design ERGONÔMICO: uma revisão dos seus aspectos metodológicos Luis Carlos Paschoarelli José Carlos Plácido da Silva Resumo Abstract Palavras-chave



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design 1 Luis Carlos Paschoarelli José Carlos Plácido da Silva 2 ERGONÔMICO: Resumo O design ergonômico tem por princípio a aplicação do conhecimento ergonômico no projeto de dispositivos tecnológicos. Suas metodologias baseiam-se na compreensão e na predição da interação homem/tecnologia. Este estudo objetiva revisar as principais metodologias de design ergonômico, demonstrando similaridades e divergências. Foram analisadas quatro propostas metodológicas, sendo poucas aquelas que destacam a avaliação do produto, cujos procedimentos têm garantido a efetiva aplicação dos critérios de usabilidade na ação projetual. Uma nova proposta metodológica para o design ergonômico é apresentada. Palavras-chave Design ergonômico; metodologia; usabilidade. Abstract The principle of ergonomic design is the application of ergonomic knowledge to the technological devices project. These methodologies are based on the comprehension and prediction of the interaction between man and technology. The objective of this study is to review the principal ergonomic design methodologies, demonstrating their similarities and differences. Four methodological proposals have been analyzed, being some of those that emphasize the evaluation of the product, whose procedures have been assuring the effective application of design action usability criteria. A new proposal of the ergonomic design methodology is presented. Key words Ergonomic design; methodology; usability. 1 Laboratório de Ergonomia e Interfaces, Departamento de Desenho Industrial da Faac/Unesp; Professor- Assistente; Doutor em Engenharia de Produção (CCET/UFSCar). E-mail: lcpascho@faac.unesp.br 2 uma revisão dos seus aspectos metodológicos Laboratório de Ergonomia e Interfaces, Departamento de Desenho Industrial da Faac/Unesp; Professor-Titular; Doutor em Geografia (FFLCH/USP). E-mail: plácido@faac.unesp.br

200 INTRODUÇÃO Neste início de século XXI, o desenvolvimento de projetos de produto tem procurado considerar, com maior intensidade, os aspectos de usabilidade, desempenho e segurança dos produtos, uma vez que os mercados apresentam-se cada vez mais competitivos, as exigências normativas tornam-se cada vez mais rigorosas, e as inovações tecnológicas são cada vez mais, freqüentes e distribuídas na sociedade de consumo. Dentro dessa nova condição produtiva, apresenta-se o denominado design ergonômico, que pode ser caracterizado por um segmento do desenvolvimento do projeto do produto, cujo princípio é a aplicação do conhecimento ergonômico no projeto de dispositivos tecnológicos, com o objetivo de alcançar produtos e sistemas seguros, confortáveis, eficientes, efetivos e aceitáveis. (PASCHOARELLI, 2003). Seus princípios baseiam-se na inter-relação entre usabilidade, ergonomia e design; entretanto, são os seus procedimentos metodológicos os aspectos que mais se destacam, uma vez que são desenvolvidos para melhorar o desenvolvimento de produtos através da compreensão da interação entre todos os aspectos humanos e os mais variados e distintos dispositivos tecnológicos. O objetivo deste estudo é revisar as principais metodologias de design ergonômico, a fim de demonstrar as similaridades e divergências entre elas, bem como as alternativas de aplicação no desenvolvimento do projeto do produto, apresentando, ao fim, uma nova proposta metodológica para a sua aplicação. O conceito de usabilidade ainda não apresenta uma definição consensual na comunidade acadêmica. Para Moraes (2001) alguns sugerem que usabilidade é simplesmente uma tentativa de introduzir user friendliness de novo no jargão do projeto de produtos. Outros colocam que as questões em torno da usabilidade já foram tratadas no usercentred-design. (p. 13). De qualquer maneira, vários pesquisadores têm apresentado suas definições e compreensões sobre usabilidade. Para Jordan (1998), essa área do conhecimento destacou-se inicialmente nas décadas de 70 e 80, entre os ergonomistas que projetavam computadores e sistemas. Atualmente, a usabilidade não é uma exclusividade da informática, uma vez que foi verificada a importância de sua aplicação em outros setores tecnológicos, com especial atenção ao desenvolvimento do projeto do produto. Nesse sentido, procurando apresentar um conceito mais amplo, a International Organization for Standadization (ISO) define usabilidade como a eficácia, eficiência e satisfação com que usuários específicos podem alcançar objetivos específicos em ambientes particulares. (ISO DIS 9241-11 apud JORDAN, 1998, p. 25). Stanton e Barber (1996), ao delimitar o conceito de usabilidade e definir seu escopo, sugerem o atendimento aos seguintes fatores: facilidade na aprendizagem do uso; efetividade no desempenho; custos humanos aceitáveis (fadiga, estresse, desconforto); flexibilidade nas tarefas; utilidade percebida do produto; adequação às tarefas; atendimento às caracterizações das tarefas; atendimento às caracterizações dos usuários. Segundo Moraes (2001), a usabilidade, enquanto conceito, trata da adequação entre o