Curso básico de identificação de aves estepárias



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1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Curso básico de identificação de aves estepárias 1. Ferramentas básicas para a observação de aves: algumas considerações As ferramentas mais importantes para a observação de aves são os binóculos e o guia de campo, para além dos olhos e dos ouvidos. A visão e a audição indicam-nos em que direcção olhar, os binóculos permitem-nos fazer uma observação mais detalhada, e o guia de campo permite-nos identificar o individuo que estamos a observar. 1.1. Binóculos De entre todos os aspectos a considerar aquele que tem mais importância é a adequabilidade dos binóculos ao observador. Caso os binóculos não sejam adequados não vai poder observar convenientemente e portanto desfrutar desta actividade. É importante experimentar os binóculos antes de os comprar! Enquanto experimenta os binóculos deve fazer estas perguntas a si próprio: É adequado aos meus olhos? È adequado á minha face? É adequado às minhas mãos? Quando agarra os binóculos o meu dedo indicador não caí rápido e facilmente no parafuso de focagem? Preciso subir os cotovelos ou mudar a posição das mãos para rodar o parafuso de focagem? Se sim, então o modelo que está a experimentar não é o mais adequado para si! Se aproximar os binóculos dos olhos e não conseguir ver uma única e imagem ou a imagem está constantemente a desaparecer ( fica tudo preto ) então a distância interpupilar dos binóculos não é a adequada. 1

21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 Figura 1 Ao ajustar correctamente a distância interpupilar dos binóculos deve ver uma única imagem (como a da direita). Caso não seja possível ajustar os binóculos até ver uma única imagem, provavelmente, o design dos binóculos não é o mais adequado para si (ou então esqueceu-se de ajustar os apoios oculares). Geralmente cada binóculo tem uma fórmula binomial gravada que indica o poder de ampliação e o diâmetro da objectiva. Por exemplo: 10 50 Ou seja, o que isto significa é que o binóculo amplia a imagem em 10x (a imagem fica mais perto 10 vezes), e que a objectiva tem um diâmetro de 50 milímetros. 31 32 33 Figura 2 Esquema simples de um binóculo. 1 Apoio ocular; 2 Ocular; 3 Parafuso de focagem; 4 Objectiva. 2

34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 Para a observação de aves a ampliação ideal é: 7 ideal para observação em habitats fechados (p.e.: bosques, florestas). 10 ideal para observação em habitats abertos, por exemplo estuários, ou para observação de aves em voo a grande distância (p.e.: aves de rapina). Ou então, pode-se optar por um compromisso entre os dois poderes de ampliação: 8 ; 8.5. Deve evitar-se o uso de binóculos com zoom, porque geralmente, para a mesma gama de preços, são mais pesados, a qualidade óptica é reduzida, são mecanicamente inferiores, são mais caros que binóculos de ampliação fixa. Geralmente o diâmetro ideal da objectiva pode encontrar-se entre os 30mm e os 50mm. È importante ter em conta o seguinte: Quanto maior for o poder de ampliação, maior é a proximidade do objecto observado, é mais difícil estabilizar a imagem, o campo de visão e a profundidade de campo são mais estreitas (torna-se mais difícil encontrar as aves). Quanto maior for o diâmetro da objectiva, a imagem é mais luminosa (mesmo nas ao inicio e fim do dia), os binóculos são mais pesados (tem que transportar mais peso, e também dificulta a estabilização) e por norma mais caros. 1.2. Guias de campo Existem vários guias de campo no mercado e em vários idiomas. Todos com pontos fortes e com algumas fraquezas. Um bom guia de campo deve ter as seguintes características: Fácil de transportar (pequeno e leve) já que deve andar sempre com o observador; Prático e informativo: - Fotografias ou ilustrações a cores, acompanhadas por texto descritivo das características de cada espécie; - Mapa de distribuição para cada espécie, assim com a sua ocorrência ao longo do ano; - Descrição do habitat preferido de cada espécie; - Descrição dos chamamentos e/ou cantos. Os guias de campo aconselhados são: 3

