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Transcrição:

História da Política Externa Brasileira DAESHR024-14SB/NAESHR024-14SB (4-0-4) Professor Dr. Demétrio G. C. de Toledo BRI demetrio.toledo@ufabc.edu.br UFABC 2018.II (Ano 3 do Golpe) Aula 13 3ª-feira, 17 de julho

Blog da disciplina: https://hpebufabc.wordpress.com/ No blog você encontrará todos os materiais do curso: Programa Textos obrigatórios e complementares ppt das aulas Links para sites, blogs, vídeos, podcasts, artigos e outros materiais de interesse

Horários de atendimento extra-classe: São Bernardo, sala D-322, Bloco Delta, 5as-feiras, das 14h00-15h00 e 17h30-18h30 (é só chegar) Atendimentos fora desses horários, combinar por email com o professor: demetrio.toledo@ufabc.edu.br

Aula 13 (3a-feira, 17 de julho): Governo Dutra: a criação da ONU, da OEA e da CEPAL Texto base VIZENTINI, P. F. (2004) Dutra: retrocesso e alinhamento voluntário na Guerra Fria (1946-1951), p. 55-68. Texto complementar CERVO, A. L., BUENO, C. (2017) Dutra e o alinhamento na Guerra Fria, p. 289-293.

Contexto mundial O final da II GM marca a consolidação definitiva dos EUA na condição de potência hegemônica Na década e meia que se segue ao final da guerra os EUA vão dirigir sua atenção para a reconstrução da Europa e do Japão e a expansão de seu poder sobre África e Oriente Médio e a Guerra Fria 5

Contexto mundial A América Latina, que na primeira metade do século XX havia ocupado lugar de destaque na política externa dos EUA, sobretudo imediatamente antes e durante a II GM, deixou de ser alvo da atenção dos EUA Mais do que desimportante, a questão da AL para os EUA já havia sido resolvida. A AL, por assim dizer, já havia sido conquistada pelos EUA, e não representava mais nenhuma preocupação nem oferecia qualquer espécie de vantagem que os EUA já não tivessem assegurado antes da região 6

Contexto mundial Para a AL de modo geral, e para o Brasil em especial, o ambiente das relações internacionais que se segue ao final da II GMrepresentou uma enorme frustração A condição de parceira especial da AL em relação aos EUA foi pura e simplesmente descartada. A região foi parar nas últimas posições na escala de prioridades da política externa dos EUA 7

Contexto mundial: grandes temas Reconstrução da Europa e do Japão Contenção da URSS/Guerra Fria/Doutrina Truman Instituições da hegemonia estadunidense: ONU Bretton Woods FMI BM 8

Reconstrução da Europa e do Japão Plano Marshall (1948): plano para reconstrução da Europa com recursos dos EUA Plano liderado por George C. Marshall, general do Exército dos EUA durante a II GM e secretário de Estado (1947-1949) O Plano Marshall, em linha com a Doutrina Truman de contenção do avanço do comunismo nos elos fracos (inicialmente, Grécia e Turquia), tinha por objetivo neutralizar a ameaça comunista e soviética na Europa 9

Reconstrução da Europa e do Japão Marshall Plan - Foreign Assistance Act of 1948: an act to promote world peace and the general welfare, national interest, and foreign policy of the United States through economic, financial, and other measures necessary to the maintenance of conditions abroad in which free institutions may survive and consistent with the maintenance of the strength and stability of the United States. 10

Reconstrução da Europa e do Japão General Douglas A. MacArthur, comandante do SCAP (Comando Supremo das Forças Aliadas) e líder das forças de ocupação do Japão Além do apoio econômico, o Japão teve suas instituições políticas e econômicas profundamente redesenhadas pelos EUA durante a ocupação 11

Contenção da URSS/Guerra Fria/Doutrina Truman As disputas entre EUA e URSS começaram pouco tempo depois do fim da II GM O objetivo dos EUA era conter a influência soviética na Europa; o objetivo da URSS era impedir que os EUA e seus aliados ocupassem ou tivessem influência sobre países que faziam fronteira com a URSS Doutrina Truman (1947): impedir o avanço do comunismo e da URSS. Materializou-se na forma de ajuda externa e intervenções militares 12

Instituições da hegemonia estadunidense Bretton Woods (1944) Banco Mundial, fundado como Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento (1944) Fundo Monetário Internacional (1945) Organização das Nações Unidas (1945) - Conferência de São Francisco 13

Instituições da hegemonia estadunidense Vetores da política externa dos EUA para a AL no pósguerra: Ascensão à condição de potência hegemônica Manutenção da hegemonia estadunidense na América Latina Expansão dos interesses empresariais estadunidenses na AL 14

Queda de Vargas em 1945 O General Eurico Gaspar Dutra é eleito presidente (1946-1951) Dutra vai alterar a política econômica e a política externa de Vargas, ambas alterações sem sucesso 15

