TRATAMENTO DA PERIODONTITE AGRESSIVA E ALTERAÇÕES NOS COMPOSTOS SULFURADOS VOLÁTEIS



Documentos relacionados
PRODUZINDO AUTOESTIMA DESDE 1990

Métodos para a limpeza da língua: um estudo clínico

Doença Periodontal na Infância

Dissertação O EFEITO DO TRATAMENTO DA GENGIVITE SOBRE O HÁLITO DE PACIENTES PORTADORES DE PERIODONTITE CRÔNICA. Autora Elcia Maria Varize Silveira

INFLUÊNCIAS DA KINESIOTAPING NO DESEMPENHO DO SALTO EM DISTÂNCIA, EM INDIVÍDUOS SADIOS JOVENS

Instituição Educacional: Universidade de São Paulo USP Ribeirão Preto

Segundo pesquisa realizada pelo Prof. Daniel Van Steemberg (1999), juntamente com

Victor Silvano Resende. Estabilidade da margem gengival após cirurgia para recuperação do espaço biológico - avaliação clínica

VARIABILIDADE NA PROFUNDIDADE CLÍNICA

Conexão protética mais utilizada em implantes unitários por cirurgiões-dentistas que praticam implantodontia

A Meta-Analytic Review of Psychosocial Interventions for Substance Use Disorders

PROTOCOLO DE ATENDIMENTO EM PERIODONTIA 1 - DIAGNÓSTICO 2 - TRATAMENTO PERIODONTAL 3 - ACOMPANHAMENTO

UNA-SUS Universidade Aberta do SUS SAUDE. da FAMILIA. CASO COMPLEXO 6 Dona Margarida. Fundamentação Teórica: Odontologia geriátrica

A POLUIÇÃO DO AR NA REGIÃO METROPOLITANA DO RIO DE JANEIRO: IMPACTOS À SAÚDE HUMANA

Carlos Heitor Cunha Moreira 1, Tiago Fernandes 2, Raquel Antoniazzi 3, Cassiano Kuchenbecker Rösing 4

COMPARAÇÃO DE CRITÉRIOS QUE DETERMINAM O DIAGNÓSTICO CLÍNICO DA DOENÇA PERIODONTAL

Qual é a origem do mau hálito?

Controle da placa bacteriana supragengival na terapia periodontal não-cirúrgica

Halitose: avaliando a criança

Escovação no Controle da Placa

A Comissão Intergestores Bipartite/RS, no uso de suas atribuições legais, e considerando:

HALITOSE NA GERIATRIA: DIAGNÓSTICO, CAUSAS E PREVALÊNCIA

Como estimar peso vivo de novilhas quando a balança não está disponível? Métodos indiretos: fita torácica e hipômetro

DIAGNÓSTICO COLETA DE DADOS RACIOCÍNIO E DEDICAÇÃO

UNIVERSIDADE PAULISTA - UNIP PROPRIEDADES FÍSICAS DE FIOS ORTODÔNTICOS DE AÇO APÓS UTILIZAÇÃO CLÍNICA CRISTINA YURI OKADA KOBAYASHI

Perfil Epidemiológico das Doenças Bucais no Centro de Especialidades Odontológicas (CEO) de Itabaiana, Sergipe, Brasil

AVALIAÇÃO DE CONFIANÇA DO CPITN EM LEVANTAMENTOS EPIDEMIOLÓGICOS DE CONDIÇÕES PERIODONTAIS

AVALIAÇÃO DE MÉTODOS MECÂNICOS NO CONTROLE DA HALITOSE RELACIONADA A LÍNGUA SABURROSA

Celi Novaes Vieira 1, Denise P. Falcão 2, Jorge Faber 3, Fernanda de Paula Nunes 4, Soraya Coelho Leal 5

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

ESTUDO DA PREVALÊNCIA DO CÂNCER BUCAL NO HC DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA, ATRAVÉS DO CID 10

ANÁLISE DE DIFERENTES MODELOS DE ATRIBUIÇÃO DE NOTAS DA AVALIAÇÃO INTEGRADORA (AVIN) DO CURSO DE ENGENHARIA CIVIL DO UNICENP

