Cabelos: uma Contextualização no Ensino de Química



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PIBID UNICAMP PROGRAMA INSTITUCIONAL DE BOLSAS DE INCENTIVO À DOCÊNCIA SUBPROJETO QUÍMICA 2013 Cabelos: uma Contextualização no Ensino de Química Por Vicente Gomes Oliveira Por que abordar esse tema? Um dos grandes desafios para professores de Química tem sido transpor, de forma adequada, os conteúdos escolares propostos. Conduzir os alunos a um aprendizado significativo não é tarefa simples e estratégias que possam colaborar com esse processo são sempre bem vindas. A contextualização no ensino vem sendo defendida por diversos educadores e pesquisadores como um recurso motivador e que, portanto, tem potencial para provocar a adesão tão esperada e necessária dos alunos. Segundo documentos oficiais como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNEM), [...] utilizando-se a vivência dos alunos e os fatos do dia-a-dia, a tradição cultural, a mídia e a vida escolar, busca-se construir os conhecimentos químicos que permitam refazer essas leituras de mundo, agora com fundamentação também na ciência. Para tanto, ainda segundo o documento, é requerida do professor, uma visão mais abrangente e interdisciplinar de tudo o que acontece ao seu redor, maior pesquisa e uma formação continuada que forneça novos artifícios ao trabalho desenvolvido pelo professor. No Ensino Médio e na Educação de Jovens e Adultos (EJA), pensou-se em abordar a cosmética do cabelo como contexto que desperta o interesse dos alunos para o aprendizado. Podem ser explorados conceitos como tensoativos, interações intermoleculares, proteínas, sais orgânicos, bem como propostas de debate em torno de questões como o uso de formol e amônia em salões de beleza e a participação de mercado e mídia de produtos para cabelo. Entendendo a Fisiologia do Cabelo A fibra de cabelo é uma proteína, ou seja, um polímero biológico composto de aminoácidos unidos por ligações peptídicas. (a) (b) Figura 1. Representação de (a) Monômero, unidade básica de repetição; e (b) Polímero

Existem apenas 20 aminoácidos essenciais, que são produzidos naturalmente, e que atuam como monômeros. Todas as proteínas existentes são diferentes combinações desses 20 aminoácidos, em diferentes sequências e quantidades. A ligação estabelecida entre os aminoácidos é chamada de ligação peptídica. Figura 2. Os 20 aminoácidos essenciais, que compõe as proteínas. No caso da fibra capilar, encontramos proteínas específicas com alta cristalinidade, denominadas α-queratina. Recebe este nome pois sua estrutura possui forma de α-hélice, como mostra a Figura 3. Esta estrutura espiralada é mantida devido a ligações de hidrogênio estabelecidas entre o hidrogênio e oxigênio dos grupamentos N-H e C=O, respectivamente, situados a quatro aminoácidos de distância.

R = CH 2 -SH no caso da cisteína Figura 3. Estrutura de α-queratina assumida pela queratina. Observe que o aminoácido cisteína, na Figura 2, possui uma cadeia lateral (em azul) com o grupamento CH 2 -SH. Este grupamento ocuparia o lugar de R na Figura 3. Repare que estas cadeias laterais ficam apontadas para fora da α-hélice. Uma característica da α-queratina comparada a outros tipos de proteínas é o grande conteúdo de enxofre (S) presente nos resíduos de cisteína. Quando duas ou mais α-hélices estão próximas, as cadeias laterais dos aminoácidos de diferentes proteínas criam ligações covalentes enxofre-enxofre, difíceis de serem rompidas, chamadas de ligações dissulfeto. Outros tipos de interações podem ocorrer, como mostra a Figura 4 abaixo, e são essas interações que conferem estabilidade e grande resistência mecânica aos fios de cabelo. Figura 4. Interações entre cadeias laterais de aminoácidos. Representam, de cima para baixo: interação entre dois anéis fenilas; ligação de hidrogênio; interação eletrostática (ligação iônica); ligações dissulfeto; e ligação peptídica. As α-queratinas se entrelaçam e interagem formando um filamento. Vários destes filamentos se alinham paralelamente ao comprimento do fio, formando macrofibrilas. Por fim, várias macrofibrilas são envolvidas por uma matriz amorfa,