(...) O condestável do regime autoritário e exsimpatizante do Eixo era agora um fiel aliado de Washington. Essa seria a marca de seu governo (...). Uma mudança de tal magnitude resultava tanto de uma nova correlação de forças interna como, sobretudo, externa. (Visentini 2004: 55) 16

Após a fase inicial de cooperação entre Estados Unidos e União Soviética no pós-guerra, com o intuito de reconstruir a Europa e a polarização mundial em duas zonas de influência política neste primeiro momento, iniciaram-se os anos da Guerra Fria e uma nova ordem mundial. Isso alterava profundamente as possibilidades de inserção internacional do Brasil, pois a América Latina não era considerada uma zona prioritária e em disputa, mas um espaço que fazia parte da esfera de influência norte-americana. (Visentini 2004: 56) 17

A diplomacia brasileira não apenas se alinhava automaticamente às posições americanas nas organizações internacionais, como, geralmente, se excedia em seu conservadorismo, tomando atitudes que não eram solicitadas nem praticadas pelos Estados Unidos. (Visentini 2004: 58) 18

(...) Dutra e seu novo chanceler Raul Fernandes trataram de provocar a ruptura das relações diplomáticas com Moscou (...) Na verdade, essa ruptura fazia parte de uma política mais ampla, e fora longamente preparada pelo governo e pela chancelaria. (...) Essa política anticomunista não se devia apenas às concepções ideológicas e necessidades sociopolíticas do governo e das elites brasileiras. Seu caráter um tanto exagerado vinculava-se, igualmente, à necessidade de evidenciar perante os Estados Unidos o engajamento do país na luta contra a subversão. (Visentini 2004: 59) 19

(...) O governo Dutra viria a vincular-se estreitamente à estratégia da Casa Branca. (...) Alinhou-se automaticamente aos Estados Unidos, sem qualquer avaliação objetiva e deixando de lado os próprios interesses brasileiros, que muitas vezes eram contrários à política de Washington. Nada era pedido em troca de tal alinhamento (...). (Visentini 2004: 59) 20

Ocorreram inúmeros atritos entre [o chanceler Raul Fernandes] e Osvaldo Aranha, então presidente da Assembleia Geral e chefe da delegação brasileira na ONU. (Visentini 2004: 60) 21

(...) Raul Fernandes, que possuía uma visão provinciana e defendia incondicionalmente o alinhamento brasileiro à política norte-americana. (Visentini 2004: 60) 22

Osvaldo Aranha (...) percebeu a real situação da política internacional do período e a colaboração entre os dois países dominantes: Estados Unidos e URSS. Percebeu também que a posição política defendida pelo Brasil em relação aos Estados Unidos, de aliado preferencial na América Latina, não existia. O interesse norte-americano agora estava voltado para a Europa que se reconstruía, tornando-se palco da disputa pela hegemonia mundial. (Visentini 2004: 60-61) 23

O alinhamento brasileiro baseava-se em várias considerações. Durante a Segunda Guerra Mundial a atenção política norte-americana voltou-se para os países latino-americanos, considerados então como estratégicos. (...) Com o advento da Guerra Fria a política externa americana passou a ter suas prioridades voltadas às regiões devastadas pela guerra mundial, e que agora constituíam as fronteiras quentes da Guerra Fria. (Visentini 2004: 61) 24

(...) A América Latina via-se abandonada pelos Estados Unidos, que a encorajava somente a eliminar as restrições e controles cambiais para lograr a entrada de capitais privados. (Visentini 2004: 61-62) 25

Dessa forma, por que então a diplomacia brasileira alinhava-se à americana? O Brasil de Dutra julgava constituir um aliado privilegiado dos Estados Unidos (...). Em função do ativo apoio a Washington durante a Segunda Guerra Mundial e do alinhamento automático na Guerra Fria, os conservadores brasileiros, então no poder, esperavam manter relações especiais com o governo norte-americano. (Visentini 2004: 62) 26

À subserviência político-diplomática somou-se a econômica. (...) Vargas, na oposição, denunciava a possibilidade de o governo abrir o setor siderúrgico e petrolífero a grupos estrangeiros. (...) Vargas (...) acercou-se dos grupos sociais descontentes com a política de Dutra e denunciava a entrega da indústria e da economia nacionais ao capital estrangeiro, articulando assim a sua volta ao poder através da aliança com esses grupos. (Visentini 2004: 62-63) 27

Em agosto de 1947 ocorreu em Petrópolis a Conferência Interamericana sobre a Defesa do Continente, cujo principal resultado seria a assinatura do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR). Mas o evento também teve, indiretamente, algumas consequências no plano econômico. (...) Acordou-se a criação da Comissão Brasil-Estados Unidos [Comissão Abbink-Bulhões], para estudar e elaborar um programa para o desenvolvimento. (Visentini 2004: 63-64) 28