HALITOSE BUCAL: IMPORTÂNCIA DA SABURRA LINGUAL E PERIODONTITE NA SUA ETIOLOGIA

Aula 12: ASPECTOS RADIOGRÁFICOS DAS LESÕES PERIODONTAIS

FÁTIMA BARK BRUNERI LORAINE MERONY PINHEIRO UNIVERSIDADE POSITIVO

ROL DE PROCEDIMENTOS Atendimento em consultórios particulares dos cooperados em todo o Brasil

4 Análise dos Resultados

3.4 O Princípio da Equipartição de Energia e a Capacidade Calorífica Molar

PREVALÊNCIA DE CÁRIE DENTÁRIA NOS ALUNOS DA ESCOLA MUNICIPAL ADELMO SIMAS GENRO, SANTA MARIA, RS: UMA ANÁLISE DESCRITIVA PARCIAL 1

Curso de Mestrado em Ciências Odontológicas, Centro Universitário da Fundação Educacional de Barretos UNIFEB.

PROTOCOLO INTEGRADO DE ESPECIALIDADES ODONTOLÓGICAS CREO CISAMUSEP 1. PRÓTESE 2. ENDODONTIA 3. PERIODONTIA 4. CIRURGIA ORAL MENOR

A doença periodontal e o fumo


Palavras-chaves: Periodonto, Patologia, Periodontite, Epidemiologia, Geriatria

Eficácia da Suplementação de Ômega-3 como Agente Modulador da Periodontite Crônica. Reduz o Sangramento e a Inflamação Gengival

ASPECTO RADIOGRÁFICO DAS ALTERAÇÕES DO PERIODONTO

5 Considerações finais

Condições gengivais e periodontais associadas a fatores socioeconômicos Gingival and periodontal conditions associated with socioeconomic factors

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE ODONTOLOGIA DEPARTAMENTO DE ODONTOLOGIA CONSERVADORA GERMANO BORBA DE FREITAS

EM PESQUISA RANDOMIZAÇÃO. Randomização Cegamento Calibragem Controle de vieses Uso de grupos de comparação Representatividade da amostra

OTIMIZAÇÃO DA DOSE GLANDULAR MÉDIA NA MAMA E DA QUALIDADE DA IMAGEM NOS SISTEMAS DE MAMOGRAFIA DIGITAL

Ana Carolina Dupim Souza 1, Carolina Ferreira Franco 1, André Luiz Pataro 2, Fernando de Oliveira Costa 3, José Eustáquio da Costa 3

O USO DE ENXAGUATÓRIOS BUCAIS NO CONTROLE DA HALITOSE Use of the mouthrinses on halitosis control

MANUAL PARA CONFECÇÃO DE PAINÉIS CIENTÍFICOS*

O USO DA ONICOABRASÃO COMO MÉTODO DE AUXÍLIO NA OBTENÇÃO DE AMOSTRAS PARA O DIAGNÓSTICO DA ONICOMICOSE

Doenças gengivais induzidas por placa

"UMA BOCA SAUDÁVEL NA IDADE ADULTA DEPENDE DOS CUIDADOS QUE FOREM MANTIDOS DESDE O BERÇO".O que é a Odontopediatria?

PED ABC Novembro 2015

VITAMINA K2. Saúde Óssea e Cardiovascular

Análise do índice de placa gengival e higiene bucal de pacientes em relação ao tabagismo

AVALIAÇÃO DE TRATAMENTOS ENDODÔNTICOS REALIZADOS POR ALUNOS DE GRADUAÇÃO COM PROSERVAÇÃO DE SEIS MESES

PUBLICAÇÕES CIENTÍFICAS

TÉCNICAS DE PROMOÇÃO E PREVENÇÃO DA CÁRIE DENTÁRIA EM CRIANÇAS

IMPACTO DA ADIÇÃO DE CROMO HEXAVALENTE NA ATIVIDADE MICROBIANA E REDUÇÃO EM CONDIÇÕES DE INCUBAÇÃO

UTILIZAÇÃO DO APARELHO DE PROTRAÇÃO MANDIBULAR COMO ANCORAGEM PARA MESIALIZAÇÃO DE MOLARES INFERIORES: RELATO DE CASO CLÍNICO RESUMO

UFPB PRG X ENCONTRO DE INICIAÇÃO À DOCÊNCIA

Anexo II. Conclusões científicas e fundamentos para a recusa apresentados pela Agência Europeia de Medicamentos

Índice. Passo a passo para uma higiene bucal completa

Análise da relação entre a ocorrência da halitose e a presença de saburra lingual

ICMS estarão reduzidas as fontes de expansão da arrecadação?