formando a maior parte de um fio de cabelo cerca de 80% da massa do fio parte esta denominada córtex. No córtex, há ainda água, lipídeos, grânulos de melanina e traços de metais. O córtex é revestido por 6 a 10 camadas de células sobrepostas como escamas, o que chamamos de cutícula. A cutícula é uma barreira externa transparente que tem a função de proteger o córtex e controlar a entrada e saída de água do fio de cabelo. Todas as estruturas do cabelo estão aderidas por um material amorfo, um cimento que chamamos de complexo da membrana celular. Filamento Macrofibrila Complexo da Membrana Celular Córtex Cutícula Figura 5. Constituintes da fibra capilar Os cuidados com a cutícula do cabelo irão se refletir na penteabilidade, pontas duplas, brilho e aparência geral do cabelo, por ser a camada mais externa do fio. Como o córtex é a parte mais encorpada do fio, será responsável por características como a forma e cor. Crescimento e Queda de Cabelo O fio de cabelo está situado em tecido vivo: o bulbo ou folículo capilar. Este tecido é nutritivo e promove a multiplicação e diferenciação das células, formando o cabelo como uma haste que aumenta de tamanho, com células que vão se renovando de baixo para cima e morrem na ponta do fio, ao saírem do bulbo. Figura 6. Representação do Couro Cabeludo Nosso cabelo cresce, em média, um terço de milímetro por dia, mas esse crescimento não é um processo contínuo. Cada fio do couro cabeludo cresce no

intervalo de 4 a 6 anos, interrompe o crescimento por aproximadamente 20 dias e, a seguir, cai. Em seu lugar, começa a nascer um novo fio e o ciclo se repete. Como os fios do couro cabeludo estão em fases diferentes desse ciclo, a perda de aproximadamente 100 fios de cabelo por dia é considerada normal. Inicialmente há o crescimento das células matriciais e a preparação do bulbo, na fase anágena. Quando se atinge o ápice de crescimento de células do bulbo, estamos na fase metágena, e há produção de melanina. Na fase catágena, há apenas a produção de proteínas, permitindo o crescimento do fio. A última fase do ciclo é a telógena, em que o cabelo é expulso e o bulbo permanece em repouso. A partir daí, começa um novo ciclo de crescimento. Nos homens, o principal fator de perda dos cabelos é devido à alopecia androgenética que provoca queda de cabelo crônica e difusa, podendo ter inicio já por volta dos 17 ou 18 anos, com uma significativa queda diária dos fios. Já nas mulheres, os fatores da calvície também podem ser hereditários, e devido ao uso excessivo de produtos e tinturas nos cabelos, problema de tireóide, anemia, pílulas anticoncepcionais, estresse, entre outros. Descoloração e Tingimento A coloração natural dos cabelos é determinada pelos grânulos de melanina presentes na região do córtex. A melanina (a mesma encontrada na pele) também é responsável pela fotoproteção da fibra contra a radiação ultravioleta que recebemos diariamente pelo sol. Existem dois tipos de melaninas: as eumelaninas, que conferem uma coloração marrom a preta, e as feomelaninas, de coloração avermelhada. As diferentes proporções e dispersões dessas melaninas são responsáveis pela grande variabilidade de colorações conhecidas para os cabelos naturais. Em procedimentos estéticos, quando se deseja pintar o cabelo com uma cor mais clara que este já possui, é necessário fazer uma descoloração, envolvendo agentes oxidantes. A água oxigenada dissolve os grânulos de melanina e o clareamento é intensificado pelo íon perssulfato, presente em pós descolorantes. A tintura permanente atua no córtex, difundindo para dentro dele os precursores de pigmentos que irão se polimerizar dentro do fio, adquirindo um tamanho que impede a sua saída. A cutícula não é colorida, permanece transparente. Quando os fios crescem, o trecho mais recente do cabelo é a raiz, que possuirá a coloração natural dos cabelos dada pela melanina, sendo portanto necessário retocála. Existem ainda as tinturas temporárias ou semipermanentes (por exemplo, acetato de chumbo) cuja formulação possui compostos de alta massa molar que irão penetram parcialmente no córtex ou apenas se depositar na superfície da cutícula, saindo após algumas lavagens.

