implante dentário para o espaço submandibular



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CasoClínico Deslocamento de implante dentário para o espaço submandibular RAFAEL ZETEHAKU ARAÚJO 1 AÉCIO ABNER CAMPOS PINTO JÚNIOR 1 LUIZ FELIPE CARDOSO LEHMAN 2 FELIPE EDUARDO BAIRES CAMPOS 2 WAGNER HENRIQUES DE CASTRO 3 RESUMO A instalação de implantes dentários osseointegráveis é considerada um procedimento cirúrgico previsível e seguro. No entanto, sem um adequado planejamento do tratamento cirúrgico, várias complicações trans-operatórias e pós-operatórias podem ocorrer. O presente artigo objetiva relatar o caso de uma paciente, com 48 anos de idade, que compareceu com histórico de deslocamento de implante dentário durante sua instalação, com queixa álgica e de desconforto psicológico. Avaliações clínicas intrabucais e extrabucais não apontaram alterações signiicativas, e o exame tomográico revelou deslocamento do implante para o espaço submandibular. Em um segundo tempo cirúrgico, o implante foi removido via acesso submandibular. As complicações com implantes dentários podem ser trans-operatórias, como hemorragias e danos neurossensoriais, ou pós-operatórias, como falta de osseointegração e peri-implantite. O deslocamento de implantes ou materiais relacionados é raro e, em geral, relatado como sua movimentação para o interior do seio maxilar. Fatores de risco para essa complicação estão diretamente relacionados a características anatômicas locais. A decisão quanto à sua remoção envolve questões isiológicas, funcionais, psicológicas e médico-legais. Não existem casos relatados na literatura de deslocamento de implante para o espaço submandibular. Um minucioso planejamento clínico e radiográico de todas as etapas do tratamento cirúrgico é necessário para evitar esse tipo de complicação. Palavras-chave: Implantes. Complicações. Deslocamento. Submandibular. 1 Residente em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. 2 Preceptor do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. 3 Coordenador do Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Como citar este artigo: Araújo RZ, Pinto Júnior AAC, Lehman LFC, Campos FEB, Castro WH. Deslocamento de implante dentário para o espaço submandibular. J Braz Coll Oral Maxillofac Surg. 2015 maio-ago;1(2):68-73. DOI: http://dx.doi.org/10.14436/2358-2782.1.2.068-073.oar Enviado em: 08/10/2014 - Revisado e aceito: 24/04/2015» Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de propriedade ou financeiros, que representem conflito de interesse, nos produtos e companhias descritos nesse artigo.» O(s) paciente(s) que aparece(m) no presente artigo autorizou(aram) previamente a publicação de suas fotografias faciais e intrabucais, e/ou radiografias. Endereço para correspondência: Aécio Abner Campos Pinto Júnior Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais SEDTO Serviço Especial de Diagnóstico e Tratamento em Odontologia Departamento de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial Av. Prof. Alfredo Balena, 110, Santa Efigênia, Belo Horizonte/MG - CEP: 30.130.100 E-mail: aeciocampos@gmail.com Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 68

Araújo RZ, Pinto Júnior AAC, Lehman LFC, Campos FEB, Castro WH INTRODUÇÃO O uso de implantes osseointegráveis visando a reabilitação de áreas edêntulas tem crescido muito nos últimos 40 anos. A reabilitação com implantes é considerada um tratamento com boa previsibilidade cirúrgica e protética, com altas taxas de sucesso. Embora relatado como um procedimento seguro, muitas complicações trans- e pós-operatórias podem ocorrer 1,2. Goodacre et al. 1, em uma revisão de literatura de 20 anos associada a complicações com implantes dentários, identiicaram as principais intercorrências, incluindo hemorragias, distúrbios neurossensoriais, dano ou desvitalização a dentes adjacentes e fraturas mandibulares. Em uma menor escala, esses autores também encontraram na literatura casos de hemorragias com risco de vida, embolia aérea, deslocamento de implantes para o canal mandibular, aspiração de instrumentais, mediastinite necrotizante e hemorragia intraocular 1. Alexander e Attia 3, em sua revisão das complicações gerais relacionadas aos implantes, mencionaram a possibilidade do deslocamento de dentes, implantes ou objetos para os seios paranasais e espaços fasciais, principalmente os espaços infratemporal, submandibular, bucal e sublingual. O deslocamento de implantes dentários é uma complicação cirúrgica