ERRATA 001 AO EDITAL N. 001/2014 (CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGO DE PROFESSOR ADJUNTO NÍVEL 1 DA FESURV-UNIVERSIDADE DE RIO VERDE)

RELATÓRIO DE DISSERTAÇÃO DE INVESTIGAÇÃO ARTIGO DE INVESTIGAÇÃO MÉDICO DENTÁRIA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL FACULDADE DE ODONTOLOGIA CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM PERIODONTIA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Registro periodontal simplificado em gestantes Periodontal screening and recording in pregnant women

RELAÇÕES ENTRE O DESEMPENHO NO VESTIBULAR E O RENDIMENTO ACADÊMICO DOS ESTUDANTES NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE MATERIAIS DA UFSCAR

Diagnóstico da escolarização de crianças e adolescentes no Brasil

CIRURGIA DE RINOSSEPTOPLASTIA. Informações sobre a cirurgia

NORMA Nº 003/2016 PARA EXECUÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DE IMPLANTE ODONTOLÓGICO

A Importância de Inventários de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) em Governos Locais

Survey de Satisfação de Clientes 2009

COAGULANTE QUÍMICO SULFATO DE ALUMÍNIO PARA O TRATAMENTO DO EFLUENTE ORIGINADO DA LAVAGEM DE VEÍCULOS

SONDAGEM ESPECIAL PRODUTIVIDADE RIO GRANDE DO SUL. Sondagem Especial Produtividade Unidade de Estudos Econômicos Sistema FIERGS

Air-Lift é diferente porque é mais eficaz

Absenteísmo por causas odontológicas em uma empresa agropecuária da Região Sudeste do Estado de Minas Gerais

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ODONTOLOGIA ÁREA DE CONCENTRAÇÃO ODONTOPEDIATRIA

Palavras-Chave Cor, Espectrofotometria, Própolis, Resina composta, Café

ANÁLISE DO CUSTO DOS ANTIPSICÓTICOS ATÍPICOS: A CO- PARTICIPAÇÃO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE E DO MINISTÉRIO DA SAÚDE.

RASPAGEM E ALISAMENTO RADICULAR E TRATAMENTO PERIODONTAL DE SUPORTE

Antibióticos na Doença Periodontal Canina

IDENTIDADE DE POLÍTICOS E DESENVOLVIMENTO DE LONGO- PRAZO

PROTOCOLO DE DESCONTAMINAÇÃO ORAL

O EMPREGO DOMÉSTICO. Boletim especial sobre o mercado de trabalho feminino na Região Metropolitana de São Paulo. Abril 2007

A Importância da Halitose

Discussão do artigo Opportunities and challenges of clinical research in the big-data era: from RCT to BCT

1 Introdução. futuras, que são as relevantes para descontar os fluxos de caixa.

UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS FACULDADE DE ODONTOLOGIA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

Testes de Estresse para Risco de Liquidez

INFLUÊNCIA DO ESTRÓGENO NO PERIODONTO DE MULHERES MENOPAUSADAS

CONTROLO DE SISTEMAS

Transcrição:

ARTIGO TRATAMENTO DA PERIODONTITE AGRESSIVA E ALTERAÇÕES NOS COMPOSTOS SULFURADOS VOLÁTEIS TREATMENT OF AGGRESSIVE PERIODONTITIS AND ALTERATIONS ON VOLATILE SULFUR COMPOUNDS Moreno, Tatiana* Haas, Alex Nogueira** Castro, Gabriel Dias*** Winter, Rodrigo**** Oppermann, Rui Vicente***** Rösing, Cassiano Kuchenbecker****** RESUMO O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito do tratamento periodontal na produção de compostos sulfurados voláteis (CSV) em pacientes com periodontite agressiva. Foram incluídos 17 indivíduos (13-26 anos) com pelo menos um molar/incisivo com profundidade de sondagem (PS) e perda de inserção (PI) = 4 mm. O tratamento foi realizado em duas fases: tratamento da gengivite (controle de placa supragengival por 14 dias), e da periodontite (raspagem e alisamento radicular subgengival). Placa visível, sangramento gengival, PS e PI foram avaliados no início, após tratamento da gengivite, 3 e 6 meses após tratamento da periodontite. CSV foram medidos nos mesmos momentos com um monitor portátil de CSV (Halimeter). Alterações foram comparadas ao longo do estudo através do teste de Friedman. Associações entre variáveis clínicas e alterações nos CSV foram avaliadas com correlação de Pearson (r). Níveis de placa e gengivite reduziram significativamente ao longo dos 6 meses. Houve reduções significativas do início para o final do estudo em PS (3,2 ± 0,8 mm para 2,3 ± 0,3 mm; p < 0,001) e PI (1,6 ± 1,0 mm para 1,3 ± 0,9 mm; p < 0,001). Os níveis de CSV se mostraram reduzidos ao longo do estudo e não se alteraram significativamente (medianas: 34 ppb inicial, 36 ppb após controle de placa, 57 ppb 3 meses, 18 ppb 6 meses; p = 0,197). Indivíduos com maiores percentuais de placa antes do tratamento da periodontite demonstraram maiores reduções de CSV após o mesmo (r = 0,54; p = 0,024). Conclui-se que o tratamento periodontal não levou a alterações nos níveis de CSV em pacientes com periodontite agressiva. UNITERMOS: halitose; periodontite agressiva; compostos sulfurados voláteis. SUMMARY Objectives: The aim of this study was to evaluate the effect of periodontal treatment on the production of volatile sulfur compounds (VSC) in young individuals with periodontitis. Methods: 12 individuals (13-26 years old) with at least one permanent first molar and/or * Mestranda em Odontologia, ênfase em Clínicas Odontológicas Periodontia, Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ** Mestre em Odontologia, ênfase em Clínicas Odontológicas Periodontia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor Substituto de Periodontia da UFRGS. *** Mestre em Odontologia, ênfase em Clínicas Odontológicas Periodontia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Professor de Periodontia do Curso de Odontologia da Universidade Luterana do Brasil, campus Cachoeira do Sul. **** Cirurgião-dentista. Ex-bolsista da Disciplina de Periodontia da UFRGS. ***** Doutor em Odontologia pela Universidade de Oslo, Noruega. Professor Titular de Periodontia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. ****** Mestre e Doutor em Periodontia pela Faculdade de Odontologia de Araraquara da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Professor Adjunto de Periodontia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e da Universidade Luterana do Brasil. Revista Odonto Ciência Fac. Odonto/PUCRS, v. 20, n. 49, jul./set. 2005 217