Alisamento Térmico e Químico Quando se deseja tornar o cabelo mais liso, é necessário aumentar o raio de curvatura dos fios. Isto pode ser conseguido por alisamento térmico ou químico. A primeira maneira é o caso das chapinhas e escovas. O calor fornecido (energia térmica) é capaz de quebrar algumas interações moleculares, desmanchando as estruturas de α-hélices no córtex. Dizemos que a queratina foi desnaturada, e passa a assumir uma nova forma, denominada folha-β-pregueada. Figura 8. Estrutura de Folha β Este fenômeno é conhecido como transição α β-queratina e é responsável pela maior mobilidade e fluidez das proteínas do cabelo, deixando-os lisos. Com o aumento da umidade, recuperam-se as ligações originais e as proteínas retornam a forma de α-hélice. O alisamento é temporário pois a desnaturação protéica é um processo reversível. Você certamente já deve ter ouvido falar de chapinhas com íons negativos. Neste caso, como as proteínas possuem várias cadeias laterais com cargas positivas (reveja a Figura 2), íons negativos diminuem repulsões eletrostáticas responsáveis pelo frizz do cabelo, e selam as cutículas minimizando a entrada de água. Outra maneira de se obter cabelos lisos, o alisamento químico, consiste em fazer as mesmas alterações nas estruturas proteicas do córtex, porém, quebrando as interações intermoleculares por oxirredução e reorganizando-as. Inicialmente reduz-se a queratina em meio básico (hidróxido de sódio, hidróxido de lítio, amônia, tioglicolato de amônio ou guanidina) com um agente redutor (grupo mercaptano ou sulfeto), rompendo as ligações dissulfídicas. Após, realiza-se a neutralização para cessar a redução da queratina, empregando-se uma solução ácida (ácido tioglicólico) e um agente oxidante (peróxido de hidrogênio), reestabelecendo novas interações dissulfídicas organizadas em folha-β. Então, faz-se a impermeabilização do cabelo (formol, glutaraldeído) para evitar que ocorra a

conversão da estrutura β em α. Este processo é mais efetivo e portanto tem maior durabilidade. H 2 O 2 NH 4 OH HSCH 2 COO - NH 4 + Água Oxigenada ou Peróxido de Hidrogênio Formol, Metanal, ou Formaldeído Amoníaco ou Hidróxido de Amônio Persulfato de Amônio Tioglicolato de Amônio Glutaraldeído ou pentan-1,5-dial NaOH Hidróxido de Sódio NH 3 Amônia Guanidina HSCH 2 CO 2 H Ácido Tioglicólico (grupo mercaptano) Figura 9. Quadro de fórmulas das principais substâncias aplicadas nos cabelos A legislação sanitária permite o uso de formol, glutaraldeído e amônia em produtos cosméticos capilares em concentrações máximas de 0,2%, 0,1% e 6% respectivamente, durante a fabricação do produto, somente. A adição destes produtos químicos ou qualquer outra substância a um produto acabado, pronto para uso, constitui infração sanitária, estando os estabelecimentos e profissionais que adotam esta prática sujeito às sanções administrativas, cíveis e penais cabíveis. A má manipulação e a exposição a esses produtos podem causar irritação, coceira, queimadura, inchaço, descamação e vermelhidão do couro cabeludo, queda do cabelo, ardência e lacrimejamento dos olhos, falta de ar, tosse, dor de cabeça, vômitos, desmaios, feridas na boca, narina e olhos e câncer nas vias aéreas superiores, podendo até levar a morte. Fixadores Gel de cabelo ou sprays para modelagem são produtos que ajudam a modelar os fios de cabelo, mas não afetam sua estrutura. Basicamente, são dispersões coloidais que possuem uma viscosidade alta o suficiente para manter os fios imóveis conforme a forma aplicada fisicamente. Geralmente apresentam polímeros e copolímeros em sua composição, como o poli(acetato de vinila) ou PVA, poli(vinil pirrolidona) ou PVP, poliuretana e siliconas. Xampús e Condicionadores As glândulas sebáceas situadas no couro cabeludo, como mostrou a Figura 6, produzem um óleo, ou sebo, que envolve as cutículas. A maior parte da sujeira do cabelo se adere neste sebo, e portanto, a maneira mais eficaz de se lavar os cabelos é removendo a camada de gordura.

