NOVA METODOLOGIA DE HIPOFISECTOMIA EM CURIMATÃ Prochilodus brevis (PISCES, PROCHILODONTIDAE)



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Transcrição:

NOVA METODOLOGIA DE HIPOFISECTOMIA EM CURIMATÃ Prochilodus brevis (PISCES, PROCHILODONTIDAE) José Patrocínio Lopes (jpatrobr@yahoo.com.br), Jeane Gomes de Souza; Maria Conceição Freire Rocha Departamento de Educação, Universidade do Estado da Bahia RESUMO No nordeste de Brasil, peixes reofilicos total são usados como doadores de hipófises. O presente trabalho descreve uma nova metodologia de hipofisectomia em curimatãs, Prochilodus brevis desenvolvida na Estação de Piscicultura de Paulo Afonso (EPPA), da Companhia Hidro Elétrica de São Francisco (CHESF) buscando melhor utilização do peixe hipofisectomizado. Foram hipofisectomizados 53 espécimes de curimatãs sexualmente maduros. Foram postas em uma calha de contenção e com ajuda de arco de serra ou uma faca, foi efetuado um corte na região occipital da cabeça do peixe. Com pinças metálicas o encéfalo foi removido descobrindo a sela túrsica do esfenóide onde fica a hipófise. Depois de retirada à hipófise, esta é colocada em recipiente com álcool absoluto. Os peixes foram eviscerados, espalmados, salgados ficando prontos para o mercado. Esta nova técnica apresenta diferencial em relação a técnica tradicional, que apresenta uma metodologia complicada, quando da utilização do cotóstomo que dificulta a realização do procedimento e deixa o peixe com apresentação de difícil comercialização. Esta pesquisa descreve uma nova metodologia de hipofisectomia em curimatã Prochilodus brevis com melhor aproveitamento do peixe para o mercado, contribuindo deste modo com uma metodologia de fácil aplicação. Palavras-chave: Peixes, Reprodução, Hipófise NEW METODOLOGY OF HYPOPHYSECTOMY IN Prochilodus brevis (PISCES, PROCHILODONTIDAE) ABSTRACT In the northeast of Brazil, fish of total spawning are used as donors of hypophyses. The present work aims at to describe new hypophysectomy technique in curimata, Prochilodus brevis developed in the Station of Fish farming of Paulo Afonso (SFFPA), of the San Francisco Hydro Electric Company (SFHC). Seeking better use of the fish hypophysectomized. They were hypophysectomized 53 91

specimens of curimatã sexually ripe. The fish were put in a contention gutter and with aid of mountain arch or a knife, traverse cut was given in the subsequent border of the occipital of the head of the fish. With metallic tweezers the encephalon was moved away discovering the saddle of the sphenoid where is the hypophysis. After retreat to the hypophysis, it is conditioned in container with absolute alcohol. The fish were eviscerates, flattened, salty being ready to the market. This new technique presents differential in relation to the previous technique, that it presented a complicated methodology, using apparels as scissors that hinders the accomplishment of the procedure and clue the fish with aesthetic presentation of difficult commercialization. That research lance the importance of that new hypophysectomized methodology in curimatãs Prochilodus brevis seeking better use of the fish to the market, contributing in that way with methodology of easy application. Key words: Fishes, Reproduction, Hypophyses INTRODUÇÃO A Aqüicultura tem como finalidade produzir alimentos de alto valor protéico de baixo custo e melhorar as condições sociais e econômicas da população, buscando criar novos nichos econômicos. Porém não se pode esquecer que essa produção para ser praticada de forma perene, deve estar sustentada em três pilares: 1) prudência ecológica; 2) viabilidade econômica e 3) eqüidade social (VINATEA, 1999). Dessa forma a produção estará atendendo a todos os requisitos da sustentabilidade. Na América Latina, a Aqüicultura recebeu maior atenção quando entraram em funcionamento diversas estações experimentais de piscicultura. Na Venezuela, essa atividade teve início em 1937, destacando-se na aqüicultura daquele país uma espécie de salmonideo de água doce, embora houvesse alternativas tecnológicas, inclusive de várias espécies nativas (SALAYA et al. 1980). No Brasil, apesar dos 8.400 quilômetros de costa e de extensas bacias hidrográficas (só a Amazônia detém 18% da água doce do planeta), o consumo anual de pescado é de apenas 5,8 kg percapita, contra 16 kg no Canadá e 65 kg no Japão. Enquanto em Manaus o consumo de pescado atinge o expressivo número de 50 kg/habitante/ano, há regiões no interior do país onde o consumo percapita está abaixo de um kg/ano. O hábito alimentar está diretamente relacionado à oferta do produto (Pesca Brasil, 2004). A pesca predatória está reduzindo drasticamente os estoques pesqueiros de ambientes naturais, sejam eles mares ou rios. As frotas pesqueiras dotadas de sofisticados equipamentos para detecção de cardumes facilitam a pesca, porém, torna as populações de peixes cada vez mais vulneráveis. Segundo a Organização das Nações Unidas ONU, será necessário cerca de 120 milhões de toneladas de pescado por ano, um acréscimo de 30 milhões do que é produzido atualmente. Os técnicos garantem 92

