UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMIMENSE INSTITUDO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA LABORATÓRIO DE GEOLOGIA MARINHA LAGEMAR VICTOR CRUZ MURILLO



Documentos relacionados
GEOLOGIA GERAL GEOGRAFIA

Instituto de Pesquisas Hidráulicas. IPH - UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil. Av. Bento Gonçalves 9500, , Porto Alegre, RS, Brasil

A importância das dunas frontais na avaliação da evolução da linha de costa- O caso da Praia da Manta Rota

SEDIMENTOLOGIA E GEOFÍSICA NA PLATAFORMA INTERNA DO RIO GRANDE DO SUL: PRO-REMPLAC.

45 mm INDICADORES DE PALEOLINHAS DE COSTA E VARIAÇÕES DO NÍVEL DO MAR NA PLATAFORMA CONTINENTAL SUL DE ALAGOAS

CAPÍTULO 4 GEOLOGIA ESTRUTURAL DA ÁREA

ESTUDO SEDIMENTOLÓGICO-AMBIENTAL DO MUNICÍPIO COSTEIRO DE BARRA DOS COQUEIROS

PRAIAS. i - Terminologia ii Quebra de ondas iii Morfologia iv Transport de sedimentos. v Impcto mpact of tidal ranges on beach morphol

Synthesis Study of an Erosion Hot Spot, Ocean Beach, California. Patrick L. Barnard, Jeff E. Hansen, and Li H. Erikson

MÉTODO DE ANÁLISE DA VULNERABILIDADE COSTEIRA À EROSÃO

Aula 5 PLANÍCIES E LAGUNAS COSTEIRAS. Aracy Losano Fontes

Geoideias: Earthlearningidea. Litorais mudando Investigando como a erosão, o transporte e a deposição das ondas podem mudar as formas dos litorais

Tipos de Depósitos de Algas Calcárias na Plataforma Continental Brasileira. Gilberto T. M. Dias UFF

BATIMETRIA E DISTRIBUIÇÃO DOS SEDIMENTOS DA PLATAFORMA CONTINENTAL INTERNA PARANAENSE PARANÁ - BRASIL

MORFODINÂMICA DA ZONA DE ARREBENTAÇÃO NA PRAIA DO CASSINO EM EVENTOS DE MARÉ METEOROLÓGICA

CARACTERÍSTICAS MORFODINÂMICAS DA PRAIA DE ITAPIRUBÁ, SC, BRASIL. Palavras-chave: Praias arenosas, morfodinâmica praial, morfologia de praia

LAUDO GEOLÓGICO GEOTÉCNICO GUARITUBA

MÓDULO DA AULA TEMÁTICA / BIOLOGIA E FÍSICA / ENERGIA

Anderson Gomes de Almeida 1, Alberto Garcia de Figueiredo Jr. 2, Gilberto Pessanha Ribeiro 3

Os sedimentos da Formação Urucutuca foram originalmente interpretados por Bruhn

EXERCÍCIOS DE REVISÃO - CAP. 04-7ºS ANOS

Colégio Salesiano Dom Bosco GEOGRAFIA Prof. Daniel Fonseca 6 ANO. Capítulo 7 Formas, Relevos e solos da Terra

Rotas de aprendizagem - Projetos

Figura 1: Localização da Praia de Panaquatira. Fonte: ZEE, Adaptado Souza, 2006.

CLASSIFICAÇÃO DOS AMBIENTES MARINHOS

ANÁLISE COMPARATIVA DAS DERIVAÇÕES ANTROPOGÊNICAS EM ÁREAS DE MANGUEZAIS EM ARACAJU-SE. Geisedrielly Castro dos Santos¹

Disciplina de Levantamentos Topográficos II 2013

Respostas - Exercícios de rotação e translação

CAPÍTULO 1 Introduzindo SIG

Capítulo 5: Aplicações da Derivada

CAPÍTULO 1 GENERALIDADES

Geotecnologia aplicadas à análise histórica humana /intervenções urbanas e evolução da linha de costa

GEOGRAFIA DO RIO GRANDE DO SUL

OS ESTUÁRIOS NA MARGEM CONTINENTAL SUL dialética do acontecimento sedimentar

GERÊNCIA EDUCACIONAL DE FORMAÇÃO GERAL E SERVIÇOS CURSO TÉCNICO DE METEOROLOGIA ESTUDO ESTATISTICO DA BRISA ILHA DE SANTA CATARINA

Jonathan Kreutzfeld RELEVO BRASILEIRO E FORMAS

EROSÃO E PROGRADAÇÃO DO LITORAL BRASILEIRO

Questões Climáticas e Água

Elementos e fatores climáticos

PLANO DE ESTUDOS DE GEOGRAFIA - 7.º ANO

PRIMEIROS ANOS. GEOGRAFIA CONTEÚDO P2 2º TRI Água: superficiais, oceânicas e usos. Profº André Tomasini

Capítulo 5 A Geografia da União Europeia

V ESTUDO TEMPORAL DA QUALIDADE DA ÁGUA DO RIO GUAMÁ. BELÉM-PA.

BACIA HIDROGRÁFICA OU BACIA DE DRENAGEM

TENDÊNCIAS DE TRANSPORTE SEDIMENTAR AO LONGO DAS PRAIAS DO MUNICÍPIO DE PONTAL DO PARANÁ (PR): DADOS PRELIMINARES.

MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE CONSELHO NACIONAL DO MEIO AMBIENTE

Refração da Luz Índice de refração absoluto Índice de refração relativo Leis da refração Reflexão total da luz Lentes Esféricas Vergência de uma lente

Identificação de Solos Moles em Terrenos Metamórficos Através de Sondagem Barra Mina.

Medição de vazão. Capítulo

1. Difusão. A difusão só ocorre quando houver gradiente de: Concentração; Potencial; Pressão.

Faculdade Sagrada Família

OS VENTOS, AS ONDAS E AS MARÉS COMO AGENTES GEOLÓGICOS DE SUPERFÍCIE MODELADORES DAS FAIXAS LITORÂNEAS ARTIGO 9. Pelo Geólogo Josué Barroso

Controle II. Estudo e sintonia de controladores industriais

SOLO NA FAIXA DE INFLUÊNCIA DO RIO MADEIRA, PORTO VELHO-RO A HUMAITÁ-AM

4Distribuição de. freqüência

GEOMORFOLOGIA E ANÁLISE DA REDE DE DRENAGEM DA FOLHA ALHANDRA, TABULEIROS LITORÂNEOS DOS ESTADOS DA PARAÍBA E PERNAMBUCO

Universidade de São Paulo Departamento de Geografia FLG Climatologia I. Pressão Atmosférica

NÍVEL MÉDIO DO MAR. Diagrama triangular

VARIAÇÃO DA SUSCETIBILIDADE E VULNERABILIDADE À AÇÃO DE PERIGOS COSTEIROS NA PRAIA DOS INGLESES (FLORIANÓPOLIS-SC) ENTRE 1957 E 2009

Bacia Hidrográfica Precipitação Infiltração Escoamento

Figura 2.1. Baía de Todos os Santos (Grupo de Recomposição Ambiental/ Gérmen).

Ciclos Biogeoquímicos

IMPACTOS DE ATIVIDADES DE MINERAÇÃO NA DINÂMICA FLUVIAL DO RIO ARAQUÁ (SÃO PEDRO SP)

SISTEMAS COSTEIROS CLÁSTICOS DOMINADOS POR ONDA

FUVEST Resolvida 12/Janeiro/2016

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA DISCIPLINA DESENHO GEOLÓGICO PROF. GORKI MARIANO

UTILIZANDO O HISTOGRAMA COMO UMA FERRAMENTA ESTATÍSTICA DE ANÁLISE DA PRODUÇÃO DE ÁGUA TRATADA DE GOIÂNIA

DEPÓSITOS SEDIMENTARES DO DELTA DE CABECEIRA DO RIO SANTA MARIA DA VITÓRIA, BAÍA DE VITÓRIA, ES.

