ANÁLISE ESTATÍSTICA DA PATOLOGIA EM EDIFÍCIOS RECENTES

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Transcrição:

Congresso 2007-3.º Congresso Nacional 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal Universidade de Coimbra ANÁLISE ESTATÍSTICA DA PATOLOGIA EM EDIFÍCIOS RECENTES Rui Calejo Rodrigues 1, Flora Silva 2 1 SCC/CEC/GEQUALTEC FEUP, 2 ESTiG - IPB e-mail: {calejo@fe.up.pt, flora@ipb.pt } Resumo O património edificado com menos de 25 anos, considerado o património recente, apresenta um conjunto muito elevado de edifícios cujo desempenho está abaixo do padrão desejável. O País em geral, e a região de Trás-os-Montes, particularmente o Distrito de Bragança sofreu nessa época um enorme incremento de construção, muitas das vezes sem ser dotada das necessárias características de robustez que lhe permita evidenciar hoje em dia uma melhor condição de estado. Recorrendo-se a uma amostra aleatória do parque edificado em causa procedeu-se à tipificação de fenómenos de patologia associados à respectiva manifestação patológica. Analisaram-se por meio de um processo de diagnóstico cerca de 100 casos dos quais se apresentam as situações mais frequentes bem como as respectivas incidências na qualidade de vida dos utentes. Conclui-se com a identificação das principais causas que estiveram na origem das manifestações observadas salientando-se a existência de erros do processo (projecto e construção) como a causa mais frequente (80%). Patologia relacionada com a Humidade e com Fissuração representa por sua vez cerca de 80% da totalidade das disfunções analisadas de onde se conclui que a acção de agentes atmosféricos, bioquímicos ou físicos, bem como o fim do ciclo de vida dos componentes acaba por não justificar a durabilidade da construção que se vê prematuramente afectada por erros. Não restam dúvidas que a acção mais importante a encetar para contrariar este cenário é a de recrutar actores especializados para o processo construtivo, integrando-os em estruturas profissionais que possam garantir a eficiência do seu desempenho. Palavras-chave: patologia, diagnóstico, comportamento de edifícios em serviço.

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva 1 Introdução e considerações gerais 1.1 Enquadramento da problemática e objectivos O conceito de Edifício Recente acaba por não estar tipificado no léxico dos estudiosos da problemática de edifícios. Na realidade, o lapso de tempo que permite identificar um edifício como recente corresponde a um período que vai para além do intervalo de tempo que se associa a edifícios novos e fica aquém do que se pode atribuir a um edifício velho. Estabeleceu-se em 25 anos o tempo de serviço de edifícios identificados como recentes. Nos dias de hoje corresponde à construção edificada a partir do início dos anos 70, que em Portugal contempla cerca de dois milhões e meio de edifícios ou seja cerca de 1/4 do total de edifícios existentes em Portugal. Além do intervalo de tempo de serviço, o conceito de edifício recente integra também uma dada característica construtiva e uma iniciativa promocional específica. Ou seja, assiste-se à quase ausência de inovação construtiva repetindo-se à exaustão uma tecnologia construtiva baseada num sistema estrutural porticado em betão armado, complementado por panos de alvenaria sem funções estruturais. Despertam as característica de comportamento térmico e acústico identificadas por soluções tipo muitas vezes descontextualizadas. Do ponto de vista social corresponde ao lapso de tempo que Portugal levou a irradicar as barracas, passando-se de uma carência de cerca de 700.000 habitações para um excesso de oferta. O acesso ao crédito ditou a promoção privada em larga escala destinada à venda, quase eliminando o mercado de aluguer. No distrito de Bragança, base territorial da amostra colhida, acresce ainda o fenómeno de desertificação de aldeias, assistindo-se a um crescimento do parque edificado em vilas e na cidade de Bragança motivado por deslocalização das populações para junto dos serviços (ensino, hospital, etc) mais do que por crescimento real do tecido económico. É também um factor de incremento da construção a construção promovida por emigrantes que, tendo-se reformado nos países de trabalho, regressam a Portugal onde durante o período de ausência foram construindo novas habitações. Note-se no entanto que a amostra identificada como edifício recente já não inclui a autoconstrução dos anos setenta. Todo este enorme grupo de construções tipifica as edificações recentes cujo desempenho evidencia carências a diversos níveis. Foi essa sensibilidade para um mau desempenho que motivou este estudo. A escolha do distrito de Bragança deveu-se apenas ao facto de estarem envolvidas neste estudo investigadores oriundos ou conhecedores da região, factor que se considerou essencial para o êxito deste estudo. Trata-se pois de avaliar com base em diagnósticos específicos cerca de uma centena de manifestações de patologia identificadas aleatoriamente e, com base nesse diagnóstico, procurar evidenciar os principais problemas. O objectivo deste trabalho não pretende caracterizar um distrito mas sim uma época que terá semelhança em muitas outras regiões e que poderá dar uma imagem da condição de estado do parque edificado recente. Com este estudo procura-se contribuir para o conhecimento da construção, do seu desempenho e das potenciais necessidades de intervenção a que necessariamente deve ser sujeita sob pena de com o acelerar do processo de degradação, rapidamente permitir que o actual cenário de satisfação das necessidades de habitação se transforme em carência. Por outro lado, sob o ponto de vista macro económico o País não suporta a necessidade de ciclicamente consumir as economias dos cidadãos e as receitas públicas com o problema da habitação. Num cenário avaliado a nível Nacional, a recuperação prematura deste parque (como se referiu de cerca de 2.500.000 habitações) implica investimentos de cerca de 15.000 M! 2