61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 Estes guias podem ser adquiridos através das seguintes lojas, respectivamente: 1 Loja online da SPEA Sociedade portuguesa para o estudo das aves: www.spea.pt 2 Loja de História Natural online: www.lojadehistorianatural.com 1.3. O que vestir (Dica extra) Apesar da indumentária do observador de aves não ser um factor fulcral para esta actividade pode ser um factor a ter em conta, especialmente quando as espécies alvo são mais tímidas. Assim é aconselhável: - Usar roupa confortável; - Evitar o contraste de cores vivas; - Usar cores secas como o verde, o castanho ou até camuflados; - Evitar tecidos que produzam ruído quando nos movimentamos. 2. Aves estepárias 2.1. Ambiente estepário A palavra estepe deriva da palavra russa step ( степь = stip). Designa a cintura de vegetação herbácea que se estende por cerca de 8000km desde a Hungria a oeste, passado pela Ucrânia e a Ásia Central até à região nordeste da China. Contudo a designação aves estepárias é geralmente utilizada para designar as aves que ocorrem em terrenos de estrutura semelhante á verdadeira estepe eurasiática como por exemplo: Savanas africanas; Pradarias da América do Norte; Pampas da América do Sul; Semi-deserto australiana; Pseudo-estepe / Estepe cerealífera ibérica. 4

85 86 Figura 3 - Pseudo-estepe ibérica. Planícies de Castro Verde durante o Inverno. (HNL, 2013) 87 88 Existem características que são gerais a estes tipos de ambientes, e que influenciam (ou podem influenciar) a biologia e ecologia da avifauna que aí ocorre. Essas características são: 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 100 101 102 103 104 105 106 107 108 Simplicidade estrutural / Estrutura simples: poucas ou nenhumas árvores, predominância de vegetação herbácea e arbustiva de porte não arbóreo em proporções variáveis: Baixa produtividade: a ausência de árvores resultante da aridez, resulta numa baixa disponibilidade de recursos para as aves; Boa visibilidade devido à vegetação rasteira e ao relevo plano; Falta de locais seguros para a nidificação (p.e. árvores ou escarpas); Elevada exposição aos elementos climatéricos (vento, chuva, sol, ); Grande amplitude térmica (principalmente entre dia e a noite); Baixa disponibilidade de pontos de água permanentes (a maioria dos pontos de água seca durante o Verão e só voltam a encher a partir das primeiras chuvas do Outono), os que existem são localizados e de extensão reduzida. 2.2. Características das aves estepárias (não são exclusivas deste agrupamento): Aves que caminham: alongamento das patas (permite passadas maiores) e redução da área da planta do pé e do número de dedos (redução da fricção); Coloração críptica: por norma coloração parda e discreta que permite camuflagem com o meio. Coloração fanérica (= para mostrar): por norma marcas pretas e brancas na cabeça, pescoço ou ventre associadas ao dimorfismo sexual (= diferenças entre machos e fêmeas) e por isso estão mais marcadas ou mais desenvolvidas nos machos adultos do que nas fêmeas ou juvenis. 5

109 110 111 112 113 114 115 116 Figura 4 - Macho de Sisão Tetrax tetrax em plumagem nupcial. Representação de algumas das características das aves estepárias. (BWPi, 1998) Comportamento discreto: alimentam-se silenciosamente produzindo chamados de alarme ou de contacto quando levantam; passam grande parte do tempo a vigiar. Tendência para se agregarem em bandos particularmente fora da época reprodutora: vantajoso pois aumenta a capacidade de vigilância e a utilização de recursos alimentares escassos de ocorrência localizada e irregular (no tempo e no espaço, dependente da chuva). 117 118 119 120 121 122 Figura 5 - Imagem aérea de uma área de pseudo-estepe. Os recursos alimentares (marcados com as setas amarelas) ocorrem de forma irregular e localizada. (Adaptado de Google Earth, 2013) Comportamento adaptado às condições climatéricas: as actividades de alimentação, defesa e marcação de território e comportamento de reprodutor ocorrem geralmente ao início da manha e em menor escalar ao fim da tarde; as aves descansam durante o dia e cuidam da 6

