Salário Mínimo e Mercado de Trabalho no Brasil no Passado Recente



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Transcrição:

Salário Mínimo e Mercado de Trabalho no Brasil no Passado Recente João Saboia 1 1. Introdução A questão do salário mínimo está na ordem do dia. Há um reconhecimento generalizado de que seu valor é muito baixo quando comparado com o nível de desenvolvimento do país, assim como com a experiência de outros países. Sua importância é muito grande, tanto em termos de referencial para o pagamento de salários no mercado de trabalho quanto por conta de seu papel como piso para a política de seguridade social. Por sinal, seu duplo papel tem sido uma das causas que dificultam seu crescimento. Neste texto será discutido o papel que o SM tem representado no mercado de trabalho a partir dos anos noventa. Inicialmente, será apresentada a evolução do SM real nos últimos anos. Em segundo lugar, serão identificados alguns segmentos onde o SM possui mais importância na fixação do nível de remuneração do trabalho. Em seguida, a partir da evolução do SM e do nível médio de rendimentos encontrado no mercado de trabalho, será indicado seu papel na redução das desigualdades de rendimentos do trabalho na última década. O trabalho será finalizado com o esboço de uma proposta para a recuperação do SM a médio prazo. 2. Evolução do Salário Mínimo na Última Década O salário mínimo tem evoluído favoravelmente desde meados dos anos noventa. Enquanto na primeira metade da década passada, o SM apresentou fortes flutuações por conta do processo hiperinflacionário, a partir de 1995, houve nítida tendência de crescimento. Beneficiado pela entrada do país num novo período de baixas taxas de inflação e por uma política de reajustes acima da inflação durante o governo FHC, o salário mínimo cresceu cerca de 40% desde então. Note-se que o processo de elevação do SM continuou nos dois primeiros anos do governo Lula. (ver gráfico 1) 1 João Saboia é professor titular e diretor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A evolução futura do SM, entretanto, é uma incógnita. A discussão anual sobre seu nível de reajuste envolve amplos segmentos da sociedade. O resultado final depende da combinação das forças políticas envolvidas e da conjuntura econômica do período, representando um processo demorado e desgastante que se repete a cada ano. Desta forma, seria desejável que o país possuísse uma política nacional para o SM, que orientasse as discussões e apontasse na direção de um processo efetivo de recuperação do valor real do SM. Esta questão será retomada na última seção do texto. 280 Gráfico 1 - Salário Mínimo Real - 1990/2004 Em R$ de Abril/05 260 240 220 200 180 160 1990 1991 1992 2004 Fonte: IPEADATA Obs. Valores inflacionados pelo INPC

3. Distribuição dos Rendimentos do Trabalho por Segmentos de Trabalhadores Os dados desta seção foram levantados a partir da Síntese de Indicadores da PNAD 2003, cobrindo, portanto, todo o país, exceto as áreas rurais da região Norte. 2 Segundo a PNAD, em 2003, 27,8% das pessoas ocupadas recebiam até 1 SM, enquanto 26,0% recebiam mais de 1 a 2 SM. Verifica-se, portanto, que o SM representa um verdadeiro ponto de atração para as remunerações do trabalho no país. As mulheres estão mais sujeitas a remunerações próximas ao SM que os homens. Enquanto 24,4% dos homens recebiam até 1 SM, entre as mulheres chegava a 32,5%. Em termos regionais, as remunerações próximas ao SM estão mais concentradas nas regiões Norte e Nordeste. Enquanto 46,1% das pessoas ocupadas na região Norte recebiam até 1 SM, na região Sudeste não passavam de 19,9%, na região Sul, 17,8% e na região Centro-Oeste, 24,3%. (ver gráfico 2) Em termos da posição na ocupação dos trabalhadores, há fortes diferenças em relação à importância do SM. Apenas 12,8% dos trabalhadores com carteira assinada recebiam até 1 SM em 2003. Entre os empregados sem carteira assinada, entretanto, mais da metade recebiam até 1 SM. (ver gráfico 3) É no emprego doméstico, entretanto, onde há maior concentração de trabalhadores recebendo próximo ao mínimo legal. Mais de três quartos dos empregados domésticos sem carteira assinada recebem até 1 SM. Entre aqueles com carteira assinada a situação é mais desfavorável. Há, todavia, 43% com remuneração até 1 SM. A predominância quase total de mulheres no serviço doméstico explica o forte papel do SM na remuneração feminina apontado acima. Conclui-se, portanto, que efetivamente o SM exerce um forte poder de atração na definição das remunerações do trabalho no país, principalmente nas regiões Norte e Nordeste e entre os trabalhadores sem carteira assinada e os trabalhadores domésticos em geral. No setor formal, a importância do SM é 2 Ver IBGE (2004).

