DIREITOS HUMANOS E A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES Daniele Gasperini Gabriela Barbosa Joane Pinson Vânia Casal Nilda Stecanela Bruna Conrado Karla Sinara Magrinelli Resumo Neste artigo pretendemos expor nossas considerações acerca do assunto Direitos Humanos e a Formação de Professores tendo como objetivo principal compreender quais fatores levam os professores a desacreditarem na importância de trabalhar a favor dos Direitos Humanos em sala de aula. Partimos do pressuposto que, para todo cidadão existem direitos e deveres que para serem cumpridos devem, anteriormente, ser conhecidos e acreditamos que cabe ao docente o papel de mediador desse saber. Nesse texto, estaremos focando na formação continuada de professores em Direitos Humanos. Esse aspecto nos pareceu um tanto desvalorizado ao estudarmos os resultados encontrados no projeto de pesquisa elaborado e desenvolvido coletivamente pelas alunas da Disciplina de Análise Crítica da Atuação Docente, da grade curricular do Curso de Pedagogia da Universidade de Caxias do Sul, no primeiro semestre de 2013. Analisando os dados empíricos do projeto, construídos com base na aplicação de um questionário para 21 professoras da rede pública de ensino que atuam nas séries iniciais do Ensino Fundamental, percebemos que ao serem questionadas a respeito de como elas tomaram conhecimento dos Direitos Humanos, que a maioria das professoras afirmou ter conhecido através de meios de comunicação. Isso nos faz perceber que existem vários desafios no cotidiano da escola, sendo que o maior deles é a necessidade dos professores conhecerem seus direitos e deveres, para que assim possam trabalhar de forma democrática, contribuindo na formação de sujeitos participativos na sociedade. Embasaremos nossas relações a partir das ideias de Canário, Perrenoud, Stecanela e McCowan. Palavras-chave: Direitos Humanos. Formação docente. Cidadania. INTRODUÇÃO Os estudos aqui reunidos procuram analisar a formação profissional dos docentes, partindo do pressuposto que, na atualidade, a educação formal é tida como maior forma de educação, e esta depende quase que exclusivamente dos professores. Problematizaremos a habilitação destes professores para educar futuros cidadãos
conhecedores e experenciadores de seus direitos e deveres. Segundo a Declaração Universal dos Direitos Humanos: A educação deve visar à plena expansão da personalidade humana e ao reforço dos direitos do Homem e das liberdades fundamentais e deve favorecer a compreensão, a tolerância e a amizade entre todas as nações e todos os grupos raciais ou religiosos, bem como desenvolvimento das atividades das Nações Unidas para a manutenção da paz. (Declaração Universal dos Direitos Humanos, Artigo 26º.2) Para tanto, presumimos ser necessário o conhecimento prévio dos educadores sobre Direitos Humanos, o que são, como aplicá-los no cotidiano da sala de aula e como fazer com que os alunos cheguem à plenitude de sua cidadania, compreendendo o intuito da DUDH, bem como dos demais tratados legais vinculados aos direitos dos cidadãos, como a Lei de Diretrizes e Bases, o Estatuto da Criança e do Adolescente e até mesmo a Constituição Federal. De acordo com McCowan (2011, p.10), Nós só poderemos ter uma imagem clara daquilo a que o direito à educação se aplica quando avaliarmos as justificativas para o mesmo e estimarmos o nosso progresso na sua realização.. Portanto, antes de questionarmos a especificidade da DUDH, achamos necessário que os docentes e discentes conheçam seu propósito. Chamou-nos a atenção na entrevista feita pela turma de 2013/2 a falta de informação a respeito desse assunto. O projeto em questão foi elaborado pela turma de Análise Crítica da Prática Docente, desenvolvida no 1º semestre de 2013, na Universidade de Caxias do Sul, curso de Pedagogia, ministrada pela professora Nilda Stecanela, contando com o apoio do estagiário Marcos Leandro Hübner e da monitora Monique Neckel Bueno. Foram entrevistados 21 professores, todos do sexo feminino, com idades a partir de 21 anos, atuantes nos anos iniciais do Ensino Fundamental, em escolas públicas e privadas. Todas as entrevistadas cursavam Ensino Superior e o tempo de atuação no magistério variava de 2 a mais de 20 anos de experiência. Das 47 questões aplicadas às professoras, 10 foram sobre seus conhecimentos sobre Direitos Humanos. Selecionamos 4 destas questões para serem problematizadas:
P.31: Como você tomou conhecimento dos Direitos Humanos?, na qual podemos perceber maioria de respostas Nos meios de comunicação e Outra, mostrando que não é um assunto muito abordado nas escolas e universidades em que trabalham ou se formaram. P.32: O tema transversal Direitos Humanos foi contemplado em sua licenciatura e/ou curso de magistério?, que teve maioria de respostas não, como justificativa à falta de conhecimento sobre o assunto. P.33: O tema transversal Direitos Humanos é contemplado em sua prática? - com quase metade das respostas Não, explicitando a aparente irrelevância do tema para estas professoras. P.46: Você se considera apto a trabalhar sobre o tema Direitos Humanos nas escolas? - com todas respostas apontando para a necessidade de atualização e aperfeiçoamento das professoras sobre o assunto em questão. Considerando que os cursos formadores de professores passaram a ser oferecidos predominantemente em nível superior, faremos a análise das questões anteriormente citadas com base no ensino superior e formação continuada de docentes. Pensamos que reorientar o currículo é buscar práticas mais consequentes, com a garantia do direito à educação. Assim sendo, nas páginas que seguem analisaremos brevemente as novas possibilidades que se criam na era do direito à educação, com foco em como podem ser aproveitadas pelos professores e quais são as ferramentas necessárias para tal. 1 Direitos Humanos: para quem? Escolhemos esse tema para ser trabalhado depois de percebermos a falta de informações que nós profissionais da educação temos em relação aos nossos direitos, pela pesquisa podemos observar a grande dificuldade de abordar o assunto em sala de aula, assunto esse que poderia ajudar no crescimento dos nossos alunos.
Para iniciarmos vamos falar um pouco sobre o que são direitos humanos: Direitos humanos são os direitos e liberdades básicas de todos os seres humanos. Seu conceito também está ligado com a ideia de liberdade de pensamento, de expressão, e a igualdade perante a lei. Os direitos humanos são princípios internacionais que servem para proteger, garantir e respeitar o ser humano. Devem assegurar às pessoas o direito de levar uma vida digna, isto é, com acesso à liberdade, ao trabalho, a terra, a saúde, a moradia, a educação entre outras. Segundo McCowan (2011, p.), o direito à educação não é como o do vestuário ou da moradia, por exemplo, pois nesses casos é relativamente fácil averiguar se os direitos estão sendo cumpridos ou não. Os direitos humanos estão baseados no princípio de respeito em relação ao indivíduo. A sua suposição fundamental é que cada pessoa é um ser moral e racional que merece ser tratado com dignidade. Enquanto as nações ou grupos especializados usufruem dos direitos específicos que se aplicam só a eles, os direitos humanos são os direitos aos quais todas as pessoas têm direito, não importa quem sejam ou onde morem, simplesmente porque estão vivos. Em eras passadas, não havia direitos humanos. Depois surgiu a ideia de que as pessoas deveriam ter certos direitos. E essa ideia, no final da Segunda Guerra Mundial, resultou finalmente no documento chamado Declaração Universal de Direitos Humanos e nos trinta direitos que todas as pessoas têm. Mas se pensarmos em para quem os direitos humanos se destinam, percebemos que como nós profissionais, as pessoas no geral também demonstram dificuldade em saber quais são seus direitos, pelo fato de esse assunto não ser abordado de forma significativa. Para exercer a cidadania, os membros de uma sociedade devem usufruir dos direitos humanos, direitos fundamentais tanto a nível individual quanto coletivo ou institucional.
