HAQUE, Usman. Arquitetura, Interação e Sistemas. Revista AU, disponível em: http://www.revistaau.com.br/edicoes/149/artigo26764 2.



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Transcrição:

HAQUE, Usman. Arquitetura, Interação e Sistemas. Revista AU, disponível em: http://www.revistaau.com.br/edicoes/149/artigo26764 2.asp Interseção ARQUITETURA, INTERAÇÃO E SISTEMAS 'A arquitetura não pode mais ser considerada estática e imutável', diz o arquiteto especializado em design e pesquisa de sistemas interativos. Conheça mais de suas idéias a seguir POR USMAN HAQUE Hoje em dia, a palavra "interatividade" é encontrada em toda parte. Assim, vale a pena considerar o que significa e se as coisas apresentadas a nós como "interativas" realmente o são, antes de ir adiante e pensar porque queremos que nossos objetos e espaços projetados sejam "interativos". " Interatividade" e "hi-tech" não são palavras equivalentes. É possível ter algo que seja interativo, mas não hi-tech, da mesma forma que existem coisas hi-tech, porém nada interativas. Os avanços tecnológicos, é evidente, tornam alguns aspectos da interação mais fáceis de se obter, em parte porque eles comprimem as escalas temporais, espaciais ou interpessoais. Melhor do que fornecer logo de saída uma definição fixa de "interatividade", gostaria de discutir o assunto a partir de alguns pontos de vista diferentes, com a expectativa de que os limites esboçados nos possibilitem convergir para um conceito especialmente útil da palavra. Fundamentalmente, interação diz respeito à transmissão de informações entre dois sistemas, por exemplo, entre duas pessoas, entre duas máquinas, ou entre uma pessoa e uma máquina. A chave, porém, é que essa transmissão deverá ser de alguma forma circular, caso contrário, ela será somente "reativa". Em um contexto arquitetônico, por exemplo, uma parede de tijolos se desfaz ao longo dos anos sob o impacto da chuva. Mas será que a parede estaria "interagindo" com o meio ambiente? Em minha opinião, está somente "reagindo", porque a parede não causa nenhum efeito no meio ambiente ao qual está respondendo - exceto, de forma duvidosa e sem maiores conseqüências, em nível molecular. Assim, não existe circularidade porque o ambiente não altera seu comportamento, nem mesmo no caso de a parede ruir totalmente. A causalidade é fácil de ser atribuída neste caso porque a transmissão ocorre em uma única direção. Da mesma forma, quando brises seguem a direção do sol para orientar a incidência da luz em um prédio, estão somente respondendo a determinado input e, como tal,

não devem ser comumente descritas como "interativas", mas sim "reativas". Sacar dinheiro de um caixa eletrônico é uma ação interativa? Digitamos alguns números e a máquina entrega as cédulas, fechando um círculo. Antes de responder a essa pergunta, vamos dar um passo atrás por um instante e pensar no que ocorre quando realmente falamos com uma pessoa de carne e osso, dentro de um banco, com o objetivo de sacar dinheiro. Vamos até o posto de trabalho do caixa, fornecemos algumas informações, esperamos alguns instantes e então recebemos a quantia de dinheiro que solicitamos. Embora essa seja uma ação bastante básica, houve aqui uma transmissão de informação: fornecemos nossa identidade e o valor desejado e recebemos o que esperávamos. A chave aqui é que recebemos o que esperávamos, tanto nós quanto o caixa. Ocorreu uma interação no sentido de haver uma transmissão de informação através de uma fronteira e algo nos foi devolvido. É evidente que nós fornecemos ao caixa a informação esperada da parte dele (embora tivesse de ser distinguida entre um conjunto enorme de outros pedaços de informações fixas, ou seja, contas de clientes), e nós mesmos recebemos o que esperávamos na forma de uma quantia em dinheiro. Essa breve relação pode ser interativa, mas é, para mim, a forma menos interessante de interação porque cada uma das partes operou dentro de um conjunto de regras pré-determinadas. O caixa eletrônico espelha esse processo no qual cada um atua dentro de um conjunto fixo de possibilidades e responde diretamente a partir de outros conjuntos de resultados possíveis. É parecido com um sistema de termostato em um edifício, que nos possibilita ajustar a temperatura desejada e responde (pelo menos assim esperamos!) resfriando ou aquecendo o ambiente conforme solicitamos. Vamos chamar isso de "interação de circuito único". Muito mais profunda, creio eu, é a interação na qual realmente entramos em um diálogo com o caixa do banco. Pode ser a respeito de alguma notícia, ou uma conversa sobre um determinado assunto financeiro que necessite de mais interações, ou ainda a respeito de assuntos particulares, o que pode acontecer quando conhecemos o caixa devido às freqüentes visitas ao banco. A chave é que o campo de nossas interações está aberto e por meio de conversações somos capazes de manter um relacionamento produtivo e envolvente. Provavelmente descobriremos novas e inesperadas informações, poderemos nos beneficiar dessas informações ou simplesmente dos próprios circuitos de interação, que devem encorajar novas interações no futuro. Note-se, entretanto, que não é somente o "inesperado" que torna construtiva esta