produto e as tarefas [...] cujo desempenho [...] se destina, da adequação com os usuários que o utilizará, e da adequação ao contexto em que será usado. (p. 15). Afirma ainda que tradicionalmente, a preocupação com a usabilidade só ocorre no final do ciclo do design, durante a avaliação do produto já finalizado. Resulta que poucas modificações são implementadas e, se algumas realmente substitutivas o são, implicam em custos elevados. Assim, desde o início da atividade projetual, a consideração com a usabilidade deve estar presente. (p. 15). Portanto, pode-se compreender usabilidade pela maximização da funcionalidade de um produto na interface com seu usuário. ERGONOMIA A ergonomia apresenta como objetivo a adequação de processos e produtos tecnológicos aos limites, à capacidade e aos anseios humanos. Devido ao seu caráter trans e multidisciplinar, o conceito de ergonomia também não apresenta um consenso, principalmente quando se adotam diferentes enfoques. 201

202 Hendrick (1993) propõe um conceito particular para ergonomia, pois afirma que É importante destacar que o estudo aqui apresentado segue uma linha de conhecimentos da ergonomia física que, associada à usabilidade e ao design, caracteriza um paradigma quantitativo. 203 a única e específica tecnologia da ergonomia é a tecnologia da interface homem sistema. A ergonomia como ciência trata de desenvolver conhecimentos sobre as capacidades, limites e outras características do desempenho humano e que se relacionam com o projeto de interfaces, entre indivíduos e outros componentes do sistema. Como prática, a ergonomia compreende a aplicação da tecnologia na interface homemsistema, aos projetos ou modificações de sistemas, para aumentar a segurança, conforto e eficiência do sistema e da qualidade de vida. (p. 43). O conselho da The International Ergonomics Association (IEA), após ampla discussão entre suas associações afiliadas, adotou, em agosto de 2000, uma definição oficial segundo a qual Ergonomia (ou Fatores Humanos) é uma disciplina científica preocupada com a interação entre os seres humanos e outros elementos de um sistema, e sua aplicação se dá através de teorias, princípios, dados e métodos de projeto com o objetivo de otimizar o desempenho do ser humano e de todo o sistema. Os ergonomistas contribuem no projeto e na avaliação das tarefas, profissões, trabalho, produtos, ambientes e sistemas, a fim de torná-los compatíveis com as necessidades, as habilidades e as limitações das pessoas. (IEA, 2006). A IEA destaca, ainda, que existem algumas especializações dentro da ergonomia, a saber: ergonomia física preocupada com os aspectos físicos da relação homemsistema, incluindo: anatomia, antropometria, fisiologia, biomecânica, posturas funcionais, manipulação de materiais, movimentos repetitivos, doenças profissionais, postos de trabalho, segurança e saúde musculoesquelética; ergonomia cognitiva preocupada com os processos mentais, tais como: a percepção, a memória, o raciocínio; ergonomia organizacional preocupada com a otimização dos sistemas sociotecnológicos, incluindo suas estruturas organizacionais, de políticas e de processos. DESIGN Conforme o que ocorre com usabilidade e ergonomia, o design também não tem uma definição que apresente um consenso no meio acadêmico. Apesar disso, entre as proposições de muitos estudiosos da área, percebe-se que o design é uma área de conhecimento correlato ao desenvolvimento do projeto do produto, cujos princípios apóiam-se no atendimento às exigências e às expectativas do homem (produtor, consumidor, usuário e expectador), em sua concepção produtiva. Talvez um dos melhores conceitos, para compreender design, seja o apresentado por Löbach (2001), o qual pode ser entendido como toda atividade que tende a transformar em produto industrial passível de fabricação, as idéias para a satisfação de determinadas necessidades de um indivíduo ou grupo. (p. 17), ou seja, é um processo de adaptação dos produtos de uso, fabricados industrialmente, às necessidades físicas e psíquicas dos usuários ou grupo de usuários. (p. 21). Tais necessidades têm origem em alguma carência e ditam o comportamento humano visando à eliminação dos estados não desejados. [...] Quando as necessidades são satisfeitas, o homem sente prazer, bem-estar, relaxamento. (p. 26). Entretanto, o alcance dessa satisfação exige que ele modifique a natureza, utilizando sua inteligência para idealizar objetos que ampliem suas capacidades e limitações. A produção desses objetos se dá por processos industriais, nos quais se encontra a participação ativa do designer. Por fim, Löbach afirma: Na sociedade industrial altamente desenvolvida, o objetivo de quase toda atividade é a elevação do crescimento econômico e do nível de vida. Aí a satisfação de necessidades e aspirações tem um papel substancial, motivando a criação e o aperfeiçoamento de objetos. O processo se inicia com a pesquisa de necessidades e aspirações, a partir das quais se desenvolverão as idéias para sua satisfação, em forma de produtos industriais (projeto de produtos). É na transformação dessas idéias em produtos de uso (desenvolvimento de produtos) que o designer industrial participa ativamente. (2001, p. 29).