123 124 125 126 127 128 129 130 131 132 133 134 135 136 137 138 139 140 141 142 143 144 145 146 147 148 149 150 151 152 153 154 155 156 157 158 159 160 161 162 163 164 165 166 plumagem; aproveitamento de sombras e locais ais frescos; adaptações fisiológicas fisiológicas à escassez de água. Estratégias de reprodução: ajustes à disponibilidade alimentar, ou seja, sobreposição do período de eclosão com o período de maior disponibilidade de alimento que está dependente dos períodos e quantidade de chuva o que torna a o período reprodutor bastante flexível/adaptável; tendência para nidificar em grupos sendo que a distância entre ninhos resulta de um compromisso entre as vantagens de estar agrupado (vigilância comum, melhor exploração dos recursos disponíveis) e a necessidade de dispersar os ninhos como medida antipredação; os passeriformes preferem os cantos em vôo ou em poisos altos e as demostrações aéreas (protecção contra predadores, cantar no chão seria arriscado); as aves de maior porte fazem paradas em que utilizam principalmente batimentos de asas e saltos elevados (p.e.: o sisão) ou então exibem-se em locais com vegetação pouco desenvolvida uma vez que proporciona melhor visibilidade e melhores condições de vigilância (p.e.: a abetarda). Nidificação no solo: considerada a característica que permite separar as aves verdadeiramente estepárias das restantes aves que ocorrem neste ambiente; os não-passeriformes são geralmente nidífugos (= abandonam o ninho após eclosão) fazem a postura directamente no solo nu podendo existir alguns elementos decorativos no interior ou em redor (p.e.: ramos, ervas, seixos, excrementos de lagomorfos); os passeriformes constroem ninhos mais ou menos complexos em forma de taça no chão. Parâmetros reprodutores: número de ovos tende a ser menor em espécies cujas crias são alimentadas pelos adultos, e maior em espécies cujas crias se alimentam sozinhas (mas não se pode generalizar); em caso de perda de postura, construção de novos ninhos e posturas de reposição rápidas; as segundas posturas são pouco frequentes provavelmente devido à escassez de recursos, e à brevidade dos períodos favoráveis. 2.3. Aves estepárias: quais são? A Península Ibérica representa a área mais importante para as aves estepárias na União Europeia (EU), especialmente nas últimas décadas porque estas aves sofreram um declínio acentuado numa grande parte da Europa [2]. Porque: Todas as espécies de aves estepárias Europeias estão presentes na Península Ibérica, tornando esta região Europeia a mais diversa em avifauna estepária; Na EU, o Cortiçol-de-barriga-preta, a Calhandrinha-das-marismas, a Calhandra de Dupont e o Pintarroxo-trombeteiro ocorrem apenas na Península Ibérica. As populações de Abetarda, Cortiçol-de-barriga-branca, e a Cotovia-escura são particularmente importantes a nível mundial; As maiores populações de uma grande parte das espécies de aves estepárias que existem na Europa estão concentradas na Península Ibérica. O número de espécies consideradas estepárias varia consoante os critérios que cada autor utiliza para definir uma espécie de ave estepária. Por esta razão, existem listas maiores ou mais curtas e incluem mais ou menos espécies. Este curso baseia na listagem que de Juana criou em 1989. Para além das espécies verdadeiramente estepárias consideradas por este autor, os ambientes estepários são também adequados a outras espécies de aves, algumas das quais dependem deste tipo de habitat, e portanto é inevitável não referi-las. 7

