Naum, Naum. o Orelha! Chamavam-no assim por causa -das orelhas grandes é volta r das para a frenteg Cabelos lisos- e colados ao craneo, mansos olhos castanhos, baixinho e robusto. Naum, o OrelhaJ Conta-me alguma coisa de tua infancia, Naum" que vou te contar, poderias chamar o episcidio das bicicletas. Durante um bom pedaço de minha vida, estive sob o signo de bicicletas. Quase todos os gurís de minha rua tinham a sua. Faziam acrobacias, apostavam corrida na praça. Eu era o juiz. Gritava4 Jal e largavam a toda. As rodas rangiam no areião, o vento lhes entrava pela bf5 sca e pelo nariz. De pe sobre os pedais o corpo subindo e descendo no esfargo, i iam e'les, sob meu olhar invejoso... Ninguém entendia mais de bicicletas do que eu; sabia a marca de todas, sabia desmontar um torpedo, em monta-lo em seguida. E eu não tinha bicicleta. Sofria muito. Que minha 114e ( pai? Morreu de cancer quando eu era pequenino assim) fosse pobre e não pudesse me comprar um;, '\< IL Mas ela dizia: "Passa de ano t e eu te compro", e não comprava nada. E entao, eu tinha que me virar. Conquistava uma voltinha até a esquina; com selos, com vinte figurinhas ab- R pdnetrou em mim o espírito do come'r io... t-7,9 :1-1Cib2.8_ de _garrafa. Assim Uma vez, um sujeitinho muito besta me pediu duas balas café com leite, e depois nc'}c to quis me deixar andar em sua bicicleta. Como batí né'lei Chorava e berrava4- "Vais ver judeu desgraçado, covarde / 1 4; - Eu agarrei a bicicleta e andei, andei até cansar. E assim penetrou em mim o espirito da rev1ta.n A rua das lojinhas X Cada bairro da cidade era cortado p - uma larga avenida - e nelas ficavam os estabelecimentos comerciais judaicos. Nos birros chiques, modas e j5ias; nos bairros médios, credirios de m6veis; nos birros pobres, roupas usadas e quinquilharias. No Caminho do Meio ela se comprimiam uma ao l!do da outra: "A Preferível "Alfaiataria Favorita", "Casa Azul" e outras e cltras.., No fim da rua, ficava a estação da estr a d( ferro; e pelas calçadas fluía constantemente a massa humana cheg Andavam devagar, carregando mala lhos. 2L Pelps rells do interior. asgadas de papelão, trouxas, enbru
-Os homens usavam grandes chap éus, camisas doloridas e botas empoeiradas. Seu olhar mortiço errava de um an -Cindio para outro. As crianças com o rosto sujo de ranho e pó*, arrastavam-se atrás, das mães Para trás, ficara um pedacinho de terra, cabana, enxada, animais. Diante A deles, estava a eídade pronta a enguli-los. E no caminho ficava a rua das lojinhas. Com o minguado dinheiro que tinham no bolso, era preciso comprar roupas para se tornarem mais apresentvois sapatos, remkiosz, Compra! -diziam os manequins, sorrindo idiotamente. Compra! - diziam os letreiros pintados nas ppredes desbotadas. Compra! Preços Reduzidos - Vejam o Nosso Sortimento. Artigos par-,- Cavalheiros Pilhas de calças de brim azul e zuarte; sapatos com sola de pneu e alpar gatas capas p ásticas; lenços de cores berrantes; perfume barato; jias de imitação; bonecos de celuloide, chaveiros despertadores relcigios pentes... Um cartaz, em grosseiras letras vermelhas anunciava: Aproveitem! Grande Liquidagg.o,! fistes eram os primeiros degraus na escada _ da prosperida Lá em ojr, estavam os grandes magazines, os palacetes, os t rulos. Mas aqui em baixo, sujeira e fumaça cortadas pelos apitos dos trens e pelos gritos dos camelos. Naum,. o Orelha, trabalha. No fundo da 14inha estava o proprietário, senhor Ardo. Era um homem baixinho e gordo. Usava um colete de 1L-t, todo manchado de gordura, porque estava sempre resfriado. Naum fica parado a porta. Chama os fregueses:- É aqui mesmo, amigo! Pode entrar e escolher á vontade. Sem compromisso! Mede a mulata que passa, com olhos cobiçosos. Cumprimenta um amigo que passa:- Fala, Jaime! Passeando, hein? Faz como eu, vai trabalhar, vagabundo! A Entra um fregues.-- Boa terde... Boa tarde. o senhor queria alguma coisa? Eu queria ver uma camisa boa... Ah, sim, um momentinho s(5. Traz as ^ ". # camisas., espalha-as sobre o balda. Este e um artigo muito bom, de muita é- salaa. Depois é um pano formidavel, pode lavar a vontade que n.o estraga, Qual é" o preço desta aqui? Esta é duzentos. Mas. é preço de estoque antigo. Vai subir para trezen tos, a fábrica já avisou.