204 Frisoni e Moraes (2001) lembram que a atividade do design será enriquecida se o projetista não se limitar à configuração dos objetos, segundo parâmetros estéticos, funcionais e de materiais e processos. Há que se ter em mente que é da responsabilidade do designer pensar a relação Homem Tarefa Máquina, zelando pelas questões de usabilidade, conforto e segurança. (p. 196). Outra importante característica do design está vinculada ao seu processo e denomina-se metodologia do projeto, surgida num momento em que se procurou sistematizar e tornar científico o desenvolvimento de produtos. Jones (1976), considerado um dos precursores da metodologia do projeto, apresentou na década de 70, 35 propostas metodológicas, constituindo uma reunião fundamental para a teoria e prática do design. Depois disso, muitos pesquisadores e designers desenvolveram e publicaram trabalhos sobre metodologia do projeto, como, por exemplo, Bonfim et al. (1977), Bonsiepe (1978), Quarante (1992). Uma das mais completas e atuais propostas de metodologia de desenvolvimento do projeto do produto é denominada Total Design (PUGH, 1996), caracterizada, dentre outros aspectos, pelo desenvolvimento de um produto, em que todas as variáveis do projeto são consideradas em todas as suas fases ou etapas do início ao fim. Esse procedimento tem garantido melhores resultados, tanto no desenvolvimento quanto no produto final. Entretanto, esse tipo de metodologia é aplicado principalmente em setores produtivos, em que uma extensa possibilidade de recursos apresenta-se disponibilizada para o desenvolvimento do projeto. Ao observar todas essas propostas de metodologia de projeto, deve-se considerar que a evolução tecnológica e os processos de relação entre homem e tecnologia foram se alterando ao longo do tempo e, conseqüentemente, novas necessidades metodológicas foram surgindo. Com base no proposto por Yap et al. (1983), pode-se afirmar que, enquanto produtos e outros dispositivos tecnológicos eram simples, seus desenhos podiam ser desenvolvidos por métodos puramente empíricos ou mais intuitivos. Do ponto de vista histórico, podemos encontrar essa condição desde meados do século XIX até, aproximadamente, as décadas de 60 e 70 do século XX. Com a evolução tecnológica e a complexidade dos sistemas e produtos, essa abordagem empírica tornou-se insuficiente, sendo necessária uma abordagem científica, baseada em considerações ergonômicas das capacidades e limitações do ser humano, aperfeiçoando e maximizando a segurança, a funcionalidade e a usabilidade dos produtos. METODOLOGIAS DE DESIGN ERGONÔMICO Considerado um segmento do design, o design ergonômico também apresenta algumas alternativas metodológicas. De acordo com Stanton e Young (1999), os métodos ergonômicos foram criados para melhorar o desenvolvimento do projeto do produto, através da compreensão e da predição da interação entre o homem e seus dispositivos tecnológicos. Esses pesquisadores apresentaram 12 ferramentas metodológicas, sendo algumas delas destinadas, particularmente, a determinadas fases do desenvolvimento do projeto do produto. Eles afirmam também que, dentre essas fases, as ferramentas metodológicas podem causar maior impacto nos estágios do desenvolvimento do projeto, mais particularmente durante a geração de protótipos analíticos, momento em que as diferentes alternativas podem ser comparadas ou avaliadas. Existem algumas metodologias de design ergonômico que podem ser consideradas mais completas, pois não são simples ferramentas complementares no desenvolvimento do produto, mas apresentam uma estrutura metodológica própria e com enfoque ergonômico mais preciso e fundamentado. 205

