Vaginites na Infância: Valor do Estudo do Esfregaço Vaginal por Papanicolaou e por Gram Usando Escore de Nugent

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Transcrição:

Artigo Vaginites na Infância: Valor do Estudo do Esfregaço Vaginal por Papanicolaou e por Gram Usando Escore de Nugent Jose Eleutério Junior, Renata Mirian Nunes Eleutério, Diane Isabelle Magno Cavalcante Laboratório Prof. Eleutério da Costa S/C Ltda - LABPEC. Fortaleza, CE Resumo Objetivo: Avaliar a prevalência dos patógenos e o diagnóstico de vaginose usando exame de Papanicolaou e escore de Nugent em pré-púberes e suas correlações com sintomas. Métodos: Entre janeiro de 2002 e junho de 2005, duzentas e cinqüenta e cinco pré-púberes foram submetidas a exame de conteúdo vaginal, usando métodos de Papanicolaou e Gram, este último para escore de Nugent. Os achados foram relacionados com os sintomas referidos. Resultados: Em esfregaços de Papanicolaou houve processo inflamatório em 56%, dos quais 28,71% foram específicos. Em 6,6% dos casos o escore de Nugent foi de 7 a 10, sugerindo vaginose bacteriana. Na presença da queixa de corrimento, o patógeno mais prevalente foi Candida sp (15,58%), seguido por Gardnerella vaginalis (7,79%) e Mobiluncus sp (3,89%). Prurido foi associado mais freqüentemente com Candida sp (33,3%). Nenhum patógeno foi identificado quando a principal queixa foi odor. O único sintoma correlacionado com escore de Nugent acima de 7 foi corrimento. Conclusão: O esfregaço de Papanicolaou é um método simples que pode auxiliar no diagnóstico de patógenos na infância. O escore de Nugent é utilizado para confirmar a vaginose bacteriana, que ocorreu em 6% das crianças, principalmente quando referiam corrimento. Palavras-chave: Infância, vaginite, Papanicolaou, escore de Nugent Summary Aims: To evaluate the prevalence of pathogens and the diagnosis of vaginosis using Pap smear and Nugent score in pre-pubertal girls and their correlation with symptoms. Methods: Between 2002 January and 2005 June two hundred fifty five pre-pubertal girls were submitted to examination of vaginal fluid, using Papanicoloau smear and Gram to Nugent score. The findings were related with the symptoms referred. Results: On Pap smear, inflammatory process occurred in 56% (28.71% was specific). In 6.6% of the cases the Nugent score was 7 to 10 suggesting bacterial vaginosis. When discharge was referred the most prevalent pathogen was Candida sp (15.58%), followed by Gardnerella vaginalis (7.79%) and Mobiluncus sp (3.89%). Pruritus was associated more frequently with Candida sp (33.3%). No pathogen was identified when foul-smelling vaginal fluid was the principal claim. The only symptom correlated with Nugent score above 7 was discharge. Conclusions: The Pap smear is a simple method that can help in the diagnosis of pathogens in childhood. The use of Nugent score is useful just for confirmation of bacterial vaginosis, which occurred in about 6% of the children, meanly referring discharge. Keywords: Childhood, vaginitis, Pap smear, Nugent score Introdução S intomas associados a quadros inflamatórios vaginais são bastante freqüentes em consultórios de ginecologia geral e não é diferente nos serviços especializados em atendimento a crianças até a idade de 12 anos (1). A vaginite é um problema inevitável que ocasiona aproximadamente 10 milhões de visitas a clínicas por ano, mas que tem no autotratamento seu maior problema. Entre as adolescentes, pelo menos 61% referem quadro inflamatório, onde 70% se autodiagnos- 124