Confira as respostas às principais dúvidas sobre o PIDV PORTAL PETROS

Bioma é um conceito estabelecido para classificar ambientes com base na

1 Introdução. futuras, que são as relevantes para descontar os fluxos de caixa.

A situação do câncer no Brasil 1

Enchente - caracteriza-se por uma vazão relativamente grande de escoamento superficial. Inundação - caracteriza-se pelo extravasamento do canal.

Período de injeção. Período que decorre do início da pulverização no cilindro e o final do escoamento do bocal.

Eletrônica Analógica

Nome:

INSTRUÇÃO: Responder à questão 18 com base no mapa que representa a localização de cidades hipotéticas e nas afirmações a seguir. D E OCEANO PACÍFICO

PEQUENAS BARREIRAS NO ESTADO DO CEARA, NORDESTE DO BRASIL

Ciências/15 6º ano Turma:

Ponte rolante: como escolher

Avaliação Ambiental Estratégica nas zonas costeiras e a subida do nível médio do mar

7. o ANO FUNDAMENTAL. Prof. a Andreza Xavier Prof. o Walace Vinente

DEFINIÇÃO MAIS SIMPLES

Blindar ou não blindar?

Prof. Franco Augusto

Dist. da linha saída à 1ª barreira

VALOR DOS DIREITOS DE PROPRIEDADE INTELECTUAL NO SECTOR CULTURAL E CRIATIVO

Evolução da Terra. Geografia Prof. Cristiano Amorim

GEOGRAFIA - 1 o ANO MÓDULO 19 VEGETAÇÃO EURO-AMERICANA

da ZONA PILOTO João Duarte Aurora Bizarro

Atividade 11 - Exercícios sobre Relevo Brasileiro Cap. 03 7º ano. Atenção: Pesquise PREFERENCIALMENTE em seu Livro e complemente a pesquisa em sites.

Topografia. Conceitos Básicos. Prof.: Alexandre Villaça Diniz

compreensão ampla do texto, o que se faz necessário para o desenvolvimento das habilidades para as quais essa prática apresentou poder explicativo.

XIII Congresso da Associação Brasileira de Estudos do Quaternário ABEQUA

Luciana Scur Felipe Gonzatti Eduardo Valduga Ronaldo Adelfo Wasum

CINÉTICA QUÍMICA CINÉTICA QUÍMICA EQUAÇÃO DE ARRHENIUS

Problemas na Utilização da Água (poluição )

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS DA BACIA HIDROGRÁFICA E DO PERCURSO DO RIO PINHÃO RESUMO

Transcrição:

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMIMENSE INSTITUDO DE GEOCIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA LABORATÓRIO DE GEOLOGIA MARINHA LAGEMAR VICTOR CRUZ MURILLO DISTRIBUIÇÃO SEDIMENTAR NA PLATAFORMA CONTINENTAL INTERNA E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DAS CRISTAS DE PRAIA NA DESEMBOCADURA DO RIO PARAÍBA DO SUL Niterói RJ 2008

2 VICTOR CRUZ MURILLO DISTRIBUIÇÃO SEDIMENTAR NA PLATAFORMA CONTINENTAL INTERNA E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DAS CRISTAS DE PRAIA NA DESEMBOCADURA DO RIO PARAÍBA DO SUL Dissertação apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Geologia e Geofísica Marinha da Universidade Federal Flumenense, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Área de Concentração: Geologia e Geofísica Marinha Orientador: Prof. Dr. CLEVERSON GUIZAN SILVA Niterói-RJ 2008

3 VICTOR CRUZ MURILLO DISTRIBUIÇÃO SEDIMENTAR NA PLATAFORMA CONTINENTAL INTERNA E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O DESENVOLVIMENTO DAS CRISTAS DE PRAIA NA DESEMBOCADURA DO RIO PARAÍBA DO SUL Dissertação apresentada ao Curso de Pós Graduação em Geologia e Geofísica Marinha da Universidade Federal Flumenense, como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre. Área de Concentração: Geologia e Geofísica Marinha BANCA EXAMINADORA Dr. Cleverson Guizan Silva (Orientador) Universidade Federal Fluminense UFF Dr. Dieter Carl Ernst Heino Muehe Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ Dr. Gilberto Tavares de Macedo Dias Universidade Federal Fluminense UFF Dr. Guilherme Borges Fernandez Universidade Federal Fluminense UFF Niterói RJ 2008

4 AGRADECIMENTOS À Cleverson Guizan Silva, pela orientação, pelos conhecimentos transmitidos e toda sua paciência. À Guilherme Fernandez pelos ensinamentos, contribuições e dicas, pela ajuda nos trabalhos de campo e todo incentivo. Às suas conversas que às vezes eram engraçadas, mas nunca deixavam de ser produtivas! À Thiago Gonçalves pela ajuda no planejamento do campo, da força na hora de puxar a draga, pela boa navegação e pelos papos descontraídos. À Thais Baptista da Rocha pela ajuda no processamento das amostras. À Ricardo Alves Santos e Camilo Aristizábal pelo tempo despendido ao me socorrer com os mapas e figuras e pelas trocas de experiência. Aos professores e funcionários do LAGEMAR que contribuíram para minha formação. Ao professor José Antônio que me deu um teto em Niterói ao aceitar ser meu fiador. Aos meu primos Raquel e Willian que me acolheram por algum tempo logo que cheguei a Niterói. À minha prima Marina, à minha grande amiga Karol, ao Léo e a Ju pelas conversas, companhia, e pelos rangos nos finais de semana. À minha família, inclusive meus avós, por todo apoio, incentivo e orações, em especial ao meu pai, que concedeu a oportunidade e sempre esteve ao meu lado me apoiando, estimulando, dando suporte e até mesmo cobrando de maneira saudável. À Deus, do fundo do meu coração, pela oportunidade e pela força para finalizar esse trabalho.

5 RESUMO O complexo deltaico do rio Paraíba do Sul, norte do estado do Rio de Janeiro, é marcado por uma planície costeira composta por barreiras regressivas, de idade holocênica, que se dispõem de forma assimétrica em relação à desembocadura fluvial. A evolução dessa planície foi bastante estudada principalmente na década 80, entretanto, podem-se perceber algumas divergências entre os modelos propostos para explicar o desenvolvimento dos cordões de praia que a compõem, principalmente quanto à fonte sedimentar. Este trabalho tem como objetivo mapear a distribuição sedimentológica da plataforma interna adjacente à planície deltaica do rio Paraíba do Sul para discutir se essa contribui com sedimentos para a formação dos cordões de cristas de praia da planície. A importância fluvial e das correntes longitudinais como possíveis fontes sedimentares também é avaliada. Para satisfazer tais objetivos, métodos geofísicos, mais precisamente sísmica de alta resolução (10KHz), e amostragem superficial dos sedimentos foi realizada na plataforma interna adjacente à planície de crista de praia do delta do rio Paraíba do Sul e os resultado foram confrontados com as bibliografias existentes. Os resultados mostraram uma seqüência deltaica progradante, com as lamas de prodelta se sobrepondo às areias relíquias da plataforma. Uma faixa lamosa se estende ao longo de toda a plataforma adjacente à planície e estão em contato direto com os sedimentos biogênicos ao norte e ao sul da planície. Areias foram encontradas somente em uma pequena região da área de estudo. Dessa forma o rio Paraíba do Sul juntamente com as correntes de deriva litorânea, parecem ser as principais fontes de sedimentos responsáveis pela formação da planície de cristas de praia que compõem o complexo deltaico do rio Paraíba do Sul.

