A Apropriação do Modelo de Espiral do Conhecimento de Nonaka e Takeuchi: uma análise dos anais do EnANPAD de 2005 a 2009

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Transcrição:

A Apropriação do Modelo de Espiral do Conhecimento de Nonaka e Takeuchi: uma análise dos anais do EnANPAD de 2005 a 2009 Autoria: Fernanda Tavares Silva, Juliana Cristina Teixeira, Cibele Maria Garcia de Aguiar, Luiz Marcelo Antonialli Resumo: Os estudos que envolvem o tema conhecimento têm recebido especial atenção em pesquisas relacionadas à Administração. Inserido no âmbito organizacional, o conhecimento se configura como um ativo intangível, conferindo-lhe, assim, um caráter estratégico. Especificamente, vários trabalhos sobre a temática utilizam o modelo de criação de conhecimento de Nonaka e Takeuchi (2008), denominado espiral do conhecimento, sendo um dos modelos mais conhecidos e influentes da literatura sobre estratégia do conhecimento. Porém, assim como é ampla sua utilização, também pode ser a diversidade com que esta seja eventualmente apropriada. Acredita-se, neste sentido, que haja também maior possibilidade de que, disseminada, a espiral seja apropriada de forma diferente da originalmente concebida. Pois, tratada pelos autores em seu texto base como um modelo de criação de conhecimento, a espiral tem sido muitas vezes utilizada como um modelo de gestão do conhecimento. Diante deste cenário, chegou-se à seguinte questão: como ocorre a apropriação da espiral do conhecimento no campo da Administração? Para respondê-la, foi realizada uma análise bibliométrica dos artigos publicados nos anais do EnANPAD dos anos de 2005 a 2009, ou seja, utilizou-se um corte transversal de cinco anos. A pesquisa se caracteriza como exploratória e descritiva. A análise dos resultados possui um caráter quantitativo no que se refere à descrição percentual dos dados obtidos, e também pela própria abordagem quantitativa inerente aos estudos bibliométricos. Mas a abordagem também é qualitativa, pautando-se nas idéias de Morgan e Smirich (1980), que afirmam ser esse um tipo de pesquisa realizado quando se tem a intenção de aprofundar os conhecimentos sobre determinado assunto, enfatizando a importância de se compreender os processos nos quais os seres humanos criam a realidade. Os resultados demonstraram que a maioria dos artigos trata da espiral do conhecimento enquanto modelo de criação, mas há uma parcela que o trata como modelo de gestão de conhecimento, sem deixar claro que foi realizada uma apropriação diferente da forma originalmente concebida. Além disso, verificou-se que o modelo é mais utilizado nas áreas de Administração da Informação e de Gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação do evento analisado. Observou-se também que os autores utilizam o modelo preponderantemente sob uma postura de aceitação ou neutralidade, havendo baixa significância de análise crítica do mesmo. Quanto às possibilidades temáticas de aplicação do modelo, essas se apresentaram diversas. Ainda, a maioria dos estudos que utilizam o modelo são teórico-empíricos e estudos de caso, e a abordagem qualitativa foi a mais adotada para a condução dos estudos. Como reflexão possível, a importância de se realizar apropriações da espiral do conhecimento que não só a referenciem da forma adequada, como também possam buscar avanços ao modelo concebido por meio de perspectivas mais críticas de análise. 1