Congresso 2007, 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal Captando estes investimentos para outros fins, mesmo admitindo que uma parcela teria de ser dispendida em Planos de Manutenção, seguramente permitiriam relançar uma outra área do tecido económico com pendente exportador que muito contribuiria para a riqueza geral do país. 1.2 A metodologia de investigação Por processos aleatórios, recorrendo a uma selecção de edifícios a que alunos do IPB tinham acesso foi possível entre 1998 e 2007 identificar cem edifícios nos quais se elegeu uma manifestação patológica determinante no seu comportamento. Essa manifestação foi alvo de um processo de diagnóstico detalhado de acordo com a seguinte metodologia: A - Caracterização da Patologia - Descrição do local: Com recurso a visita, meios fotográficos e esquemas desenhados - Lista Universal de Diagnóstico LUD : Com base na imagem da anomalia, sem mais averiguações listaram-se todas as possíveis explicações para a manifestação B - Exame (destinado a eliminar diagnósticos inverosímeis) - Reconstituição construtiva : Para identificar construtivamente a base de suporte da anomalia - Observação visual da Envolvente: Análise 360º em torno da manifestação para compreensão do fenómenos - História : Identificação da evolução e comportamento da anomalia. Eventuais intervenções anes efectuadas - Manifestações Afins: Outras manifestações no mesmo edifício que sejam consequência de um dado diagnóstico - Ensaios experimentais: identificação e quantificação de parâmetros físicos e químicos da anomalia C - Diagnóstico: Obtido com base nos diagnósticos não eliminados da LUD D Intervenção: Após a identificação do diagnóstico procedeu-se à definição da forma de actuação obedecendo todas as situações estudadas ao seguinte esquema: - Caracterização geral da intervenção - Listagem de tarefas a executar - Especificações Técnicas A figura 1, que se segue, dá ideia do fluxograma do processo do diagnóstico. Esta forma de proceder teve como consequência uma uniformização de abordagem que no final permitiu obter dados comparáveis, não obstante o período de 9 anos durante o qual decorreu este estudo. Cada situação anómala deu lugar a um processo de diagnóstico para identificar a patologia que a justifica. Ou seja entende-se que sob o ponto de vista conceptual uma patologia é todo o conjunto de causas e efeitos conjugados que estão detrás de uma manifestação disfuncional. Este conceito de disfuncionalidade da construção, isto é a incapacidade para um dado material elemento ou componente desempenhar a(s) funções para que foi dimensionado, esteve na base da interpretação e análise efectuada a cada uma das situações abordadas. Foram produzidos relatórios individuais de cada situação que permitiram registar a generalidade da informação associada ao diagnóstico, com particular destaque para ensaios in situ que muitas das vezes foi necessário executar para robustecer o diagnostico final. 3