6 ABSTRACT The Paraíba do Sul river associated strand plain, northern Rio de Janeiro, is composed by a series of holocenic beach ridges that fits asymmetrically at both sides of the river mouth. Its evolution was largely studied manly in 80 s years, however there were some divergences between the models proposed to explain its beach ridge development and its probable sedimentary sources. The purpose of this work is mapping the sedimentological distribution of the inner shelf adjacent to the Paraíba do Sul strand plain and discuss if it really contributes with sediments to the coastal plain development. The role of the river and longshore currents as sedimentary sources was evaluated as well. To satisfy these objectives geophysics methods (high seismic resolution) and superficial samples were used to map the sedimentological distribution at inner shelf and the results were compared with preexistent bibliography. The results showed a regressive sequence with deltaic muds overlaying relict sands. A prodelta mud stripe extends along the beach ridges strand plain and are directly in contact with biogenic sediments to north and south of the studied area. In this case the Paraíba do Sul and the long shore currents seem to be the main sources of sediments responsible for the beach ridges formation.

7 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Principais componentes do delta... 12 Figura 2 Estrutura geral de um delta... 13 Figura 3. Modelo proposto por Galoway (1975) para a classificação dos deltas... 14 Figura 4. Mapa geológico da planície costeira do Paraíba do Sul... 16 Figura 5. Modelo de formação de cristas de praia em Magilligan, norte da Irlanda...20 Figura 6. Mapa de localização da planície deltaica do Rio Paraíba do Sul... 24 Figura 7. Detalhe da planície costeira nas proximidades da foz atual do rio.... 26 Figura 8 Mapa da planície deltaica do Rio Paraíba do Sul mostrando os 7 sistemas de cristas de praia interpretados por Dias e Gorini (1980) e Dias (1981)... 27 Figura 9 - Mapa de fotointermpretação mostrando os 9 sistemas distintos de cristas de praia identificados por Bastos e Silva (1996)... 28 Figura 10 Modificações morfológicas na foz do rio Paraíba do Sul entre os anos de 1956 e 1979 (Dias, 1981).... 30 Figura 11. Mapa da distribuição de sedimentos do lobo deltáico do rio Paraíba do Sul... 31 Figura 12 Perfil estratigráfico da planície de cristas ao lobo deltaico... 32 Figura 13 Mapa de comportamento morfodinâmico, ressaltando os principais parâmetros morfométricos e hidrodinâmicos dos diferentes setores morfodinâmicos do litoral... 36 Figura 14 Esquema evolutivo da sedimentação quaternária nas feições deltaicas da costa leste brasileira.... 40 Figura 15. Inversão da regra de Bruun... 42 Figura 16. Modelo de bloqueio de transporte sedimentar pelo fluxo fluvial.... 43 Figura 17 Modelo dinâmico de reversão no sentido da deriva litorânea para o delta do rio Paraíba do Sul... 45 Figura 18. Mapa de posicionamento das amostras e das linhas de levantamento... 48 Figura 19 Amostragem superficial com draga do Tipo Van Veen... 50 Figura 20 - Exemplo de interpretação do dado de perfilagem..... 52 Figura 21 Mapa batimétrico e localização dos perfis transversais.... 54 Figura 22 Mapa de províncias fisiográficas com base na batimetria.... 56 Figura 23 Perfis Batimétricos... 60 Figura 24 Localização dos perfis e tabela de declividade.... 61 Figura 25 Mapa Faciológico... 63 Figura 26 Mapa da localização dos refletores correspondentes a Formação Barreiras e da localização do paleocanal.... 66 Figura 27 Paleocanal identificado com o perfilador de sub-fundo... 67 Figura 28 Mapa de Isópacas... 68 Figura 29 Mapa de profundidade do topo da areia relíquia... 70

8 SUMÁRIO 1. Introdução... 9 1.1 Objetivos gerais... 10 1.2 Objetivos específicos... 10 1.3 Hipótese de trabalho... 10 2. Base Teórico-Conceitual... 11 2.1 Sistemas deltaicos... 11 2.2 Formação de sistemas de cristas de praia... 17 3. Caracterização da Área de estudo... 24 3.1 Localização... 24 3.2 Características morfológicas da planície deltaica... 24 3.3 Características morfológicas da frente deltaica... 29 3.4 Características morfológicas e sedimentares da plataforma continental... 33 3.5 Oceanografia Regional... 35 3.6 A evolução do sistema deltaico do rio Paraíba do Sul... 37 3.7 Formação do sistema de cristas de praia da planície deltaica do rio Paraíba do Sul... 41 4. Metodologia... 46 4.1 Perfilagem Sísmica... 46 4.2 Amostragem Superficial... 49 4.3 Interpretação dos dados... 50 5. Resultados... 53 5.1 Batimetria... 53 5.2 Perfis batimétricos... 57 5.3 Faciologia... 61 5.4 Perfis sísmicos... 63 5.5 Isópacas... 67 5.6 Profundidade do topo da areia relíquia... 69 6. Discussão... 71 7. Conclusões... 76 Referências bibliográficas... 79

9 1. INTRODUÇÃO A zona costeira é representada por um mosaico de ambientes que apresentam feições geomorfológicas características, sendo alguns dinâmicos e suscetíveis às diversas forças presentes, cada uma das quais com sua própria variabilidade espacial e temporal. Essas forças que incluem, dentre outras, a ação do vento, ação de ondas, efeitos de maré, regimes de circulação costeiros e flutuações do nível relativo do mar promovem uma dinâmica sedimentar considerável ao longo do litoral e são, portanto, grandes responsáveis pela morfodinâmica costeira. A evolução costeira é conseqüentemente resultado, ao longo do tempo, dos diferentes padrões de transporte/deposição de sedimentos controlados por esses agentes e associados à topografia do local. A evolução da planície deltaica do Rio Paraíba do Sul, norte Fluminense, foi bastante discutida principalmente na década de 80, entretanto podem-se perceber algumas divergências entre os modelos propostos para explicar o desenvolvimento dos cordões de praia que a compõem, principalmente quanto à fonte sedimentar. De acordo com Dominguez et al. (1983) e Martin et al. (1984a), a fonte sedimentar para a formação das cristas de praia que compõem a planície deltaica do rio Paraíba do Sul seria as areias da plataforma continental interna adjacente, disponibilizadas durante o abaixamento do nível do mar ocorrido durante os últimos 5000 anos, segundo a relação inversa da Regra de Bruun (1962)(figura 15). Já Dias e Gorini (1980) e Dias (1981) relacionam a formação dos cordões de praia com o retrabalhamento, pelos agentes costeiros, dos sedimentos despejados pelo rio Paraíba do Sul em sua desembocadura, ao longo do tempo. Poucos são os trabalhos (e.g. Dias et al. 1984) que fazem referência à região submersa do complexo. Dias e Gorini (1980) concluíram que a história da evolução sedimentar do complexo deltaico do rio Paraíba do Sul, só poderia ser bem determinada após a integração de dados obtidos na planície costeira e os da plataforma continental adjacente, considerando-se assim todo o prisma sedimentar do quaternário. Baseandose nessas informações, esse estudo visa o mapeamento sedimentar da plataforma

10 interna adjacente à desembocadura do Rio Paraíba do Sul (RJ) para o maior entendimento morfodinâmico da região e da própria evolução do ambiente costeiro. Esse tipo de análise também é favorável ao desenvolvimento urbano costeiro, implementação de estruturas de engenharia, lançamento e aterramento de dutos, entre outros. 1.1 Objetivos gerais Este trabalho tem como objetivo geral associar a distribuição faciológica da plataforma continental interna adjacente à desembocadura do rio Paraíba do Sul, aos processos responsáveis pela evolução da planície de cristas de praia que compõem o delta atual. 1.2 Objetivos específicos De maneira mais concisa esse estudo objetiva o mapeamento das lamas de prodelta através de métodos geofísicos e amostrais para determinar se a plataforma continental interna contribui com sedimentos para a planície costeira, onde ocorrem as cristas de praia adjacentes à desembocadura atual. 1.3 Hipótese de trabalho Caso exista uma camada de lama contínua em toda a extensão da antepraia fronteira ao complexo deltaico do rio Paraíba do Sul, as areias que alimentam a planície costeira não poderiam estar vindo da plataforma continental fronteira à foz. Neste caso, as contribuições fluvial e/ou por corrente longitudinal à praia seriam mais importantes na construção da planície de cristas de praia.