um pouco menor. Mesmo assim, mais da metade dos empregados com carteira assinada recebiam no máximo 2 SM em 2003. 50 45 % Gráfico 2 - Distribuição das pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, por Grandes Regiões, segundo as classes de rendimento mensal - 2003 46,1 40 35 30 25 20 15 10 5 0 27,8 26,0 11,5 13,0 10,2 6,1 2,8 1,3 1,4 7,5 34,2 29,4 11,7 8,6 4,8 20,0 1,9 0,9 1,1 18,3 6,0 4,7 2,4 1,2 0,5 0,9 5,7 19,9 29,0 16,5 13,2 8,1 3,8 1,8 2,0 15,0 17,8 28,3 15,2 11,6 7,1 3,0 1,3 0,6 7,2 24,3 29,8 14,3 10,9 7,0 3,9 Brasil (1) Norte urbana Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste 1,7 0,9 Sem rendimento Até 1 salário mínimo Mais de 1 a 2 salários mínimos Mais de 2 a 3 salários mínimos Mais de 3 a 5 salários mínimos Mais de 5 a 10 salários mínimos Mais de 10 a 20 salários mínimos Mais de 20 salários mínimos Sem declaração Fonte: IBGE, PNAD, Síntese de Indicadores 2003 (1) Exclusive as pessoas da área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. 60 % Gráfico 3 - Distribuição dos empregados no trabalho principal da semana de referência, de 10 anos ou mais de idade, por categoria do emprego e as classes de rendimento mensal do trabalho principal - Brasil - 2003 50 51,2 40 34,3 40,1 30 24,8 21,2 21,6 24 29,1 20 10 0 0,1 16,8 12,5 6,7 2,7 1 1,1 0 12,3 14,2 7 2,9 1 1,2 0 10,2 17,1 16,9 6,3 2,6 1,2 0,4 9,3 5,3 2,4 1 0,4 0,9 Total Com carteira de trabalho assinada Militares e estatutários Outros sem carteira de trabalho assinada Sem rendimento (1) Até 1 salário mínimo Mais de 1 a 2 salários mínimos Mais de 2 a 3 salários mínimos Mais de 3 a 5 salários mínimos Mais de 5 a 10 salários mínimos Mais de 10 a 20 salários mínimos Mais de 20 salários mínimos Sem declaração Fonte: IBGE, PNAD, Síntese de Indicadores 2003 (1) Inclusive as pessoas que receberam somente em benefícios

4. Evolução Recente dos Rendimentos dos Trabalhadores Os rendimentos médios dos trabalhadores ao longo da última década ficaram marcados pelos efeitos do Plano Real e da recuperação econômica do período 1993/95, seguidos pela desaceleração da economia e da recessão. Excetuando-se os anos de 2000 e 2004, a regra geral foi o pouco crescimento econômico a partir da segunda metade dos anos noventa. O resultado final foi um forte crescimento dos rendimentos do trabalho até 1995/98, seguido de queda. Tal comportamento se repete para todas as posições na ocupação cobertas pela PNAD. O gráfico 4 e a tabela 1 abaixo ilustram os resultados encontrados no período. Tabela 1 - Número-Índice do Rendimento Real 1993/2003 (2003=) Variável Ano Max Valor Max Ano Min Valor Min Brasil 1996 120,2 1993 87,3 Nordeste 1996 119,7 1993 86,3 Sudeste 1997 123,2 1993 87,1 Empr. cc 1998 123,0 2003,0 Empr. sc 1998 116,0 1993 75,0 Trab. Domést. 1996 109,8 1993 68,3 Conta Própria 1996 141,7 1993 98,8 Fonte: Elaboração do autor a apartir do IBGE, PNAD, Síntese de Indicadores 2003

Gráfico 4 - Número-Índice do rendimento médio mensal real do trabalho principal dos empregados, de 10 anos ou mais de idade, ocupados na semana de referência, por categoria de emprego - Brasil - 1993/2003 (2003 = ) Total Com carteira de trabalho assinada 92,1 116 116,4 117,7 119 111,6 110,3 108,1 101,1 120,7 120,8 121,8 123 114,2 110,3 108,4 Militares e estatutários Outros sem carteira de trabalho assinada 106,7 106,3 108,5 111,5 108,2 110,8 109,6 104 111,8 112,6 116 107,5 113,4 110,8 81,8 75,0 Trabalhadores Domésticos Conta Própria 141,7 103,2 109,8 109,4 109,5 107,8 106,8 105,2 98,8 128,2 131,1 125,3 116,1 114,2 107 Fonte: IBGE, PNAD, Síntese de Indicadores 2003 Notas: 1. Exclusive o rendimento das pessoas da área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. 2. Valores inflacionados pelo INPC com base em setembro de 2003. Os anos de 1994 e 2000 foram obtidos por interpolação linear.