que a única forma de fazer frente a esse desafio é através da aqüicultura, que se trata da criação racional de animais e vegetais aquáticos. Assim, a reprodução é a atividade biológica mais vital para a preservação das espécies animais e vegetais. Sendo a reprodução no ambiente natural determinada pela idade de maturação sexual, condições ambientais e matrizes de muitas espécies. No Nordeste brasileiro, os peixes de desova total, normalmente, podem ser usados como doadores de hipófises a partir do mês de novembro de cada ano até a realização da reprodução em natureza (FONTENELE, 1981). Uma boa parte das espécies de água doce que se destacam quanto ao seu porte e conseqüentemente ao seu valor comercial são espécies que precisam realizar migrações no período reprodutivo, a fim de promover a maturação final das gônadas. O período de cheias, o aumento do fotoperíodo, a quantidade de íons dissolvidos na água (condutividade) e a temperatura da água são os fatores indutores da finalização desse processo. Conhecidos como reofílicos, os peixes que apresentam este comportamento somente liberam seus gametas mediante tais sinais indutores; caso contrário, a desova não ocorre mesmo que as gônadas já se encontrem desenvolvidas. Desta forma, a reprodução destas espécies em ambientes confinados somente é possível através de duas maneiras: simulação das condições naturais, como o aumento da temperatura e elevação do nível da água, ou via indução hormonal (VINATEA, 2004). Nos dias atuais é de fundamental importância o cultivo de peixes através da propagação em massa, artificial ou semi-artificial de alevinos das espécies cultiváveis. Por isto, é cada vez maior a importância atribuída à cultura de peixes, sendo necessário que criadores leigos aprimorem as técnicas para assegurar o bom êxito na cultura (WOYNAROVICH & HORVÁTH, 1993). Nos peixes, como em todos os animais, os fatores determinantes da reprodução estimulam uma glândula, conhecida por hipófise, existente na base do cérebro, que envia mensagens (hormônios) às gônadas (ovários em fêmeas e testículos em machos), para que se preparem e realizem a desova. Muitas espécies de peixes de água doce de importância econômica necessitam migrar rio acima para realizarem a reprodução, fenômeno este conhecido como piracema. É, justamente, essa viagem rio acima, esse esforço e os fatores ambientais que provocam os estímulos para a reprodução. A temperatura da água, enxurradas provocadas pela chuva e a ampliação da quantidade de horas de luz por dia (na primavera), induzem a hipófise a intensificar a produção de hormônios para provocar a reprodução de muitas espécies de peixes. A hipófise é, portanto, uma glândula que comanda todo o processo de reprodução. Com vistas a atender a demanda mundial, esta glândula está sendo industrializada e comercializada por muitos países, principalmente os Estados Unidos da América, Canadá, Hungria, 93