rara. Características específicas são associadas a essa complicação, como a baixa densidade óssea encontrada nas regiões posteriores de maxila e mandíbula, instrumentação incorreta, variação anatômica, imperícia do cirurgião e planejamento cirúrgico inadequado 2,3,4. O presente artigo relata um caso de deslocamento de implante para o espaço submandibular e a sua remoção através de procedimento cirúrgico tardio. São discutidos, também, os principais fatores de risco associados à complicação, e as possíveis justiicativas para se proceder à remoção cirúrgica do implante. Esse é o primeiro artigo que descreve um deslocamento de implante para o espaço submandibular como complicação cirúrgica trans-operatória no tratamento reabilitador por meio de implantes dentários. RELATO DO CASO Uma paciente, com 48 anos de idade, compareceu ao Serviço de Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, para avaliação de um possível deslocamento de um implante dentário para os espaços intersticiais da face, durante a tentativa de sua instalação na mandíbula, 7 dias antes. A paciente foi encaminhada por outro proissional, que relatou que, ao realizar a colocação de dois implantes de 3,75 x 9mm na região dos elementos 46 e 47, ausentes: durante a inserção do primeiro implante (região do elemento 46), não houve intercorrências; entretanto, no momento da instalação do segundo implante, esse simplesmente desapareceu. O cirurgião procurou pelo implante através da perfuração mandibular produzida pela fresagem, mas não pôde encontrá-lo. Em seguida, um retalho lingual foi realizado visando localizar a posição do implante, sem sucesso. Assim, o procedimento foi inalizado e a paciente encaminhada. Na anamnese, a paciente relatou sensibilidade facial e desconforto psicológico, pela presença do implante deslocado, e negou ser portadora de alterações sistêmicas ou fazer uso de medicamentos. Ao exame físico extrabucal, não foi observado edema ou assimetria facial; contudo, a região submandibular apresentava sintomatologia dolorosa à palpação. A avaliação intrabucal revelou processo de reparação acelerado do leito cirúrgico, sem sinais de infecção. O implante não se apresentava palpável pela via intraou extrabucal. A radiograia panorâmica pós-operatória, solicitada pelo proissional que encaminhou a paciente, mostrou a presença de um corpo estranho radiopaco localizado inferiormente à basilar mandibular, no lado direito. Foi solicitada uma tomograia computadorizada de feixe cônico (CBCT), para auxiliar na avaliação e localização do implante no espaço intersticial (Fig. 1, 2). O plano de tratamento para o caso consistiu na proposição de um procedimento cirúrgico visando a remoção do implante, sob anestesia geral, haja vista a possibilidade da necessidade de realização de um acesso extrabucal. A cirurgia foi então realizada, dez dias após o procedimento de tentativa de instalação do implante. Durante o procedimento, em um primeiro momento, procedeu-se à tentativa de remoção por via intrabucal, por meio da realização de um retalho mucoperiosteal lingual. O implante não foi localizado entre a cortical lingual e o periósteo. Apesar da dissecção dos tecidos adjacentes, não foi possível senti-lo ou visualizá-lo. Então, uma abordagem através do acesso submandibular foi executada. Após dissecção romba, auxiliada pela palpação intra e extrabucal, o implante foi localizado e removido (Fig. 3). Não houve complicações pós-operatórias e a paciente recebeu alta hospitalar 24 horas após a cirurgia. A paciente passou por controle ambulatorial do tratamento, sem relatar queixas signiicativas funcionais ou estéticas. Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 69

Deslocamento de implante dentário para o espaço submandibular Figura 1: Tomografia computadorizada de feixe cônico (CBCT): cortes coronal, axial e sagital, visando uma avaliação tridimensional da posição do implante deslocado no espaço submandibular. Figura 2: Reconstrução tridimensional da CBCT: posição do implante deslocado no espaço submandibular, vista da face interna da mandíbula. Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 70