1. Introdução Os estudos que envolvem o tema conhecimento têm recebido especial atenção em pesquisas relacionadas à Administração. Inserido no âmbito organizacional, o conhecimento se configura como um ativo intangível, conferindo-lhe, assim, um caráter estratégico. As temáticas que relacionam o conhecimento ao universo empresarial abrangem questões como: fluxos de conhecimento (NAKANO, 2005), criação do conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI, 2008; DAVENPORT e PRUSAK, 1999), gestão do conhecimento (TERRA, 2005; PROSBT, RAUB e ROMHARDT, 2002) e transferência do conhecimento (GIANNAKIS, 2008; GOH, 2002), havendo uma diversidade possível de aplicações teóricoempíricas. Especificamente, vários trabalhos sobre a temática utilizam o modelo de criação de criação de conhecimento de Nonaka e Takeuchi (2008), denominado espiral do conhecimento, sendo este o modelo ao qual se refere a temática central do presente artigo. A espiral do conhecimento é considerada um dos mais conhecidos e influentes modelos na literatura de estratégia do conhecimento, sendo, assim, significativamente respeitada (GOURLAY, 2006). Porém, assim como é ampla sua utilização, também pode ser a diversidade com que esta seja eventualmente apropriada. Acredita-se, nesse sentido, que haja também maior possibilidade de que, disseminada, a espiral seja apropriada de forma diferente da originalmente concebida. Pois, tratada pelos autores em seu texto base como um modelo de criação de conhecimento, a espiral tem sido muitas vezes utilizada como um modelo de gestão do conhecimento. Diante desse cenário, chega-se à seguinte questão: como ocorre a apropriação da espiral do conhecimento no campo da Administração? Para responder a essa problemática, considera-se a importância do modelo proposto por Nonaka e Takeuchi (2008) espiral do conhecimento, enquanto modelo de criação de conhecimento, objetivando-se, com o presente artigo, analisar de que forma este modelo tem sido utilizado e apropriado nos estudos no campo da Administração. Contudo, essa não será a única análise empreendida, pois se pretende analisar outros fatores referentes ao modo de apropriação. Ou seja, a contradição entre sua utilização enquanto modelo de gestão ou criação não é o aspecto central de análise, sendo apenas o fator que instigou a realização da pesquisa. Para tanto, realizou-se uma análise bibliométrica dos artigos publicados nos anais do EnANPAD (Encontro da ANPAD Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração) dos anos de 2005 a 2009, ou seja, utilizando-se um corte transversal de cinco anos. A escolha dos anais do referido evento se deu por este ser de grande relevância no campo da administração no Brasil (ZIMMER et al, 2007; DURANTE e MAURER, 2007), no qual são apresentados estudos que refletem tendências recentes para o campo de pesquisa. Com as análises, pretende-se descrever: (1) de que forma se dá a apropriação dos conceitos da espiral, seja como modelo de criação e/ou gestão do conhecimento; (2) para qual enfoque ou temática de estudos o modelo tem sido utilizado; (3) a natureza dos estudos que o empregam, enquanto teóricos e/ou empíricos; (4) a forma de abordagem do problema, enquanto qualitativa e/ou quantitativa e, por fim, (5) a postura adotada pelos autores em relação ao modelo, enquanto neutralidade, aceitação ou análise crítica do mesmo. Dessa forma, acredita-se que o presente trabalho venha a contribuir para reflexões acerca da utilização do modelo, bem como para orientar pesquisadores que visem a sua aplicação em futuros estudos. Após essas linhas introdutórias, será abordado um referencial teórico que versa sobre aspectos conceituais relacionados ao conhecimento e à espiral do conhecimento de Nonaka e Takeuchi. Em seguida, apresenta-se a metodologia utilizada no estudo, e a descrição e análise dos resultados. Por fim, serão tecidas as considerações finais. 2

2. Referencial teórico Para subsidiar a pesquisa, este tópico apresentará primeiramente alguns aspectos relacionados ao conhecimento. Posteriormente, será abordado o assunto alvo deste trabalho, que é a Espiral do Conhecimento. 2.1. Aspectos conceituais relacionados ao conhecimento O conhecimento é um dos recursos mais valiosos que uma empresa dispõe na nova economia. Nesta, segundo Crawford (1994), a informação e conhecimento substituem capital físico e financeiro, tornando-se uma das maiores vantagens competitivas nos negócios. A descoberta e uso do conhecimento estão relacionados ao fato de que há grande demanda por flexibilidade gerencial e diferencial competitivo entre as organizações (DAVENPORT e PRUSAK,1999; DRUCKER, 2001; TERRA, 2005). Segundo Davenport e Prusak (1999) o conhecimento tem origem e é aplicado na mente dos conhecedores. Silva (2002) relata que o conhecimento é uma habilidade inerente às pessoas e Nonaka (1994); Nonaka e Takeuchi (2008) argumentam que o conhecimento é um processo humano dinâmico de justificativa às crenças e compromissos pessoais do detentor do conhecimento, é uma função de atitude ou intenção específica, ação e significado. Probst, Raub e Romhardt (2002, p.29) apresentam uma definição bem completa do conceito de conhecimento, relatando que o mesmo seja um conjunto que inclui o conjunto cognição e habilidades que o indivíduo utiliza para resolver problemas. Ele inclui tanto a teoria quanto a prática, as regras do dia a dia e as instruções sobre como agir. O conhecimento baseia-se em dados e informações, mas, ao contrário deles, está sempre ligado a pessoas. Ele é construído pelo indivíduo e representa suas crenças sobre relacionamentos causais. Em relação às organizações, o conhecimento costuma estar embutido não só em documentos, mas em rotinas, processos, práticas e normas organizacionais (DAVENPORT e PRUSAK, 1999). Para Prosbt Raub e Romhardt (2002), o conhecimento organizacional é constituído de ativos individuais e coletivos utilizados na realização das tarefas empresariais. Os autores supracitados possuem uma idéia mais voltada para a fragmentação do conhecimento organizacional ao conhecimento de seus funcionários, ou seja, o conhecimento organizacional é formado pelo conhecimento que cada funcionário possui. Vasconcelos (2001) observa que, para se gerir conhecimento, seria imprescindível antes a gestão da ignorância, ou seja, antes de se gerenciar o conhecimento seria salutar a gestão do que não se sabe (ignorância). Tal pensamento segue a filosofia socrática de que sábio não é o que conhece respostas, e sim, o que sabe fazer perguntas. Ainda, pode-se dizer que a gestão do conhecimento seja a organização das principais políticas, processos e ferramentas gerenciais e tecnológicas, que possuem como finalidade uma melhor compreensão dos processos de geração, identificação, validação, disseminação, compartilhamento e uso dos conhecimentos estratégicos para gerar resultados para a empresa e benefícios para os colaboradores (TERRA, 2005). Segundo Fleury (2001), o processo pelo qual uma empresa gerencia o conhecimento que possui distingue-se em pelo menos três momentos: aquisição e desenvolvimento do conhecimento, disseminação do conhecimento e a memorização do conhecimento. No mesmo sentido, Davenport e Prusak (1999) definem gestão do conhecimento como sendo: um conjunto de processos que orientam a criação, disseminação e utilização do conhecimento para atingir plenamente os objetivos da organização. 3

