SUBSTITUIÇÃO DO DENTE POR IMPLANTE: OS LIMITES DO TRATAMENTO PERIODONTAL Substitution of a tooth by implant: the limits of periodontal therapy



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Transcrição:

R. Periodontia - Dezembro 2008 - Volume 18 - Número 04 SUBSTITUIÇÃO DO DENTE POR IMPLANTE: OS LIMITES DO TRATAMENTO PERIODONTAL Substitution of a tooth by implant: the limits of periodontal therapy Cassiano Kuchenbecker Rösing¹, Tiago Fiorini², José Mariano da Rocha³ RESUMO A literatura demonstra, de maneira convincente, que a doença periodontal tem cura e que mesmo dentes com reduzido suporte periodontal têm bom prognóstico, desde que tratados e mantidos de maneira adequada. Implantes dentários, quando bem indicados e tecnicamente bem executados, também apresentam bons resultados. Porém, existe um certo ceticismo em relação aos limites do tratamento periodontal por parte de dentistas e pacientes, enquanto uma popularização crescente está relacionada ao uso de implantes. Uma análise crítica da literatura revela diferenças consideráveis entre as populações estudadas, os desenhos metodológicos e o período de acompanhamento de estudos que envolvem dentes e implantes. Fatores de risco associados à perda dentária, como suscetibilidade à doença e hábito de fumar parecem também estar associados a maiores complicações em implantes. Quando observadas apenas as taxas de sobrevivência, dentes e implantes apresentam resultados similares. Entretanto, as complicações biológicas associadas aos implantes (principalmente a periimplantite) são comuns e cada vez mais prevalentes com o passar do tempo, embora ainda pouco estudadas. A opção pela extração dentária parece não estar ligada apenas ao efeito da progressão da doença periodontal, mas sim, a presença de múltiplos complicadores do prognóstico, como necessidade de tratamento endodôntico, reconstrução protética com pinos e presença de fatores de risco sistêmicos. Com base nos estudos da literatura, a Odontologia necessita fazer uma reflexão crítica sobre o seu papel, especialmente não abreviando a vida de órgãos humanos. UNITERMOS: Tratamento periodontal, implantes, longevidade dentária, longevidade de implantes, periimplantite, extração dentária. R Periodontia 2008; 18:34-39. ¹ Professor Adjunto de Periodontia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. ² Doutorando em Periodontia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. ³ Mestrando em Periodontia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil. Recebimento: 22/10/08 - Correção: 03/11/08 - Aceite: 25/11/08 INTRODUÇÃO A doença periodontal tem cura. Inúmeros estudos demonstraram, de maneira convincente, que mesmo pacientes com doença periodontal avançada, quando tratados de maneira apropriada, mantêm sua dentição por toda a vida (Hirschfeld & Wasserman, 1978; Lindhe & Nyman, 1984; Rosling et al., 2001; Axelsson et al., 2004; Lundgren et al., 2008). A literatura demonstra também que dentes saudáveis, mas com o periodonto reduzido, são capazes de suportar extensos trabalhos protéticos por longo tempo (Nyman & Ericsson, 1982). Entretanto, este conhecimento não tem sido utilizado de maneira rotineira na prática clinica da maioria dos dentistas. Por outro lado, o advento e a popularização da terapia com implantes causaram grandes mudanças na forma como os cirurgiões dentistas têm abordado seus pacientes. O sólido embasamento científico de que a terapia com implantes é viável e eficaz na substituição de dentes perdidos causou certa euforia, tanto no meio profissional quanto entre leigos. Termos definindo a terapia com implantes como a terceira dentição demonstram, claramente, como esta técnica terapêutica foi muito bem aceita pela comunidade científica de um modo geral. 34