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva Caracterização da patologia Descrição do local Lista universal de diagnósticos Exame Reconstituição construtiva Observação visual da envolvente História Eliminação de diagnósticos Manifestações afins Ensaios experimentais Diagnóstico Forma de actuação Caracterização geral da intervenção Listagem de tarefas a executar Especificações técnicas Medidas preventivas Figura 1 Fluxograma do Processo de Diagnóstico [1]. 2 Descrição da Amostra 2.1 Identificação dos edifícios Os edifícios analisados enquadravam-se em dois grupos distintos correspondendo cerca de 50% dos casos observados a cada grupo. Um dos grupos era constituído na sua generalidade por habitações isoladas, germinadas ou em banda com cave (ou semi-cave), piso térreo e andar. O outro grupo era constituído por edifícios em propriedade horizontal ou edifícios públicos com desenvolvimento em vários pisos, normalmente associados a fracções habitacionais. Em todos a estrutura portante era realizada por meio de pórticos de betão armado com fundação directa e lajes aligeiradas a materializar os pavimentos estruturais. Os panos de parede exterior ou interior eram invariavelmente de alvenaria de tijolo (em menos casos) ou de bloco de betão tipificando soluções de parede dupla na envolvente exterior e de panos simples a materializar as divisórias interiores. Os revestimentos de parede apresentavam maior diversidade, mas ainda assim repartiam-se entre soluções rebocadas pintadas ou em cerâmico. Os revestimentos de piso tipificavam soluções em cerâmico ou em madeira tipo soalho ou em elementos à base de derivados de madeira. Portas interiores invariavelmente prefabricadas de madeira (variam no acabamento pintado ou em verniz). Vãos exteriores em alumínio e em menor número em madeira ou ferro. Dir-se-á que, não fosse a marca de época de alguns revestimentos, pela análise das soluções construtivas era impossível distinguir um edifício dos finais dos anos setenta dos concluídos nos últimos anos. Repetem-se à exaustão soluções construtivas (algumas a evidenciar erros) sem se notar qualquer força inovadora. 4

Congresso 2007, 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal As figuras 2 e 3 que se seguem dão nota de duas situações que identificam os dois grupos referidos. Figura 2 Edifício tipo do grupo das habitações individuais. Figura 3 Edifício tipo do grupo das habitações em propriedade horizontal. 3 Análise de dados obtidos A abordagem efectuada traduziu-se em extensos documentos de que necessariamente se procedeu neste estudo a uma síntese. Essa síntese procurou orientar-se no sentido de se identificarem grupos de anomalias afins que permitissem uma abordagem estatística, não obstante cada caso ser um caso e dificilmente se terem encontrado dois casos iguais. Organizou-se a informação em quadros que se enquadraram numa apresentação descritiva. Cada grupo é identificado por meio de cinco campos descritores:, Idade média do grupo,, Fase de empreendimento associada ao erro,. A fase do empreendimento associada ao erro carece de alguma explicação. Pretende-se com essa descrição identificar em todo o processo do empreendimento (da concepção à utilização) a(s) fase(s) que tipificarão a origem de maior número de erros. Desta forma procurou-se identificar onde incidir esforços no sentido de se actuar preventivamente para evitar essas situações de erro. Por sua vez as apresentadas foram adaptadas das especificadas nos estudos individuais mais para dar uma ideia das consequências das manifestações observadas do que para estabelecer uma tecnologia de intervenção. Até porque a generalidade dos 19 grupos individualizados representa uma situação média de um conjunto de casos e obviamente que não é possível fazerem-se especificações de intervenções médias. 5