11 2. BASE TEÓRICO-CONCEITUAL 2.1 Sistemas deltaicos Quando um rio entra em um grande corpo de água, como o oceano, os sedimentos que ele transporta tendem a se depositar na forma de um delta (Komar, 1973). O complexo deltaico, segundo Suguio (2003), corresponde a uma associação de deltas geológica e geneticamente relacionados entre si, porém espacialmente e temporalmente independentes. A distribuição dos deltas está fortemente relacionada à quantidade de energia nas margens continentais. Se a taxa de sedimentos supridos pelo rio excede a taxa de sedimentos dispersados pelas ondas e correntes de maré, um acúmulo costeiro de sedimentos fluviais ocorre e forma-se um delta, tipicamente estendendo-se da desembocadura do rio em direção ao mar (Brown et al, 1989; Kennett, 1982). Os deltas estão entre as maiores construções físicas que ocorrem na costa e são extremamente importantes como locais para o assentamento humano, agricultura e indústria. Sua natureza física tem sido principalmente estabelecida por sedimentólogos trabalhando na indústria de exploração de petróleo, pois os ambientes deltáicos, mais antigos, contêm muito dos critérios sedimentológicos necessários para a geração e acúmulo de hidrocarbonos (óleo e gás), contendo as rochas geradoras e reservatório (Haslett, 2000). Os deltas são divididos morfologicamente em três zonas (figura 1): Planície Deltaica que está acima do nível do mar, sendo drenada por uma rede de canais distributários. A Frente Deltaica, que inclui a desembocadura do rio, a linha de costa do delta e a área imediatamente offshore, que se inclina gradualmente em direção ao mar e onde a carga de fundo é depositada e os sedimentos consistem principalmente de areia. O Prodelta é a zona mais offshore e profunda que recebe muito do silte e argila transportados em

12 suspensão e depositados em camadas sub-paralelas, com leve inclinação em direção ao mar. Figura 1. Principais componentes do delta. (fonte Brown, 1989) Onde o acúmulo de sedimentos em direção ao mar é mais rápido que a subsidência ou remoção pela corrente de deriva litorânea, ocorre a progradação do prodelta, frente

13 deltaica ou da própria desembocadura do rio. À medida que o sistema deltaico prograda, ele conduz à clássica seção cruzada de leitos topset, foreset e bottomset, objetivamente delineados por Gilbert (1980, apud Suguio, 1984). Leitos topset são misturas de areias grossas, depositadas na planície e frente deltaica, e sedimentos marinhos mais finos ricos em matéria orgânica de áreas interdistributárias. Leitos foreset são camadas de areia grossa e fina que se inclinam em direção ao mar por sobre os sedimentos mais finos de leitos bottomset. Leitos bottomset são camadas horizontalizadas de sedimentos finos depositados em áreas distais do complexo deltaico sobre os sedimentos da plataforma continental adjacente (figura 2). Entretanto, a rigor, essas denominações só se aplicarão a alguns deltas de origem lacustre, cujo arcabouço sedimentar é mais simples que nos deltas oceânicos (Suguio, 2004). Figura 2 Estrutura geral de um delta, indicando o local de leitos topset, foreset e bottomset. (Haslett, 2000). Na verdade, nem todos os deltas apresentam a forma clássica de Delta, somente em desembocaduras de rios onde ondas e marés são ineficientes no rearranjo dos depósitos do rio é que sua forma característica se desenvolve. Tal sistema de deltas exemplificado pelo Mississippi, é chamado, de acordo com a classificação de deltas proposta por Galloway (1975, apud Suguio, 2004), de delta dominado por rio (figura 3). Ainda de acordo com a classificação de Galloway (1975) deltas onde os sedimentos

14 trazidos pelo rio até a costa são redistribuídos pelas correntes de maré são chamados de deltas dominados por maré, e em áreas costeiras, onde a energia da onda é alta, sobressaindo-se aos efeitos do rio e da maré em relação à distribuição dos sedimentos trazidos pelo rio, o delta torna-se dominado por ondas, como o São Francisco e o rio Paraíba do Sul. Nestes deltas, a erosão das ondas e a forte corrente longitudinal dispersam os sedimentos para longe da desembocadura do rio, produzindo costas relativamente retas, com somente algumas saliências na linha de costa (Pinet, 1998). Figura 3. Modelo proposto por Galoway (1975) para a classificação dos deltas. (modificado de Sugiuo 2004)

15 O rio Paraíba do Sul (figura 4) vem sendo considerado como um delta clássico dominado por ondas, porém Martin e Flexor (1987) discutem essa classificação e relatam que a formação das planícies costeiras brasileiras está relacionada à última regressão marinha holocênica, uma vez que existem ao longo do litoral brasileiro vastas zonas em progradação sem qualquer ligação com a desembocadura fluvial atual ou pretérita. Para esses autores o rio Paraíba do Sul desempenharia um papel secundário na formação da planície de cristas de praia adjacente à sua desembocadura e os sedimentos que compõem as cristas seriam os sedimentos palimpsestos (Swift et al., 1971) depositados na plataforma continental em épocas de nível do mar mais baixo. Essa hipótese será melhor discutida nos capítulos seguintes.

Figura 4. Mapa geológico da planície costeira do Paraíba do Sul (fonte Martin et al. 1984) 16

17 2.2 Formação de sistemas de cristas de praia Cristas ou cordões de praia são definidos como corpos arenosos alongados em forma de cristas, que geralmente se dispõem paralelamente à linha de costa, sendo separadas entre si por cavas. Individualmente, as cristas representam sucessivas posições de linha de praia durante a história evolutiva da planície progradante (Curray, 1969). Ao contrário das bermas, que são terraços não persistentes formados na região entremarés ou ligeiramente acima dela, as cristas de praia são formadas na porção superior da face de praia e geralmente, são passíveis de preservação (Hesp et al. 1999) Segundo Swift (1976), cristas de praia são os afloramentos na superfície de prismas de acresção formados a partir da progradação em direção ao continente da face de praia (foreshore) e da antepraia (shoreface). Hesp et al. (1999), definem os cordões de praia como depósitos integralmente desenvolvidos pela ação das ondas, na maioria das vezes, formados durante condições de alta energia de ondas e\ou níveis de água elevados (e.g elevação do nível da água durante tempestades), formados primariamente de areia, cascalho, seixos ou a combinação desses, além de poder conter grandes quantidades de sedimentos marinhos e orgânicos. Eles são tipicamente formados ao nível, ou acima do nível normal das marés de sizígia e são geralmente persistentes. Planícies de cristas de praia são expressões comuns de costas progradantes (Carter, 1986; Hesp e Short, 1999; Roy et al. 1995). As planícies de cristas de praia ocorrem em costas progradantes ou deposicionais, onde o abundante aporte de sedimentos, aliado ao regime hidrodinâmico, são capazes de superar taxas lentas de subida do nível do mar ou períodos de estabilização (Fitzgerald et al. 1992). Progradação da linha de costa pode ser também um produto de abaixamento do nível do mar e/ou suprimento positivo de sedimentos (Hesp e Short, 1999). Devido ao aporte sedimentar as cristas de praia estão comumente associadas às desembocaduras de rios compondo as planícies deltaicas (e.g. Delta do Rio Grijalva no México, Delta do Rio Niger na África, Delta do Rio São Francisco e Paraíba do Sul no Brasil).