Os direitos da área de educação estão fundamentados na LDB - Lei de Diretrizes e Bases nº 9.394, promulgada em 20 de dezembro de 1996. Cabe a nós, brasileiros, segui-la, tornando a educação muito mais humana e formativa, já que o sistema educacional envolve a família, as relações humanas, sociais e culturais. 2 A formação de professores e a desvalorização das relações sociais Segundo McCowan (2011), Direitos Humanos são antes direitos morais do que direitos legais. Moral é compreendida pelo senso comum como o conjunto de regras adquiridas através da e que orientam o comportamento humano dentro de uma sociedade. Portanto, o comprometimento com os Direitos Humanos pressupõe a vivência e a ciência, através da cultura, da educação, da tradição e do cotidiano, de valores que norteiem essas regras orientadoras em virtude desses direitos. Atualmente, as relações sociais vêm sendo desvalorizadas em detrimento do individualismo, processo que ganhou forças com o Renascimento através do Humanismo, onde o homem retoma o lugar central das ações do próprio homem. Se por um lado a busca pelo ganho individual valoriza mais o homem, por outro as relações coletivas cotidianas, a tradição, se tornam cada vez mais frágeis. O fato de o homem ter sua identidade, assumir um universo em si, afetou não somente o próprio homem, mas também o que dele se produz, a cultura. Se, de acordo com a pesquisa feita no semestre anterior, as professoras tiveram conhecimento dos Direitos Humanos através dos meios de comunicação, que podemos citar como sendo um veículo de cultura, e esta vem sendo afetada pelo individualismo, assim como a tradição e o cotidiano, resta-nos, como única opção viável de discutirmos o tema transversal Direitos Humanos seja a educação. Apesar de a educação, nesse contexto, ser influenciada pelo ideário neoliberal que dissemina valores individualistas, competitivistas e consumistas que contribuem para a desigualdade social, ela possui algo que as demais relações sociais não possuem: caráter obrigatório. Em vista disso, não vemos outro responsável por difundir
valores morais e éticos, senão o professor, contemplando assim, em sua prática, o tema Direitos Humanos, em busca de uma transformação da sociedade atual. O profissional pode se voltar a seus próprios valores se eles forem capazes de guiá-lo sem hesitação e de fazê-lo investir na luta contra o fracasso e contra o elitismo, na educação para a cidadania ou na instrução propriamente dita, na negociação ou na sanção. (PERRENOUD, 2002, p.55). 3 Formação de professores: Direitos humanos como parte do processo pedagógico curricular A formação do educador em Direitos Humanos, de acordo com as entrevistadas, está pautada fortemente em atitudes e valores, que remetem à experiência pessoal e profissional do professor. No entanto, o conhecimento e a vivência em Direitos Humanos não acontecem de maneira espontânea. Faz-se necessário que em primeiro lugar o professor conheça os seus direitos, sabendo beneficiar-se deles e evitar situações negativas em sua prática. Ainda sobre o questionário aplicado no semestre anterior, houve muitas respostas não comentadas, somente assinaladas. Tal fato deve ser questionado: não comentar significa não dominar o assunto? Ou não reconhecer totalmente os seus direitos? Ou quem sabe nem mesmo conhecê-los? Acreditamos que os saberes provenientes da formação profissional são uma dimensão fundamental na construção do saber docente em Direitos Humanos. A universidade, bem como cursos e oficinas promovidas por entidades como ONGs ou outras instituições, são os locais de aquisição destes saberes pedagógicos em Direitos Humanos, onde deve ser oferecido este apoio aos professores para enriquecerem sua prática. A universidade pode oferecer três frentes de formação de educadores que devem estar conjugadas: disciplinas pedagógicas que contemplem a discussão de uma metodologia adequada ao trabalho com os Direitos Humanos na sala de aula, disciplinas de Direitos Humanos que abordem sua evolução histórica, e sua
problemática concreta no mundo atual e na sociedade brasileira; e, finalmente, estágios orientados à prática educativa em Direitos Humanos. Na educação superior, em todos os cursos, é necessário que se criem espaços para a discussão dos Direitos Humanos. Neste sentido, sugere-se a criação de disciplinas, seminários, oficinas, cursos e outras instâncias acadêmicas que conduzam à realização de projetos sociais e comunitários nos quais os Direitos Humanos apareçam como uma realidade vivida. Em relação à pós-graduação, parece fundamental aos autores que se gere uma massa crítica de conhecimentos e pesquisas em torno da temática, de tal forma que estes conquistem, cada vez mais, reconhecimento social e acadêmico. CONSIDERAÇÕES FINAIS O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu capítulo IV, afirma no Artigo 53: A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho, assegurando-se-lhes: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola. (ECA, 1990). Quanto a isso, faz-se necessário refletir que as leis garantem o acesso e a permanência na escola, mas caminhamos para o momento em que elas também incluirão em seus artigos a garantia de aprendizagem. Quando a sociedade se ajustar para conseguir garantir a aprendizagem, estaremos vivendo em uma nova era, certamente com uma civilização mais evoluída e capaz de desenvolver plenamente e efetivamente os seus sujeitos, tornando-os, de fato, cidadãos. Mas ainda é cedo para falar disso, já que o governo não tem garantido apropriadamente a educação elementar, pois constatamos diariamente a falta de vagas em escolas infantis públicas e, muitas vezes em escolas de ensino fundamental e médio, que obrigam o aluno a se deslocar demasiadamente para ter seu direito efetivado.