A causa de tamanha discrepância de aceitação entre essas técnicas terapêuticas suscita algumas reflexões: a terapia com implantes é melhor que o tratamento periodontal em pacientes com doença periodontal avançada? Até onde se deve tratar um dente e a partir de qual momento o uso de implantes se torna a melhor opção? Quais os fatores estão associados ao prognóstico mais seguro e a melhor relação custo-benefício? Devido à relativa simplicidade da técnica e ao crescente acesso à terapia com implantes, um número cada vez maior de dentes tem sido extraído para a colocação de implantes. Neste artigo, não se tem a presunção de fixar regras para a extração ou manutenção de dentes, pois esta é uma questão que envolve inúmeras variáveis, inclusive relacionadas a percepções e desejos do paciente. Entretanto, serão abordados alguns fatores associados ao prognóstico e longevidade, tanto de dentes quanto de implantes, os quais serão úteis na escolha da melhor opção terapêutica. Além disso, uma discussão será feita da forma como esta opção por extrair dentes e colocar implantes tem sido feita e suas conseqüências no longo prazo. Figura 1 Número de citações encontradas no PubMed até maio de 2008 Quantidade e qualidade dos estudos Ao realizar uma busca no PubMed com os termos PERIODONTAL DISEASE TREATMENT e DENTAL IMPLANTS, percebe-se que dentes têm sido mais estudados que implantes, tanto moderna quanto cumulativamente (Figuras 1 e 2). Percebe-se, também, que o número de ensaios clínicos ainda é muito baixo quando comparado ao total de publicações, para ambas as terapias. Outro aspecto que chama a atenção são os diferentes critérios usados para a definição de sucesso das terapias periodontais e com implantes. Enquanto alguns artigos utilizam critérios como conforto mastigatório, estética e aparência, outros utilizam apenas a sobrevivência dos dentes e implantes. Quando diferentes pontos de corte para variáveis como perda óssea e profundidade de sondagem são usados para definição de sucesso, a comparação torna-se ainda mais complicada. Além disso, dependendo do tipo de população estudada e do sistema de implantes avaliado, diferentes taxas de sobrevida são encontradas. Em virtude de tantas peculiaridades, a comparação entre dentes e implantes é normalmente realizada através de generalizações, pois a abordagem individualizada de cada aspecto acima citado é praticamente inviável. O EFEITO DO TRATAMENTO PERIODONTAL EM DENTES COM DOENÇA PERIODONTAL AVANÇADA O efeito da terapia periodontal é reconhecido há muito Figura 2 Número de citações encontradas no PubMed nos últimos 5 anos tempo na literatura odontológica. Estudos clássicos como o de Hirschfeld & Wasserman (1978) demonstraram o resultado do tratamento periodontal em 600 pacientes acompanhados por um período mínimo de 15 anos, com média de acompanhamento de 22 anos. Os pacientes do estudo foram classificados em 3 grupos, de acordo com o número de dentes perdidos durante o período de acompanhamento: well maintained (n = 499) - perderam de 0 a 3 dentes, downhill (n=76) - perderam de 3 a 9 dentes e extreme downhill (n = 25) - perderam de 10 a 23 dentes. A perda dentária por motivos periodontais foi de 7,1%, sendo que 1,2% dos dentes foram perdidos por outros motivos. Neste estudo, os autores demonstram que mesmo após o longo período de acompanhamento, metade dos pacientes (n = 300) não perdeu nenhum dente, enquanto apenas 4,2% deles (n = 25) foram responsáveis por grande parte das perdas dentárias. Um dos principais argumentos contra a terapia periodontal (e a favor da colocação de implantes) é de que dentes com reduzido suporte ósseo, mesmo que estáveis do ponto de vista periodontal, são incapazes de suportar reabilitações protéticas. Porém, os benefícios da terapia não foram demonstrados apenas pela sobrevida de dentes, mas também pela manutenção de dentes em função mesmo com 35

reduzido suporte periodontal. Nyman & Ericssson (1982) avaliaram a estabilidade dos parâmetros clínicos periodontais em pacientes com avançada doença periodontal tratados e mantidos ao longo de um período de 8-11 anos. Estes pacientes foram submetidos a extensos trabalhos de reabilitação protética, sendo que em apenas 8% dos casos a área de inserção dos pilares remanescentes era igual ou superior a área dos dentes repostos proteticamente. Em 57% dos casos a área de suporte periodontal remanescente era de menos da metade da área agora ocupada pelos pônticos. Mesmo nessas condições, as próteses se mantiveram em função ao longo do tempo e as falhas que ocorreram estiveram relacionadas a fraturas nas próteses e não à progressão de doença periodontal. Rosling et al (2001) avaliaram o efeito do tratamento periodontal sobre pacientes com diferentes suscetibilidades à doença em um estudo com 12 anos de acompanhamento. Os