incisor with probing depth (PD) 4 mm and clinical attachment loss (CAL) 4 mm were included in the study. All subjects had a 14-days initial program of supragingival scaling and plaque control. Subgingival scaling and root planing was performed in a subsequent period of 14 days. Presence of visible plaque (VP), gingival bleeding (GB), PD, CAL and bleeding on probing (BOP) were assessed at baseline, 14 days after supragingival plaque control and three months after subgingival therapy by one calibrated examiner. At the same intervals, levels of VSC were measured with a VSC portable monitor (Halimeter, Interscan TM). Clinical variables were compared using paired t test and VSC levels with Friedman s test. Associations between VSC alterations and initial VP, GB, BOP, mean PD and percent of sites with PD 4 mm were assessed with Pearson s correlation coefficient (r). Results: Periodontal treatment resulted in significant reductions in PD (6.55 ± 1.23 mm to 3.91 ± 0.75 mm) and CAL (5.19 ± 1.47 mm to 3.26 ± 1.61 mm). Initial low levels of VSC were observed in the sample (median 29.50, maximum and minimum 214-7). There were no significant differences between VSC levels at baseline, after supragingival plaque control and after three months (median, maximum and minimum: 29.50, 214, 7; 20.00, 156, 8; 35.00, 140, 11; respectively). It was observed a significant correlation between initial percent of sites with gingival bleeding and VSC reduction after treatment (r = 0.69, p = 0.01). Conclusions: Periodontal treatment did not promote alterations in VSC production in young individuals with periodontitis. UNITERMS: halitosis, aggressive periodontitis, volatile sulfur compounds. INTRODUÇÃO O termo halitose é derivado do latim, onde halitos significa ar expirado e osis uma alteração patológica, e é um termo que pode denotar hálito desagradável, resultante de causas fisiológicas e patológicas com origem oral ou sistêmica (Hine 6, 1957; Tonzetich 16, 1977). A produção de compostos sulfurados voláteis (CSV) na boca, em particular sulfeto de hidrogênio e metil mercaptana, é a principal fonte de halitose (Tonzetich 15, 1971). Estes compostos são o resultado final de degradação de aminoácidos da dieta, células epiteliais descamadas, soro e saliva (Rosenberg 13, 1996).Outros tipos de compostos de origem bacteriana como a cadaverina, indol, escatol, amônia, putrescina e certos alimentos também podem levar à percepção de maus odores (Goldberg 4, 1994). Estudos demonstraram que sulfeto de hidrogênio, metil mercaptana e menos extensamente o dimetil sulfeto, somam cerca de 90% do total de CSV identificados na cavidade bucal, sugerindo que estes seriam os responsáveis químicos da halitose (Solis-Gaffar 14, 1975; Tonzetich 16, 1977). Diversos estudos demonstraram relação entre halitose e doença periodontal (Tonzetich 17, 1978; Yaegaki et al. 19, 1992; Yaegaki et al. 21, 2000). Estudos microbiológicos demonstraram que microrganismos periodontalmente patogênicos contribuem para aumentar a produção de CSV, particularmente de metil mercaptana na cavidade bucal (Pianotti et al. 11, 1986; Tonzetich et al. 18, 1981). O impacto do tratamento periodontal na halitose tem recebido atenção. Quirynen et al. 12, (1998), observaram efeitos benéficos para redução do hálito no tratamento periodontal em uma única sessão (full mouth disinfection) quando comparado com a terapia periodontal convencional 12. No entanto, não existem estudos a respeito da relação entre halitose e periodontite agressiva. O objetivo deste estudo foi avaliar o efeito do tratamento periodontal na produção de compostos sulfurados voláteis (CSV) em pacientes jovens com periodontite agressiva. MATERIAIS E MÉTODOS A amostra deste estudo foi composta por 17 indivíduos participantes de um ensaio clínico sobre o uso de azitromicina no tratamento de periodontite em indivíduos jovens, projeto de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Para serem incluídos na amostra, os indivíduos deveriam ser sistemicamente saudáveis, com idade entre 13-26 anos no início do estudo; deveriam apresentar profundidade de sondagem (PS) e perda de inserção (PI) 4 mm, em pelo menos um primeiro molar ou incisivo após o controle de placa supragengival e não terem feito usos de antibióticos nos 6 meses anteriores ao início do estudo. O protocolo de tratamento incluiu duas fases: tratamento da gengivite através do controle de placa supragengival e tratamento da periodontite com raspagem e alisamento subgengival, sob anestesia local. O grupo teste recebeu azitromicina 500 mg por 3 dias e o grupo controle, placebo, pelo mesmo período de tempo. Os pacientes receberam 3 a 218 Revista Odonto Ciência Fac. Odonto/PUCRS, v. 20, n. 49, jul./set. 2005