França, índia, China e Japão, mediante extração de peixes doadores como a carpa, o salmão, a truta e outros, que a exportam sob a forma de pó liofilizado, extrato glicerinado ou em unidades integrais dessecadas. O preço deste produto no mercado internacional é de UD$ 300,00/grama, muito superior ao do ouro, pelo que seria para o nosso país uma fonte de renda muito boa, se fosse desenvolvida esta indústria de produção, pois temos de sobra a matéria prima necessária, haja vista a riqueza de nossa ictiofauna (GURGEL, 2005). A hipofisação é uma técnica que tem dado bons resultados na maturação e extrusão das células reprodutoras de peixes adultos. O processo de coleta de hipófises, utilizado convencionalmente, não altera a qualidade do peixe. No entanto, como é feita através de cortes realizados na cabeça, provoca aspecto desagradável para comercialização. Por isso, é que essa pesquisa tem como objetivo desenvolver uma técnica de hipofisectomia em Prochilodus brevis, através da eficiência na coleta de hipófises para os trabalhos de propagação de alevinos e maior qualidade no beneficiamento e comercialização do peixe hipofisectomizado. MATERIAL E MÉTODOS LOCAL DE EXECUÇÃO O trabalho de pesquisa foi realizado na Estação de Piscicultura de Paulo Afonso (EPPA), pertencente à Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF), localizada próximo às usinas Apolônio Sales, PA I, II, III e IV. Apresenta uma área inundada de 3,8 hectares e é abastecida d água através do reservatório de Moxotó. Tendo como objetivo a propagação de alevinos nos reservatórios da CHESF (Moxotó, Itaparica, PA IV, Delmiro Gouveia) e lagos do acampamento de Paulo Afonso (Balneário, Touro e a Sucuri, SE III, Vila Militar, Cemitério e Capuchú). Também colabora com a região através da venda de alevinos para povoamentos de açudes e cultivo em viveiros e tanques-rede. O peixe utilizado neste trabalho pertence à família Prochilondontide da espécie Prochilodus brevis (antiga P. cearensis), conhecido vulgarmente na região nordeste do Brasil, como curimatãcomum (Figura 1). Todos eram adultos e estavam sexuadamente maduros. Figura 1. Exemplar de curimatã Prochilodus brevis 94

Em geral apresentam hábito alimentar iliófago, consumindo matéria orgânica depositada no fundo dos açudes e viveiros. Esta característica permite usá-las em policultivo, junto espécies que se alimentam de frutas, sementes e organismos aquáticos de pequeno porte, que são onívoras. Segundo Fontenele (1982), a curimatã ocupa lugar de destaque pela precocidade, prolificidade, regime alimentar e principalmente pela grande aceitação que tem merecido por parte dos habitantes da região nordeste. A curimatã exige para sua desova uma modificação de ambiente. Essa modificação é produzida pelas chuvas. O peixe prepara-se para desovar, se não houver águas novas não o faz, pois não consegue aquele conjunto de fatores necessários a maturação e promove a eliminação dos óvulos (FONTENELE, 1981). Daí, ser necessária a hipofisação para realização da desova em cativeiro. Para realização de desovas artificiais se faz necessário o uso de hipófises ou hormônios sintéticos. Para coleta de hipófises (hipofisectomia) é necessária a captura de curimatãs, peixe este utilizado principalmente pela facilidade com que é encontrado em açudes nordestinos. DOADORES DE HIPÓFISES Como as espécies de piracema necessitam realizar a migração para a reprodução, não atingem pleno desenvolvimento das gônadas quando se encontram permanentemente em águas paradas (lagoas, tanques, barragens etc.), é preciso que se estimulem fêmeas e machos, a completarem o estágio de maturação gonadal, para que consigam realizar a desova. Daí a importância da hipófise, como elemento imprescindível à obtenção da reprodução artificial. Injetando artificialmente a mesma quantidade de hormônio que a hipófise forneceria aos ovários e aos testículos, se estivessem em condições ambientais naturais, então, poder-se-á fazer, também, com que os peixes de piracema se reproduzam em águas paradas. Esta técnica, conhecida como hipofisação", foi desenvolvida pelo cientista brasileiro Rodolpho von Ihering, no tempo em que dirigiu a Comissão Técnica de Piscicultura do Nordeste, atual Diretoria de Pesca e Piscicultura do Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS). Este acontecimento, o mais notável do Século XX, no campo da biologia da pesca, foi apresentado no XV Congresso Internacional de Fisiologia, realizado em agosto de 1935 nas cidades de Leningrado e Moscou, da então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, a partir de quando o Método Ihering de Reprodução Induzida (MIRI), passou a ser adotado no mundo inteiro com êxito total na propagação de peixes (GURGEL, 2005). 95