sujeitos do estudo foram classificados como com suscetibilidade normal (SN, n = 225) ou com alta suscetibilidade à doença periodontal (AS, n = 109). Todos foram tratados e mantidos através de visitas periódicas de acordo com a necessidade individual. Os resultados demonstram que apesar de uma maior perda dentária no grupo AS quando comparado ao SN (1,9 dentes versus 0,3) e maior perda óssea (0,06 mm/superfície/ano versus 0,04 mm/superfície/ano), o tratamento periodontal consegue manter níveis de inserção razoavelmente estáveis ao longo do tempo, com poucas perdas dentárias. Neste estudo, aproximadamente 80% do grupo AS perdeu menos de 3 dentes durante os 12 anos. Um fato a ser ressaltado tanto no estudo de Hischfeld & Wassermann (1978) quanto no de Rosling et al (2001) é a polarização da perda dentária, ou seja, uma pequena porção dos indivíduos é responsável por grande parte das perdas. A interpretação desse fato ainda é baseada em especulações, mas há indícios de que esses indivíduos possam estar dentre aqueles com maior número de fatores de risco. O significado dessa perda no contexto reabilitador, especialmente relacionada à longevidade de implantes é incerto. Não apenas os parâmetros clínicos e a suscetibilidade do paciente são responsáveis pela sobrevida dentária. Fatores de risco ao estabelecimento e progressão da doença periodontal, como o fumo, também estão associados a maiores perdas dentárias. Recentemente, Al-Bayaty et al (2008) demonstraram que o fumo está associado a maiores perdas dentárias em diferentes faixas etárias, incluindo indivíduos jovens (7). Resultados semelhantes foram descritos por Susin et al (2006) em um estudo com uma amostra da região metropolitana de Porto Alegre (8). Qualquer tratamento periodontal deve levar este fator em conta para melhores êxitos a longo prazo. A literatura odontológica demonstra também, além do efeito do tratamento periodontal sobre a doença avançada, o efeito de programas de controle de placa sobre a prevenção de cárie, doença periodontal e perda dentária. Axelsson et al (2004) relataram perdas dentárias ínfimas (0,4-1,8 dentes, dependendo do grupo etário avaliado) durante um período extremamente longo (30 anos), sendo que a maior parte destas perdas era por fratura radicular. Tais resultados demonstram que um adequado controle de placa promove a estabilidade dos parâmetros periodontais por toda a vida. LONGEVIDADE DOS IMPLANTES Estudos prospectivos que avaliam a longevidade de implantes normalmente têm incluído um número menor de indivíduos e apresentam um período menor de acompanhamento quando comparados aos estudos que avaliam a longevidade de dentes. Também vale ressaltar que o perfil de sujeitos avaliados é diferente. Enquanto nos estudos com implantes apenas indivíduos que realizaram tratamento odontológico e que têm sido bem mantidos são avaliados, nos estudos que observam perda dentária são incluídos também sujeitos que não tiveram acesso ao tratamento dentário e não realizam manutenção freqüente (Tomasi et al., 2008). Devido a estes fatores, a incidência de perda de implantes varia menos que a incidência de perda dentária na literatura. Abreu et al (2007) compararam a condição periodontal e periimplantar de pacientes parcialmente edêntulos que foram submetidos ao tratamento com implantes há pelo menos um ano. Os autores relataram maior perda óssea e inflamação subgengival nos implantes do que nos dentes contralaterais que foram utilizados como controle, apesar de acúmulos de placa e presença de inflamação marginal semelhantes em ambos os grupos. O grupo de Karoussis et al (2003) comparou o prognóstico de implantes colocados em pacientes com e sem história prévia de doença periodontal em um estudo prospectivo com 10 anos de acompanhamento. Os autores relatam uma taxa de perda de implantes total de 7,3% ao longo dos 10 anos de acompanhamento. Pacientes com histórico prévio de doença perderam significativamente mais implantes (9,5%) que pacientes sem histórico de doença (3,5%). Além disso, a incidência de periimplantite nos pacientes com histórico de doença foi de 28,6%, significativamente maior que os 5,8% encontrados no grupo sem histórico de doença. Resultados similares foram descritos por Roos-Jansaker et al (2006 a,b,c), em um estudo retrospectivo que acompanhou 218 pacientes por um período que variou de 9 a 14 36