Cabe notar que, apesar da queda dos rendimentos do trabalho nos últimos anos, em geral, a situação do nível médio de rendimentos, em 2003, ainda era um pouco mais favorável do que em 1993, exceção feita aos empregados com carteira assinada que sofreram pequena queda. No caso dos trabalhadores sem carteira assinada, cujos rendimentos estão entre os mais baixos, houve forte recuperação no decênio. Tal resultado indica que a evolução relativamente favorável do salário mínimo pode ter contribuído para proteger os menores níveis de rendimento no período considerado. 5. O SM e a Evolução da Distribuição dos Rendimentos do Trabalho A distribuição dos rendimentos do trabalho, em 2003, mostra que as pessoas que recebem um SM mensal estão localizadas no terceiro décimo (de baixo para cima) da distribuição de rendimentos do trabalho. Portanto, qualquer elevação em seu nível de rendimento tende a apresentar efeitos favoráveis na distribuição dos rendimentos do trabalho. Em setembro daquele ano, enquanto o SM valia R$ 240, o rendimento médio do terceiro décimo era de R$ 237 3. A combinação entre um SM em crescimento com um rendimento médio do trabalho em queda, por conta das dificuldades econômicas do período, resultou em um processo de melhoria da distribuição dos rendimentos do trabalho no período. O índice de Gini para a população ocupada com rendimentos caiu de 0,600 para 0,555 entre 1993 e 2003. Embora este índice ainda seja extremamente elevado para os padrões internacionais, trata-se de uma queda significativa e consistente. Comportamento semelhante é encontrado nas diversas regiões do pais. (ver gráfico 5) Pode-se, portanto, concluir, que a evolução favorável do SM no período contribuiu para reduzir as desigualdades de rendimento do trabalho no país, pressionando o piso das remunerações para cima ao mesmo tempo em que a conjuntura geral da economia reduzia o nível médio de remunerações 4. 3 A PNAD levanta a cada ano informações de rendimento referentes ao mês de setembro. 4 Pochmann (2005) chega à mesma conclusão sobre o papel do salário mínimo na melhoria da distribuição de renda no período.

Gráfico 5 - Índice de Gini da distribuição do rendimento mensal de todos os trabalhos das pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, com rendimento de trabalho, por Grandes Regiões - 1993/2003 Brasil (1) Norte urbana 0,600 0,585 0,580 0,580 0,567 0,566 0,563 0,575 0,555 0,580 0,567 0,568 0,564 0,564 0,547 0,537 0,545 0,518 Nordeste Sudeste 0,643 0,596 0,603 0,601 0,590 0,587 0,576 0,574 0,564 0,573 0,561 0,554 0,552 0,546 0,537 0,546 0,541 0,535 Sul Centro-Oeste 0,563 0,557 0,543 0,561 0,545 0,543 0,527 0,522 0,603 0,581 0,585 0,592 0,584 0,573 0,572 0,578 0,521 0,548 Fonte: IBGE, PNAD, Síntese de Indicadores 2003. (1) Exclusive o rendimento das pessoas da área rural de Rondônia, Acre, Amazonas, Roraima, Pará e Amapá. Os anos 1994 e 2000 foram obtidos por interpolação linear

6. Linhas Gerais de uma Proposta de Recuperação do SM a Médio Prazo O reconhecimento de que o SM encontra-se em nível bem inferior ao seu potencial, tendo em vista o grau de desenvolvimento econômico do país, aponta no sentido da definição de uma política de valorização do SM. As dificuldades para o aumento do SM em curto prazo, entretanto, sugerem que seria desejável uma política de médio/longo prazo. A maior dificuldade para o aumento do SM não é econômica, mas política. O fato do SM ter passado a representar um duplo papel de piso no mercado de trabalho e de piso na seguridade social (inclusive na assistência social) faz com que qualquer tentativa de elevação de seu valor esbarre nas dificuldades das contas públicas do país. Portanto, uma alternativa possível seria desvincular parcialmente os dois pisos. Tal desvinculação, entretanto, teria que ser feita com salvaguardas para não prejudicar os beneficiários da política social. A proposta teria os seguintes pontos 5 : a) O salário mínimo serviria apenas como piso para o mercado de trabalho e as aposentadorias (contributivas); b) O SM seria corrigido uma vez por ano segundo o INPC (índice mais adequado às baixas rendas) para preservar as perdas inflacionárias; c) Seria repassado ao SM anualmente o aumento do PIB per capita que representa a medida mais geral da produtividade do país; d) Seria ainda repassado ao SM, uma vez por ano, um percentual de aumento, definido em nível nacional, indicando uma clara política de recuperação do SM a médio/longo prazo; e) No primeiro ano, os benefícios não contributivos da assistência social (Benefício de Prestação Continuada etc) permaneceriam iguais ao valor do SM; f) A partir do segundo ano, tais benefícios passariam a ser corrigidos uma vez por ano segundo o INPC mais a variação do PIB per capita. Cabe notar que tal proposta protege as pessoas que recebem os benefícios da assistência social, atualmente fixados em 1 SM, na medida em que, além da correção pela inflação, haveria aumento real segundo o crescimento do PIB per capita. A desvinculação em relação ao SM, entretanto, permitiria que 5 Para outras propostas de recuperação do salário mínimo ver, por exemplo, Dedecca (2005) e CUT/DIEESE (2004).

