ROMANTISMO O Romantismo foi uma estética artística surgida no início do século XVIII, que provocou uma verdadeira revolução na produção literária da época. Retratando a força dos sentimentos, ela propôs o rompimento da postura racional da estética árcade, passando a interpretar a realidade pelo filtro da emoção, combinada à originalidade e ao racionalismo. A estética romântica substitui a exaltação da nobreza pela valorização do indivíduo e de seu caráter. Em lugar de louvar a beleza clássica, que exige a perfeição, o artista romântico elogia o esforço individual, a sinceridade e o trabalho. Pouco a pouco, os valores burgueses vão sendo apresentados como modelos de comportamento social nas obras de arte que começam a ser produzidas. PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS LITERÁRIAS O Romantismo pode ser definido como uma arte da burguesia, tentando criar uma identidade estética para o burguês. O primeiro passo para alcançar esse objetivo é valorizar, na obra literária, o indivíduo e toda a sua complexidade emocional, abolindo o controle racional. Os textos literários traçarão o perfil de heróis que precisam agir, sofrer, superar obstáculos de toda natureza para se qualificarem como exemplares. O Romantismo considera a imaginação superior à razão e à beleza, porque ela não conhece limites. Assim, os artistas românticos encontram, na própria individualidade, as referências para a originalidade e para a interpretação própria da realidade, traduzida pelas emoções que sentem. O público que lê os textos românticos tem um perfil bem mais heterogêneo do que o restrito público dos séculos anteriores, já que a linguagem utilizada nos romances românticos era passional, direta, não seguindo, necessariamente, os padrões estéticos da herança literária. Para conquistar o público, a
leitura também tinha de ser um momento de diversão e entretenimento. Como a sociedade herdou os processos racionais e iluministas dos séculos anteriores, os românticos desejavam mudar essa mentalidade. De certa forma, seu sentimento de desajustamento social é verdadeiro e nasce do confronto entre os valores que defende, centrados no subjetivismo e na emoção, e os que organizam a sociedade em que vive. A fuga da realidade, o medievalismo e a linguagem romântica O embate entre esses dois sistemas de valores ganha forma na fuga da realidade, um dos temas mais explorados pela literatura romântica. A morte passa a ser vista como possibilidade de fuga do real e, por isso, é idealizada. Ela se manifesta como opção e alívio para os males do mundo ou para o encontro definitivo dos amantes, separados pelos obstáculos da realidade. Além da morte, o mundo dos sonhos torna-se um espaço de fuga para o romântico, onde o escritor projeta suas utopias pessoas e sociais. O passado, apresentado de modo completamente idealizado, também acolhe o olhar subjetivo do autor que se sente deslocado na sociedade. Os temas medievais, cheios de harmonia, sentimentos nobres e feitos heroicos, foram resgatados. Recuperar o passado histórico significava reconstruir os passos de um povo e reconhecer os símbolos de sua identidade; portanto, o nacionalismo foi retomado, somando um forte sentimento de orgulho de sua pátria. A linguagem dos textos românticos é marcada pela liberdade formal: para expressar o arrebatamento romântico, os autores recorrem à adjetivação constante e abandonam as fórmulas literárias, com rigorosos esquemas métricos e rimas. A
preocupação em demonstrar a subjetividade foi enorme; nos textos literários, ela era traduzida por meio da pontuação, enchendo de pontos de exclamações, interrogações e reticências. Os autores românticos, apesar de deixarem a estética formal de lado, se preocupavam em livrar do racionalismo e centrar no subjetivismo e nas emoções. O principal autor português foi Almeida Garrett (1799-1854), que comandou a missão de resgatar o passado glorioso de seu povo, encontrando figuras históricas que pudessem representar o caráter dos portugueses que, aos poucos, recuperavam sua soberania. Seus romances românticos traduziam a ideia de um país em transformação, dividido nos embates entre o antigo e o novo. ROMANTISMO NO BRASIL O contexto histórico no Brasil, no início do século XIX, era muito dinâmico. A chegada do imperador D. Pedro I, em 1808, trouxe mudanças significativas tanto na economia e na política, quanto no social: a