18 O desenvolvimento das cristas de praia vem sendo estudado por vários autores em diversas partes do globo e alguns modelos são propostos para sua formação. Tais modelos por vezes são motivos de controvérsias entre os autores. Como nem todas as regiões costeiras do mundo possuem um mesmo histórico evolutivo (e.g variação do nível do mar, fisiografia local, aporte sedimentar, tectônica, agentes atuantes como ondas, ventos e maré), alguns desses modelos são particulares da região estudada. Davies, 1958 (apud Taylor e Stone, 1996) explicou a construção de cristas de praia através de um processo de corte e preenchimento (cut and fill), controlados pela dinâmica e características das ondas e o espraiamento resultante durante eventos normais e de tempestade. Preenchimento ocorreria durante períodos de ondas construcionais de swell formando uma berma. Corte seria predominante durante períodos de ondas de tempestade erosionais. A berma é a única feição construcional na praia e, conseqüentemente, poderia ser considerada uma crista de praia incipiente. A deposição da berma seria seguida por um período de rápida colonização pela vegetação a qual resultaria na agradação através de depósitos eólicos. Psuty (1965) atribui o desenvolvimento de cristas de praia em associação ao delta do Rio Grijalva (Tabascan México) a dois fatores principais: aporte de sedimentos e um agente formacional repetitivo. Ele descreve o desenvolvimento de cristas de praia em Tabascan como produto da grande disponibilidade de sedimentos que chega à costa trazida por rios, depositados na praia durante tempo bom, e retrabalhados por ondas de tempestade. As ondas de tempestade erodem parte da antepraia e depositam esse sedimento no pós-praia, formando uma berma. O retrabalhamento da berma por depósitos de washover (leques de espraiamento) a transformam em crista de praia. Posteriormente, ondas de tempo bom engordariam a praia e as próximas frentes frias não afetariam a nova crista, mas dariam início à formação de outra em função do suprimento sedimentar. Assim essa combinação de aporte sedimentar e variações sazonais formam as cristas, produzindo uma progradação da linha de costa e o desenvolvimento da planície.

19 Construção de cristas de praia individuais em Tabasco foi considerada por TANNER e STAPOR (1971) de ser o produto de espraiamento, entretanto, sem a ação de eventos de alta energia. TANNER e STAPOR (1971) afirmam que sob condições de onda constante, uma pequena berma se depositará no limite superior do espraiamento. Caso ondas construtivas prevalecem, progradação em direção ao mar aumento na elevação ocorre resultando no desenvolvimento de cristas de praia. Formadas dessa forma, as cristas de praia apresentam predominantemente camadas mergulhantes em direção ao mar. Curray et al. (1969), ao estudar a planície costeira de Nayarit (México) propôs que a crista de praia primária é formada a partir de barras emergentes as quais crescem durante condições de baixa energia das ondas. Nesse mecanismo uma barra offshore cresce até o nível do mar quando areia suficiente é suprida a esse segmento da linha de costa, tanto por transporte longitudinal, como por erosão de areias relíquias da plataforma interna. Essa barra pode tornar-se emergente durante períodos de ação de ondas de baixa energia combinada com marés altas de sizígia e, caso não seja destruída por eventos de maior energia, ela constituirá uma nova barra. A periodicidade desse processo é função da taxa de suprimento de sedimentos e volume de areia requerida para cada crista. Flexor et al. (1984) relatam que a formação de cordões litorâneos a partir do crescimento de barras de antepraia como descrito por Curray (1969) ocorreria somente em casos muito particulares, como na desembocadura de um curso de água quando a linha de antrepraia é alimentada lateralmente pelos aportes do rio, fenômeno constatado nas desembocaduras dos rios Paraíba do Sul e Jequitinhonha. Para esses autores o mecanismo de formação de cordões litorâneos mais comum seria através do retrabalhamento dos sedimentos depositados na praia durante tempo bom, e retrabalhados por ondas de tempestade como descrito por Psuty (1965). Carter (1986) estudou a morfodinâmica de formação das cristas de praia de Magilligan, norte da Irlanda, e observou que dois tipos de cristas de praia estão sendo formados na atualidade. Ambos os tipos derivam de uma fonte comum, a erosão de escarpas de dunas durante eventos de alta energia, entretanto divergem quanto ao processo de

20 formação. O primeiro tipo está associado com o transporte transversal de sedimentos sob condições de ondas dissipativas. Essas cristas se formam próximas ao nível alto das marés de sizígia através da migração de barras de espraiamento (swash bars) coalescentes dentro de 30 a 55 dias após uma tempestade. A formação do segundo tipo é um pouco mais complexa. O sedimento armazenado inicialmente em uma barra longitudinal é movido ao longo da costa, provocando o alongamento e posterior rompimento da barra em lugar de maior pulso da corrente longitudinal (Figura 5). A refração das ondas atuando na região de rompimento entre as barras é responsável pelo início da migração da barra rompida em direção à costa, onde consolidará em uma nova crista. O tempo de duração desse processo é em torno de 90-150 dias após uma tempestade. A sobrevivência da crista não é garantida, podendo ser erodida posteriormente por processos marinhos. Figura 5. Modelo de formação de cristas de praia em Magilligan, norte da Irlanda. Crescimento de uma barra longitudinal para dentro de uma zona refletiva distal (A) resultando em alongamento em um ludar de maior pulso de energia (B) e eventual ruptura. A anexação da barra rompida (C) forma uma crista de praia emergente (D). (Modificado de Carter, 1996)

21 Baseados em dados de campo de um complexo de barreiras afogadas na plataforma média em 30 a 50 m de profundidade no norte de Sydney, Austrália, suplementado por resultados de modelagem computacional, Roy et al.(1995) descrevem um modelo que relaciona a formação das cristas de praia com o abaixamento do nível do mar. A medida que o nível do mar abaixa, a crista de praia sofre progradação da shoreface com areias erodidas de regiões mais offshore. Erosão ocorre na shoreface inferior, e com o abaixamento contínuo do nível do mar, a barreira regressiva é construída em direção ao mar sobre a zona erodida. Esses autores observaram também que a declividade do substrato desempenha um papel importante no controle da formação das barreiras, sendo que o melhor desenvolvimento das cristas deve ocorrer em gradiente moderadamente baixo e alta energia. As simulações mostram que à medida que o substrato torna-se mais íngrime, o fluxo de sedimento reverte e se torna diretamente dominante offshore. Tanner (1995) estudou aproximadamente 50 diferentes sistemas de cristas de praia nos Estados Unidos, Canadá, México, Brasil, Dinamarca, entre outros, e propôs um modelo no qual pequenas variações do nível do mar produziriam condições para a formação de complexos de cristas de praia. Cada crista seria formada por uma variação combinada de elevação e abaixamento do nível do mar (amplitudes de 5-30 cm). Como o perfil transversal de uma praia é côncavo para cima, com a curvatura máxima mais próxima da praia, uma elevação do nível do mar provocaria um ajuste na chegada das ondas. As ondas quebrariam mais altas na zona de surfe uma vez que o aumento da profundidade, decorrente da elevação do nível do mar, dissiparia menos a energia das ondas que chegam à costa. Isso resultaria em maior run-up do swash e, conseqüentemente, num transporte mais alto da areia. Um abaixamento no nível do mar impediria o retrabalhamento dessa areia e uma crista seria formada. A areia adicionada com o nível do mar mais baixo resultaria na cava (swale). Tanner (1995), através de datação radiométrica, observou que o intervalo de tempo entre as cristas formadas em cada complexo tinha intervalos bem definidos entre: 3-7 anos, 10-12 anos, 18-19 anos, 30-35 anos, e 50-51 anos, sendo os dois primeiros períodos mais raros e os dois últimos mais comuns. Então ele atribuiu que as cristas