167 168 A lista refere 21 espécies consideradas estepárias (das quais 20 são abordadas neste curso) e 18 outras espécies. 169 Espécies tipicamente estepárias * (21) Outras espécies (18) Espécies residentes (12) (8) Perdiz-comum Alectoris rufa Abetarda Otis tarda Sisão Tetrax tetrax Alcaravão Burhinus oedicnemus Cortiçol-de-barriga-preta Pterocles orientalis Ganga Pterocles alchata Calhandra-real Melanocorypha calandra Cotovia-escura Galerida theklae Cotovia-de-poupa Galerida cristata Calhandrinha-das-marismas Calandrella rufescens Fuínha-dos-juncos Cistocola juncidis Trigueirão Miliaria calandra Grifo Gyps fulvus Peneireiro Falco tinnunculus Coruja-das-torres Tyto alba Mocho-galego Athene noctua Seixa Columba oenas Picanço-real Lanius meridionalis Corvo Corvus corax Gralha-preta Corvus corone Espécies nidificantes (6) (6) Águia-caçadeira Circus pygargus Codorniz Coturnix coturnix Perdiz-do-mar Glareola pratincola Calhandrinha Calandrella brachydactyla Petinha-dos-campos Anthus campestris Chasco-ruivo Oenanthe hispanica Cegonha-branca Ciconia ciconia Milhafre-preto Milvus migrans Francelho Falco naumanni Rolieiro Coracias garrulus Abelharuco Merops apiaster Gralha-de-nuca-cinzenta Corvus monedula Espécies invernantes (3) (4) Tartaranhão-cinzento Circus cyaneus Laverca Alauda arvensis Petinha-dos-prados Anthus pratensis Milhafre-real Milvus milvus Grou Grus grus Abibe Vanellus vanellus Tarambola-dourada Pluvialis apricaria * Segundo classificação de de Juana (1989). Adaptado de Suárez et al. (1997) As espécies a negrito constituem o lote a abordar no capítulo de identificação (capítulo 3). 170 171 2.4. Identificação e principais características morfológicas das espécies estepárias 2.4.1. Espécies residentes (= encontram-se no território durante todo o ano) Espécie Perdiz-comum Alectoris rufa Características principais Dorso cinzento-acastanhado; Peito mesclado (mancha preta não uniforme) de preto; 8

Estrias castanhas e pretas nos flancos; Bico e anel orbital vermelhos; Dimorfismo sexual: machos maiores e com esporão na parte posterior do tarso. Abetarda Otis tarda Sisão Tetrax tetrax Alcaravão Burhinus oedicnemus Cortiçol-de-barrigapreta Pterocles orientalis Calhandra-real Melanocorypha calandra Grande porte (ave mais pesada da Europa); Asas longas e com muito branco na parte superior que contrasta com as penas secundárias pretas; Voo pesado constante bater de asas; Dimorfismo sexual: Machos são 30% maiores que as fêmeas e têm o pescoço mais largo; Na Primavera a distinção é mais fácil: os machos adquirem cor castanho-arruivado na base do pescoço; possuem longos bigodes e colocam a cauda em leque; No Inverno (quando pousados) a parte inferior das asas dos machos possui um barra branca mais larga que nas fêmeas. Dorso castanho sarapintado; Peito e barriga brancos; Em voo: bater de asas muito rápido; muito branco nas asas; extremidade da asa é preta; Dimorfismo sexual durante a Primavera: Macho adquire um gravata preta e branca no pescoço; Os machos possuem uma alteração anatómica numas das penas primárias que produz um assobio característico quando as asas são agitadas; Identificação auditiva [ prrrt intermitente 10 em 10 segundos]. Difícil de observar no solo; Plumagem muito críptica; Olho amarelo e grande; Padrão da asa típico, facilmente distinguível em voo; Actividade essencialmente crepuscular (= durante o final da tarde); Difícil de observar no solo; Tamanho aproximado semelhante ao de um pombo; Em voo: barriga preta evidente; parte debaixo das asas brancas com a ponta preta; Geralmente vocalizam em voo; Dimorfismo sexual: plumagem das fêmeas mais críptica que nos machos; Maior cotovia da Península Ibérica; Mancha preta na base do pescoço muito evidente; Bico grosso e forte; Em voo: asas escuras na face inferior; bordo traseiro das asas branco (muito evidente); Identificação auditiva (canto composto por imitações). Cotovia-de-poupa Coloração castanho-acinzentada; 9