A forma como o conhecimento é criado e transmitido é também muito discutida no mundo acadêmico, o que se relaciona, então, ao conceito de criação do conhecimento. Podese dizer que o conhecimento seja criado em um processo interativo que reúna fatores tecnológicos e sociais, além de estruturar-se de acordo com a conversão de formas tácitas em explícitas em um dado contexto organizacional (LAM, 2000; PAN; SCARBROUGH, 1999; NONAKA; TAKEUCHI, 2008). No contexto de estudos sobre a criação do conhecimento, DAVENPORT e PRUSAK (2003) elaboraram cinco modos de se gerar conhecimento organizacional, sendo eles: Aquisição: que significa a capacidade das organizações comprarem conhecimento, seja por meio de benchmarking, de outra organização, entre outras formas; Recursos dedicados: em que as organizações pretensiosamente formam equipes com fim específico de criação de conhecimento, por meio de pesquisas e desenvolvimento, ou mesmo a criação de bibliotecas ou universidades corporativas; Fusão: onde se reúnem pessoas de diferentes áreas para resolver uma situação ou problema específico. Adaptação: em que se busca permanentemente novos produtos ou práticas inovadoras que são implementadas de maneira permanente. Rede do conhecimento: que são constituídas por funcionários da empresa, podendo ser informais ou formais. Para Nonaka e Takeuchi (2008), a criação do conhecimento organizacional envolve cinco fases principais: compartilhamento do conhecimento tácito, criação de conceitos, justificação de conceitos, construção de um arquétipo e difusão interativa do conhecimento. Os autores supracitados desenvolveram a teoria de criação do conhecimento organizacional apoiada em duas dimensões: ontológica e epistemológica. A dimensão ontológica aborda os níveis de entidades criadores do conhecimento - indivíduos, grupos, organizações e interorganizações. A dimensão epistemológica é baseada na distinção entre conhecimento tácito e conhecimento explícito. Amparados pelas dimensões citadas acima os autores desenvolveram um modelo de criação do conhecimento fundamentado em interações de conversão do conhecimento. Esse modelo será abordado no próximo tópico. 2.2. A espiral do conhecimento de Nonaka e Takeuchi O modelo de criação do conhecimento apresentado por Nonaka e Takeuchi (2008), denominado espiral do conhecimento (Figura 1), é composto por quatro modos de conversão do conhecimento tácito e explícito, a saber: Socialização, Externalização, Combinação e Internalização. Tal conversão um processo social que ocorre entre os indivíduos, e não de forma isolada, portanto o conhecimento adquirido no nível individual pode ser transferido para o nível grupal e esse para o organizacional. O conhecimento tácito é altamente pessoal e difícil de ser articulado na linguagem formal, se origina de experiências, percepções e valores individuais, sendo dependente do contexto. Já o conhecimento explícito é articulado na linguagem formal, em palavras, símbolos, números e pode ser armazenado, o que permite que ele seja facilmente transmitido dentro da organização (NONAKA e TAKEUCHI, 2008; DAVENPORT e PRUSAK, 2003). A socialização tem como objetivo criar e compartilhar conhecimentos tácitos por meio da interação entre as pessoas. Neste modo a interação é de indivíduo para indivíduo e ocorrem geralmente em compartilhamento de experiências, observação, imitação e prática (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). A externalização é a conversão do conhecimento tácito em explícito. 4