Naum, Nami o Orelha: Chamavam-no assim por causa das orelhas grandes e voltadas para a fronte* Cabelos lisos e colados ao erkeo os olhos castanhos baixinho e robusto* Naum o Orelha' Conta-me alguma coisa de tua infancia, Naum* II0 q12.e vou te contar, poderias chamar - o epis4dio das bicicletas* Du rante um bom pedaço de minha vida estive sob o signo de bicicletas* Quase todos os guris de minha rua tinh a sua* Faziam acrobacias, apostavam cor rida na praça* Eu era o juiz* Gritavas 4311 e âllors largavam tda. rang am no areiao o vento lhes entrava pela bc;ca e pelo nariz. De sêtbre os pedais o corpo subindo e descendo no esforço, IS. iam eles, sob meu olhar invejoso... Ninguém entendia ma de bicicletas do que eu; sabia a marca de tc;das, sabia desmontar um torpedo ex mont'l.lo em seguida. E eu não tinha bicicleta* S'ofria muito* Que minha me ( p? Morreu de quando eu era pequenino assim) fosse pobre nao pudesse me comprar lá.* Mas ela dizia: "Passa de ano, e eu te ompro" e não comprava nada. E então eu tinha que me v_rar* Conquistava uma voltinha até' a esquina; com saos, com vinte figurinhas de Red Boy, com tampinhas de garrafa* Assim Pdnetrou em mim o espfi'ito do com4rcio* ta vez, um suj eitinho muito besta me pediu duas balas cafécom leite, e depois não quis me deixar andar em sua bicicleta* Como bad n;le: Chorava e berrava4 "Vais ver judeu desgraçado covarde:" Eu agarre/ a bicicleta e andei, andei at cansar. sim penetrou em mim o esr&ito da revolta. A rua das lojinhas X Cada bairro da cidade era cortado por uma larga avenida - e nelas ficavam os estabelecimentos comerciais judaicos. Nos bairros chiques, modas e jias; nos bairros médios t credia:rios de moveis; nos bairros pobres, roupas usadas e quinquilharias. As rodas No Caminho do Meio ela se comprimiam uma ao lado da outra: "A "Alfaiataria Favorita", "Casa Azul" e outras, e outras*** No fim da rua, ficava a estação da estrada de ferro; e fluia constantemente a massa humana chegada pelos trens do Andavam devagar, carregando malas rasgadas de papelão lhos* pelas cal interior* trouxas, ada mbru
Os homens usavam grandes chapéus, camisas coloridas e botas empoeiradas. Seu olhar mortiço errava de um anlincio para outro. As crianças, com o rosto sujo de ranho e pó., arrastavam-se atrás das máes. Para tr4s, ficara um pedacinho de terra, cabana, enxada, animais. Diante deles, estava a cidade pronta a engulmos. E no caminho ficava a rua das lojinhas. Com o minguado dinheiro que tinham no 1361 o era preciso comprar roupas para se tornarem mais apresentáveis, sapatos, rem dios4 Compra! -diziam os manequins, sorrindo idiotamente. Compras - diziam os letreiros pintados nas»redes desbotadas. Compra! Artigos para Cavalheiros Preços Reduzidos - Vejam o Nosso Sortimento. Pilhas de calças de brim azul e zuarte; sapatos com sola de pneu e alpar gatas; capas plgsticas, lenços de cores berrantes; perfume barato; jkas de imitaçáo; bonecos de celulude; chaveiros despertadores rel(sgios pentes.., Um cartaz, em grosseiras letras vermelhas anunciava: Aproveitem! Grande uídaçao4 estes eram os primeiros degraus na escada da prosperidade. Lá* em cima, estavam os grandes magazines, os palacetes, os tirulos. Mas aqui em baixo, sujeira e fumaça cortadas pelos apitos dos trens e pelos gritos dos camelos, Naum, o Orelha, trabalha. No fundo da l4inha estava o proprietèrio senhor Arão. Era um homem baixinho e gordo. Usava um colete de lã, todo manchado de gordura, porque estava sempre resfriado. Naum fica parado a porta. Chama os fregueses:- É aqui mesmo, amigo! Pode entrar e escolher vontade. Sem compromisso! Mede a mulata que passa com olhos cobiçosos. Cumprimenta um amigo que passa:- Fala, Jaime! Passeando, hein? Faz como eu, vai trabalhar, vagabundo! Entra um fregu;s.