22 com intervalos entre 3-7 anos poderiam ser formadas em variações do nível do mar decorrentes do fenômeno El Niño, as com intervalos entre 10-12 anos formadas por variações do nível do mar decorrentes do ciclo sunspot, e as com intervalo entre 18-19 anos formadas por variações decorrentes do lunar nodal tide. Entretanto ele não soube explicar ao certo como seriam formadas as cristas de intervalos maiores, apenas supôs a combinação dos ciclos citados anteriormente. Tanner ainda concluiu que a formação de cristas de praia por eventos de tempestade, como relatado por alguns autores, seria impraticável, já que a freqüência de tempestades não coincide com o intervalo de tempo entre as cristas observadas. Goy et al. (2003) propõem um modelo semelhante ao modelo de Tanner (1995) para explicar a formação de cristas de praia no Golfo de Almería, Mediterrâneo oeste (Espanha). Para esses autores as unidades que compõem a planície de cristas de praia dessa região seriam depositadas durante períodos de elevação relativa do nível do mar e aumento da entrada de sedimentos na região costeira. Essas unidades são limitadas por depressões largas (swales) ou superfícies erosionais associadas com níveis do mar mais baixos e reduzida entrada de sedimentos na costa. Essas oscilações do nível do mar estariam associadas a mudanças no influxo de águas superficiais atlânticas para dentro do mar Mediterrâneo e mudanças na força relativa de ventos W/SW. Goy et al. (2003) sugerem que essas mudanças estariam relacionadas, por sua vez, às flutuações do índice de Oscilação do Atlântico Norte (North Atlantic Oscilation index) e variações da atividade solar com periodicidade de uma década. Podemos observar que o suprimento de areias da zona costeira para a construção das cristas de praia é amplamente relatado na maioria das literaturas. A zona costeira é frequentemente considerada como a fonte básica para as cristas de praia. Em alguns casos, entretanto, os rios desempenham um papel maior no suprimento de sedimentos para a zona costeira. A importância dos rios no suprimento de sedimentos para a progradação costeira está relacionada, em parte, ao próprio ambiente geomorfológico, à história climática e de variação do nível do mar e à incidência de ondas em relação à costa (Anthony, 1995).

23 Anthony (1995) ao estudar o desenvolvimento de cristas de praia da costa oeste da África verificou a importância do suprimento de sedimentos pelos rios para a formação das maiores planícies de cristas de praia dessa região. Ele observou que as maiores planícies de praia de costa aberta do oeste da África foram, nas fases anteriores, principalmente supridas por sedimentos da zona costeira, enquanto que nas fases posteriores, com a depleção do estoque da zona costeira, parecem ter sido amplamente dominadas pelo suprimento de desembocaduras de rios agregadas.

24 3. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 3.1 Localização O delta do rio Paraíba do Sul (figura 6) situa-se no norte do Estado do Rio de Janeiro, na porção emersa da Bacia de Campos. Sua planície possui uma área de cerca de 3000 Km 2 sendo suas dimensões máximas de 120 km na direção N-S e 60 km na direção E-W. Figura 6. Mapa de localização da planície deltaica do Rio Paraíba do Sul. 3.2 Características morfológicas da planície deltaica Dias e Gorini (1980) denominaram de complexo deltaico do rio Paraíba do Sul o conjunto de ambientes sedimentares relacionados às diversas fases de deltação do rio, representado pelas seguintes unidades: complexo fluvial Campos-São Tomé, com preservação de depósitos fluviais antigos; a região da Lagoa Feia, testemunha de uma

25 antiga baía; planície de cordões de cristas de praia a SW do cabo de São Tomé e lagoas associadas; e o delta atual do rio Paraíba do Sul. Silva (1987) divide a planície costeira, ou complexo deltaico, em duas regiões com características morfológicas e estratigráficas distintas: (a) litoral progradante em forma de Cúspide, entre Porto de Manguinhos e Cabo de São Tomé, formado por sucessivas cristas de praia quem marcam o contínuo avanço do continente sobre o mar; (b) litoral retrogradante, entre o Cabo se São Tomé e Macaé, onde um cordão arenoso transgressivo vem caminhando em direção ao continente, truncando lagunas costeiras e antigos sistemas de cristas de praia associados ao antigo curso do rio Paraíba do Sul (evidenciado por numerosos peleocanais). O litoral progradante, que forma o delta atual do rio Paraíba do Sul, é caracterizado por uma planície com sistemas de cristas de praia que mostram feições morfológicas contrastantes, denotando uma dinâmica progradacional distinta ao norte e ao sul da desembocadura fluvial (figura 7). Ao norte do rio, a planície é formada por sucessão de cordões arenosos alongados com limites, largura e extensões variáveis, intercalados com terrenos superficialmente lamosos onde se desenvolvem lagos, pântanos e manguezais (Dias, 1981). Já ao sul do rio, a planície é formada por sucessivos cordões arenosos retilíneos e depressões alongadas (cavas) com direção geral NE-SW. A distância relativa entre as cristas é da ordem de 100 a 150m e a distância entre a cava e o topo da crista varia em média entre 2 a 3m (Dias e Gorini, 1980). Esse setor é caracterizado por sistemas de cristas separadas entre si por discordâncias evidenciadas por truncamentos da direção geral dos cordões arenosos, marcando escalonamentos (degraus) entre os sistemas.

26 Figura 7. Detalhe da planície costeira nas proximidades da foz atual do rio (Martin et al. 1984). Dias e Gorini (1980) e Dias (1981) registraram 7 desses sistemas de cristas de praia que são restritos ao norte da planície (Figura 8). Na porção mais interna, onde o rio sofre uma inflexão para leste, são reconhecidos 4 sistemas irregulares separados por discordâncias, que podem corresponder a uma faixa pantanosa na planície ao norte do rio. Os sitemas V, VI e VII se desenvolvem a partir do trecho em que o rio apresenta seu curso retilíneo. Em direção ao sul, os prolongamentos das discordâncias não são muito evidentes em função da orientação paralela dos cordões arenosos.

27 Figura 8 Mapa da planície deltaica do Rio Paraíba do Sul mostrando os 7 sistemas de cristas de praia interpretados por Dias e Gorini (1980) e Dias (1981). Com base no mapa de Dias e Gorini (1980), Bastos e Silva (1996) fizeram uma nova interpretação com base em fotografias aéreas e reconheceram 9 sistemas ao invés dos 7 propostos anteriormente (Figura 9).