Porém, sabemos que a gordura é apolar enquanto a água é polar, de forma que o enxágüe com água não será suficiente para remover o sebo. É necessário o uso de uma molécula que possua uma parte apolar, que interaja com a gordura, e uma parte polar, que interaja com a água, para que então o enxágüe possa arrastar o sebo junto à água. Estas moléculas características que possuem uma parte polar e uma parte apolar são chamadas de surfactantes. Elas são encontradas nos sabões, detergentes, xampus e condicionadores. O sebo apolar, que chamaremos de hidrofóbico por não possuir afinidade pela água, tentará minimizar o seu contato com esta. Assim, as moléculas de surfactante formam uma estrutura tridimensional que aglomera em seu interior a parte apolar e em seu exterior expõe-se as partes polares, como mostra a Figura 10. Com surgimento dessas estruturas, pode haver incorporação de ar e levar à formação de bolhas e espuma. Água (Polar) Gordura (Apolar) Cauda Apolar (Hidrofóbica) Cabeça Polar do Surfactante Figura 10. Representação de uma Micela Durante a fabricação de alguns xampus utiliza-se como ingrediente bases fortes, como mostra a reação de saponificação da Figura 11a. Os surfactantes empregados também apresentam características básicas. Isso faz com que algumas formulações apresentem um ph (medida da acidez e basicidade de um material) acima de 7 (básico). O ph natural do cabelo está numa faixa de 4 e 5 (ácido), e essa acidez deve-se à produção de ácidos graxos pelas glândulas sebáceas. Assim, o uso de determinados tipos de xampus pode produzir alterações no ph do cabelo. (a) (b) Figura 11. (a) Reação de Saponificação para produção de um sal orgânico, que atua como surfactante; (b) exemplo de surfactante aniônico, o palmitato de sódio.

Em soluções muito ácidas, as ligações de hidrogênio e interações eletrostáticas são desfeitas, pois protona-se os grupos carboxilas e carbonilas nas cadeias de proteínas, danificando o cabelo, tornando-o quebradiço. Em soluções levemente básicas, algumas ligações dissulfeto são rompidas e observa-se danos à cutícula, que se torna mais áspera, deixando o cabelo sem nivelamento, tornando-o opaco e gerando pontas duplas ou múltiplas. Se o meio estiver fortemente alcalino, todos os tipos de ligações podem ser quebrados, ocasionando eventuais quedas de cabelos. Este é o princípio dos cremes depilatórios. Portanto, o ph do cabelo deve ser mantido entre levemente ácido à neutro. A maior parte dos xampus atuais são balanceados, ou seja, contêm em suas formulações ingredientes ácidos cuja função é manter o ph do cabelo lavado próximo de seu ph natural. Este efeito é obtido, por exemplo, adicionando-se à formulação do xampu o ácido cítrico. Existem vários surfactantes de uso comercial e que são empregados nas formulações de cosméticos capilares. A maioria deles possuem cargas negativas na cabeça polar e são empregados em diferentes misturas e concentrações para cada tipo de cabelo. Já os surfactantes carregados positivamente aderem aos fios dos cabelos formando uma camada uniforme de forte atração pela água, deixando os fios mais úmidos, reduzindo a fricção entre os fios e, conseqüentemente, a eletrização estática. Desta maneira, cabelos ficam mais macios e fáceis de pentear e portanto esse tipo de surfactante é empregado nos condicionadores e demais cremes. Há ainda detergentes sintéticos anfóteros (cargas positivas e negativas) ou sem carga, que possuem a propriedade de não irritar os olhos, além de formarem uma quantidade moderada de espuma. Por esta razão, são usados nos xampus para bebês, apesar de serem mais caros. Artifícios de marketing buscando criar vantagem competitiva para os produtos podem ser observados. Baseado na crença popular de que a água do mar aliada à exposição à radiação ultravioleta danifica o cabelo, acreditava-se que o sal teria efeito maléfico aos fios. Surgiram então os produtos rotulados sem sal. Porém, estes produtos são isentos de cloreto de sódio (sal de cozinha), que antes era adicionado por ser espessante e estabilizante de emulsões. Este foi apenas substituído por cloreto de potássio ou derivados, que em nada interferem nos fios (apenas na emulsão), além dos surfactantes presentes em todas as formulações, que são sais orgânicos! Considerações Finais O cabelo é muito valorizado e sua importância ultrapassa o universo da estética. Comprimentos longos podem ter um significado religioso ou, como em alguns povos na antiguidade, ser símbolo de poder e força. Em certas comunidades religiosas, raspar a cabeça é um sinal de renúncia às coisas materiais e vaidades do mundo, pelo