A forma mais comum de se obter o hormônio a ser fornecido aos reprodutores e matrizes para a reprodução artificial, é retirando-o de outros peixes, que funcionam como doadores. Alguns peixes são cultivados com o objetivo principal de fornecerem suas hipófises para a reprodução de outros peixes. Cada peixe possui uma hipófise que, próxima à época de desova, apresenta certa quantidade de hormônio. Para realização de hipofisações com sucessos utiliza-se 5 mg de hipófise por Kg de peixe a ser hipofisado. Os hormônios gonadotróficos são produzidos pelo peixe sexualmente maduro e as mudanças cíclicas, da concentração da glândula pituitária, estão relacionadas com o ciclo reprodutivo do peixe. A sua concentração é máxima durante o período de pré-desova, e é neste momento que o peixe deve ser hipofisectomizado. No entanto, ela é muito baixa ou quase nula durante e pós desova. A liberação de gonadotropina pela glândula pituitária é comandada pelo hipotálamo, através da secreção do hormônio que libera a gonadotropina. A gonadotropina é também responsável pela indução da migração da desova, durante a qual sua concentração na glândula pituitária decresce gradualmente. O desenvolvimento gonadal durante a migração de desova provavelmente é controlada pela gonadotropina liberada continuamente. A glândula pituitária está situada do lado ventral do cérebro abaixo do hipotálamo, o qual está ligado à glândula pituitária por uma estrutura tipo funil, o infundíbulo. A parte do crânio onde a glândula pituitária se encontra é conhecida como sela túrcica do esfenóide. A glândula está normalmente envolvida por tecido adiposo. Quando o cérebro é retirado do crânio a glândula pituitária permanece ligada ao cérebro de alguns peixes, ao passo que na maioria deles, um infundíbulo se rompe e a glândula fica na base do crânio. Os doadores de hipófises para este trabalho apresentavam-se maduros sexualmente. Os machos apresentavam liberação fácil de sêmen e as fêmeas, ventres abaulados com papila genital hiperemiada. O período propício à coleta de hipófise é de novembro a fevereiro antes das chuvas. Pois ocorrendo inverno nesse período os peixes já aptos à desova podem realizar a piracema e assim não servem mais como doadores de hipófises, tendo que se esperar mais um ano para nova coleta. HIPOFISECTOMIA Depois de capturados os peixes; deve-se esperar que estes terminem de morrer para se dar início aos trabalhos de coleta de hipófise. No caso dos peixes utilizados neste trabalho, estes foram mortos através de choque térmico utilizando gelo na água. 96

PROCESSO TRADICIONAL A técnica de extração de hipófise (também conhecida por pituitária) de peixe resume-se na execução de uma craniectomia, nos peixes doadores, visando atingir a sela túrcica do esfenoide, localizada exatamente sob o encéfalo. Após a coleta, caso se deseje obtenção de desovas, a hipófise é macerada em soro fisiológico e, em seguida, aplicada por via intramuscular nos exemplares receptores, que estimulados pela gonadotropina - hormônio da reprodução - são induzidos à desova. No Nordeste brasileiro são utilizados, geralmente, como doadores de hipófises, exemplares de curimatã comum, capturados pelos pescadores em açudes públicos e particulares destinados a comercialização. No método de coleta utilizado tradicionalmente, usam-se os seguintes instrumentos: calha de contenção (Figura 2), constituída de duas peças de madeiras, que se engavetam, a maior, 0,30 x 0,20 m, que tem por finalidade manter o peixe imóvel na posição ventral. Figura 2. Calha para contenção dos peixes São utilizados: arco de serra, metálico, e respectiva serra de aço; cotóstomo, instrumento cirúrgico, metálico, niquelado, tipo tesoura; pinça cirúrgica, niquelada, pontas curvas, corrugadas; vidro para preservação da hipófise frasco boca larga, cor âmbar com rolha de vidro esmerilhada, com capacidade de 20 cc; álcool absoluto de boa qualidade (90º ) e algodão hidrófilo. Contudo, antes da operação se verifica se o peixe preenche as condições para ser doador (fresco e com desenvolvimento gonadal independente do sexo). Imobiliza-se o doador na calha de contenção, e, com o auxilio do arco de serra, dar um corte transversal na cabeça, no bordo posterior do occipital (pouco atrás das órbitas) sem separar a cabeça do peixe e depois com auxílio com cotóstomo retirava-se o tampão da cabeça para posterior coleta da hipófise (Figura 3). 97