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva 3.1 Apresentação descritiva O quadro seguinte apresenta, como já se referiu, uma síntese de problemas identificados, dando nota da respectiva causa e soluções genéricas que lhes estão associados. Quadro 1 Síntese descritiva dos principais tipos de anomalias. Cerâmicos Tipo : 1 Idade média (anos) 20 - Juntas mal executadas ao nível do afastamento entre elementos; - Eliminação de pano integral e recolocação - Desrespeito pelo tempo de cura do produto de igual solução com especial atenção ao de assentamento; produto de colagem e ás condições de - Produto de assentamento inadequado; aplicação dos cerâmicos - Retracção das argamassas de assentamento da alvenaria aliada às tensões nas argamassas de chapisco e emboço. - + - +++ - Tipo : 2 Idade média (anos) 22 - Deformação da laje por flexão; - Choque térmico: fonte de calor incidente na laje onde está colocado o revestimento de pavimento. - Remoção e substituição da totalidade dos cerâmicos, uso de um cimento cola à base de látex que irá permitir uma absorção dos movimentos dos azulejos e o aumento da largura das juntas, o que evitará a destruição destas. - +++ - + + Madeiras Tipo : 3 Idade média (anos) 14 - Humidade de precipitação proveniente de terraços ou varandas; - Causas acidentais (inundação). - Substituição integral ou local dos elementos em madeira ; - Raspagem geral e acabamento a verniz - ++ - + ++ Manchas de Humidade Tipo : 4 Idade média (anos) 18 - Humidade de condensação (existem condensações, zona de pontes térmicas); - Solicitação térmica (devido à grande amplitude térmica, das diferentes estações do ano); - Eliminação da causa por isolamento térmico (interior ou exterior) ventilação e redução da produção de humidade - Eliminação da manifestação por meio de remoção de elementos friáveis, reperfilamento e repintura. - +++ - - - 6

Congresso 2007, 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal Manchas de Humidade Tipo : 5 Idade média (anos) 24 - Humidade devido a causas fortuitas (inundações, fugas de água de abastecimento e de drenagem, lavagens, etc) - Sensibilização para a utilização de dos equipamentos sanitários, e para o respectivo controlo; - Inspecção de rotina; - Regras de limpeza e de lavagem - Importância do Manual de - + - - +++ Tipo :6 Idade média (anos) 12 - Inexistência de Isolamento térmico e evidência de pontes térmicas - Falha de impermeabilização em coberturas planas - Definição de sistema de isolamento térmico pelo exterior - Detecção e selagem da rotura de impermeabilização - ++ + ++ - Tipo : 7 Idade média (anos) 10 - Humidade devido a fugas com locais húmidos, Fugas nas banheiras - de paredes duplas com elementos em continuidade e deficiência de impermeabilização do paramento exterior ( normalmente associado a soluções de tijolo à vista ) - Falhas de impermeabilização associadas à padiera do vão - Deficiente ventilação do local - Isolamento das juntas da banheira com a parede - Ligação, recolocação da descarga de superfície da banheira - Eliminação das causas por intervenção no paramento exterior aplicando soluções hidrófugas: - Recuperação da imagem só após a completa secagem (superficial e em profundidade) da parede. - Mais grave em orientações Norte - ++ + ++ - Fissuras Tipo : 8 Idade média (anos) 21 - Tensões tangenciais nos diedros de aberturas resultantes das tensões de presa das argamassas - Erros estruturais em fase de construção; - Alterações das condições estruturais do - Estando a fissura estabilizada, limpeza da fissura, reforçar a estabilidade do reboco com malha de fibra, refechamento da mesma e acabamento final para reposição de imagem edifício com intervenções posteriores. + ++ - +++ ++ Tipo : 9 Idade média (anos) 5 - Erros de montagem da alvenaria da divisória sem remate no cunhal; - Deformação do pavimento estrutural por fluência. - Reforçar o cunhal por meio do embebimento de uma armadura de pele - Observar o desenvolvimento da fluência até estabilizar e proceder á colmatação reforço e reprofilamento da fissura. ( Não colar com resinas), Usar tinta de acabamento com alguma elasticidade - ++ - +++ - 7