europeização cresceu demasiadamente. A proclamação da independência, em 1822, trouxe uma inspiração para os jovens idealistas, que começaram a buscar símbolos verdadeiramente brasileiros, inclusive na literatura. No Brasil, o romantismo assume três gerações, de acordo com as características que cada uma possui. A PRIMEIRA GERAÇÃO ROMÂNTICA: nacionalista ou indianista A emancipação política, em 1822, trouxe a urgência de criar referencias concretas que consolidassem a ideia de uma nação brasileira, separada de Portugal. Muitos jovens intelectuais abraçaram a missão de escrever os textos que apresentariam, para brasileiros e estrangeiros, a face do novo país
independente como uma nação, longe da importação de temas, formas e valores portugueses. O modo de construir a consciência nacionalista era valorizar a cultura local. Assim, a intenção dos poetas da primeira geração era divulgar uma identidade nacional que, além de promover o sentimento de amor à pátria, também nos libertasse das influências literárias portuguesas. Os textos literários eram escritos para divulgar a imagem do índio e da natureza americana como elementos definidores da natureza, sendo conhecidos como nativistas ou indianistas. Os românticos projetarão o espírito do homem livre e incorruptível nos índios numa imagem bastante idealizada, tentando encontrar um veículo ideal para os valores e princípios que desejavam apresentar ao público leitor. A idealização, inclusive, era extensamente utilizada: muitas vezes, a representação literária dos elementos nacionais ganhava o tom exagerado da saudade dos exilados. Estimulados pela criação da Imprensa Régia, o público recebeu abertamente a poesia romântica, que logo fez um sucesso imediato. Apesar do Romantismo em si ter uma liberdade formal, os textos da primeira geração que encantavam o povo brasileiro eram marcados pelo controle da métrica e pela escolha das rimas. Havia uma delicada caracterização da natureza brasileira, promovendo uma identificação entre ela e os índios. O escritor Gonçalves Dias (1823-64) foi o grande nome da primeira geração romântica. Em sua poesia, ele abordou os grandes temas românticas: natureza, pátria e religião. O casamento entre a expressão dos sentimentos individuais, a idealização, a religião e a natureza mostra a força da vinculação de Gonçalves ao arrebatamento romântico. Seus poemas indianistas e líricos são consagrados até hoje; no campo do lirismo, o autor explorava o clássico amor romântico, relatando os sofrimentos da vida, da solidão e da morte.
A SEGUNDA GERAÇÃO ROMÂNTICA: ultrarromantismo A segunda geração romântica foi marcada pelo ultrarromantismo, que era caracterizado pela adoção de uma postura exagerada, associada ao arrebatamento sentimental. Os ultrarromânticos levaram a extremos a expressão de sentimentos contraditórios, vividos pela maioria deles de modo atormentado. Assim, eles se mostraram mais voltados para o próprio coração do que para os grandes temas que definiram a primeira geração. A idealização absoluta e o interesse por duas ideias essencialmente românticas, amor e morte, definem o projeto literário da segunda geração. Havia uma expressão exacerbada de um subjetivismo pessimista, sendo marcado pelo desejo da evasão da realidade, pela atração pelo mistério, e ainda pela consciência da inadaptação do artista à sociedade em que vive. Os temas dos ultrarromânticos permaneceram essencialmente os mesmos. A idealização da mulher virginal também era uma forma poética encontrada para traduzir, em imagens, os sentimentos arrebatados que vivenciavam os poetas ultrarromânticos. A morte era, de certa maneira, uma forma de sedução para os autores, uma vez que ela garante o término da agonia de viver; é no contexto das desilusões e da maneira pessimista de encarar a própria existência que a morte surge como uma solução. Os ultrarromânticos conviviam num estreito espaço acadêmico, que estimulava a troca de textos e fazia com que os autores fossem leitores uns dos outros, realimentando o interesse por temas associados à expressão de sentimentos individuais. A vida boêmia facilitava a aceitação, sem juízo moral, dos textos dos membros das sociedades. A leitura e a discussão dessa produção literária fornecia aos poetas um público de perfil intelectualmente respeitável. Eram todos leitores dos versos arrebatados de Byron e Alfred de Musset, ultrarromânticos europeus.