28 Figura 9 - Mapa de fotointermpretação mostrando os 9 sistemas distintos de cristas de praia identificados por Bastos e Silva (1996). As praias ao sul e ao norte da desembocadura também apresentam uma morfologia diferente. Ao sul da desembocadura, na região de Atafona, a praia apresenta características morfodinâmicas intermediárias, composta de areia média e com alto índice de mobilidade, provavelmente decorrente de uma convergência de ortogonais neste ponto acarretando em processos erosivos (Bastos, 1997). Após cinco anos de levantamentos, Bastos (1997), observou que a linha de praia recuou cerca de 37m estimando-se uma taxa de recuo de 7 a 8m/ano para a região da foz, na localidade de

29 Atafona. Esse mesmo autor notou que apesar de ter havido uma grande variação volumétrica ao longo de sua pesquisa, não houve uma tendência à ganho ou perda de sedimentos. O caráter erosivo da praia de Atafona pôde ser mapeado até cerca de 2500m ao sul da foz (Bastos, 1997) e é claramente evidenciado pela destruição de propriedades que se encontravam junto ao campo de dunas na região próxima à desembocadura. Em direção ao sul Bastos (1997) verificou um aumento na granulometria e consequentemente aumento da declividade da praia que passa a características refletivas. Apesar de não haver trabalhos morfodinâmicos da praia ao norte da desembocadura do rio, pudemos constatar, através de observações visuais realizadas durante a obtenção dos dados para a realização desse trabalho, que esta possui características refletivas, com alta declividade e composta de areia grossa em sua face de praia e areias muito finas na shoreface. 3.3 Características morfológicas da frente deltaica Junto à foz do rio, podemos observar a presença de esporões e barras submarinas, que ao crescerem até a superfície se transformam em ilhas barreiras (Figura 7). De acordo com Dias et al. (1984a) a formação dessas feições estaria associada à intensa dinâmica de sedimentação nessa região. De tempos em tempos, um esporão arenoso é formado na desembocadura fluvial, tendendo a fechá-la. A construção desse esporão é acompanhada pela erosão do litoral adjacente à cidade de Atafona (Figura 7), onde a linha de praia recuou cerca de 100m no período de 1956 a 1976 (Martin et al. 1984). Em épocas de cheia do rio essa feição pode ser totalmente erodida pela forte corrente fluvial (figura 10).

30 Figura 10 Modificações morfológicas na foz do rio Paraíba do Sul entre os anos de 1956 e 1979 (Dias, 1981). Os depósitos prodeltaicos na plataforma rasa adjacente ao rio Paraíba do Sul são de pequena importância em comparação com os rios Doce e São Francisco, uma vez que eles não ultrapassam a isóbata de 10m (Araújo et al., 1975). Para Dias (1981) a inexistência de depósitos prodeltaicos mais conspícuos é função da alta energia das ondas e correntes atuantes na área.

31 Um lobo deltaico submerso se dispõe simetricamente em relação ao eixo do rio, incorporando-se progressivamente ao litoral adjacente em ambos os lados da foz (Dias et al.,1984a). Esse lobo apresentaria a extremidade superior limitada pela isóbata de 2m, aproximadamente, e uma parte frontal com declividade bastante acentuada (3% no seu ápice, em frente a foz do rio e 0,5% nas partes laterais). Sua base se encontra à profundidades de 8 a 9m na porção frontal e 4 a 5m nas laterais (figura 11). Figura 11. Mapa da distribuição de sedimentos do lobo deltáico do rio Paraíba do Sul (Dias et al. 1984a). A distribuição sedimentar observada na parte submarina rasa adjacente mapeada por Dias et al. (1984a) (figura 11) sugere a existência de uma seqüência deltaica tipicamente progradante (figura 2), com areias grossas a médias na camada superior, recobrindo areias finas, siltes micáceos e lamas prodeltaicas.

32 Essa seqüência estratigráfica regressiva foi também observada na planície costeira através de sondagens realizadas por Dias et al. (1984b). Esses autores revelaram que o prisma sedimentar da planície costeira do rio Paraíba do Sul pode ser dividido nas seguintes seqüências da base para o topo (figura 12): seqüência (I) constituída por sedimentos argilo-arenosos do Grupo Barreiras; seqüência (II) constituída por sedimentos lamosos na base, recobertos por areias quartzosas com elevado teor de carbonatos (algas calcáreas); seqüência (III) constituída por sedimentos argilosos na base, recobertos por siltes micáceos e areias quartzosas litorâneas. Os sedimentos da seqüência (II) podem caracterizar uma seqüência transgressiva, formadas por areias marinhas (areias relíquias) recobrindo depósitos de lagunas e pântanos. A Seqüência (III) é tipicamente deltaica, composta por lamas e siltes prodeltaicos, com microfauna marinha, sotapostas a areias quartzosas da frente deltaica propriamente dita. Um fato interessante observado no trabalho de Dias et al. (1984b) foi a grande coincidência entre as espessuras das camadas observadas nas sondagens e as profundidades de ocorrência dos respectivos sedimentos no fundo marinho adjacente. Figura 12 Perfil estratigráfico da planície de cristas ao lobo deltaico (modificado de Dias et al. 1984b).

33 3.4 Características morfológicas e sedimentares da plataforma continental A evolução geomorfológica da plataforma continental adjacente à planície costeira do Rio Paraíba do Sul está associada com as mudanças do nível do mar no quaternário, as quais controlaram as ações de processos fluviais e marinhos e também o desenvolvimento de vários ambientes sedimentares (Bastos e Silva, 2003). A largura máxima da plataforma continental é de aproximadamente 120Km em frente à cidade de Macaé, com topografia suave e declividade de 1:2.900 e quebra na profundidade de 150m (Silva, 1987). Entre Macaé e o cabo de São Tomé as isóbatas apresentam um caráter regular, aparecendo razoavelmente paralelas entre si e acompanhando o contorno da linha de costa. Em frente ao cabo de São Tomé, encontramos um banco submarino nas profundidades de 10 a 15m, estendendo-se perpendicularmente à costa por aproximadamente 21 km sendo denominado de Banco de São Tomé. De acordo com Silva (1987) esse banco representaria um shoal retreat massif que baseado no modelo de Swift et al. (1972), estaria associado à convergência de direções de deriva litorânea ao longo de linhas de costa retrogradantes. Ao norte do Cabo de São Tomé ocorre uma mudança na direção da linha de costa, que passa a ser NNW-SSE, e um alargamento da plataforma continental interna compreendida até a isóbata de 30m. A plataforma interna ao largo do litoral, entre Cabo de São Tomé e a foz do Rio Paraíba do Sul, é caracterizada por uma morfologia relativamente plana com baixo gradiente, em torno de 1:2200 (Bastos e Silva, 2003). Podemos observar nessa região a presença de um paleocanal denominado Canal de Grussaí. Essa feição conspícua possui orientação NW-SE e é delimitada pelas isóbatas de 15 e 20m. Após isóbata de 30m as linhas isobatimetricas se aproximam mostrando um aumento do gradiente.

