocultar os instrumentos, meios, motivos e a própria conduta praticada [...] A investigação preliminar também atende a uma função simbólica [...] ao contribuir para restabelecer a tranqüilidade social abalada pelo crime. Significa que [...] contribui para amenizar o mal-estar causado pelo crime através da sensação que os órgãos estatais atuarão, evitando a impunidade [...] A nosso juízo, a função de evitar acusações infundadas é o principal fundamento da investigação preliminar, pois, em realidade, evitar acusações infundadas significa esclarecer o fato oculto (juízo provisório e de probabilidade) e com isso assegurar à sociedade de que não existirão abusos por parte do poder persecutório estatal. (LOPES JR.,2008, p. 211-216, grifo do autor). Assim elegendo essa instrumentalidade constitucional da investigação preliminar, tem-se que a função de comprovar a noticia crime, suas circunstâncias, visando a dar uma resposta estatal de forma imediata e justificar o processo ou não processo, há de observar-se também algumas razões que a fundamentem: a) a busca do fato oculto; b) a função simbólica; e c) evitar acusações infundadas. (LOPES JR., 2008). 1.1.2 O processo penal Como se viu, uma vez cometido o delito, a primeira providência a ser executada pelos órgãos encarregados pela persecução penal, visando à preservação da paz social, é a investigação preliminar. O jus puniendi, que será exercido através do processo penal, exige a realização de atividades investigativas, no caso atos de Polícia Judiciária. Assim desde o cometimento da infração penal até a conclusão do processo, dever-se observar os órgãos que legitimamente podem realizar a atividades ao feito inerente. (MIRABETE, 2003). Para Mirabete (2003, p. 29, grifos do autor) processo penal é: É o conjunto de atos cronologicamente concatenados (procedimentos), submetidos a princípios e regras jurídicas destinadas a compor as lides de caráter penal. Sua finalidade é assim, a aplicação do direito penal objetivo [...] São, portanto, necessárias as normas que disciplinem a criação, estrutura, sistematização, localização, nomenclatura a atribuição desses diversos órgãos diretos e auxiliares do aparelho judiciário destinado à administração da justiça penal, constituindo-se o que se denomina Organização Judiciária. Dessa forma, pode-se conceituar o Direito Processual Penal, no seu direto aspecto de ordenamento jurídico, como o

18 conjunto de princípios e normas que regulam a aplicação jurisdicional do Direito Penal, bem como as atividades persecutórias da Polícia Judiciária, e a estruturação dos órgãos da função jurisdicional e respectivos auxiliares. Na explanação sobre processo penal, Muccio (2000) é mais conciso, declinando que desde a pretensão punitiva até o final o processo o Estado necessita realizar vários atos visando a oportunizar o julgamento. Tendo em vista que o Estado encontra-se impedido de fazer o uso da força e de forma direta resolver os conflitos de interesses, criou um órgão que tem competência para deduzir sua pretensão punitiva ao Estado-Juiz. Trata-se, portanto, do Ministério Público, titular da ação penal, que por sua vez precisa ter em mãos elementos para poder exercer a pretensão punitiva, auxiliado pela atividade investigativa da Polícia judiciária. Assim, praticada uma infração penal, um outro órgão do Estado à polícia Judiciária desencadeia intensa atividade investigatória buscando a identificação do autor do fato, a prova da sua existência, colhendo-se informes quanto à motivação e às circunstâncias que o envolveram. Nessa fase o processo ainda não existe no seu sentido estrito. É o momento da sua preparação. Stricto sensu, o processo só se inicia quando o autor deduz a pretensão punitiva [...] pode-se dizer, portanto, quer o processo não passa de um conjunto de atos que de sucedem, segundo a lei, até o ato final e mais importante: a sentença, que tem por fim dirimir a lide. (MUCCIO, 2000, p. 42-43). Assim o Ministério Público, enquanto titular da ação penal, quando oferece a denúncia, tendo por alvo a pretensão punitiva invoca a prestação da tutela jurisdicional ao juiz, o qual por sua vez, não pode recusar o pedido, mesmo que o acusado não queira resistir a pretensão, pois a lide penal é sui generis. O juiz não pode negar ao infrator o direito de se pronunciar, ou seja, formular sua defesa, mesmo que este a recuse. Neste viés, citado o réu, está estabelecida a relação processual, e ambas as partes, Ministério Público e réu, aguardarão do Estado-Juiz a decisão final, que nada mais é que a sentença, pondo fim na lide formada. (MUCCIO, 2000). Nas palavras de Tourinho Filho (2003, p. 16): Colhidas as primeiras notícias sobre a infração e identificado o seu autor, o estado, já agora representado por outro órgão, o Ministério público, leva ao conhecimento do Juiz, em petição circunstanciada, a pretensão punitiva, instaurando-se, assim, o processo [...] Colhido todo o material probatório, o acusador e o acusado se manifestam sobre tudo quanto se apurou, e,

19 finalmente, o Juiz, já devidamente instruído, profere a sua decisão, dizendo se procede ou improcede a pretensão punitiva. Como titular do direito de punir, quando alguém infringe a norma penal, deverá o Estado, para fazer valer o seu direito, procurar os elementos comprobatórios do fato infringente da norma e os de quem tenha sido o seu autor, entregando-os, a seguir, ao órgão do Ministério Público para promover a competente ação penal. [...] O Ministério Público incumbe-se ajuizar a ação penal e acompanhar o seu desenrolar até o final. É o que chama persecutio criminis in judicio. (TOURINHO FILHO, 2003, p. 187). Entretanto, Tourinho Filho (2003, p. 17), observa que visto dessa maneira, o processo não passa de uma série de atos visando à aplicação da lei ao caso concreto, o mesmo autor aduz que: O processo não é apenas um conjunto de atos coordenados visando ao julgamento da pretensão punitiva. Essa seqüência de atos coordenados, dispostos segundo as regras e formalidades previstas em lei, nada mais representa senão a exteriorização de uma verdadeira relação jurídicoprocessual [...] Realmente quem procurar ver o processo intrinsecamente, pelo lado de dentro, á de convir que ali se entretece um complexo de vínculos juridicamente relevantes e juridicamente regulados. Trata-se de uma relação jurídico-processual unitária, complexa, progressiva e continuada (TOURINHO FILHO, 2003, p. 17). Também se posiciona Muccio (2000, p. 43, grifo do autor): O processo visto como relação jurídico-processual. Essa relação jurídicoprocessual é autônoma, pública, complexa, progressiva e continuativa. Pública porque somente o Estado dita a solução para a lide penal, por um de seus poderes soberanos, o Poder Judiciário [...] Complexa porque envolve uma série de direitos e obrigações entre os sujeitos processuais principais (autor, réu e Juiz) [...] Unitária porque é uma no seu objeto, a solução da lide penal. Desde o instante inicial, quando se opera a invocação da prestação da tutela jurisdicional, os atos processuais que se desencadeiam, convergem para o ato mais importante, a sentença [...] Progressiva e continuada porque os atos processuais são coordenados segundo a previsão legal [...] Autônoma porque se prende ao fato de o Estado-Administração exercitar seu direito de ação, pedindo a tutela jurisdicional, e ao dever que tem o Estado-juiz, por seus órgãos de prestá-la. Porém, todas as matérias relacionadas ao Direito devem fundamentalmente estar em sintonia com a Constituição Federal, uma vez que esta possui papel normativo. Assim, toda a legislação infraconstitucional, por óbvio, deve obedecer às regras e princípios consagrados na carta maior. Na lição de Muccio (2000, p. 49, grifo do autor):