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva Fissuras Tipo : 10 Idade média (anos) 4 - Erros construtivos ( com base na falta de embricamento das alvenarias) em elementos pontuais ( armários, muretes, etc.) - Solicitação mecânica aquando da - Reforço com armadura de pele em toda a extensão; - Reboco sintético sobre armadura - Acabamento decorativo instalação de equipamentos - + - +++ + Tipo : 11 Idade média (anos) 8 - Fragilidade do betão e alvenarias perante esforços transversos motivado por deformações dos elementos de fundação quando tipificam assentamentos diferenciais - - Normalmente há uma tendência para redistribuição de esforços e a fissuração tende à estabilização. Nestes casos colar a fissura com resinas e recuperar a imagem por pintura depois de regularizada a superfície. - Em situações não concorrentes com a estabilização é necessário reequacionar o reforço dos elementos de fundação - ++ - ++ - Tipo : 12 Idade média (anos) 20 - Deformação excessiva, por flexão do suporte (grande dimensão do vão da laje/viga sobre a qual assenta a parede) - Normalmente há uma tendência para redistribuição de esforços e a fissuração tende à estabilização. Nestes casos abrir uma caixa removendo o reboco em torno da fissura, armar a caixa com fibra de vidro, reprofilar e redecorar com tinta que permita absorver deformações ligeiras - Em situações que não progridam para a estabilização é necessário reequacionar o reforço dos elementos estruturais - +++ - - - Tipo : 13 Idade média (anos) 21 - Solicitações térmicas (devido ao deficiente isolamento térmico na laje de cobertura). - Colocação de isolamento térmico deficitário - Redecoração - +++ - - - Tipo : 14 Idade média (anos) 25 - Excesso de água de amassadura do reboco; - Exposição solar permitindo grandes amplitudes térmicas. - Normalmente observa-se apenas micro fissuração omnidireccional com rejeição inferior a 0,1mm resolvendo-se a situação com uma repintura após remoção de friáveis da tinta base. - - + +++ - 8

Congresso 2007, 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal Fissuras Tipo : 15 Idade média (anos) 17 - Fundações independentes transmitindo cargas muito diferentes que provocam assentamentos diferenciais - Compactação de solos de fundação deficientes - Normalmente o fenómeno é severo e é mais adequado aceitar a fissura encaminhando-a em todo o contacto com a construção principal - Injectar mástique e refechar com cordão de silicone - ++ - +++ - Outros Tipo : 16 Idade média (anos) 15 - Deterioração da tinta e do primário (especificamente do primário); - Agressividade dos agentes erosivos (fachada com elevada exposição a agentes - Remoção de toda a tinta que ainda permanece aderente à parede; - Limpeza e desinfecção da parede; - Aplicar primário anti alcalino e repintar. atmosféricos); - Incompatibilidade entre primário e alcalis do reboco. - + ++ + - Tipo : 17 Idade média (anos) 17 - Presença de humidade de obra ou de infiltrações ; - Perda de coesão e de aderência do revestimento (ausência de primário); - Limpeza da parede; - Observação da secagem por secagem ou actuação nas infiltrações - Aplicação de um primário e repintura - Remates de argamassa em fase final de obra antes de pinturas - - + ++ + Tipo : 18 Idade média (anos) 10 - Recobrimento insuficiente - Carbonatação - Acção gelo-degelo - Retirar o betão na zona danificada com uma profundidade de 3 cm de modo a assegurar 2cm acima da armadura; - Tratamento anti-oxidante primário na armadura; - Aplicação do betão não retráctil; - Nivelamento da superfície; - Aplicação de tinta plástica para exterior. - - - +++ - Tipo : 19 Idade média (anos) 13 - Delaminação do betão por oxidação das armaduras - Recobrimentos insuficientes - Acidentes não reparados - Retirar o betão na zona danificada com uma profundidade de 3 cm de modo a assegurar 2cm acima da armadura; - Tratamento anti-oxidante primário na armadura; - Aplicação do betão não retráctil; - Nivelamento da superfície; - Aplicação de tinta plástica para exterior. - - - +++ +++ 9