Para reforçarem a ideia dos temas associados ao amor e à morte, os autores do período fazem uso recorrente de algumas palavras que os auxiliam a construir as imagens de saudade, solidão, morte e pessimismo. A adjetivação pálida e o uso de expressões depressivas registravam um olhar mais pessimista para a vida. A série de vocábulos melancólicos também será utilizada para caracterizar a beleza feminina etérea idolatrada pelos autores. O poeta mais lido do ultrarromantismo brasileiro foi Casimiro de Abreu (1839-60), utilizando uma musicalidade em seus versos, que acentuava a suavidade e facilitava a memorização dos poemas. O escritor valorizava o tratamento sensível de temas como a saudade, a natureza e o desejo, sem a carga de pessimismo e culpa que aparece em outros autores da época. Outro autor bastante popular foi Álvares de Azevedo (1831-52), que explorou o tema dos desesperos passionais, tratados a partir de duas perspectivas: a série a irônica. Em sua obra Lira dos Vinte Anos, o autor divide a primeira parte pelo sentimentalismo e pelo egocentrismo típicos dos ultrarromânticos, e a segunda parte com pitadas de humor, ironia e sarcasmo. A TERCEIRA GERAÇÃO ROMÂNTICA: o Condoreirismo A partir da terceira geração, os poetas trataram mais de temas relacionados a questões sociais, sendo participantes da vertente social do Condoreirismo. Os condoreiros eram estimulados pelas condições brasileiras da época, que eram marcadas pela escravidão e pela pressão constante para o abolicionismo; portanto, o lema da liberdade era constante em seus poemas. A poesia, até então expressão subjetiva de um sentimentalismo exacerbado, torna-se um instrumento de uma causa social, priorizando, principalmente, a libertação dos escravos e a denúncia das injustiças sociais por meio da poesia. Os
condoreiros participavam apaixonadamente dos debates sociais, influenciando uma literatura mais engajada e mais consciente do contexto brasileiro do momento. Para divulgarem suas ideias abolicionistas e deflagrarem a precariedade da situação brasileira, os condoreiros procuravam atingir um público mais numeroso. Assim, os poetas vão aos teatros, às sacadas dos jornais e às praças públicas declamar seus versos, sendo poetas-oradores. Composta para ser declamada, a poesia condoreira faz uso intenso de vocativos e exclamações, uma vez que procuram dar aos textos um tom característico da oratória. O poeta Castro Alves (1847-71) foi o mais conhecido dos condoreiros. Sua produção literária revela um importante deslocamento em relação aos outros autores românticos: o sentimento da natureza é substituído pelo da humanidade, e a ordem do coração é trocada pela do pensamento. Os textos mais conhecidos sobre a escravidão aparecem no livro Os Escravos, em que a maior parte dos poemas é dedicada ao tema. OS TIPOS DE ROMANCES ROMÂNTICOS Além dos poemas, o estilo literário do Romantismo também era divulgado em romances, gêneros literários em prosa centrados num enredo, na análise dos personagens e no exame das situações descritas. Graças à vasta diversidade dos romances românticos, estes são divididos em romances: urbano, indianista e regionalista. Na grande maioria das vezes, a circulação dos romances românticos, no Brasil, era feita por meio de folhetins. O ROMANCE URBANO: o retrato de vida da corte A década de 1830 trouxe para os moradores da capital do Império uma nova forma de entretenimento: a leitura de
romances estrangeiros, principalmente franceses, traduzidos e publicados em jornais brasileiros na forma de folhetins. Os romances, marcados por lances melodramáticos e finais felizes, faziam o gosto dos jovens da corte portuguesa. Gradativamente, escritores brasileiros, entusiasmados pelo sucesso dos folhetins franceses, começaram a se aventurarem na criação de romances. Os romances urbanos têm, como característica, a preocupação em ilustrar as paixões, os interesses e o comportamento de uma classe social específica em uma determinada época. A estrutura típica desse romance apresenta um herói e uma heroína, que se apaixonam um pelo outro e precisam superar obstáculos para viverem felizes para sempre. No Brasil, o pano de fundo será o Rio de Janeiro, capital do Império. Os leitores dos folhetins românticos eram membros da elite, profissionais liberais da corte ou das províncias, e pessoas que desejavam seguir o exemplo das cortes europeias. Geralmente excluídas da sociedade, as mulheres ganharam importância significativa nos romances românticos: é geralmente a elas que o narrador se dirige, com quem dialoga e a quem pretende comover as histórias que são contadas. O romance urbano, por meio da divulgação de perfis, espaços e comportamentos reconhecidos, também investe na construção de uma identidade nacional. A consolidação dessa nacionalidade é componente fundamental do projeto literário dos romances urbanos, uma vez que os comportamentos das personagens são familiares aos leitores brasileiros. Assim, há uma democratização da literatura, ampliando seu alcance. Assim, a linguagem utilizada nos romances urbanos era bastante acessível. Nos textos, o diálogo do autor com um leitor específico marcava um aspecto de confidência trocada entre duas pessoas íntimas. O cearense José de Alencar (1829-77) foi quem deu ao romance urbano uma forma mais bem acabada. O escritor priorizava, em seus textos, as relações humanas, estudadas em