uma forma de interação. Se for muito inesperado - por exemplo, o caixa do banco começa a gritar conosco sem nenhuma razão aparente - então a interação se romperá. Em tais sistemas interativos de "circuitos múltiplos", a causalidade é muito mais difícil de atribuir do que em sistemas meramente reativos: A provoca B, mas B afetou A primeiro, em um circuito eternamente contínuo. Note-se que os sistemas termostáticos complexos, como aqueles que levam em conta outros dados ambientais não são em sua complexidade necessariamente sistemas de interação de "circuitos múltiplos". A interação de circuitos múltiplos não depende da complexidade, ela depende da abertura e da continuação dos circuitos de resposta. Esse é o tipo de interação que não está presente em um caixa eletrônico. No entanto, não é uma interação que eu creia ser impossível de se obter com máquinas! Já discutimos três cenários diferentes: um no qual defendo que não há interação, um segundo no qual existe interação, embora em termos pouco sofisticados, e um terceiro no qual havia interação construtiva e contínua. Minha tese é que o terceiro cenário é o mais interessante e também o mais produtivo no contexto do design de espaços e de arquitetura. No âmbito de relacionamentos humanos-máquinas, o segundo cenário, ou seja, o de interação de circuito único - caso do caixa eletrônico - fornece uma situação na qual uma pessoa fica à mercê da máquina e de suas lógicas construtivas inerentes. Podemos obter resultados inesperados, como quando a máquina nos diz que está sem dinheiro, por exemplo. Mas o fato de que a própria máquina estava selecionando um conjunto pré-determinado de respostas impede qualquer interação construtiva. O terceiro depende da criatividade da pessoa e da máquina enquanto negociam por intermédio de uma interface, e é essa criatividade "conversacional", na minha opinião, que torna essas interações as mais interessantes. Eu admito que dispositivos reativos ou de circuito único que satisfazem o conforto dos seres humanos são úteis para metas funcionais - aqui estou pensando na mansão tecnologicamente saturada do Bill Gates, nos sistemas de gestão predial que procuram otimizar a distribuição da luz solar, ou nos termostatos que regulam a temperatura interna dos ambientes. Entretanto, se desejamos que os

habitantes de um prédio se sintam como agentes e possam contribuir para sua organização, então a situação mais estimulante e potencialmente produtiva seria um sistema no qual as pessoas constroem seus espaços por meio de "diálogos" com o meio, em que a história das interações fornecerá novas possibilidades para repartir metas e para repartir resultados. O cibernético Gordon Pask, que colaborou com arquitetos nos anos 70 e 80 na Architecture Association de Londres, nos fornece orientação rigorosa sobre como desenvolver tais sistemas. A sua Teoria da Conversação nos dá uma moldura clara para projetar interações nas quais sistemas (humanos, máquinas ou ambientes) podem se engajar na troca construtiva de informações sem depender de uma comunicação perfeita um com o outro - sem, por exemplo, exigir que um ambiente seja capaz de falar conosco com a voz de inflexão emocionada, ainda que eletrônica, do computador de bordo da Star Trek, Jornada nas Estrelas! O trabalho de Pask estava algo adiante de seu tempo e não foi totalmente entendido pela comunidade arquitetônica de maneira geral. Agora, entretanto, conseguimos um desenvolvimento tecnológico que já alterou nosso relacionamento com as máquinas, da mesma forma que o desenvolvimento conceitual nos permite compreender o papel construtivo que os participantes, antes meramente "usuários", podem ter em um sistema aberto. Assim, é possível pensar como essa Teoria da Conversação poderá nos ajudar a construir ambientes interativos complexos e dinâmicos no sentido mais pleno dessas palavras. Nesses sistemas, pode haver um dispositivo ambiental sensor/agente que monitora um espaço e é capaz de alterá-lo. Entretanto, em vez de apenas executar o que lhe ordenamos, o que depende de sabermos exatamente o que queremos - e nos termos da máquina, além de tudo -, esta nos diz o que pensa que necessitamos. Tal possibilidade depende de a máquina "interpretar" nossos anseios, levando à conhecida desigualdade entre humano-máquina, ou, como alguns diriam, mau atendimento. Um sistema Paskiano, entretanto, nos dotaria de um método para comparar nosso conceito de condições espaciais com o conceito de condições espaciais da máquina. Isso nos permite convergir, concordar e, assim, compartilhar os modelos conceituais do espaço um do outro e decidirmos de quais alterações precisa. Com este conceito