Galerida cristata Peito claro com estrias pretas mais ou menos nítida; Sem bordo branco na parte traseira da asa; Ponta pontiaguda e esparsa; Poupa no topo da cabeça, com projecção para fora da nuca; Axila com tom ferrugem; Raramente aparece empoleirada; Difícil de distinguir da Cotovia-de-poupa Galerida theklae. Cotovia-escura Galerida theklae Calhandrinha-dasmarismas Calandrella rufescens Fuínha-dos-juncos Cisticola juncidis Trigueirão Miliaria calandra Peneireiro Falco tinnunculus Coloração castanho-acinzentada (mais escuro que na G. cristata); Peito branco com estrias pretas muito evidentes; Sem bordo branco na parte traseira da asa; Pequena poupa no topo da cabeça, com projecção para fora da nuca; Poupa cheia; Axila com tom cinzento ou ligeiramente rosa; É comum observar-se pousada e apoios (p.e.: cercas); Difícil de distinguir da Cotovia-de-poupa Galerida cristata. Coloração cinza / cinzenta-acastanhada; Peito branco com estrias pretas bem marcadas; Mancha escura pouco contrastante nas coberturas médias; Voo de canto: canto em voo ascendente com batimentos agitados das asas e abertura parcial da cauda; Identificação auditiva; Distribuição limitada aos sapais de Castro Marim; Pequena, arredondada e de cauda curta; Tons acastanhados; Riscas castanho-escuras na cabeça; Canto em voo: voo ondulante com a cauda aberta e canto durante a fase ascendente da ondulação; Identificação auditiva [ dziip dziip dziip durante vários minutos]. Corpo robusto e arredondado com cabeça que parece grande e bico forte; Facilmente observada pousada em apoios; Faz voos de curta distância com as patas descaídas; Dorso castanho-avermelhado sarapintado de preto; Unhas das patas pretas; Mancha escura evidente logo abaixo do olho (bigode); Em voo pode confundir-se com o Peneiro-das-torres; Dimorfismo sexual. 172 2.4.2. Espécies nidificantes (=encontram-se no território durante a sua época de nidificação) Águia caçadeira Circus pygargus Dimorfismo sexual acentuado: Macho: dorso com vários tons de cinzento; barra preta nas asas (face superior e face inferior) e ponta das asas pretas; abdómen com riscas castanhas escuras; uropígio branco; Fêmea: dorso castanho; parte ventral branca malhada de castanho; 10

Juvenil: semelhantes às fêmeas; partes inferiores castanhas uniformes ou acobreadas; Semelhanças com o Tartaranhão-cinzento (especialmente as fêmeas). Codorniz Coturnix corturnix Perdiz-do-mar Glareola pratincola Calhandrinha Calandrella brachydactyla Petinha-dos-campos Anthus campestris Chasco-ruivo Oenanthe hispanica Francelho Falco naumanni Difícil de observar, pois evita voar de dia; Pequena com plumagem bastante críptica em vários tons de castanho; Voo: asas longas e batimentos muito rápidos; Asas compridas e pontiagudas; Uropígio branco; Dorso castanho uniforme; Abdómen branco que contrasta com o preto do resto do corpo; Padrão da cabeça inconfundível (lágrima preta que se une abaixo da garganta formando um colar); Nidifica em colónias; Plumagem castanho-acinzentada e branco-sujo; Peito branco; Mancha escura na parte lateral do peito (mais ténue que na Calhandrareal); Mancha escura contrastante nas penas terciárias; Voo de canto: mantem a cauda fechada executando uma ondulação tipo io-io ; silencioso durante a descida com as asas fechadas, começa a cantar quando abre as asas para deslizar e continua a cantar batendo as asas agitadamente até ao pico da ascensão; Ave esguia com cauda comprida e bico pontiagudo; Plumagem cor de areia muito uniforme; Risca por cima do olho pálida e bem marcada; Peito claro sem estrias; Mancha escura pouco contrastante nas coberturas terciárias; Passam muito tempo no solo (incluindo caminhos); Geralmente observado pousado em cercas ou em montes de pedra; Padrão da cauda diagnosticante (preta e branca; parte preta em forma de T); Dimorfismo sexual: Macho: dorso branco tingido de ocre quando a plumagem é recente; mascarilhas e asas pretas; Fêmea: partes superiores castanhas; sem mascarilha; asas castanhoescuras; Dimorfismo sexual: Macho: dorso avermelhado liso; cabeça e cauda cinzento-azuladas; peito alaranjado; ausência de bigode; Fêmea: dorso mais acastanhado sarapintado de preto; cabeça e cauda castanhas com listas pretas; bigode pouco evidente; Unhas claras; 11