Neste modo de conversão, o conhecimento passa do indivíduo para o grupo e ocorrem na forma de metáforas, analogias, conceitos, hipóteses e modelos (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). A combinação, por sua vez, tem como objetivo sistematizar o conhecimento explícito. Neste caso, o conhecimento passa do grupo para a organização sob a forma de documentos, formalizações e conversas (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). Já a internalização tem o intuito de converter o conhecimento explícito em tácito. Na mesma, o conhecimento passa da organização para o indivíduo e está relacionado com o aprender fazendo (NONAKA e TAKEUCHI, 2008). Figura 1: Espiral do conhecimento. Fonte: Nonaka e Takeuchi (2008). Segundo os autores: [...] o modelo dinâmico da criação do conhecimento está ancorado no pressuposto crítico de que o conhecimento humano é criado e expandido através da interação social entre o conhecimento tácito e o conhecimento explícito. Chamamos essa interação de conversão do conhecimento. Não podemos deixar de observar que essa conversão é um processo social entre indivíduos, e não confinada dentro de um indivíduo (NONAKA e TAKEUCHI, 1997, p.37). Desse modo, observa-se que o modelo criado pelos autores é um modelo relacionado à questão da criação de conhecimento. Para o contexto organizacional, este tem sido significativamente utilizado. E é exatamente sobre a forma com que o mesmo tem sido apropriado no campo da Administração que se pauta a presente análise. Assim, apresenta-se a operacionalização da pesquisa no seguinte tópico. 3. Procedimentos metodológicos A pesquisa foi conduzida por meio de uma análise bibliométrica dos artigos publicados nos anais do EnANPAD nos anos de 2005 a 2009. A análise bibliométrica considera que a literatura científica é um componente do conhecimento que é produzido no âmbito da pesquisa e, sendo assim, possui informações que indicam a orientação e a dinâmica de um campo de conhecimento (MACHIAS-CHAPULA, 1998). Assim, como técnica de coleta de dados, utilizou-se a chamada pesquisa bibliográfica, por terem sido utilizados como fonte artigos científicos (GIL, 2002). Ainda, a pesquisa se caracteriza como exploratória, por buscar informações sobre a forma com que um conceito é tratado na literatura, assim como descritiva, já que pretende observar e descrever as características de um tema por meio do registro e análise de 5

informações sem sua manipulação, trabalhando com dados ou fatos da própria realidade (GIL, 2002; COLLIS e HUSSEY, 2005). Para a análise bibliométrica, adotou-se a estratégia de busca pela palavra-chave conhecimento. Em seguida, entre os artigos resultantes desta busca, procuraram-se aqueles que se referiam a Nonaka, por meio da ferramenta de localização de palavras no texto. Em seguida, observaram-se quais destes artigos utilizavam os conceitos inerentes à espiral do conhecimento de Nonaka e Takeuchi (2008) para que fossem, então, selecionados para análise. Contendo a palavra-chave conhecimento, foram encontrados, no total, 617 artigos. Porém, em relação a artigos que se referiam aos conceitos da espiral do conhecimento, resultaram apenas 40 artigos. A análise dos resultados possui um caráter quantitativo no que se refere à descrição percentual dos dados obtidos, e também pela própria abordagem quantitativa inerente aos estudos bibliométricos. Mas a abordagem também é qualitativa, pautado nas idéias de Morgan e Smirich (1980) que afirmam ser esse um tipo de pesquisa realizado quando se tem a intenção de aprofundar os conhecimentos sobre determinado assunto, enfatizando a importância de compreender os processos nos quais os seres humanos criam a realidade. Descritos então os procedimentos metodológicos da presente pesquisa, segue-se à apresentação e análise dos resultados obtidos. 4. A apropriação do modelo de Nonaka e Takeuchi (2008) nos estudos publicados nos anais do EnANPAD de 2005 a 2009 Em primeiro lugar, observou-se a quantidade de artigos que tratavam dos conceitos da espiral do conhecimento nos anais. Foram encontrados, no total, 617 artigos contendo a palavra-chave conhecimento. Em seguida, todos foram analisados para verificar quais utilizavam a espiral em suas análises teórico e/ou empíricas. Desse total, apenas 40 foram selecionados, estando distribuídos da seguinte forma entre os anais: Tabela 1: Distribuição dos artigos que utilizam a espira do conhecimento nos anais do EnANPAD de 2005 a 2009. Anais Frequência Absoluta Relativa EnANPAD 2005 6 15% EnANPAD 2006 8 20% EnANPAD 2007 9 22,5% EnANPAD 2008 13 32,5% EnANPAD 2009 4 10% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Observaram-se, neste caso, tanto os estudos que utilizaram a espiral do conhecimento como elemento central de análise, como aqueles que tratavam a mesma no referencial, mas não como conceito central para o subsídio das análises. Observa-se uma densidade maior de utilização do modelo no período de 2007-2008. Em seguida, analisou-se de que forma os estudos tratavam a espiral, enquanto modelo de criação e/ou gestão do conhecimento. Tal análise se deu devido a uma observação de que, embora o modelo tenha sido concebido originalmente por Takeuchi e Nonaka (2008) enquanto modelo de criação de conhecimento, sua utilização tem ocorrido 6