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva 3.2 Incidência das anomalias A análise destes dados presta-se a inúmeras análises estatísticas mas as que se entenderam ser mais importantes relacionam-se com a distribuição e tipificação dos fenómenos anómalos que estão na base da identificação de patologias. Assim, no quadro 2 estabelece-se a frequência da incidência das patologias estudadas nos cem edifícios alvo Quadro 2 Incidência das Patologias observadas. Casos de N.º de Tipos de Problemas Patologias casos % Destacamento de revestimento cerâmico em paredes Tipo 1 4 Cerâmicos Levantamento de revestimento cerâmico em pavimentos Tipo 2 2 6 Madeiras Levantamento de soalho/tacos Tipo 3 3 3 Manchas na ligação de paredes a elementos estruturais Tipo 4 19 Manchas com empolamento de tinta no tecto e paredes Tipo 5 8 Humidades Manchas Manchas no tecto Tipo 6 4 40 Manchas na parte inferior de uma parede interior Tipo 7 9 Fissuras Fissura na ligação de paredes vãos Tipo 8 6 verticais Fissura vertical em parede interior Tipo 9 3 Fissuras Fissura horizontal em parede interior Tipo 10 1 horizontais Fissura horizontal em parede exterior Tipo 11 11 Fissuras Fissura em paredes a 45º Tipo 12 12 42 Fissura no tecto Tipo 13 5 Fissuras omnidireccionais em parede exterior Tipo 14 2 Fissura na ligação escada edifício Tipo 15 2 Descasques de tinta em parede exterior Tipo 16 2 Descasques de tinta em parede interior Tipo 17 3 Outros Exposição de armaduras Tipo 18 2 9 Delaminação de betão Tipo 19 2 N.º total de casos 100 100% Outros 9% Cerâmicos 6% Madeiras 3% Fissuras 42% Humidades 40% Figura 4 Incidência das Patologias. Complementarmente recolheram-se os indicadores da responsabilidade de cada fase do empreendimento nas Patologias estudadas. Pesaram-se percentualmente a totalidade das atribuições de responsabilidade a cada uma das fases e foi assim possível definir uma incidência. O quadro 3 e a figura 5 ilustram os resultados obtidos. 10

Congresso 2007, 17 a 19 de Dezembro, Coimbra, Portugal Quadro 3 Origem dos erros detectados. 0% 36% 7% 42% 15% 45% 40% 35% 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% Figura 5 Peso relativo de cada fase do empreendimento nas Patologias observadas. 4 Conclusões O contacto com uma centena de edifícios durante cerca de dez anos permitiu compreender muito melhor o comportamento em serviço de um parque edificado recente. Do ponto de vista estritamente comportamental, estes edifícios evidenciaram que a generalidade das intervenções de que tinham necessidade resultavam quase exclusivamente de erros que se manifestavam em anomalias do desempenho. Sem que este fenómeno esteja erradicado da tipificação do desempenho de um edifício é desnecessário procurar-se parametrizar a durabilidade da construção com base em mecanismos de degradação ( físicos, químicos, etc.) porque não são esses agentes que motivavam a degradação observada. E em Portugal existem cerca de ¼ de edifícios recentes,... com erros que vão ser decisivos no seu desempenho! No que diz respeito à natureza das anomalias observadas, a partir das quais foi possível diagnosticar as respectivas patologias, os dados recolhidos acabam por se enquadrar no que tem vindo a ser publicado sobre patologia da construção. Ou seja fissuração e manifestações de humidade representam mais de 80% das situações estudadas cujas causas em cerca de 80% das situações são atribuídas á fase de projecto ou de construção. Há aqui claramente uma insuficiência no domínio da especificação e realização de soluções construtivas eficazes no que diz respeito à contenção de humidade e à estabilidade a esforços. Mesmo quando se observa a responsabilidade das diferentes fases do processo do empreendimento na totalidade das Patologias diagnosticadas é possível concluir que as insuficiências ao nível do projecto e da execução são claramente identificadas. Este fenómeno poderá ser menos claro quando se constata que na região a partir da qual se recolheu esta amostra é frequente assistir-se a promoções da construção em que o projectista é o construtor. Não foi possível obter-se esta informação mas julga-se não se estar a cometer um grande erro se se assumir que em pelo menos 50% das situações acontece tal coincidência. Talvez a separação clara destas funções permitisse minorar esta situação de erro. A importância atribuída à fase de utilização (15%) acaba por ser menos esperada enquanto que a não responsabilização a fase de concepção (0%) gera surpresa em sentido contrário. 11

Rui Calejo Rodrigues, Flora Silva Interessante seria poder-se desenvolver esta metodologia à escala Nacional. Tal possibilidade poderia permitir validar ou contrariar a síntese deste estudo segundo a qual : Se está a Conceber MUITO BEM, a Projectar e a Construir MAL, a utilizar BONS Materiais e e a Utilizar os edifícios RAZOAVELMENTE. Agradecimentos Agradece-se à FCT que através do CEC Centro de Engenharia Civil do Departamento de Engenharia Civil da FEUP apoiou este trabalho. Referências [1] Calejo Rodrigues, Rui Metodologia da Manutenção de Edifícios, Ed. FEP, 2005, pág.35. 12