anos. A taxa total de perda de implantes foi de 4,3%. Um histórico prévio de periodontite esteve significativamente associado à perda de implantes. Além disso, os mesmos autores, em um estudo seqüente com a mesma amostra, relatam uma incidência de 6,6% de periimplantite, a qual afetou 16% dos pacientes. A presença de doença periodontal prévia e o hábito de fumar estiveram significativamente associados às lesões periimplantares. Pacientes considerados refratários ao tratamento periodontal (aqueles que perderam vários dentes durante um período de 13 anos de acompanhamento) foram avaliados em relação a sobrevida de implantes(fardal & Linden, 2008). Os autores relatam que estes pacientes, mais suscetíveis a perdas dentárias, também são mais suscetíveis a perdas de implantes. Após um período de acompanhamento médio de 5,4 anos, 25% dos implantes foram perdidos, situação que afetou 64% dos indivíduos considerados refratários. Este fato demonstra que os mesmos fatores envolvidos na perda dentária, sejam eles conhecidos ou não, muito provavelmente estão envolvidos também na perda de implantes. Apesar da incidência de periimplantite elevada, principalmente em sujeitos com maior suscetibilidade a doença periodontal e fumantes, poucas evidências de qualidade existem a respeito de qual seria a melhor forma de tratamento (Esposito et al, 2008). Freqüentemente estudos com amostras pequenas e curto tempo de acompanhamento têm sido encontrados na literatura. A prevalência de perdas de implantes e de periimplantite descrita na literatura é maior entre pacientes com doença periodontal prévia do que pacientes sem doença. Entretanto, este fato não contra-indica o uso de implantes nesses pacientes. Porém, o tratamento periodontal prévio e um regime de manutenção constante se tornam indispensáveis para o sucesso da terapia (Abreu & Rösing, 2007). A OPÇÃO DE EXTRAIR UM DENTE Diferentes motivos podem levar o cirurgião-dentista a tomar uma decisão de extrair um dente. Entre eles, motivos relacionados a condições de saúde oral como: cáries, doença periodontal e razões ortodônticas ou protéticas. Porém, outros fatores contribuem de forma significativa para esta decisão, como: motivos econômicos, estéticos e relacionados à vontade do paciente. Estes fatores, apesar de não estarem relacionados com condições de saúde oral, representam uma parcela significativa dos motivos que serão levados em conta na hora de extrair um dente(bouma et al., 1987; Klock & Haugejorden, 1993). Isto mostra que a extração dentária está diretamente ligada a conceitos extremamente variáveis como a definição de saúde/doença e a padrões e valores tanto do profissional quanto do paciente. A sonda periodontal é um instrumento essencial para que o clínico possa estabelecer um correto diagnóstico e construir corretamente um planejamento de tratamento para o paciente. Apesar disso, uma parcela significativa dos profissionais no Brasil não realiza o exame clinico periodontal como rotina (80,7%) e menos da metade dos profissionais (42,1%) sequer possui sonda periodontal em seus consultórios (Ramos Cury et al., 2006). Um aspecto que chama atenção nesse estudo é que apenas 50% dos profissionais com especialização em implantodontia têm sonda no consultório e realizam o exame periodontal. Este fato leva a crer que em muitos casos a avaliação da real condição periodontal do paciente pode estar sendo realizada de forma inadequada, levando a um planejamento equivocado por parte do profissional. CONSIDERAÇÕES FINAIS Os implantes dentários são uma alternativa valiosa na reposição de dentes perdidos. Porém, é essencial lembrar que um diagnóstico acurado e uma abordagem correta de todos os fatores que levam a perda dentária (como cooperação do paciente ao tratamento, estado de saúde geral, suscetibilidade à doença, hábito de fumar, etc.) devem também ser realizados antes da colocação dos implantes, pois irão interferir de maneira semelhante na tsobrevida de implantes ao longo do tempo. Como observado no exposto nesse artigo, a popularização da implantodontia (uma técnica reabilitadora moderna), tem levado a que os profissionais da Odontologia tenham perdido um pouco de seus referenciais para a manutenção