Ao adentrar no tema Direitos humanos e relacioná-lo com a educação, evocamos a relação do papel do professor na era do direito à educação, ou mais especificamente, na constituição da docência. É preciso refletir sobre as dinâmicas protagonizadas no interior das instituições de educação a partir dos efeitos dos Direitos Humanos. Por um lado, há professores e gestores educacionais que ainda estão se acostumando com a nova concepção de educação e de prática pedagógica, que requer o respeito a alguns direitos do aluno que antes eram impensados. Conforme Stecanela: Gestores, professores e família estão cada vez mais embretados em suas ações cotidianas, pois a era dos direitos, ao mesmo tempo em que trouxe avanços significativos e necessários à proteção de nossas crianças e jovens, desestabiliza práticas cristalizadas, as quais ao insistirem continuar a fazer parte do cotidiano da escola, geram imensos conflitos e de várias ordens: geracionais, de classe, culturais, pedagógicos, políticos, de gestão. (STECANELA, 2013, p.2). Por outro lado, há os educandos e famílias que por vezes agem de maneiras negativas e exacerbadas por estarem completamente protegidos por direitos. Quanto a isso é preciso pensar que os direitos existem, porém os deveres de todos os envolvidos não devem ser esquecidos. Desta forma, pode-se perceber a importância de toda sociedade refletir sobre os direitos humanos, principalmente no que diz respeito ao direito à educação, de maneira que todos compreendam este direito e usem-no de forma positiva, concebendo-os como forma de evolução da civilização. Além disso, é preciso estarmos cientes de que os direitos não anulam nem se sobrepõe aos deveres, portanto é fundamental a reflexão profunda sobre os direitos e deveres humanos em todos os âmbitos da sociedade. REFERÊNCIAS CANÁRIO, Rui. Escola: crise ou mutação? In: CANÁRIO, Rui. A escola tem futuro? Das promessas às incertezas. Porto Alegre: Artmed, 2006, (p.11-50)
MCCOWAN, Tristan. O direito universal à educação: silêncios, riscos e possibilidades. Ponta Grossa: Práxis Educativa, v.6, n.1, jan-jun 2011, (p.9-20). PERRENOUD, Phillippe. Saber refletir sobre a própria prática: objetivo central da formação de professores? In: PERRENOUD, Phillipe. A prática reflexiva no ofício de professor: profissionalização e razão pedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2002, (p.47-70) STECANELA, Nilda. Ser professor na era do direito à educação. Universidade de Caxias do Sul, ago/2013. (texto impresso). STECANELA, Nilda (orientadora); HÜBNER, Marcos Leandro (coorientador). BUENO, Monique Neckel (monitora); Tabulação trabalho de campo do Projeto Educação e direitos humanos: a constituição da docência na era do direito à educação. Projeto de pesquisa construído pela turma 2013-2 Análise Crítica da Prática Docente. Universidade de Caxias do Sul, mar-jul, 2013 (texto impresso 21p.). STECANELA, Nilda. Roteiro para elaboração de artigo. In: Anais do X Seminário Escola e pesquisa: um encontro possível. Caxias do Sul, 2010.