Araújo RZ, Pinto Júnior AAC, Lehman LFC, Campos FEB, Castro WH Figura 3: Remoção cirúrgica do implante dentário deslocado, através do acesso extrabucal submandibular. DISCUSSÃO Embora a cirurgia de implantes dentários seja um procedimento simples, previsível e seguro, uma variedade de complicações pode ocorrer especialmente se não se realizar um planejamento adequado e usar técnica cirúrgica cuidadosa. Goodacre et al. 1, em uma revisão de literatura publicada na MEDLINE entre 1981 e 2001, apontaram as complicações cirúrgicas mais comuns. Complicações hemorrágicas relacionadas, ou seja, hematomas ou equimoses, podem ser vistas em 24% de todos os casos cirúrgicos de implantes. Em um menor grau de incidência, distúrbios neurossensoriais ocorrem em cerca de 7% dos casos, enquanto a incidência de fratura mandibular é de 0,3%. Outras complicações cirúrgicas, como a hemorragia grave com risco de vida, aspiração de instrumentais, embolia ou deslocamento do implante, são raras e seu relato na literatura consiste em poucos casos clínicos isolados. Ardekian e Dodson 2, resumindo os tipos relatados e a frequência das complicações associadas à cirurgia de implantes dentários, dividiram-nas em complicações operatórias (15% do total dos casos) como, por exemplo, sangramento, deslocamento do implante e danos aos dentes adjacentes e complicações inlamatórias (10% do total dos casos), como a peri-implantite, infecção ou hiperplasia da mucosa. De acordo com esses autores, o deslocamento (em direção às estruturas anatômicas adjacentes, tais como o seio maxilar, assoalho nasal ou canal mandibular) de um implante pode ocorrer durante a instalação desse ou da conexão do componente intermediário. Em relação às regiões anatômicas para as quais ocorre o deslocamento de implantes, Chiapasco et al. 4 relataram 27 casos de deslocamento em um período de cinco anos, tendo um deles apresentado migração espontânea para o seio esfenoidal. Outros trabalhos relataram, também, deslocamento de implantes para Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 71

Deslocamento de implante dentário para o espaço submandibular outras regiões anatômicas, como o interior da mandíbula 6, do canal mandibular 5, seio etmoidal 7 ou fossa anterior do crânio 8. Os fatores de risco para o deslocamento trans- ou pós- -operatório de um implante são a colocação de implantes em osso com má qualidade (com uma baixa densidade óssea e grande espaço medular, como observado, especialmente, na região posterior da maxila), a proximidade com o seio maxilar ou canal mandibular 2,5, as mudanças de pressão na cavidade nasal e nos seios paranasais 4, osteoporose 5, a arquitetura interna da região posterior de mandíbula, a distribuição incorreta das forças oclusais, a técnica cirúrgica inadequada (sobreinstrumentação ou uso de força excessiva na inserção do implante), e as variações anatômicas 6. Um acurado planejamento pré-operatório, contando com exames complementares adequados, como a CBCT, é sempre imprescindível. A CBCT vai ajudar a prever a densidade intraóssea, apontar quaisquer variações anatômicas e orientar a inserção do implante na angulação correta. No caso aqui relatado, é evidente que a variação anatômica da mandíbula da paciente, com uma concavidade acentuada da fóvea submandibular, visualizada nos cortes coronais, foi uma das causas do deslocamento do implante. O deslocamento de implantes dentários para os espaços intersticiais da face é considerado uma complicação muito rara, mas, com o número crescente de cirurgias para instalação desses dispositivos, essa intercorrência poderá ter a sua incidência aumentada. Mais comum do que o deslocamento do implante, é o deslocamento de terceiros molares para os espaços fasciais adjacentes. Dois artigos de revisão desse tipo de complicação sugerem que, quando deslocado para o espaço submandibular ou sublingual, uma abordagem intrabucal pode oferecer acesso limitado e pouca visibilidade da área, devido à presença do músculo milo-hióideo 9,10. Esses autores, assim como Alexander e Atttia 3, defendem uma abordagem intrabucal inicial, mas alertam para a possibilidade da necessidade de combinação, em alguns casos, com um acesso submandibular. No presente caso, a tentativa inicial de remoção intrabucal teve como objetivo evitar possíveis complicações associadas ao acesso extrabucal, como a lesão do nervo facial e, especialmente, uma cicatriz não-estética. A necessidade de remoção de um implante dentário do interior dos tecidos, e o melhor momento para fazer isso, ainda são questões controversas na literatura. Alguns autores defendem que, se o objeto for considerado biocompatível, é razoável apenas acompanhar o paciente semelhante ao que é feito em casos de fragmentos de projéteis de arma de fogo, quando a não remoção não oferece risco às estruturas anatômicas