tanto como criação, quanto como ferramenta para gestão do conhecimento, que são conceitos diferentes, como se pôde observar pelo referencial teórico do presente artigo. Para identificar de que forma a espiral era tratada, os artigos foram minuciosamente analisados, já que se torna necessário entender a forma com que os autores se apropriam do modelo, o que não é permitido por meio de busca de palavras-chave ou análises de apenas alguns itens do artigo, já que muitas vezes os autores se referiam no referencial à espiral enquanto modelo de criação, mas se apropriavam do mesmo enquanto ferramenta para gestão no momento das análises e reflexões empreendidas. Nesse sentido, os resultados demonstraram o seguinte panorama: Tabela2: Formas de apropriação da espiral do conhecimento nos anais do EnANPAD de 2005 a 2009. Utilização do modelo Frequência Absoluta Relativa Criação 25 62,5% Criação/ gestão 10 25% Gestão 5 12,5% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Como se pode observar, 62,5% dos artigos se referiram ao modelo, e o utilizaram, enquanto modelo de criação do conhecimento, ou seja, da forma que este foi originalmente concebido. Outros 25% se referiram à espiral tanto como modelo de criação, como modelo de gestão do conhecimento. Por fim, 12,5% se referiram à mesma enquanto modelo de gestão. Ressalta-se que haja liberdade no campo acadêmico para que modelos e esquemas teóricos sejam aplicados pelos autores por meio de diferentes propostas o que, inclusive, pode resultar em enriquecimentos válidos para a produção de conhecimento. Ou seja, já é esperado que cada pesquisador possa considerar de forma diferente, em termos epistemológicos, ou estritamente conceituais, uma dada informação advinda de uma teoria desenvolvida por outro autor. Além disso, a utilização equivocada da espiral enquanto modelo também de gestão do conhecimento pode se justificar devido às aproximações existentes entre os conceitos de criação e gestão do conhecimento, como se pode observar pelo referencial da presente pesquisa. Além disso, os próprios Nonaka e Takeuchi (2008) afirmam que a gestão do conhecimento só acontece quando a organização completa a espiral, ou seja, sendo um modelo de criação, ela é ferramenta para quem deseja gerir o conhecimento. Contudo, a utilização do termo adequado é importante, já que os conceitos de criação e gestão guardam diferenças entre si, como se pode observar no seguinte quadro: 7

Tabela 3: Conceitos de criação e de gestão do conhecimento. Criação do conhecimento A criação do conhecimento é um processo que ocorre por meio da interação de conhecimento tácito e explícito proporcionada por um ambiente de Socialização, Externalização, Combinação e Internalização (Nonaka e Takeuchi, 2008). Gestão do conhecimento Conjunto de atividades voltadas para a promoção do conhecimento organizacional, possibilitando que as organizações e seus colaboradores possam sempre se utilizar das melhores informações e dos melhores conhecimentos disponíveis, com vistas ao alcance dos objetivos organizacionais e maximização da competitividade (ALVARENGA NETO, 2005). Processo destinado a criar e a compartilhar conhecimento, bem como a incorporá-lo aos produtos, sistemas e serviços de uma organização (BRYANT, 2003). A geração do conhecimento é um processo que pode ocorrer por meio de cinco modos: aquisição, recursos didáticos, fusão, adaptação e rede do conhecimento (DAVENPORT e PRUSAK, 1999). O processo pelo qual uma empresa gerencia o conhecimento que possui, distingue-se em pelo menos três momentos: aquisição e desenvolvimento do conhecimento, disseminação do conhecimento e a memorização do conhecimento (FLEURY, 2001). Conjunto de processos que orienta a criação, disseminação e utilização do conhecimento para atingir plenamente os objetivos da organização (DAVENPORT e PRUSAK, 1999). Fonte: elaborado pelos autores com base em Nonaka e Takeuchi (2008), Davenport e Prusak (1999), Alvarenga Neto (2005), Bryant (2003) e Fleury (2001). Dessa forma, ainda que haja a liberdade supracitada, e também as aproximações entre ambos os conceitos, defende-se que, até mesmo pelo próprio caráter científico do contexto no qual se faz a presente discussão, considera-se importante que se deixe claro se a apropriação de conceitos de alguns autores é feita de forma diferente da originalmente concebida, ou seja, é importante discorrer que a espiral é um modelo de criação de conhecimento. Assim, ainda que a maioria dos artigos tenha tratado o modelo como criação, há casos em que se nota claramente uma mudança do termo criação para o termo gestão, o que não condiz com o que está no texto base dos autores. Como exemplos, seguem alguns trechos: Modelos de gestão do conhecimento [...]. Entre os modelos mais difundidos, está, sem dúvida, o modelo proposto por Nonaka e Takeuchi [...], no qual, a partir das interações possíveis entre o conhecimento tácito e o explícito, são definidos os quatro seguintes modos de conversão do conhecimento: socialização, externalização, combinação e internalização (Trecho de artigo X selecionado). As fases do processo de GC em uma organização envolvem as quatro formas de conversão, socialização, externalização, combinação e internalização. O conjunto destas quatro formas é conhecido como espiral 8