função do ambiente em que se encontram as personagens. Embora a idealização romântica continue sendo uma marca característica das suas narrativas, ele examina a sociedade de modo mais detalhado, criticando valores condenáveis, como o casamento por interesse, o que dá um caráter mais realista às histórias de amor. Em seus textos, os heróis e heroínas apresentam alguns aspectos bastante humanizados, sendo vítimas das pressões econômicas e sociais e praticando, na narrativa, comportamentos muitas vezes condenáveis. A história, porém, sempre dá aos protagonistas a oportunidade da redenção final, que será alcançada quando se entregarem a sentimentos nobres, como o amor e a compaixão. O ROMANCE INDIANISTA: a idealização dos índios A primeira geração romântica brasileira já tinha a missão de construir uma consciência de identidade nacional nos leitores, trazendo personagens brasileiros como, por exemplo, os índios. Nos romances indianistas, a escolha dos índios como heróis foi extensamente utilizada, principalmente por José de Alencar, que os idealizava enormemente. Os índios passaram a ser indivíduos cujas ações inspiravam admiração e espanto. O romance indianista cumpriu um claro projeto literário: fornecer obras aos leitores brasileiros em que o passado histórico do país fosse reconstituído, quando possível, ou inventado, quando necessário. O índio é elevado à condição de herói para atuar como um personagem que representa o povo americano, ao mesmo tempo que se comporta de acordo com os mais nobres princípios da sociedade burguesa (como honestidade, bravura, paixão e humildade), tão valorizados pelo Romantismo. A apreciação dos protagonistas era feita com base nas características da natureza exuberante. Assim, os traços nacionais ficam ainda mais reforçados, porque essas
personagens não apenas nasceram no Brasil, como também são exemplos vivos das belezas inigualáveis do país. A verossimilhança linguística também era assegurada. No momento em que foram publicados, os romances indianistas fizeram grande sucesso junto aos leitores, porque respondiam de modo direto ao gosto da época: apresentavam um herói associado a um passado histórico e pintado com as cores fortes dos valores burgueses. Nos romances indianistas de José de Alencar, o índio representava o casamento perfeito entre o elemento nativo e os valores burgueses. Em suas obras, a natureza exuberante ganha a dimensão do espaço paradisíaco original. A ficção romântica redescobre um Brasil intocado pela civilização, pleno de promessas e possibilidades, com um futuro a ser conquistado. Seus principais romances indianistas foram O Guarani e Iracema. O ROMANCE REGIONALISTA: a revelação do Brasil O regionalismo traz, para o centro do romance brasileiro, as paisagens e os tipos de um Brasil desconhecido, como os vaqueiros dos pampas e os sertanejos nordestinos. Nessas obras, é apresentada uma sociedade rural de comportamentos e valores bem diferentes daqueles da corte. O país que emerge dos romances regionalistas configura-se como gigantesco na extensão e arcaico nos costumes. O projeto literário dos romances regionalistas era revelar o Brasil para os brasileiros. Indo contrariamente à conduta das pessoas influenciadas por modelos europeus, os românticos regionalistas usaram suas narrativas para divulgarem os aspectos locais ignorados por seus contemporâneos. Para o público dos romances românticos, essencialmente urbano, descortinava-se um Brasil completamente desconhecido, desafiador e heroico.
A imagem grandiosa que os românticos desejavam fazer dos espaços brasileiros se formava através dos cenários que aparecem nas narrativas regionalistas. O olhar romântico recorre à adjetivação idealizada para pintar o cenário brasileiro, que era retratado principalmente por áreas não muito conhecidas pela sociedade brasileira, como o nordeste. O olhar do público era deslocado da capital do império, e passava a se concentrar nas características regionais. José de Alencar e Visconde de Taunay (1843-99) foram os principais autores regionalistas.