5 consultas nos três meses seguintes, para monitoramento do controle de placa e deplacagem profissional. As medições do hálito foram realizadas na primeira consulta, antes do tratamento da gengivite, 14 dias após (após o controle de placa supragengival) e 180 dias após o fim do tratamento da periodontite. Ao exame clínico os parâmetros analisados foram: Índice de Placa Visível (IPV), Índice de Sangramento Gengival (ISG), Profundidade de Sondagem (PS), Níveis de Inserção Clínica (NIC) e Sangramento à Sondagem (SS). Os níveis de CSV foram medidos com um monitor portátil (Hallimeter, Interscan Corp., Chatsworth, CA) 7, deixado em equilíbrio com o ar do ambiente antes de cada medida. Cada indivíduo permaneceu com a boca fechada por três minutos antes da mensuração do CSV. Um canudo de plástico descartável foi acoplado à entrada do aparelho, e introduzido na entrada da boca do paciente, que foi instruído a respirar pelo nariz durante a medida. Os níveis de CSV são determinados em partes por bilhão (ppb), por leitura direta na escala digital do monitor. Os níveis de CSV ao longo do tempo foram comparados através de teste de Friedman. Associações entre alterações nos níveis de CSV, IPV, ISG, SS, média de PS e porcentagem de sítios com PS 4 mm foram verificadas com coeficiente de correlação de Pearson (r). RESULTADOS Ocorreram reduções significativas nos índices de placa visível e índice de sangramento gengival durante o período experimental, como pode ser observado na Tabela 1. TABELA 1 Índice de Placa Visível e Índice de Sangramento Gengival ao longo do período experimental de 6 meses (mediana, mínimo, máximo). Porto Alegre, 2005. IPV* (%) ISG* (%) Inicial 72,6 (11,3-98,6) 14,1 (0,6-40,1) Pós-tratamento da gengivite 19,6 (1,2-73,7) 5,9 (1,4-33,3) * Reduções siginificativas p < 0,05, teste de Friedman. 12,5 (1,2-52,6) 5,3 (1,8-22,0) 13,5 (2,9-54,7) 8,6 (0,0-29,1) De forma semelhante, foram observadas reduções significativas na profundidade de sondagem e perda de inserção 3 meses após o tratamento, refletindo ganho de inserção clínica. No período seguinte, até o final do estudo, os níveis clínicos de inserção e de profundidade de sondagem mantiveram-se inalterados (Tabela 2). TABELA 2 Profundidade de Sondagem (PS) e Perda de Inserção (PI) ao longo do período experimental de 6 meses (média ± desvio-padrão). Porto Alegre, 2005. Pós-tratamento da gengivite PS* 3,16 ± 0,79 2,35 ± 0,39* 2,27 ± 0,31 PI* 1,66 ± 1,11 1,36 ± 0,96* 1,27 ± 0,86 * Redução signinicativa após 3 meses, p < 0,05, teste de Friedman. No início do estudo, os indivíduos apresentaram baixos níveis de CSV, porém com grande variabilidade, sendo a mediana igual a 34, com valores mínimo e máximo de 7 e 410, respectivamente (Tabela 3). Esta variabilidade foi observada ao longo de todo o período experimental, mesmo após o tratamento periodontal. Não foram observadas alterações estatisticamente significativas nos níveis de CSV durante o período experimental (Tabela 3). Não houve diferenças significativas entre os indivíduos que tomaram azitromicina ou placebo com relação aos parâmetros clínicos e níveis de CSV, portanto, os mesmos foram agrupados na análise. TABELA 3 Níveis de Compostos Sulfurados Voláteis (CSV) ao longo do período experimental de 6 meses (mediana, mínimo e máximo). Porto Alegre, 2005. Inicial Alterações não-significativas, p > 0,05, teste de Friedman. A Tabela 4 mostra a correlação entre os parâmetros clínicos periodontais (IPV, ISG e PS) e a redução nos níveis de CSV 6 meses após o tratamento. Houve correlação significativa entre os níveis de placa após o tratamento da gengivite (IPV pós tratamento da gengivite) e redução nos níveis de CSV (r = 0,54, p = 0,024). Isto é, indivíduos com maiores percentuais de placa antes do tratamento da periodontite demonstraram maiores reduções de CSV após o mesmo. Tabela 4 Correlações de Pearson (r) entre parâmetros clínicos periodontais e redução de Compostos Sulfurados Voláteis (CSV) após 6 meses. Porto Alegre, 2005. * Correlação significativa. Pós-tratamento da gengivite CSV 34 (7-410) 36 (8-571) 57 (11-380) 18 (6-273) Variáveis r P IPV pós-tratamento da gengivite CSV 0,54 0,024* ISG pós-tratamento da gengivite CSV 0,3 0,24 OS CSV 0,12 0,65 Revista Odonto Ciência Fac. Odonto/PUCRS, v. 20, n. 49, jul./set. 2005 219