compartilhado somos mais capazes de agir sobre o espaço em conjunto com o dispositivo, de maneira construtiva, engajada e mais satisfatória. Tais sistemas nos permitem desafiar o tradicional modelo de arquitetura de produção e consumo, que coloca distinções firmes entre o projetista, o cliente, o proprietário e o mero ocupante. Podemos considerar como alternativa sistemas de arquitetura nos quais o ocupante tem o papel principal na configuração do espaço que habita, uma abordagem de cabeça para baixo que resultaria num relacionamento mais produtivo com nossos espaços e um com o outro. Esta maneira de pensar sobre sistemas interativos não é, necessariamente, tecnológica: não se trata de tornar sua experiência de compra online mais eficiente. Também não se trata de instalar na recepção de um prédio mais uma bela peça de arte hi-tech que responda aos fluxos de pessoas através do espaço, obra tão representativa, carregada de metáforas e tão pouco desafiadora como uma discreta paisagem de aquarela. Trata-se de projetar ferramentas que as próprias pessoas podem usar para construir seus ambientes no sentido mais amplo, e assim construir sua própria sensação de agente. É sobre como desenvolver maneiras de tornar as pessoas mais engajadas e, no final das contas, mais responsáveis pelos espaços que habitam. É sobre como investir na produção de arquitetura com a poesia de seus habitantes. Com este objetivo, apresento a seguir alguns experimentos de arquitetura pela Haque Design + Research. Sky Ear (algo como Ouvido do Céu, em português) foi um experimento para desenvolver um sistema que respondesse em tempo real aos inputs das pessoas, do ambiente ou de dispositivos eletrônicos. Consistiu de uma nuvem de fibra de carbono flutuante formada por mil balões de hélio, sensores eletromagnéticos e telefones celulares que pairou sobre um parque de Londres, em 2004. O objetivo da nuvem era duplo: primeiro fornecer uma rede complexa de sensores respondendo a campos eletromagnéticos e, segundo, investigar como a "platéia" poderia explicitamente se tornar um "participante" criativo no evento por ter sido encorajada colaborativamente a afetar os sensores que, de outra maneira, estaria meramente observando. A nuvem era tanto um sistema sensor, respondendo a ondas eletromagnéticas geradas

por chamadas de telefones celulares, como também um agente, produzindo ela mesma campos magnéticos. A seguir apresento um par de projetos assumidos para compreender a percepção: enquanto o primeiro explora como percebemos o espaço, o segundo explora como um espaço poderia nos perceber. Haunt (assombração), uma colaboração com o psicólogo anomalístico Chris French, envolveu medir padrões eletromagnéticos, freqüências subsônicas e condições de temperatura e de luz em lugares supostamente "assombrados" e, a seguir, recriar esses fenômenos em um espaço "neutro" de forma a determinar como as pessoas construíram, psicologicamente, um espaço assombrado a partir desses fenômenos. Tomando a abordagem contrária, em Evolving Sonic Environmen (ambiente sônico em evolução), colaboração com Robert Davis, especialista em redes neurais artificiais, construímos uma rede neural "espacializada", na qual as pessoas realmente pudessem entrar, passear e afetá-la com seus movimentos e padrões de ocupação. O sistema era composto de uma sociedade de dispositivos autônomos que funcionavam analogamente aos neurônios em nosso cérebro - não inteligentes quando isolados, mas se comportando coletivamente de forma a nos possibilitar inferir diferentes propriedades de suas respostas. Circuitos de aprendizado em cada dispositivo possibilitavam que se adaptassem em longo prazo a diferentes padrões de ocupação, de forma que após um tempo, a sociedade de dispositivos coletivamente passou a desenvolver suas próprias categorias de "ocupação" que não haviam sido explicitamente programadas. Por fim, Paskian Environments (ambientes paskianos), uma colaboração do cibernético Paul Pangaro, consolidará as abordagens de Haunt, Evolving Sonic Environments e Sky Ear, ou seja, acrescentará ao que nós agora entendemos sobre como humanos percebem ambientes, ambientes percebem humanos e o papel participativo de não-projetistas em sistemas projetados, e explorar amplamente a Teoria de Conversação de Gordon Pask no contexto de construções de arquitetura. A intenção do projeto é tomar algoritmos de interação de projetos passados de Pask - os quais, importantemente são independentes de contexto - e aplicá-los na construção de um ambiente dinâmico de larga escala. Localizado em um edifício em Londres, Paskian Environments será parte instalação multimodal, parte desempenho

orientado por eventos e parte construção ambiental interativa, abrangendo espaços tanto internos como externos. Estamos particularmente interessados em trabalhar com sistemas existentes no edifício, como fachadas, iluminação interna e externa, gestão de informação e sinalização, e espaços não utilizados, como corredores sem saída e pátios trancados. Com esses projetos esperamos nos aproximar da meta de interação autêntica de circuito múltiplo em projetos de arquitetura realmente construídos, abandonando o caminho mais fácil de criar sistemas meramente "reativos". O que construímos até agora tem sido capaz de abranger as linhas entre arquitetura e ciência, tecnologia e projeto, pesquisa e experimentação com muito pouca tolerância. Pressionando por uma agenda conceitual mais profunda, esperamos demonstrar (aos outros e a nós mesmos) que é possível trabalhar em projetos de larga escala sem perder a qualidade experimental do trabalho. Gostaria de agradecer ao Dr. Paul Pangaro por fornecer comentários durante os preparativos deste artigo.