de dentes. Inclusive, há a propagação da chamada eutanásia dental como forma de prevenir perda óssea. Isso faz parte de uma conduta que enfatiza um crime inafiançável: a abreviação da vida de um órgão humano. Além disso, observando-se todos os fatores relacionados a perdas dentárias, parece que é lícito sugerir que o maior fator de risco para perdas dentárias é o profissional da Odontologia. Essa parece ser uma visão derrotista. Por outro lado, sabendo que a doença periodontal tem cura, como demonstrado nesse artigo, a motivação dos profissionais a uma retomada aos princípios básicos da manutenção de dentes é uma opção bastante importante. Também há que ser ressaltado que a escassez de estudos que tenham abordado profundamente a polarização dos problemas relacionados ao periodonto e aos implantes. Entretanto, essa observação pode estar relacionada ao seguinte fato: talvez quem mais perde dentes por doença periodontal, também seja 37

quem mais vai perder os implantes. Nesse sentido, uma frase de um dos gênios da Odontologia, o professor Jan Lindhe deve ser destacada: Quanto melhor dentista eu sou, menos implantes eu coloco. ABSTRACT The literature demonstrates, convincingly, that periodontal disease has a cure and that even teeth with reduced periodontal support have a good prognosis, if they are adequately treated and maintained. Dental implants, when well indicated and performed correctly present good results. However, a certain skepticism exists related to the limits of periodontal therapy among dentists and patients, while a growing popularization of the use of dental implants. A critical analysis of the literature reveals considerable differences among studied populations, methods and time of follow-up in studies concerning teeth and dental implants. Associated risk factors to tooth loss, as disease susceptibility and smoking seem to be associated to higher degrees of implant complications. When survival rates only are observed, teeth and implants present similar results. However, biological complications associated to implants (especially periimplantitis) are common and with increasing prevalence, despite of the small amount of studies. The option for tooth extraction seems to be linked no only to progression of periodontal disease, but also to the presence of multiple prognostic factors such as need for endodontic treatment, prosthetic reconstruction with cores and systemic risk factors. Based on the current literature, Dentistry needs to think about its role, especially when abbreviating the life of human organs. UNITERMS: Periodontal therapy, implants, tooth longevity, implant longevity, periimplantitis, tooth extraction. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1- Hirschfeld L, Wasserman B. A long-term survey of tooth loss in 600 treated periodontal patients. J Periodontol. 1978 May;49(5):225-37. 2- Lindhe J, Nyman S. Long-term maintenance of patients treated for advanced periodontal disease. J Clin Periodontol. 1984 Sep;11(8):504-14. 3- Rosling B, Serino G, Hellstrom MK, Socransky SS, Lindhe J. Longitudinal periodontal tissue alterations during supportive therapy. Findings from subjects with normal and high susceptibility to periodontal disease. J Clin Periodontol. 2001 Mar;28(3):241-9. 4- Axelsson P, Nystrom B, Lindhe J. The long-term effect of a plaque control program on tooth mortality, caries and periodontal disease in adults. Results after 30 years of maintenance. J Clin Periodontol. 2004 Sep;31(9):749-57. 5- Lundgren D, Rylander H, Laurell L. To save or to extract, that is the question. Natural teeth or dental implants in periodontitis-susceptible patients: clinical decision-making and treatment strategies exemplified with patient case presentations. Periodontol 2000. 2008;47:27-50. 6- Nyman S, Ericsson I. The capacity of reduced periodontal tissues to support fixed bridgework. J Clin Periodontol. 1982 Sep;9(5):409-14. 7- Al-Bayaty FH, Wahid NA, Bulgiba AM. Tooth mortality in smokers and nonsmokers in a selected population in Sana a, Yemen. J Periodontal Res. 2008 Feb;43(1):9-13. 8- Susin C, Haas AN, Oppermann RV, Albandar JM. Tooth loss in a young population from south Brazil. J Public Health Dent. 2006 Spring;66(2):110-5. 38

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