- Boa tarde... Boa tarde. O senhor queria alguma coisa? Eu queria ver uma camisa boa... Ah, sim, um momentinho s6. Traz as camisas, espalha-as s abre o balcão. este: 4 um artigo muito bom, de muita sarda. Depois é um pano formidável, pode lavar vontade que não estraga. Qual è" o preço desta aqui? Esta é duzentos. Mas prego de estoque antigo. Vai subir para trezentos a ft!prica jg. avisou.
Retrato em Do3,was p.ilzukuu Na 4, Naum o Orelha: Chamavam-no assim por causa das orelhas grandes e volta- das para a frente. baixinho e robusto. Naum."0 que vou te Cabelos lisos e colados ao cráneo, mansos olhos castanhos, Naum, o Orelha: Conta-me alguma coisa de tua infancia, cantar, poderias chamar - o episc5dio das bicicletas. Du- rante um bom pedaço de minha vida, estive sob o signo de bicicletas. Quase todos os gurfs de minha rua tinham a sua. Faziam acrobacias, apostavam corrida na praça. Eu era o juiz. Gritavas.74.1 e iiams_ largavam 4:P 1 t6"da. As rodas rangiam no areio, o vento lhes entrava pela baca e pelo nariz. De pé sabre os pedais, o corpo subindo e descendo no esfy;rgo, 14 iam &les, sob meu olhar invejoso... Ninguém entendia mais de bicicletas do que eu; sabia a marca de tédas, sabia desmontar um torpedo, ex mont-lo em seguida. E eu não tinha bicicleta. Sofria muito. Que minha 4e ( pai? Morreu de c'á'neer quando eu era pequenino assim) fosse pobre e não pudesse me comprar umas ar4 14. Mas ela dizia: "Passa de ano, e eu te compro", e não comprava nada,;. E então eu tinha que me virar. Conquistava uma voltinha ate' a esqui com selos, com vinte figurinhas de Red Boy, com tampinhas de garraf;a.:asoáz pdnetrou em mim o esldrito do com4rcio... -7 7 UMa vez, um sujeltinho muito besta me pediu duas balas eaf6 e :noite, e depois não quis me deixar andar em sua bicicleta. Como bati -ele! Chorava e. berravas "Vais ver judeu desgraçado, covarde:" - Eu arrei a bicicleta e andei andei at4 cansar. E assim penetrou em mim o espirito da A rua_das lo A: Cada bairro da cidade era corado por uma larga avenida - os estabelecimentos comerciai judaicos. Nos bairros chiques, nos bairros m dios, credl4rios, de moveis; nos bairros pobres quinquilharias. No Caminho do Meio,ola se comprimiam uma ao lado da outra: "Alfaiataria Favorita", "Casa Azul" e outras, e outras... VQ e nelas ficavam modas e j6ias; roupas usadas e TIA e crível No fim da r ficava a estação da estrada de ferro; e pelas calçadas, fluia constantemente a massa humana chegada pelos trens do interior. Andavam devagar, carregando malas rasgadas de papelão, trouxas, embrulhos. X
Os homens usavam grandes chapas, camisas coloridas e botas empoeiradas. Seu olhar mortiço errava de um anlincio para outro. As crianças, com o rosto sujo de ranho e p$5, arrastavam-se atr4s das mães. Para trtis, ficara um pedacinho de terra, cabana, enxada, animais. Diante deles, estava a cidade pronta a engulf-los. E no caminho ficava a rua das lojinhas. Com o minguado dinheiro que tinham no bôlso, era preciso comprar roupas para se tornarem mais apresentveis, sapatos, r-m4dios4 Compra! -diziam os manequins, sorrindo idiotamente* Comprai diziam os letreiros pintados nas»redes desbotadas. Compra! Artigos p' a Cavalheiros Preços Reduzidos Vejam o Nosso Sortimento* Pilhas de calças de brim azul e zuarte; sapatos com sola de pneu e alpargatas; capas plésticas; lenços de cores berrantes; perfume barato; j6las de imitação; bonecos de celuietide; chaveiros despertadores rel6gios pentes Um cartaz, am, Tosseiras letras vermelhas anunciava: Aproveitem! Grande Liquidação! &tos eram os primeiros degraus na escada da prosperidade. 