do conhecimento (TAKEUCHI; NONAKA, 2008). (Trecho de artigo Y selecionado). Ou seja, reflete-se sobre o risco de que modelos muito disseminados na literatura sofram deturpações conceituais, ao serem intitulados por meio de outros conceitos que guardem diferenças significativas em relação ao original. Uma forma que se revelou interessante para lidar com o modelo (que é de criação) quando se quer discutir o mesmo no contexto da gestão do conhecimento, é utilizar a expressão gestão da criação, encontrada em um dos artigos analisados. Em terceiro lugar, buscou-se analisar em quais temáticas ou áreas específicas de conhecimento o modelo tem sido utilizado. Os resultados demonstram a seguinte utilização: Tabela 4: Distribuição dos artigos que utilizaram a espiral entre as áreas de interesse dos anais do EnANPAD. Áreas temáticas Frequência Absoluta Relativa ADI - Administração da Informação 15 37,5% GCT - Gestão de Ciência, Tecnologia e Inovação 8 20% EOR - Estudos Organizacionais 7 17,5% GPR - Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho 4 10% ESO - Estratégia em Organizações 3 7,5% APS - Administração Pública e Gestão Social 2 5% MKT - Marketing 1 2,5% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Assim, observa-se que a área que mais utiliza os conceitos da espiral do conhecimento é a de Administração da Informação, o que se justifica pela relação existente entre informação e conhecimento, já que o conhecimento é a informação trabalhada. Ou seja, ele está acima da informação, pois, além de ter um significado, possui também uma aplicação. Além deste fator, é uma área que possui estudos que tratam especificamente sobre o conhecimento. Em segundo lugar, está a área de Gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação, que se relaciona e contextualiza com o tema conhecimento. A área de Estudos Organizacionais também se destaca na utilização do modelo. Objetivou-se também uma análise acerca do posicionamento adotado pelos autores dos artigos em relação à espiral do conhecimento. Especificamente, analisar se os mesmos adotavam uma postura de aceitação do modelo, uma postura mais crítica ou, ainda, uma postura neutra, sem indícios claros de aceitação ou análise crítica. Os resultados demonstram o seguinte panorama: Tabela 5: Posicionamento adotado pelos autores em relação à espiral do 9

conhecimento. Posicionamento Frequência Absoluta Relativa Aceitação 23 57,5% Neutro 15 37,5% Crítico 2 5% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Observa-se, então, que a grande maioria dos artigos não apresenta uma postura crítica em relação à espiral do conhecimento, ou seja, ou a aceitam ou não apresentam algum posicionamento que lhes permita classificar como positiva ou negativa. Apenas 2 dos artigos analisados, ou seja, 5%, apresentaram uma avaliação mais crítica do modelo. A maior incidência de aceitação (57,5%) já era esperada devido à comum adoção no referencial teórico de conceitos que posteriormente subsidiam as análises e são positivamente apropriados. A análise da postura adotada pelos autores se justifica, enquanto reflexão possível, porque se defende (os autores do presente artigo) que modelos já tradicionais na literatura precisam não somente ser adotados, testados empiricamente, ou até mesmo serem utilizados para embasamentos para análises e reflexões teóricas; como também serem questionados. Pois se acredita que haja um risco de que os mesmos se tornem verdades incontestáveis se sofrerem uma proliferação acrítica na literatura. Dessa forma, embora haja na literatura críticas ao modelo de Nonaka e Takeuchi (2008), observa-se que entre os artigos publicados nos anais do EnANPAD no período considerado estas sejam pouco significativas. Seria interessante, pois, que também fosse dada atenção a algumas análises críticas já realizadas, bem como se pudesse considerar o modelo sob novos enfoques. Nesse sentido, Gourlay (2006), por exemplo, é um autor que critica fortemente, e de forma conceitual e empírica, a espiral do conhecimento. Alguns dos argumentos utilizados pelo autor são: - a proposição de que a criação do conhecimento ocorre pela interação social contínua entre conhecimento tácito e explícito, envolvendo ainda quatro modos de conversão de conhecimento é imperfeita; - a estrutura conceitual da espiral omite inerentemente o conhecimento tácito; - a espiral utiliza uma definição subjetiva radical do conhecimento, considerando o mesmo como sendo criado por gestores. Além disso, para Gourlay (2006), as evidências utilizadas para a socialização pelos autores da espiral devem ser aceitas nada mais como evidências da crença dos gerentes sobre como eles obtêm novas idéias para os produtos. Mas aceita que há alguma justificativa de que a socialização do conhecimento tácito possa ocorrer. Quanto à externalização, o autor argumenta que os casos utilizados pelos autores para exemplificar a externalização não a ilustram, pois dão a impressão de que quando falamos, já estamos externalizando, não sendo necessário o envolvimento dos atores em algum processo especial de interação. Quanto à combinação, indica a falta de detalhamento nos exemplos. A internalização, por sua vez, parece, para Gourlay (2006), difícil de ilustrar e seus exemplos também não são convincentes. Ou seja, para o autor, há uma heterogeneidade empírica mal explicada, e há evidências plausíveis apenas para a socialização e a externalização. A crítica mais séria de Gourlay (2006) está na fraqueza conceitual do modelo, em particular a omissão do inerente conhecimento tácito e a redefinição do conhecimento para significar a crença dos gestores, por exemplo, na viabilidade de novas idéias de produtos. O autor argumenta que, pela perspectiva da espiral, parece que o conhecimento é criado quando 10