Nidifica em colónias que podem atingir dezenas de casais; Identificação auditiva [ ki-ki-ki ]. Rolieiro Coracias garrulus Inconfundível; Plumagem azul pálida com tonalidades verdes contrastante com a cor castanho avermelhada do dorso; Ponta das asas pretas; 173 2.4.3. Espécies invernantes (=encontram-se no território durante o Inverno) Tartaranhão-cinzento Circus cyaneus Laverca Alauda arvensis Petinha-dos-prados Anthus pratensis Milhafre-real Milvus milvus Grou Grus grus Dimorfismo sexual acentuado: Macho: dorso cinzento-azulado com a ponta das asas pretas; vente branco com a ponta das asas e extremidades posteriores pretas; uropígio branco; Fêmea: dorso castanho; parte ventral branca malhada de castanho; Semelhanças com a Águia-caçadeira (particularmente as fêmeas). Populações residentes no Norte e Centro do país; Poupa pouco pronunciada; Extremidade posterior das asas orlada de branco; Extremidades laterais da cauda brancas; Face inferior das asas branca (permite distinguir da Calhandra-real); Voo de canto: canta de cauda aberta agitando as asas durante a subida em espiral tornando-se difícil de detectar, e no final do voo desce sempre a cantar caindo de asas recolhidas. Identificação auditiva (canto composto por imitações; pode confundir-se com a Calhandra-real). Corpo esguio com cauda comprida e bico pontiagudo e fino; Plumagem castanho-acinzentada com matizes verde-azeitona; Silhueta elegante; Bico fino; Riscas grossas pretas no dorso; Silhueta muito característica cauda bifurcada; Padrão de coloração ventral diagnosticante; Quando pousado destaca-se a cabeça cinzento-clara e a coloração pouco uniforme do dorso e asas; Maior e com a cauda mais bifurcada que o Milhafre-preto. Plumagem cinzenta no dorso e ventre, com a extremidade das asas cinzento-escuro; Pescoço e cabeça preta e branco, com uma mancha vermelha no topo da cabeça (adultos); Em voo: bandos em formação em V ou em linha oblíqua; Pescoço e cabeça castanho-claro nos juvenis; Formam grandes dormitórios. Abibe Forma grandes bandos no Inverno; Plumagem preta e branca inconfundível; 12

Vanellus vanellus Reflexos verdes e rosa nas partes superiores; Asas largar e com as pontas arredondadas; Asas brancas e pretas na parte inferior e escuras na parte superior; Identificação auditiva; (Nidificação irregular e esporádica em Portugal). Tarambola-dourada Pluvialis apricaria Forma grandes bandos no Inverno; Plumagem difere substancialmente no Inverno e na Primavera; Dorso cinzento-escuro com as penas emarginadas de amarelo-ocre e branco; Barriga preta desaparece no Inverno; Em voo: ponta das asas preta com uma barra alar branca pouco pronunciada; 174 175 176 177 178 179 2.5. Onde e quando procurar aves estepárias em Portugal Em Portugal existem 13 Zonas de Protecção Especial (ZPE) e 12 Áreas Importantes para Aves (IBA) com características pseudo-estepárias, ideais para a observação de aves estepárias. A maioria destas IBAs sobrepõem-se espacialmente em maior ou menor percentagem às ZPEs. Estas áreas concentramse no quadrante Sul mais interior do país. 180 181 182 183 184 185 Figura 6 Mapa com a localização das ZPE e IBA com características estepárias em Portugal. O mosaico da paisagem que se estabelece nas estepes cerealíferas através da rotação tradicional de culturas é ideal para as exigências das diferentes espécies. No entanto, cada espécie tem exigências distintas, principalmente ao nível da estrutura da vegetação (altura e densidade).cada espécie tem preferência por determinado uso do solo, e a preferência pode ser variável ao longo do ano. 13

186 187 188 189 190 191 192 193 194 195 196 197 Figura 7 Preferências das aves estepárias em relação aos usos do solo ao longo do ano. Adaptado de Delgado & Moreira (2000). Residentes: As espécies residentes são aquelas que se podem encontrar no território durante todo o ano. São espécies que não efectuam migrações de longas distâncias (p.e.: intercontinentais). Nidificantes: As espécies nidificantes são aquelas que efectuam movimentos migratórios de longas distâncias para locais onde efectuam a reprodução. Invernantes: As espécies invernantes são aquelas que efectuam movimentos migratórios de longas distâncias para locais mais amenos e com maior disponibilidade de recursos durante os meses de Inverno. 3. Recursos da internet Links úteis Aves de Portugal http://avesdeportugal.info 14

198 199 200 The Internet Bird Collection (aves de todo o mundo) http://ibc.lynxeds.com/ 201 202 203 Jogos de identificação de aves http://www.birdid.no 15

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