fossem dados ao SM aumentos maiores segundo a política de recuperação do SM definida em nível nacional. Supondo, por exemplo, que o aumento real anual do SM (aumento do PIB per capita mais o aumento adicional) fosse de 10%, o SM dobraria em termos reais em cerca de sete anos. Tal resultado traria inegável melhoria na distribuição dos rendimentos do trabalho, repercutindo favoravelmente sobre a distribuição de renda em geral. Uma política com essas características, dificilmente poderia ser implementada num período de recessão, quando o PIB fica estacionado e o PIB per capita tende a cair. Portanto, o pano de fundo para seu sucesso seria o crescimento econômico e o aumento do PIB per capita. Por outro lado, permite que o SM seja beneficiado com reajustes mais favoráveis, compatíveis com o nível de desenvolvimento atingido pelo país, reduzindo, ao mesmo tempo, a pressão sobre as contas públicas resultante da vinculação atualmente existente entre o SM e todos os pisos da seguridade, sejam eles benefícios contributivos ou não. Permaneceria apenas a vinculação com os benefícios contributivos, i.e. aqueles resultantes do direito assegurado aos trabalhadores devido à contribuição previdenciária durante sua vida ativa. 6 7. Conclusão Conforme visto ao longo do texto, o salário mínimo continua sendo muito importante na definição do nível de rendimento dos trabalhadores, especialmente nas regiões Norte e Nordeste e entre os empregados sem carteira assinada do setor privado e os empregados domésticos em geral. Foi mostrado ainda que a combinação entre um salário mínimo em ascensão, a partir de meados da década de noventa, e um rendimento médio em queda, devido às dificuldades econômicas do período, resultou em melhoria da distribuição do rendimento do trabalho. Apesar de ter melhorado, a 6 Para completar a proposta seria necessário um estudo sobre seu custo e a receita para financiá-la. Cabe, entretanto, mencionar que o dado mais importante é a evolução de seu custo em relação ao PIB e que tal política teria repercussões favoráveis sobre a própria receita pelos efeitos diretos do aumento da arrecadação resultante do crescimento do salário-base na economia e que o PIB seria beneficiado pela maior demanda originária do aumento do SM. Sobre a questão do custo e do financiamento necessário para aumentar o SM ver, por exemplo, Dain e Milko (2005) e Dedecca op. cit.

distribuição dos rendimentos do trabalho permanece ainda muito desfavorável segundo os padrões internacionais. Finalmente, foram apresentadas as linhas gerais de uma proposta para a recuperação do salário mínimo a médio/longo prazo a partir da desvinculação dos benefícios assistenciais (não contributivos) em relação ao valor do SM, permanecendo, entretanto, sua vinculação com os benefícios previdenciários (contributivos). Tal proposta permitiria que tanto o salário mínimo quanto os benefícios contributivos e não contributivos aumentassem ao longo do tempo, porém reduzindo eventuais pressões sobre as contas públicas. Bibliografia: CUT/DIEESE, As Propostas da CUT para uma Política de Recuperação do Salário Mínimo, mimeo, São Paulo, 2004. Dain, Sulamis e Matijascic, Milko, Salário Mínimo, Seguridade Social e Finanças Públicas: As Aparências Enganam, Seminário Salário Mínimo e Desenvolvimento, IE/UNICAMP, Campinas, 28 e 29/04/2005. Dedecca, Cláudio, Diretrizes para uma Política de Valorização do Salário Mínimo, Seminário Salário Mínimo e Desenvolvimento, IE/UNICAMP, Campinas, 28 e 29/04/2005. IBGE, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, Síntese de Indicadores 2003, Rio de Janeiro, 2004. Pochmann, Marcio, Ciclos do Valor do Salário Mínimo e seus Efeitos Redistributivos no Brasil, Seminário Salário Mínimo e Desenvolvimento, IE/UNICAMP, Campinas, 28 e 29/04/2005. Obs: Texto apresentado no Seminário Salário Mínimo e Desenvolvimento, realizado na UNICAMP em 28 e 29 de abril de 2005 pelo CESIT Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, com apoio de: DIEESE, CUT, Instituto de Economia da Unicamp, Abet, Prolam/USP e IE/UFRJ.