os gestores decidem que algo é conhecimento para as organizações. Bereiter (2002) também é outro autor que critica o modelo, argumentando que o mesmo não explica como novas idéias são criadas, não sendo um modelo convincente. Apesar de tais críticas, nos artigos analisados não foram encontradas argumentos desta natureza, questionando na mesma medida em que o modelo o é pelos autores supracitados. Correlacionando ainda o posicionamento dos autores com a área de interesse na qual o artigo foi publicado, observou-se o seguinte panorama: Tabela 6: Correlação entre áreas temáticas dos artigos e o posicionamento adotado pelos autores quanto à espiral do conhecimento. Áreas temáticas Posicionamento Aceitação Crítico Neutro ADI - Administração da Informação 9 ------ 6 APS - Administração Pública e Gestão Social 1 ------ 1 EOR - Estudos Organizacionais 4 2 1 ESO - Estratégia em Organizações 1 ------ 2 GCT - Gestão de Ciência, Tecnologia e Inovação 6 ------ 2 GPR - Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho 1 ------ 3 MKT - Marketing 1 ------ ------ Total 23 2 15 Fonte: dados da pesquisa Assim, observa-se que os únicos estudos críticos ao modelo foram publicados na área de Estudos Organizacionais, sendo que nos demais há uma reprodução dos conceitos da espiral de forma positiva ou acrítica. Além desses fatores, foi realizada uma análise nos artigos acerca do contexto do problema de pesquisa. Tais análises demonstraram a utilização da espiral do conhecimento para os seguintes temas básicos (os temas foram agrupados para melhor visualização, indicando os assuntos que foram tratados de forma geral, e não por cada artigo especificamente): 11

Tabela 7: Temas básicos dos problemas de pesquisa dos artigos analisados. Temas básicos dos problemas de pesquisa Espiral do conhecimento e vantagem competitiva Gestão estratégica do conhecimento Criação de conhecimento e liderança Como efetivar a criação e utilização do conhecimento nas organizações Como estimular o compartilhamento de conhecimento entre colaboradores Conhecimento e aprendizagem em redes interorganizacionais e redes sociais Conhecimento e inovação Conhecimento e tomada de decisões Formação de memória organizacional Gestão do conhecimento e certificações de qualidade Gestão do conhecimento e espiral do conhecimento Gestão do conhecimento e interação universidade-empresa Gestão do conhecimento e qualidade do ensino Gestão do conhecimento relacionada ao planejamento empresarial Gestão por competências e gestão do conhecimento Instrumentos para gestão do conhecimento Integração da gestão do conhecimento a processo de negócios Ligação entre conhecimento e processos de aprendizagem Ligação entre criação do conhecimento e teorias institucionais Mecanismos para a geração de conhecimento organizacional Método de análise da criação de conhecimento Modelo de mapeamento do conhecimento O conhecimento no contexto de empresas incubadas Processos de aquisição, disseminação, transmissão e compartilhamento do conhecimento Relação entre valores organizacionais e criação do conhecimento Fonte: dados da pesquisa Ou seja, a espiral tem sido e pode ser utilizada para o tratamento de diversas temáticas dentro do âmbito da Administração. Acredita-se que tais resultados possam colaborar para indicar possíveis aplicações do modelo. Os artigos também foram analisados em relação à sua classificação enquanto estudos teóricos, teórico-empíricos e estudos de caso. Revela-se a seguinte distribuição percentual, conforme essa tipologia de estudos: 12