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ticam e se autotratam (2). Em contra-partida, cerca de 7% das jovens com sintomas vaginais apresentam na realidade eliminação de secreção fisiológica com a sua característica de muco translúcido, que tende a ocorrer na fase pré-pubere mais próxima a seu término quando começam a subir os níveis séricos de estrogênio (3). Na fase pré-puberal a vagina é hipotrofiada, tem um ph elevado (4,7) e o exame por cultura demonstra uma variedade de microorganismos incluindo Staphylococcus epidermidis, Corynebacterium sp, Escherichia coli, Enterococcus sp e, em menor quantidade, Lactobacillus sp. Ao contrário do que ocorre nas adolescentes e adultas onde há predominantemente Lactobacillus sp (2). Embora a vaginite seja um quadro clínico freqüentemente banalizado por pacientes e médicos, há de se enfatizar que necessita de completa avaliação (2). A vagina é um dos poucos sítios do corpo humano que permite acesso para realização de exames simples e que possibilita um diagnóstico mais preciso e um tratamento adequado, principalmente entre crianças com as suas peculiaridades fisiopatológicas. As freqüentes falhas terapêuticas são devido à falta de conhecimento das características deste grupo etário, utilizando-se freqüentemente abordagens semelhantes ao de mulheres adultas (4). Material e métodos De janeiro de 2002 a junho de 2005 duzentas e cinqüenta e cinco pacientes entre um e 12 anos de idade sem vida sexual, foram submetidas à colheita de conteúdo vaginal para confecção de esfregaços, que foram fixados a seco para posterior coloração pelo método de Gram e em álcool para coloração de Papanicolaou e enviados ao Labpec. Os esfregaços corados por método de Papanicolaou foram avaliados em microscópio óptico em aumentos de 100, 400 e 1000 vezes com finalidade da observação da microbiologia vaginal. Os esfregaços corados por Gram foram submetidos ao escore de Nugent (5) (Tabela 1). Não se tentou, por morfologia, diferenciar as espécies dos patógenos identificados. Foram considerados critérios para exclusão o uso de medicamentos sistêmicos ou tópicos, bem como condições de imunodepressão (transplante renal, quimioterapia, aids, etc.). Foi estudada a prevalência de patógenos em geral e com relação aos sintomas referidos. Resultados A idade da população estudada variou de um a 12 anos, no entanto, a maioria (60,46%) tinha 11 e 12 anos (Figura 1). Os motivos referidos pelas pacientes para a consulta foram variados, sendo os mais freqüentes, corrimento vaginal (68%), prurido (14,5%) e odor desagradável (6%) (Figura 2). No exame de Papanicolaou foram detectados processos inflamatórios em 56% das vezes. Sendo que os quadros em que um patógeno específico foi iden- Tabela 1. Critério diagnóstico de Nugent para vaginose bacteriana A. Lactobacillus acidophilus (bacilos Gram positivo) B. Gardnerella vaginalis e espécies bacteróides (bacilos curtos Gram variável) C. Mobiluncus sp (bacilos curvos Gram negativo ou variável) O escore total é a soma do peso da quantidade dos três morfotipos bacterianos Escore para cada um dos morfotipos Zero = sem morfotipos no campo de imersão (1000 x) 1+ = menos que um morfotipo por campo de imersão (1000 x) 2+ = um a quatro morfotipos por campo de imersão (1000 x) 3+ = cinco a trinta morfotipos por campo de imersão (1000 x) 4+ = Mais que trinta morfotipos por campo de imersão (1000 x) A soma dos pontos dá o escore final, ou seja, A + B + C: 0 a 3 = Normal 4 a 6 = Intermediária 7 a 10 = Vaginose bacteriana 126

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Figura 1. Idade de meninas estudadas por exames de Papanicolaou e Gram Figura 2. Motivo de consulta de pacientes prépúberes atendidas Tabela 2. Diagnóstico de quadros citológicos conforme a queixa referida Queixa Normal (%) Citolítico (%) Candida (%) Gardnerella (%) Mobiluncus (%) Inespecífico (%) Total Ausente 10 (52,6) 4 (21,05) 1 (5,26) 0 0 4 (21,05) 19 Corrimento 27 (21,77) 20 (16,13) 12 (9,68) 6 (4,84) 3 (2,42) 56 (45,16) 124 Prurido 6 (23,08) 5 (19,23) 5 (19,23) 1 (3,85) 1 (3,85) 8 (30,77) 26 Odor 3 (30) 3 (30) 0 0 0 4 (40) 10 tificado ocorreram em 28,71% (Tabela 2). No método de Gram, o estudo do escore de Nugent evidenciou com mais freqüência escores de 0 a 3 (50,94%) e em 6,6% o escore foi maior que 7, sugerindo uma vaginose bacteriana (Figuras 3 e 4). Ao se levar em conta a queixa referida, observou-se pelo método de Papanicolaou que no caso de corrimento, 61,6% apresentaram quadro citológico inflamatório. Em 15,58% foi identificado Candida sp (Figura 5), seguido por Gardnerella vaginalis (7,79%) (Figura 6) e Mobiluncus sp (3,89%) (Figura 7). Dentre as que referiam prurido vulvar, o diagnóstico citológico inflamatório Figura 3. Escore de Nugent de esfregaço vaginal conforme a queixa clínica foi observado em 57,7%, com os Mobiluncus sp (6,66%). Quando patógenos específicos assim distribuídos: Candida sp (33,3%), processos inflamatórios foram di- a queixa principal era odor, os Gardnerella vaginalis (6,66%) e agnosticados em 40% das vezes, 128