206 Existem algumas metodologias de design ergonômico que podem ser consideradas mais completas, pois não são simples ferramentas complementares no desenvolvimento do produto, mas apresentam uma estrutura metodológica própria e com enfoque ergonômico mais preciso e fundamentado. Um primeiro exemplo é demonstrado pelo Ergonomi Design Gruppen (1997), da Suécia, que propõe uma seqüência de seis etapas metodológicas (figura 1). Figura 1: Seqüência metodológica para o design ergonômico Fonte: Ergonomi Design Gruppen (1997). Outra proposta desse gênero foi desenvolvida pelo Product Safety and Testing Group, da Universidade de Nottingham (Nottingham, UK), a qual é denominada metodologia de produtos ergonômicos/seguros. (NORRIS; WILSON, 1997). Nesse sentido, são apresentadas várias possibilidades de aplicação das recomendações ergonômicas no processo clássico de desenvolvimento de um produto (metodologia do projeto) e nos vários estágios em que isso pode ocorrer (figura 2). Figura 2: Diagrama indicando onde as considerações do design ergonômico são aplicadas num processo típico de desenvolvimento de produto Fonte: Adaptado de Norris e Wilson (1997). 207

208 Sandvik (1997) apresenta um programa científico para o desenvolvimento de instrumentos manuais, cujo objetivo destaca a implementação de critérios ergonômicos no projeto desses equipamentos. Esse programa é caracterizado por 11 etapas (figura 3). No Brasil, Frisoni e Moraes (2001) apresentam 14 etapas para o desenvolvimento do projeto do produto ergonômico, que se caracteriza por destacar aquelas subetapas, que têm na ergonomia sua prioridade (figura 4). 209 Figura 3: Seqüência metodológica para o design ergonômico Fonte: Sandvik (1997). Figura 4: Seqüência de etapas metodológicas para o projeto de produtos, com destaque para os aspectos ergonômicos (em fundo cinza) Fonte: Baseado em Frisoni e Moraes (2001).

210 DISCUSSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS alternar desenvolvimento e criatividade, com avaliação sistematizada de produtos e sistemas, utilizando-se, para isso, de mock-ups e/ou protótipos físicos. 211 Ao observar as metodologias de design ergonômico, nota-se que elas apresentam, como principais características, a análise ergonômica da atividade como foco da problematização, e a determinação de critérios ergonômicos e de usabilidade como diretrizes para o desenvolvimento do produto. Os aspectos relacionados à avaliação e à análise do produto são citados, porém apresentam-se pouco explorados e/ou discutidos. Enquanto Norris e Wilson (1997) e Frisoni e Moraes (2001) propõem avaliações ergonômicas, e o Ergonomi Design Gruppen (1997) propõe testes com modelos funcionais, apenas a metodologia apresentada pela Sandvik destaca os denominados testes de usabilidade durante o processo de desenvolvimento do produto, quando apresenta alguns equipamentos de avaliação, mas não detalha como poderiam ser empregados. Se analisarmos com atenção, é certo que não poderemos desconsiderar a importância de pesquisas com os usuários diretos, as quais permitem determinar critérios projetuais integralizados, contribuindo, expressivamente, para a operacionalização do projeto, justamente no momento de aprimoramento e validação das soluções focadas na usabilidade, garantindo esse princípio já nas fases iniciais do projeto. Entretanto, o desenvolvimento de procedimentos metodológicos de avaliação e análise do produto também contribuem, de forma expressiva, à aplicação do design ergonômico, uma vez que é através desses procedimentos que se cria a oportunidade de avaliar, de modo satisfatório, a usabilidade do produto. O conhecimento apresentado por esta revisão possibilita afirmar que a simples aplicação de critérios ergonômicos e de usabilidade no desenvolvimento do projeto do produto não garante que o produto final aquele cujo usuário utiliza para desempenhar suas atividades apresente características de usabilidade. Portanto, as metodologias de design ergonômico devem: caracterizar-se por um processo trans e multidisciplinar; envolver, ao menos, os conhecimentos fisiológico, perceptivo e psicológico dos aspectos humanos na interface tecnológica; fundamentar-se em abordagens epidemiológicas ou laboratoriais para a detecção e avaliação dos problemas ergonômicos; Nesse sentido, uma alternativa metodológica para o design ergonômico é proposto (figura 5) considerando os aspectos destacados anteriormente. Figura 5: Proposta metodológica para o design ergonômico Observa-se, nessa proposta, que o início do projeto pode ocorrer através do interesse de investimento num determinado mercado, normalmente baseado em necessidade do usuário, ou então, de revisões de projetos e produtos