Tabela 8: Natureza dos estudos que utilizaram a espiral do conhecimento entre os anais do EnANPAD de 2005 a 2009. Natureza do estudo Frequência Absoluta Relativa Teórica/empírica 25 62,5% Estudo de caso 8 20% Teórica 7 17,5% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Dessa forma, observa-se que a espiral tem sido utilizada principalmente em estudos teórico-empíricos, o que se revela positivo, já que o estudo empírico pode favorecer a validação ou não do modelo, e ampliar as possibilidades de sua aproximação com a realidade. Em termos metodológicos, observou-se se os artigos utilizavam uma abordagem qualitativa e/ou quantitativa. Nesse sentido, importante destacar que a metodologia quantitativa conduz investigações por meio de um plano estabelecido a priori, com a definição de hipóteses de pesquisa e de variáveis operacionalmente definidas. Conduz medições objetivas e busca a quantificação dos resultados. Preza pela precisão e por evitar distorções. Desse modo, enumera ou mede os eventos estudados e emprega instrumentos estatísticos para analisar os dados. Por outro lado, a metodologia qualitativa de pesquisa não conduz medições nem quantificação de resultados. Ao invés disso, busca a obtenção de dados de uma forma mais reflexiva sobre os fenômenos estudados, especialmente sobre as pessoas, lugares e processos interativos. Rejeita, ainda, a redução das pessoas e do ambiente estudado a variáveis, propondo uma análise mais holística dos mesmos (GODOY, 1995). Além da opção por uma das metodologias, há a possibilidade de estudos que integrem métodos quantitativos e qualitativos, ou seja, que fazem uso da triangulação metodológica (JICK 1979; MORSE, 1991; DUFFY, 2007). Com base nessa classificação, os resultados demonstram a seguinte distribuição por tipos de abordagem: Tabela 9: Tipos de pesquisa que utilizaram a espiral do conhecimento entre os anais do EnANPAD de 2005 a 2009. Tipo de pesquisa Frequência Absoluta Relativa Qualitativa 24 60% Quantitativa 10 25% Qualitativa/quantitativa 6 15% Total 40 100% Fonte: dados da pesquisa Assim, a grande maioria dos artigos utilizou uma abordagem qualitativa de pesquisa, seguida, percentualmente, pelas abordagens qualitativas, e pela triangulação metodológica. É possível supor que a abordagem qualitativa esteja sendo a predominantemente utilizada devido ao caráter subjetivo inerente aos processos de conversão de conhecimento integrantes da espiral. Contudo, como são diversas as aplicações do modelo em estudos, as possibilidades metodológicas também se ampliam. Observa-se, ainda, uma baixa incidência de estudos utilizando a triangulação metodológica, o que é um resultado que não surpreende, já que, em 13

uma análise em anais do EnANPAD, Teixeira e Nascimento (2010) verificaram a baixa incidência da triangulação metodológica comparativamente ao volume de artigos publicados. Assim, as análises empreendidas demonstram, em termos teóricos e metodológicos, a forma com que os estudos que utilizam a espiral do conhecimento foram conduzidos no âmbito da Administração, entre os anais do evento analisado. Segue-se, então, às considerações finais do presente estudo. 5. Considerações finais O presente artigo teve como objetivo explorar e descrever a forma com que os estudos em Administração têm se apropriado dos conceitos inerentes à espiral do conhecimento proposta por Nonaka e Takeuchi (2008). Os resultados demonstraram (1) que a maioria dos artigos trata da espiral do conhecimento enquanto modelo de criação, da forma como esta foi originalmente concebida. Contudo, há uma parcela que o trata como modelo de gestão de conhecimento, sem deixar claro que foi realizada uma apropriação diferente da forma com que o mesmo foi nomeado no texto base dos autores que a propuseram. Considera-se este fator um risco para uma disseminação adequada do modelo. Em seguida, (2) verificou-se que o modelo é mais utilizado nas áreas de Administração da Informação e de Gestão da Ciência, Tecnologia e Inovação do evento analisado. Constatou-se, ainda, (3) que os autores utilizam o modelo preponderantemente sob uma postura de aceitação ou neutralidade, havendo baixa significância de análise crítica do mesmo. Quanto (4) às possibilidades temáticas de aplicação do modelo, as mesmas se apresentaram diversas. Ainda, (5) a maioria dos estudos que utilizam o modelo são teórico-empíricos e estudos de caso; (6) utilizando uma abordagem predominantemente qualitativa. Como reflexão, ressalta-se a importância do modelo da espiral do conhecimento na literatura sobre o conhecimento no âmbito da Administração e, ao mesmo tempo, a necessidade de apropriações que não só o referenciem de forma adequada, como possam buscar avanços ao modelo concebido. Como limitação do estudo, indica-se a não possibilidade de generalização dos resultados, já que foram utilizados exclusivamente para análise os anais do EnANPAD, bem como houve a escolha de um período estrito, contemplando cinco anais do referido evento. Dessa forma, como sugestões para futuros estudos, a consulta a outras fontes científicas para além do evento analisado, para que a análise possa ser ampliada, bem como um aumento no período considerado. Ainda assim, acredita-se que o presente trabalho venha a contribuir no sentido de estímulo a reflexões sobre a forma de se apropriar de um conceito clássico na literatura. Pois como conceitos muito disseminados são também muito referenciados, há um risco de que seu sentido original sofra desvios que comprometam seu entendimento e a possibilidade, inclusive, de avanços teóricos que partam de seus pressupostos. 6. Referências bibliográficas: BEREITER, C. Education and mind in the knowledge age. Mahwah, NJ and London: Lawrence Erlbaum Associates, 2002. COLLIS, J.; HUSSEY, R. Pesquisa em Administração: um guia prático para alunos de graduação e pós-graduação. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005. CRAWFORD, R. Na era do capital humano. São Paulo: Atlas, 1994. DAVENPORT, T. H.; PRUSAK, L. Conhecimento empresarial: Como as 14

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