Figura 4. Esfregaço vaginal corado por Gram com escore de Nugent maior ou igual a 7, sugerindo vaginose bacteriana (1000 x) Figura 5. Candida sp em esfregaço vaginal (Papanicolaou 1000 x) Figura 6. Gardnerella vaginalis em esfregaço vaginal (Papanicolaou 1000 x) no entanto, não se identificou patógeno específico (Tabela 1). Com relação ao sintoma e ao escore de Nugent, quando a queixa principal foi corrimento, o escore de 7 a 10 esteve presente em 8,7%. Nos casos de prurido e odor não se observou escore nesta faixa. E em todas as condições os escores mais freqüentes foram de 0 a 3 (Figura 3). Discussão O estudo de quadros inflamatórios vaginais em meninas prépúberes e sem atividade sexual tem sido pouco abordado em estudos originais (1), por conta da dificuldade em se conseguir levar a frente uma pesquisa envolvendo esta faixa etária, quer pelas peculiaridades de abordagem quer pela falta de experiência dos profissionais em se conduzir. Assim, poucos autores têm feito publicações abordando tal assunto, mesmo que no Figura 7. Mobiluncus sp em esfregaço vaginal (Papanicolaou 1000 x) uso de métodos diagnósticos de baixo custo. Os sintomas mais referidos no grupo estudado foram corrimento (68%) e prurido (14,5%). Achados semelhantes foram observados por Koumantakis et al (1997) (6) que encontraram corrimento em 53% e prurido em 27% de uma população de crianças e adolescentes. Da mesma forma Almeida e Eleutério (1997) (1) observaram corrimento em 61% e prurido em 21,1%, também envolvendo crianças e adolescentes. Estudos anteriores utilizando o método de Papanicolaou demonstraram quadro citológico inflamatório em 73% das prépúberes e adolescentes sem atividade sexual (1). No presente estudo que avaliou apenas meninas com 12 anos de idade ou menos este número foi menor (56%). Os quadros inespecíficos foram freqüentes, o que corrobora achados de Navratil (2002) (4). Os patógenos específicos identificados por Almeida e Eleutério (1997) nos quadros inflamatórios de uma população de crianças e adolescentes sem atividade sexual foram Candida sp (49,2%), Mobiluncus sp (35,97%) e Gardnerella vaginalis (19,77%). Intrigantemente, embora tenhamos tido uma maior freqüência de Candida sp (15,58%), Gardnerella vaginalis foi mais freqüente que Mobiluncus sp (7,79% contra 3,89%). Pondera-se a possibilidade de que o envolvimento de faixas etárias maiores (adolescentes) pode induzir a um viés na 129

avaliação até porque as características fisiopatológicas vulvovaginais se alteram com o aumento da idade (7). Com relação ao escore de Nugent (5) não encontramos na literatura de língua inglesa ou latina trabalhos associando-o a estudo de vaginites em crianças, que pode ser justificado pelo fato de o escore ser considerado normal na presença predominante de Lactobacillus, que é um componente menos freqüente em vaginas de pré-púberes (1, 4, 7). No entanto, observamos que em 6,6% dos casos, houve sugestão diagnóstica de vaginose bacteriana (escore de 7 a 10). É equívoco imaginar uma relação direta entre sintomas e si- nais e a presença de determinados patógenos (1). Isto foi confirmado quando demonstramos a pouca especificidade dos sintomas com relação a patógenos no grupo aqui estudado, uma vez que quando a queixa principal foi odor não se constatou a presença de morfotipo de anaeróbio e o escore de Nugent foi de 7 a 10 em casos que referiam apenas corrimento. Já o quadro de prurido foi um pouco mais associado à Candida sp (33,33%). Assim, o estudo de vaginites na infância pode e deve ser feito por métodos simples e de uso rotineiro, podendo levar de imediato à identificação de morfotipos em cerca de 60% dos quadros inflamatórios, independente do sintoma referido. Desta forma não há necessidade de submeter a criança a um estresse adicional de nova coleta em laboratório para realização de testes, que apesar de mais específicos são menos abrangentes que o método de Papanicolaou. Já a bacterioscopia, embora de grande utilidade, não parece oferecer através do escore de Nugent benefício maior que a identificação de quadros de vaginose bacteriana em cerca de 6,6% das vezes. Correspondência para: José Eleutério Junior eleuterio@secrel.com.br Referências Bibliográficas 1. Almeida GM, Eleutério Jr J. Vulvovaginite na infância e adolescência - analise de 1107 exames citológicos. RBGO 1197; 19: 111-116. 2. Nyirjesy P. Vaginitis in the adolescent patient. Adolescent gynecology, part II - the sexually active adolescent. Pediat Clin Nort Am 1999; 46: 733-746. 3. Nyirjesy P et al. Over-the-counter and alternative medicines in the treatment of chronic vaginal symptoms. Obstet Gynecol 1997; 90: 50-53. 4. Novratil F. Genital infections in pre-pubertal girls. Ther Umsch 2002; 59:475-479. 5. Nugent RP, Krohn MA, Hillier SL. Reability of diagnosing bacterial vaginosis is improved by a standardized method of Gram stain interpretation. J Clin Microbiol 1991; 29:297-301. 6. Koumantakis EE et al. Vulvovaginitis during childhood and adolescence. J Pediatr Adolesc Gynecol 1997; 10:39-43. 7. Valore E et al. Antimicrobial components of vaginal fluid. Am J Obstet Gynecol 2002; 187:561-568. 130