DISCUSSÃO No presente estudo, o tratamento da doença periodontal não teve influência sobre os níveis de CSV. O tratamento periodontal, por sua vez, demonstrou-se eficaz em reduzir os níveis de placa visível, sangramento gengival e periodontal à sondagem, profundidade de sondagem e nível de inserção clínica (Tabelas 1 e 2). Os resultados da terapia periodontal observados neste estudo são similares àqueles considerados satisfatórios após o tratamento da periodontite crônica (Cobb 3, 1996). A ausência de efeito do tratamento periodontal sobre os CSV pode ser explicada, em parte, pelo fato de os pacientes não apresentarem níveis elevados de CSV no início do estudo, e também pela grande variabilidade entre os indivíduos. É assumido que o valor de 75 ppb seria o valor de corte para o diagnóstico de halitose através do monitor portátil (Halimeter) 7, e, no presente estudo, as medianas em todo o período experimental mantiveram-se abaixo deste valor. Ainda, os compostos sulfurados voláteis, que são os compostos detectados pelo Halimeter, não são as únicas substâncias responsáveis pela halitose. Outras substâncias como a cadaverina, escatol, indol entre outras, estariam envolvidas com a produção de odores desagradáveis na cavidade bucal (Goldberg 4, 1994). O monitor portátil detecta somente os níveis de CSV, e o padrão ouro para o diagnóstico de halitose seria o teste organoléptico, que não foi realizado neste estudo. Porém, o monitor portátil constitui-se num método de fácil utilização e vem sendo amplamente empregado para fins de pesquisa e diagnóstico de halitose na clínica odontológica (Loesche et al. 8, 2002). Doença periodontal e saburra lingual têm sido consideradas as causas mais freqüentes de mau hálito na população (Loesche et al. 8, 2002). Entretanto, estudos sugerem um papel preponderante da língua na ocorrência da halitose (Yaegaki et al. 19, 1992; Yaegaki et al. 20, 1992; Miyazaki et al. 9, 1995), não demonstrando associação entre periodontite e ocorrência de mau hálito (Bosy et al. 2, 1994). Além disso, foi demonstrado, em um levantamento epidemiológico no Japão, que o papel da língua na halitose é mais evidente em indivíduos jovens (Miyazaki et al. 9 (1995). No presente estudo, não foram adotadas medidas mecânicas ou químicas voltadas para a higiene do dorso da língua. Este fato pode também em parte ser uma possível causa da ausência de reduções maiores nos níveis médios de CSV após terapia periodontal, apesar do pequeno número de indivíduos avaliados e da falta de um grupo de comparação. Alguns pesquisadores encontraram relação entre a doença periodontal e a halitose (Tonzetich 17, 1978; Yaegaki et al. 19, 1992), relação esta não demonstrada por esta investigação. Os resultados do presente estudo concordam com os resultados de Bosy et al. 2 (1994), que num estudo com 127 indivíduos, não encontraram relação entre halitose e doença periodontal, e concluíram ainda que grande proporção dos indivíduos com halitose são periodontalmente saudáveis, e que a superfície da língua é o maior sítio de produção de halitose 2. Uma possível explicação para a relação entre a doença periodontal e halitose é que as bactérias que produzem CSV são predominantemente anaeróbias gram-negativas, similares às envolvidas com a patogênese da periodontite (Miyazaki et al. 9, 1995). Awano et al. 1 (2002) concluíram que a presença de espécies periodontopatogênicas na saliva aumenta a produção de CSV 1. Em contrapartida, Waler 22 (1997), demonstrou que a saliva per se causa uma produção pequena de CSV, e que o acúmulo de placa bacteriana na língua seria o principal fator para a produção de CSV 22. Yaegaki et al. 19 (1992) concluíram que não somente os microrganismos, mas também a superfície da língua e o fluido gengival contribuiriam para aumentar a produção de CSV 19. Miyazaki et al. 9 (1995), em um estudo com 2672 indivíduos (18-64 anos), onde foram mensurados os níveis de CSV, condições dentais e periodontais, concluíram que a halitose pode ser causada principalmente pela placa acumulada na superfície da língua em indivíduos jovens e por doença periodontal e língua nos indivíduos mais velhos 9. Entretanto, é fundamental ressaltar que estudos em pacientes com periodontite agressiva são inexistentes e que, para esse tipo de paciente, a informação advinda deste estudo é fundamental. O mau hálito, cada vez mais, surge como uma queixa dos pacientes, principalmente pelo impacto social que ele exerce. Diferentes abordagens terapêuticas têm sido sugeridas, com taxas de sucesso razoáveis. Dentro das limitações deste estudo, e com as evidências crescentes da existência de outros fatores associados à halitose além das doenças periodontais, pode-se sugerir que uma abordagem voltada apenas para o aspecto periodontal pode não trazer resultados satisfatórios na redução do mau hálito de pacientes jovens com periodontite. Medidas de controle das bactérias presentes no dorso da língua, orientação sobre alimentação, avaliação do estado emocional do paciente, uso de colutórios com diferentes agentes, entre outros, devem ser considerados no tratamento da halitose destes pacientes. 220 Revista Odonto Ciência Fac. Odonto/PUCRS, v. 20, n. 49, jul./set. 2005