desenvolvidos anteriormente, e que, na atual condição tecnológica, necessitam de redesenho. Na seqüência, todo o conhecimento (principalmente em torno da interface) é revisado, possibilitando não apenas agregar valores tecnológicos ao novo produto, mas principalmente, nesse caso, conhecer as variáveis ergonômicas e de usabilidade envolvidas no mesmo. O desenvolvimento do produto se dá com a definição do novo conceito de produto (auxiliado por variadas técnicas projetuais) até a obtenção de protótipos, que devem ser avaliados numa revisão projetual que, a partir do conhecimento científico, fará alterações e retornará ao processo de

212 desenvolvimento, até que condições de usabilidade sejam plenamente satisfatórias. A definição e a preparação para a produção são etapas que antecedem o processo produtivo, possibilitando a comercialização e o uso do produto, e, conseqüentemente, uma série de avaliações (agora em condições reais de uso), o que deve gerar novos conhecimentos, novas necessidades e novas possibilidades de redesenho do produto. As seis etapas principais (revisão, desenvolvimento, avaliação, preparação, produção e reavaliação final) são desenvolvidas num sistema cíclico, permitindo uma evolução contínua no design ergonômico do produto. Por fim, podemos considerar que este estudo teve por pretensão contribuir na compreensão do quanto as pesquisas em torno do design ergonômico podem e devem ser ampliadas, com a finalidade principal de melhorar a qualidade da vida humana. REFERÊNCIAS BONFIM, G. A.; NAGEL, K. D.; ROSSI, L. M. Fundamentos de uma metodologia para desenvolvimento de produtos. Rio de Janeiro: Coppe; UFRJ, 1977. BONSIEPE, G. Teoría y práctica del diseño industrial: elementos de una manualística crítica. Barcelona: G. Gili, 1978. 254 p. ERGONOMI DESIGN GRUPPEN. Shaping success [catalogue]. Bromma: Ergonomi Design Gruppen. 1997. FRISONI, B. C.; MORAES, A. de. Ergodesign: uma associação. In: MORAES, A.; FRISONI, B. C. Ergodesign: produtos e processos. Rio de Janeiro: 2AB, 2001. p. 195-206. HENDRICK, H. W. Macroergonomics: a new approach for improving productivity, safety and quality of work life. In: CONGRESSO BRASILEIRO e CONGRESSO LATINO- AMERICANO DE ERGONOMIA, 2., 1993, Florianópolis. Anais... Florianópolis: Abergo, 1993. p. 39-58. IEA. The International Ergonomics Association. The discipline of ergonomics. Disponível em: http://www.iea.cc/ergonomics/. Última atualização: jan. 2006. Acesso em: ago. 2006. JONES, J. Métodos de diseño. Barcelona: Gustavo Gili, 1976. JORDAN, P. W. Human factors for pleasurable in product use. Applied Ergonomics, n. 29-1, p. 25-33, 1998. LÖBACH, B. Design industrial: bases para a configuração dos produtos industriais. São Paulo: Edgard Blücher, 2001. 206 p. MORAES, A. Ergonomia e usabilidade de produtos: programas, informação. In: MORAES, A.; FRISONI, B. C. Ergodesign: produtos e processos. Rio de Janeiro: 2AB, 2001. p. 195-206. NORRIS, B.; WILSON, J. R. Designing safety into products: making ergonomics evaluation a part of the design process. Nottingham: Institute for Occupational Ergonomics/University of Nottingham, 1997. 30 p. PASCHOARELLI, L. C. Usabilidade aplicada ao design ergonômico de transdutores de ultra-sonografia: uma proposta metodológica para avaliação e análise do produto. 2003. 142 p. Tese (Doutorado) UFSCar, São Carlos, 2003. PUGH, S. Creating innovative products using total design: the living legacy of Stuart Pugh. Massachusetts: Addison-Wesley, 1996. 544 p. QUARANTE, D. Diseño industrial I: elementos introductorios. Barcelona: Ceac, 1992. SANDVIK Sandvik's 11 point programme: the scientific way to develop better hand tools [catalogue]. West Midlands: Sandvik, 1997. STANTON, N. A.; BARBER, C. Factors affecting the selection of methods and techniques prior to conducting a usability evaluation. In: JORDAN, P. W.; THOMAS,. Usability evaluation in industry. London: Taylor & Francis, 1996. p. 39-48. STANTON, N. A.; YOUNG, M. A guide to methodology in ergonomics: designing for human use. London: Taylor & Francis, 1999. 132 p. YAP, L. et al. Keyboard design through physiological strain measurements. Applied Ergonomics, n. 14-2, p. 117-122, 1983. 213