fato de se desfazer de um atributo estético muito precioso. Atualmente, tribos urbanas ou grupos de mesma afinidade possuem uma identidade visual ou mesmo um estereótipo que são até mesmo forma de expressão. Podem ser relacionados ao sucesso, à vaidade e a auto-estima do indivíduo. Através dos tempos, a importância e o significado social dos cabelos têm se mantido mais ou menos inalterados. Até mesmo em alguns outros mamíferos, cuja finalidade dos pêlos é a proteção, pode se observar o quanto a pelagem é importante para sua auto-estima e beleza. Especialmente na faixa etária de alunos do Ensino Médio ou da Educação de Jovens e Adultos, este é um assunto de interesse por estar inserido no cotidiano. Muitos alunos estão em uma fase de afirmação pessoal, relacionamentos, grande preocupação com a aparência física e estilo. E no caso da EJA, parte dos alunos exerce profissões em que utilizam e manuseiam esses produtos, sem muitas vezes ter noção da toxicidade à exposição prolongada de produtos como formol, amoníaco e derivados, que podem inclusive causar queda de cabelo. O Brasil é um dos maiores mercados do segmento de cosméticos capilares. Em 2007 o mercado mundial de cosméticos cresceu 6% em relação a 2006, sendo o Brasil o país que mais contribuiu para este crescimento, estando em primeiro lugar no ranking das indústrias cosméticas. Até 2008 a indústria cosmética brasileira apresentou crescimento médio de 10,6 % contra 3,0 % do PIB total, e 2,9 % obtido pela indústria geral nos últimos 13 anos. Muitas vezes criam-se necessidades até então inexistentes para os consumidores, com os produtos considerados inovadores, empregando muitas vezes conceitos e fórmulas para ilustrar os benefícios que muitas vezes não correspondem a um efeito aparente significativo. Mesmo assim, consumidores coagidos pelo padrão de beleza apreciado pela sociedade vêem nestas inovações meios de se sentirem aceitos. Tendo todo este cenário em vista, por que não fazer deste tema uma forma de contextualizar a Química? Cada vez mais se espera que o professor possa repensar maneiras tão tradicionais de abordar os conteúdos, e utilizar deste texto como subsídio para informação e atualização é um caminho para novas abordagens. Quanto mais diversificado o contexto de utilização do conteúdo científico a que o professor tenha acesso, mais preparado estará esse profissional para atender alunos com diferentes profissões e interesses. Vimos diferentes phs, vimos que alisar o cabelo nada mais é que romper ligações intermoleculares, que tingir é fazer uma polimerização dentro do fio, que lavar o cabelo é utilizar-se dos mesmos princípios de um detergente, uma molécula com uma parte polar e outra apolar. Todos esses são assuntos que permeiam os parâmetros curriculares, e podem ser mostrados de forma que prepare o aluno como consumidor e cidadão que é capaz de entender noções de ciências, tecnologia e sociedade.

Referências Bibliográficas BARBOSA, A. B.; SILVA, R. R. Xampus. Química Nova na Escola, nº 2, Nov/1995. BRASIL, MEC. Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio. 2000. NOGUEIRA A.C.S.; JOEKES I. Hair color changes and protein damage caused by ultraviolet radiation. Journal of photochemistry and photobiology, B:74 (2004) 109-117. POPESCU, C.; HÖCKER, H. Hair: the most sophisticated biological composite material. Chemical Society Reviews, 36 (8), 1282 91, 2007. RICHENA, M. Alterações nos Cabelos não Pigmentados Causadas por Radiação Ultravioleta, Visível e Infravermelha. Mestrado, 2011, Unicamp. ROBBINS, C. R. Chemical and physical behavior of Human Hair. 5th ed. New York: Springer, 2012. SILVA, E. L. Contextualização no ensino de Química: idéias e proposições de um Grupo de Professores. Tese de mestrado, IQUSP, 2007. SOUZA, E. S.; AZEVEDO, M. G. B.; FONSECA, M. G. Química do Cabelo como Tema Gerador de Conhecimento de Química. XIV ENEQ, 2007. SOUZA, M. L. T.; BOTTECHIA, J. A. A. A Química do Cabelo de Afrodescendentes como Tema Gerador de Conhecimento em Aulas do Ensino Médio: Ciência e Cultura para o Enfrentamento da Pobreza. 64ªSBPC, 2012. VELASCO, M. V. R.; BALOGH, T. S.; GAMA, R. M.; VILLA, R. T.; BEDIN, V.; BABY, A. R. Abordagem de tinturas permanentes, semi-permanentes e temporárias. USP, 2010. Agradecimentos Profa. Silvana Zanini (Supervisora) Profa. Dra. Adriana Vitorino Rossi (Orientadora)