1,6 em cima estavam os grandes magazines, os palacetes, os drulos. Mas aqui em baixo, sujeira e fumaça cortadas pelos apitos dos trens pelos gritos dos tunei s. Naum o Orelha, trabalha. No fundo da lo4inha estava o proprietério senhor Arão. Era um homem baixi nho e gordo* Usava um colete de l, todo manchado de gordura, porque estava sempre resfriado. Naum fica parado 'á porta. Chama os fregueses: É aqui mesmo, amigo! Pode entrar e escolher ;;. vontade. Sem compromisso! Mede a mulata que passa, com olhos cobiçosos. Cumprimenta um amigo que passa:- Fala Jaime, Passeando bein? Faz como ou, vai t balhar vagabundo! Entra um fregu;s.- Boa tarde. ** Boa tarde. O senhor queria alguma coisa? Eu queria ver uma camisa boa*** Ah, sim um momentinho sei. Traz as camisas, esp lha as sobre o balcão*,bste '4 um artigo multo bom, de muita sarda. Depois é' um pano formidgvel, pode lavar a vontade que não estraga. Qual o prego desta aqui? Esta g duzentos. Mas 6 preço de estoque antigo. Vai subir para tr tos a fabrica jzç avisou.
Dom Jaime Spengler Chanceler Irmão Joaquim Clotet Reitor Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Irmão Evilázio Teixeira Vice-Reitor II DELFOS Espaço de Documentação dl e Memória Cultural Luiz Antonio de Assis Brasil Coordenador Geral Regina Kohlrausch Coordenadora Adjunta Ricardo Araujo Barberena Coordenador Executivo ORIENTAÇÕES PARA O USO DELFOS DIGITAL Esta é uma cópia digital de um documento (ou parte dele) que pertence a um dos acervos que participam do projeto DELFOS DIGITAL da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS. Trata-se de uma referência, a mais fiel possível, a um documento original. Neste sentido, procuramos manter a integridade e a autenticidade da fonte, não realizando alterações no ambiente digital com exceção de ajustes de cor, contraste e definição. Você apenas deve utilizar esta obra para fins não comerciais. Os documentos publicados no DELFOS Digital são publicados conforme a licença Creative Commons 3.0: Atribuição; Vedado o uso comercial; Vedada a Criação de Obras Derivadas. 3.0 Brasil: http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/br/ Atribuição. Quando utilizar este documento em outro contexto, você deve dar crédito ao autor (ou autores), ao DELFOS Digital e ao acervo original, da forma como aparece na ficha catalográfica (metadados) do repositório digital. Pedimos que você não republique este conteúdo na rede mundial de computadores (Internet) sem a nossa expressa autorização. Direitos do autor. No Brasil, os direitos do autor são regulados pela Lei n. 9.610, de 19 de Fevereiro de 1998. Os direitos do autor estão também respaldados na Convenção de Berna, de 1971. Sabemos das dificuldades existentes para a verificação se uma obra realmente encontra-se em domínio público. Neste sentido, se você acreditar que algum documento publicado no Delfos Digital esteja violando direitos autorais de tradução, versão, exibição, reprodução ou quaisquer outros, solicitamos que nos informe imediatamente (delfospucrs.br). PUCRS DELFOS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul Av. lpiranga, 6681 Prédio 16, 7 0 andar1partenon Porto Alegre/RS 1 CEP: 90619-9001 Fone: (51) 3353.8386