Baseando-se nos resultados do presente estudo, pode-se concluir que o tratamento periodontal não levou a alterações nos níveis de CSV em pacientes jovens com periodontite agressiva. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Awano S, et al. The relationship between the presence of periodontopathogenic bacteria in saliva and halitosis. Int Den J. 2002;52:212-6. 2. Bosy A, et al. Relationship of oral malodor to periodontitis: evidence of independence in discrete subpopulations. J Periodontol. 1994;65:37-46. 3. Cobb C. Non-surgical pocket therapy: mechanical. Ann. Periodontol. 1996;1:443-90. 4. Goldberg S, et al. Cadaverine as a putative component of oral malodor. J Dent Res.1994;73: 1168-72. 5. Haas AN, et al. Azithromycin as adjuvant in the treatment of aggressive periodontitis. Pesq Odont Bras. 2004;18(supl.):20. Resumo H032. 6. Hine MK. Halitosis. J Am Dent Assoc. 1957;55: 37-46. 7. Interscan Corporation. Halimeter. RH-17 Series. Instruction manual. Chatworth; [s.d.]. 8. Loesche WJ, Kazor C. Microbiology and treatment of halitosis. Periodontology 2000. 2002;28:256-79. 9. Miyazaki H, et al. Correlation between volatile sulphur compounds and certain oral health measurements in the general population. J Periodontol. 1995;66:679-84. 10. Morita M, Wang H-L. Association between oral malodor and adult periodontitis: a review. J Clin Periodontol. 2001;28:813-19. 11. Pianotti R, Lachette S, Dills S. Desulfuration of Cysteine and Methionine by Fusobacterium nucleatum. J Dent Res. 1986;65:913-7. 12. Quirynen M, Mongardini C, Steenberghe D. The effect of a 1-stage full-mouth disinfection on oral malodor and microbial colonization of the tongue in periodontitis patients. A pilot study. J Periodontol. 1998;69:374-82. 13. Rosenberg M. Clinical assessment of bad breath: current concepts. J Am Dent Assoc. 1996;127: 475-82. 14. Solis-Gaffar MC, et al. Instrumental evaluation of mouth odor in a human clinical study. J Dent Res.1975;54:351-7. 15. Tonzetich M. Direct gas chromatographic analysis os sulfur compounds in mouth air in man. Arc Oral Biol. 1971;16:587-97. 16. Tonzetich J. Production and origin of oral malodor: a review of machanisms and methods of analysis. J Periodontol. 1977;48:13-20. 17. Tonzetich J. Oral malodor: an indicator of health status and oral cleanliness. Int Den J. 1978;28: 309-19. 18. Tonzetich M, Mcbride BC. Characterization of volatile sulphur production by pathogenic and nonpathogenic strains of oral Bacteroides. Arch Oral Biol. 1981;26:963-9. 19. Yaegaki K, Sanada K. Biochemical and clinical factors influencing oral malodor in periodontal patients. J Periodontol. 1992;63:783-9. 20. Yaegaki K, Sanada K. Volatile sulfur compounds in mouth air from clinically healthy subjects and patients with periodontal disease. J Periodontol Res. 1992;27:233-8. 21. Yaegaki K, Coil JM. Examination, classification and treatment of halitosis: clinical prospectives. J Can Dent Assoc. 2000;66:257-61. 22. Waler SM. On the transformation of sulfurcontaining amino acids and peptides to volatile sulfur compounds (VSC) in the human mouth. Eur J Oral Sci. 1997;105:534-7. Recebido para publicação em: 17/01/2005; aceito em: 16/05/2005. Endereço para correspondência: CASSIANO KUCHENBECKER RÖSING Rua Ramiro Barcelos, 2492, Santana CEP 90035-006, Porto Alegre, RS E-mail: ckrosing@hotmail.com Revista Odonto Ciência Fac. Odonto/PUCRS, v. 20, n. 49, jul./set. 2005 221