Durante os trabalhos da Comissão, os Estados Unidos procuraram não se comprometer com qualquer apoio concreto ao Brasil, mantendo-se no plano das analises e sugestões. O relatório Abbink, em essência, não fez senão repetir as recomendações liberais (...). (Visentini 2004: 64) 29

O estabelecimento do TIAR teve como desdobramento a criação da Organização dos Estados Americanos (OEA), em Bogotá, na IX Conferência Interamericana de 1948. O TIAR e a OEA constituem elementos decisivos para a compreensão das relações dos Estados Unidos com a América Latina. O TIAR era um acordo militar pelo qual os Estados Unidos e os países latino-americanos comprometiam-se em apoiar qualquer um dos signatários em caso de ameaça armada externa. (Visentini 2004: 65) 30

O tratado também possibilitava a adoção de medidas contra outras formas de agressão à Zona de Segurança. (...) Essa ameaça externa não nomeada explicitamente era a URSS, que já não era mais considerada parceira dos Estados Unidos, e simo perigo vermelho. Embora Moscou não tivesse meios ou interesse em atuar na política latino-americana. (Visentini 2004: 65) 31

Já a OEA, com sede em Washington, estabelecia vínculos políticos entre os países ligados militarmente pelo TIAR. A OEA, como organização regional, institucionalizava a política pan-americanista desenvolvida desde a Doutrina Monroe, e constituía um elemento valioso para a diplomacia americana manter sob controle a política interna dos países do continente. (Visentini 2004: 65-66) 32

Dois princípios da Carta da OEA são bastante reveladores dos objetivos da Organização, e terão repercussões sérias: o da prioridade, que encarava as disputas regionais como sua esfera de competência, e não da ONU, e da o da incompatibilidade, segundo o qual nenhum dos Estados-membros poderia afastar-se do modelo político democrático vigente no Ocidente e no continente. (Visentini 2004: 66) 33

O primeiro princípio condenava a região a um certo distanciamento internacional em termos políticos, enquanto o segundo legitimava a ação dos Estados Unidos contra qualquer alteração reformista e/ou nacionalista do status quo, excetuando-se, é claro, as ditaduras anti-esquerdistas. (Visentini 2004: 66) 34

Entretanto, nem todas as organizações regionais constituíam instrumentos da diplomacia norteamericana. Em 1948 também foi criada a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), órgão da ONU sediado em Santiago do Chile. (Visentini 2004: 66) 35

Desde o início os Estados Unidos procuraram obstaculizar a criação da Cepal, a qual atendia a uma reivindicação dos países latino-americanos. Não podendo impedir sua implantação, o governo americano logrou, entretanto, restringir suas funções, que se limitaram, sobretudo à elaboração de estudos. (Visentini 2004: 66) 36

(...) A Cepal constituiu uma verdadeira Escola, que influenciou uma geração de políticos e economistas, além de dar grandes contribuições teóricas sobre a questão da dependência. Além disso, consolidou-se como um centro que defendia o desenvolvimento dos países latino-americanos, divergindo da ortodoxia liberal dos Estados Unidos. (Visentini 2004: 66-67) 37

Durante a vigência do Governo Dutra, o Brasil só obteve pequenas concessões nas relações bilaterais com os Estados Unidos, como retribuição ao seu alinhamento automático à estratégia americana. Nesse sentido, não era difícil avaliar o clima de frustração reinante no país e nas demais nações latinoamericanas. Mas a situação era pior no caso brasileiro, pois o país esperava mais vantagens. (Visentini 2004: 67) 38

Sob o ponto de vista norte-americano, o apoio da América Latina era um fato consumado e inegociável, não havendo então motivo alguma para o Brasil receber tratamento privilegiado de Washington. (Visentini 2004: 67) 39

O alinhamento político do primeiro governo Vargas, conquistado através de uma estratégia na qual foi possível barganhar benefícios econômicos e participação efetiva na guerra, deu aos seus sucessores a ideia de privilégio no trato com os norte-americanos. Em nome dessa posição, o Governo Dutra aliou-se incondicionalmente à política de Washington, aceitando exigências e programas elaborados pelos Estados Unidos. (Visentini 2004: 67) 40

adaptou-se à nova realidade internacional, alimentando uma convicção válida para a época da guerra, mas que se mostraria equivocada para as novas condições do pós-guerra, qual seja, a da permanência de relações especiais entre o Brasil e os Estados Unidos. (Doratioto e Vidigal 2015: 67) 41

Ao analisar a política externa brasileira de 1930 a 1951, por meio da comparação entre os governos Vargas e Dutra, Gerson Moura chegou à desconcertante conclusão de que, ao longo desses anos, o país alternara dois tipos de comportamento: de um lado, o discurso grandioso e a atuação pífia ; de outro, a obediência servil, ignorando as possibilidades que o cenário internacional se lhe apresentava dois comportamentos instruídos por decisões de gabinete, sem raízes sociais sólidas, porém enunciado. (Doratioto e Vidigal 2015: 70) 42