Figura 3. Utilização do cotóstomo para retirada da hipófise Com auxílio do cotóstomo retirasse uma seção triangular do occipital, com base, na borda anterior do corte de serra; utilizando a pinça, afastar o encéfalo, descobrindo a sela túrcica do esfenóide dentro da qual se encontre a hipófise, protegida por uma membrana. Na eventualidade de peixe possuir bastante substância adiposa ou sangue, usar pelota de algodão, na ponta da pinça, para absorver o excesso de material existente no local ocupado pelo encéfalo e finalmente, romper a membrana, extrair a glândula da sela túrcica e introduzi-la no frasco de vidro contendo álcool absoluto. PROCESSO INOVADOR A nova metodologia utilizada segue o mesmo princípio da técnica tradicional. Depois da hipofisectomia o peixe é eviscerado, espalmado e salgado. O que diferencia estes processos é que neste, o peixe pode ser ou não imobilizado numa calha de contenção e isto vai depender do tamanho do exemplar. Quando grande, a exemplo de curimatã pacu Prochilodus argenteus, utiliza-se a calha de contenção e com o auxílio de um arco de serra, será dado um corte transversal na cabeça, no bordo posterior do occipital, sem separar a cabeça do peixe. Se de pequeno porte, a exemplo de P. brevis, utiliza-se a calha apenas como suporte de apoio sem necessitar de contenção e com auxílio de uma faca efetua-se os procedimentos de craniectomia. Desta forma, é possível expor a hipófise, com o auxílio de uma pinça cirúrgica de pontas curvas, com a qual se afasta o encéfalo, para descoberta da sela túrcica e retira-se a hipófise. O uso de uma pequena pelota de algodão é necessário, na ponta da pinça, para absorver o excesso de gordura e/ou sangue existente no local ocupado pelo encéfalo. A hipófise depois de extraída pode ser fixada em álcool absoluto ou tratada com acetona. 98

BENEFICIAMENTO Depois de retirada a hipófise, o peixe hipofisectomizado deverá ser espalmado tendo suas vísceras retiradas através da abertura na região dorsal para em seguida ser beneficiado. O tipo de sal usado foi o sal misturado (partes iguais de sal moído fino e de sal grosso). A salmoura exudada não deve atingir meia altura das camadas de peixe. Este processo foi realizado a sombra e a temperatura ambiente. Pelo fato da curimatã ter proteína média e ter gordura alta, recomenda-se salga por salmoura. O tempo de exposição à salga foi de 8 horas quando então os peixes foram lavados para retirada do excesso de sal e depois expostos ao sol para secagem. RESULTADOS E DISCUSSÃO HIPOFISECTOMIA O corte das narinas ao final do pescoço do peixe (processo inovador) (Figura 4), utilizando uma pequena faca tornou o processo mais ágil, devido a facilidade da coleta e a não utilização de procedimentos que só inviabilizavam o peixe para comércio, pois quase sempre deixava a cabeça do peixe estragada o que dificultava a retirada da hipófise. Figura 4. Descoberta do cérebro para retirada da hipófise Depois de extraídas as hipófises foram fixadas em álcool absoluto, sendo guardadas em vidro de cor âmbar. O corte com arco de serra e depois cotóstomo (processo tradicional) tomava maior tempo para realização da técnica de coleta de hipófises em função da utilização de mais um aparelho (no caso o cotóstomo) como pela dificuldade de coleta em função do corte realizado que além da danificação da cabeça do peixe o que influência na comercialização do pescado hipofisectomizado. 99