adjacentes 3. A maioria dos trabalhos tende a indicar a retirada do objeto, devido à possibilidade de que esse se desloque ou gere uma infecção, reações de corpo estranho, dor crônica, trismo, além do sofrimento psíquico do paciente 4,9,10. No presente caso, a paciente teve um desconforto psicológico considerável devido ao implante desalojado. Ela também declarou que a região era sensível à palpação e a incomodava nas atividades diárias, como durante a mastigação e a fonação. CONSIDERAÇÕES FINAIS O deslocamento do implante durante a sua colocação é uma complicação muito rara, ocorrendo com mais frequência nos seios maxilares. Na literatura revisada, esse é o primeiro relato encontrado de um deslocamento de implante dentário para o espaço submandibular. Na maioria das vezes, esse acidente pode ser evitado por meio de um acurado planejamento pré-operatório e uma cuidadosa técnica cirúrgica. Considerando-se as implicações legais, devido ao sofrimento psíquico e as consequências adversas que a proservação do implante deslocado pode acarretar, a possibilidade de sua remoção deve ser considerada. ABSTRACT Implant displacement into the submandibular space: a rare case report Installation of dental implants is considered a safe and predictable surgical procedure. However, without the proper surgical planning, several intraoperative and postoperative complications can occur. To report the case of a 48 year-old female patient presenting a history of dental implant displaced during surgery, and reporting pain and psychological distress. Clinical intraoral and extraoral evaluation did not show any signiicative alterations, and a tomographic scan revealed the dental implant displaced to the submandibular space. Surgery was realized to remove the displaced dental implant through a submandibular access. Several complications in dental implant surgery might occur. Intraoperative complications, like hemorrhage and neurosensory disturbance, or postoperative complications such as lack of osseointegration of the implant or peri-implantitis are some of the them. Implant displacement is rare, and when it happens, Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 72

Araújo RZ, Pinto Júnior AAC, Lehman LFC, Campos FEB, Castro WH usually is to the interior of the maxillary sinus. Risk factors for this rare complication are directly related to the local anatomic characteristics. he decision for implant removal involves physiological, functional, psychological and legal considerations. here are no cases in the literature related to implant displaced into the submandibular space. A rigorous clinical and radiographic surgical planning are necessary to avoid this rare complication. Keywords: Intraoperative complications. Implant displacement. Submandibular space. Referências: 1. Goodacre CJ, Bernal G, Rungcharassaeng K, Kan JYK. Clinical complications with implants and implant prostheses. J Prosthet Dent. 2003;90(2):121-32. 2. Ardekian L, Dodson TB. Complications associated with the placement of dental implants. Oral Maxillofac Surg Clin North Am. 2003;15(2):243-9. 3. Alexander G, Attia H. Oral maxillofacial surgery displacement complications. Oral Maxillofac Surg Clin North Am. 2011;23(3):379-86. 4. Chiapasco M, Felisati G, Maccari A, Borloni R, Gatti F, Di Leo F. The managements of complications following displacement of oral implants in the paranasal sinuses: a multicenter clinical report and proposed treatment protocols. Int J Oral Maxillofac Surg. 2009;38(12):1273-8. 5. Theisen FC, Shultz RE, Elledge DA. Displacement of a root form implant into the mandibular canal. Oral Surg Oral Med Oral Pathol. 1990;70(1):24-8. 6. Bayram B, Alaaddinoglu E. Implant-box mandible: dislocation of an implant into the mandible. J Oral Maxillofac Surg. 2011;69(2):498-501. 7. Haben CM, Balys R, Frenkiel S. Dental implant migration into the ethmoid sinus. J Otolaryngol. 2003;32(5):342-4. 8. Cascone P, Ungari C, Filiaci F, Gabriele G, Ramieri V. A dental implant in the anterior cranial fossae. Int J Oral Maxillofac Surg. 2010;39(1):92-3. 9. Huang I-Y, Wu C-W, Worthington P. The displaced lower third molar: a literature review and suggestions for management. J Oral Maxillofac Surg. 2007;65(6):1186-90. 10. Aznar-Arasa L, Figueiredo R, Gay-Escoda C. Iatrogenic displacement of lower third molar roots into the sublingual space: report of 6 cases. J Oral Maxillofac Surg. 2012;70(2):e107-15. Journal of the Brazilian College of Oral and Maxillofacial Surgery 73