34 Bastos (1997) sugere que a linha isobatimétrica de 30m representaria uma paleolinha de costa do Cabo de São Tomé até Itapemirim e que a extensa plataforma interna observada hoje, corresponderia a uma antiga planície costeira. O paleocanal de Grussaí estaria associado ao Rio Paraíba do Sul em época de nível do mar mais baixo. De acordo com Alves e Ponzi (1984), a plataforma continental compreendida entre Itabapoana e Cabo Frio é dominada por uma sedimentação terrígena, apresenta feições deposicionais do tipo bancos, ondas de areias (sand waves) e escarpas arenosas (localizadas entre 30/50 e 90/100 metros de profundidade), interpretadas como paleolinhas de costa decorrentes de estabilização do nível do mar durante o Holoceno. A caracterização da cobertura sedimentar realizada por Alves e Ponzi (1984) apresentou dois domínios distintos, um terrígeno na plataforma continental interna e média e outro carbonático na plataforma externa. A sedimentação terrígena mapeada por esses autores, desde Cabo Frio até Itabapoana, é constituída principalmente de areias quartzosas de granulometria média, baixo percentual carbonático (5-25%), grau de selecionamento moderado, grãos de subangulosos a subarrendondados e com textura superficial variando de polida a oxidada, sendo, portanto semelhantes às areias das cristas de praia existentes na área continental adjacente. Já o domínio carbonático está representado por nódulos, cascalhos e areias biodetríticas resultantes de algas calcáreas nodulares e ramificadas, associadas em menor escala por moluscos e briozoários. Areias granulometricamente finas, bem selecionadas, com vestígios de oxidação e elevado teor cabonático (46%) também foram mapeadas pelos autores citados anteriormente nas proximidades da foz do rio Paraíba do Sul. Nas imediações do banco submarino de São Tomé, também ocorrem areias finas bem selecionadas, mas com grãos límpidos e distribuídos transversalmente à linha de costa.

35 3.5 Oceanografia Regional O padrão climático da área de estudo é caracterizado por ventos predominantes de NE e penetração de massas de ar polar (frentes frias) com baixas temperaturas, chuvas e ventos fortes de S e SE (Muehe e Corrêa, 1989). A linha de costa apresenta um regime de micromaré, alcançando 1.3m na maré alta de sizígia e 0.3m na maré quadratura. Dados coletados na profundidade de 110m mostraram que as ondas oriundas de NE são predominantes ao longo do ano com uma altura significante de 1.8m e período de 8 segundos (Souza, 1988). As ondas de SE e S associadas às frentes frias, sendo assim comuns no inverno, alcançam altura de 4.5m. A altura média de quebra das ondas que atingem a costa é de 1m e período de 5 a 8s. Apesar da predominância das ondas de NE, observa-se que as ondas de SE e S concentram mais energia (Muehe e Correa, 1989) Taxas de transporte de sedimentos foram calculados em 8 diferentes pontos ao longo do litoral de Barra do Furado até Itabapoana por Cassar e Neves (1993), usando basicamente a teoria de refração de ondas. Taxas médias de transporte anual mostram diferentes compartimentos ao longo da costa (figura 13): (a) transporte longitudinal divergente na desembocadura do rio Paraíba do Sul; (b) transporte de sedimentos para sul de Atafona a Cabo de São Tomé; e (c) transporte para norte de Barra do Furado a Barra do Açu; entretanto um decréscimo significante no transporte de sedimentos pode ser observado, significando que durante o ano, existem mudanças significantes na direção do transporte longitudinal.

Figura 13 Mapa de comportamento morfodinâmico, ressaltando os principais parâmetros morfométricos e hidrodinâmicos dos diferentes setores morfodinâmicos do litoral (retirado de Bastos e Silva, 2000). 36

37 3.6 A evolução do sistema deltaico do rio Paraíba do Sul A evolução da planície costeira do rio Paraíba do Sul esteve associada a processos tipicamente fluviais (do próprio rio Paraíba do Sul) e marinhos (efeitos da variação do nível do mar no Quaternário) juntamente com uma tectônica favorável ao desenvolvimento de espessos prismas sedimentares (Silva, 1987). As variações do nível do mar no litoral leste brasileiro durante o quaternário são bem conhecidas graças aos inúmeros trabalhos desenvolvidos (Suguio et al. (1980, 1985), Martin et al. (1980a, 1982, 1984, 1985), Dominguez et al. (1981), Bittencourt et al. (1982). Esses atores por meio de mapeamento geológico de detalhe e datações com C14 reconheceram testemunhos importantes de dois níveis marinhos altos durante o quaternário, um há aproximadamente 120.00 anos, tento atingido 8±2 m acima do nível atual e outro há aproximadamente 5.100 anos antes do presente, quando atingiu 4 a 5m acima do nível atual. Lamego (1955) propôs o primeiro esquema evolutivo para o complexo deltáico do rio Paraíba do Sul. Foram propostas quatro fases: Fase I Formação de delta do tipo Mississipi durante o holoceno antigo, ocupando o paleocanal existente entre Campos e São Tomé. Duas grandes baías foram formadas, a Lagoa Feia ao sul e a de Campos ao norte. Fase II - Tem início quando o rio Paraíba penetra na baía de Campos, formando um delta do tipo Ródano, onde o rio, além do canal principal, possui vários braços que foram responsáveis pelo assoreamento do canal antigo. Fase III Formação de um terceiro delta do tipo Paraíba através do avanço do rio por sucessivas restingas paralelas. O crescimento destas restingas se deu lateralmente, apoiando-se nas falésias do Barreiras ao norte e no cabo de São Tomé ao sul e na própria desembocadura do rio. Fase IV Correntes costeiras e ondas retrabalham o material do fundo da baía da Lagoa Feia, formando a sucessão de restingas existentes a SW de São Tomé, fechando, assim, a baía e deixando como testemunho a lagoa Feia.

38 Dominguez et al. (1981), baseados nas curvas de variação do nível do mar, traçaram um esquema evolutivo das feições deltaicas dos rios São Francisco, Jequitinhonha, Doce e Paraíba do Sul. Esse esquema pode ser resumido na figura 14. Com base nesse modelo, Martin et al. (1984) descreveram quatro fases evolutivas para as planícies costeiras brasileiras do litoral desde Macaé até Maceió. Essas fases são: Fase I- Há cerca de 120.000 anos A.P., correspondendo ao máximo da penúltima transgressão, o nível do mar estaria a 8 ± 2 m acima do atual. Nesta fase, a planície costeira não existia e os vales entalhados nos depósitos do Grupo Barreiras ou nas rochas do embasamento foram invadidos pelo mar, desenvolvendo-se numerosas lagunas. A ingressão máxima do mar é marcada por uma linha de falésias nos depósitos do grupo Barreiras. Fase II Após 120.000 anos A.P., o nível do mar inicia a descida, com a construção de terraços arenosos recobertos por cordões litorâneos. Ao norte e ao sul esses terraços estão diretamente encostados nos sedimentos do Grupo Barreiras. À medida que ocorria o abaixamento do nível relativo do mar, instalava-se uma rede hidrográfica sobre a planície costeira. Fase III A partir de 18.000 anos A.P. (máximo da última glaciação quaternária no hemisfério norte), o nível do mar começa uma subida muito rápida. No decorrer dessa fase transgressiva, a maior parte da planície costeira pleistocênica foi destruída. A partir de 7.000 anos A.P., iniciou-se a formação da planície costeira holocênica, pelo assoreamento parcial de uma vasta paleolaguna separada do mar aberto por ilhas barreiras. Evidentemente, as ilhas barreiras daquela época deveriam localizar-se em posição mais externa, tendo atingido a sua posição final por volta de 5.000 anos A.P.. As zonas baixas do Grupo Barreiras e os vales escavados nos terraços pleistocênicos foram, nesta fase, invadidos pelo mar, formando várias lagunas alongadas. Fase IV A partir de 5.100 anos A.P., o abaixamento do nível relativo do mar foi acompanhado pela transferência de areias da plataforma interna para a praia. Essas areias foram retrabalhadas pelas correntes de deriva litorânea, tendo contribuído na construção dos terraços arenosos holocênicos. O ressecamento parcial da extensa laguna, cujo testemunho atual é a Lagoa Feia, ocorreu não somente pelo abaixamento do nível do mar, mas também pelo aporte fluvial do rio Paraíba do Sul, que nessa época despejava seus sedimentos na paleolaguna, constituindo um delta intralagunar. Entretanto, é