BENEFICIAMENTO O peixe hipofisectomizado pela nova metodologia apresentou melhor aspecto para comercialização, pois o corte dado rente ao crânio permitiu que a cabeça dos exemplares permanecesse fixa ao corpo. Também o tipo de corte não deixa ser percebida a craniectomia quando o peixe é espalmado para salga deixando com bom aspecto para comercialização (Figura 5). Figura 5. Peixe pronto para comercialização A certeza de qualidade dos alimentos está ligada não somente a quantidade energética mais também ao valor nutritivo, em particular de proteína animal. O habitante do mundo desenvolvido consome 100 kg de carne de peixe e o equivalente a 178 kg de leite por ano, enquanto que no mundo subdesenvolvido 29 e 31 kg respectivamente (BECKER & FOCKER, 1998). Pelo decreto nº. 1.255, de 25.06.1942 (Artigo 465, único), regulamentado pelo DIPOA, o pescado salgado e seco não deve ter mais de 35% de umidade. Freitas & Gurgel (1971), afirmam que o nordestino prefere peixe com teores de umidade entre 40 e 45% e consideram que a relação sal em base úmida/umidade é ideal quando apresenta valores superiores a 0,3%. Numa salmoura saturada (a 26%) o valor desta relação é 26 (100 26) = 0,35. Diante dos espécimes de Prochilodus brevis, utilizados nessa pesquisa, pode-se observar a diferença em relação ao aspecto externo do peixe hipofisectomizado com a técnica tradicional comparada a nova metodologia de hipofisectomia. Essa pesquisa lança uma inovação na metodologia de hipofisectomia em curimatãs Prochilodus brevis, contribuindo dessa forma com uma metodologia de fácil aplicação, de maior agilidade no processo de coleta de hipófises e tornando o peixe hipofisectomizado com potencial de ser aproveitado comercialmente pelos pescadores. 100

REFERÊNCIAS FONTENELE, O., 1982, Contribuição para o conhecimento da biologia da Curimatã pacu, Prochilodus argenteus Spix in Spix & Agassiz (Pisces: Characidae, Prochilodontinae). Coletânea de Trabalhos Técnicos. Pesca e Piscicultura. Ministério do Interior. DNOCS. p. 215-231. FONTENELE, O., 1981, Curimatã nos açudes nordestinos (Prochilodus argenteus). Coletânea de Trabalhos Técnicos. Pesca e Piscicultura. Ministério do Interior. DNOCS. p. 227 284. FONTENELE, O., 1981, Metodologia de hipofisação de peixes, adotado pelo DNOCS, Fortaleza. GURGEL, J.J.S., 2005, Histórias de Pescador. Coleção Academia Cearense de Farmácia (ACF) n. 2. Fortaleza Ceará. 72p. GURGEL, J.J.S., FREITAS, J.V., 1971, Boletim Técnico de DNOCS, Fortaleza, v.29, n.1. PESCA BRASIL. Aqüicultura: O milagre da multiplicação dos peixes. Disponível em: www.pescabrasil.com.br/aquicultura.asp. Acesso: 18 de fevereiro de 2004, as 22:00h. SALAYA, J.J.; MARTINEZ, M.; ESPINOSA, V. DE; CARVAJAL, J., 1980, Investigaciones y aspectos tecnológicos de la acuicultura em Venezuela.Ver. Lat. Acui. Lima (4): 14-27. VINATEA, L.A., 2004, Fundamentos de Aqüicultura. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis: Ed. da UFSC. VINATEA, L.A.,1999, Aqüicultura e desenvolvimento sustentável: subsídios para a formulação de políticas de desenvolvimento da aqüicultura brasileira. Florianópolis: Ed. da UFSC. 310p. WOYNAROVICH, E.; HORVÁTH, L., 1983, A Propagação artificial de peixes de águas tropicais: manual de extensão.brasília: FAO/CODEVASF/CNPq, 225 p. 101