Relevância dos estudos clínicos na farmacoterapia da tuberculose. em pacientes pediátricos. Lucas Fonseca Gonzaga

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Transcrição:

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Graduação em Farmácia-Bioquímica Relevância dos estudos clínicos na farmacoterapia da tuberculose em pacientes pediátricos Lucas Fonseca Gonzaga Trabalho de Conclusão do Curso de Farmácia-Bioquímica da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo. Orientadora: Profa. Dra. Silvia Regina Cavani Jorge Santos São Paulo 2018

Dedico este trabalho À Deus antes de tudo; Aos meus pais, Sandra e Wilson, sem eles nada na minha vida seria possível A minha irmã, Vivian Gonzaga, pela cumplicidade e inspiração; E a todos que acreditam no poder da Pesquisa Clínica.

If you can dream it, you can do it! (Walt Disney)

RESUMO GONZAGA, F. L. Relevância dos Estudos Clínicos na Farmacoterapia da Tuberculose em Pacientes Pediátricos. 2018. 44 f. Trabalho de Conclusão de Curso de Farmácia-Bioquímica Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018. Palavras-chave: Pediatria. Tuberculose. Estudos Clínicos. Farmacoterapia INTRODUÇÃO: A tuberculose é uma doença infecciosa que continua sendo uma das principais causas de mortalidade infantil em crianças com idade inferior a 10 anos. Os tratamentos para esse tipo de população mesmo com diretrizes já estabelecidas são baseados em dosagem extrapolada de dados de estudos clínicos conduzidos em adultos, além do uso de formulações farmacêuticas inadequadas na Pediatria. Desta forma é possível verificar que apesar de ser clinicamente relevante, o tratamento dessa doença em pacientes pediátricos com idade inferior a dez anos é de uso off-label, uma vez que até o momento é desprovido de sustentação clinica baseada em evidência. Tal fato é consequência do desinteresse da indústria farmacêutica e da falha na legislação que no momento está sofrendo modificações. OBJETIVOS: Identificar a frequência e relevância de estudos clínicos intervencionais na farmacoterapia da tuberculose em pacientes pediátricos de idade inferior a 10 anos. MATERIAIS E MÉTODOS: A revisão foi realizada com base em artigos científicos disponíveis em bases de dados para uso de toda a comunidade da Universidade de São Paulo. E os dados dos estudos clínicos foram acessados, através do Clinical Trials. A metodologia utilizada visou encontrar referências bibliográficas e dados de grande impacto e confiabilidade. RESULTADOS: Verificou-se um total de 26 estudos clínicos envolvendo crianças menores de 10 anos de idade. Esses resultados foram classificados de acordo com a faixa etária, o produto investigacional, a fase do estudo clínico e foi comparada a amostra com a quantidade de estudos clínicos disponíveis para outras faixas etárias superiores. DISCUSSÃO: As questões relacionadas ao volume de estudos clínicos pediátricos em comparação a adultos, o seu impacto na segurança dos pacientes e novas perspectivas futuras e legislativas foram abordados e discutidos detalhadamente com suporte dos resultados apresentados. CONCLUSÃO: Apesar de a tuberculose ser uma doença fatal para a população pediátrica, ainda existe um descaso das indústrias farmacêuticas no desenvolvimento apropriado de medicação para esse grupo populacional, uma vez que necessita de coleta de dados que só são possíveis com participação em estudos clínicos. E mesmo com as agências regulatórias atuando, no momento, os resultados não refletem os esforços que vem sendo feitos. Assim é necessário aguardar a consolidação da lei para que a questão das populações vulneráveis, como as crianças de até 10 anos de idade, na pesquisa clínica seja certa e dessa forma a segurança dos pacientes ao administrar uma medicação esteja comprovada.

LISTA DE ILUSTRAÇÕES Pág. FIGURA 01 - TAXAS DE INCIDÊNCIA ESTIMADAS DE TB NO MUNDO EM 2016... FIGURA 02 - COEFICIENTE DE INCIDÊNCIA DE TUBERCULOSE NO BRASIL NO PERÍODO DE 2007 A 2016... FIGURA 03 - CURVAS PROJETADAS DA INCIDÊNCIA (GRÁFICO À ESQUERDA) E MORTALIDADE (GRÁFICO À DIREITA) QUE A OMS ESPERA ALCANÇAR COM A IMPLEMENTAÇÃO DO PROGRAMA ESTRATÉGIA PELO FIM DA TUBERCULOSE NO INTERVALO DE 2015 A 2035... 11 12 18 FIGURA 04 - GRÁFICO PARA AVALIAÇÃO DO INTERVALO DE IDADE MÍNIMA UTILIZADO COMO CRITÉRIO DE INCLUSÃO NOS PROTOCOLOS CLÍNICOS DE TUBERCULOSE DISPONÍVEL ATÉ O MOMENTO... 24 FIGURA 05 - GRÁFICO COMPARATIVO DOS ESTUDOS CLÍNICOS PEDIÁTRICOS (0-10 ANOS) DE TUBERCULOSE CLASSIFICADOS POR FASE E SUA OCORRÊNCIA RELATIVA... FIGURA 06 - GRÁFICO DE COMPARAÇÃO DOS ESTUDOS CLÍNICOS QUE ENVOLVAM A POPULAÇÃO PEDIÁTRICA DE 0-10 ANOS, JOVENS COM IDADE SUPERIOR A 10 ANOS DE IDADE E ADULTOS (MAIORES OU IGUAL A 18 ANOS DE IDADE)... 26 28

LISTA DE QUADROS Pág. QUADRO 01 - ESQUEMA BÁSICO PARA O TRATAMENTO DA TB EM ADULTOS E ADOLESCENTES (MAIORES DE 10 ANOS). PARA A FASE DE MANUTENÇÃO PERMANECE O USO DAS APRESENTAÇÕES DE RH EM CÁPSULAS OU COMPRIMIDOS DE 300/200 MG E 150/100 MG ATÉ QUE ESTEJAM DISPONÍVEIS AS APRESENTAÇÕES DE COMPRIMIDOS EM DOSES FIXAS COMBINADAS DE 300/150 MG E 150/75 MG... QUADRO 02 - ESQUEMA BÁSICO PARA O TRATAMENTO DA TB EM CRIANÇAS (MENORES DE 10 ANOS)... QUADRO 03 - ESTUDOS CLÍNICOS DE TUBERCULOSE ENVOLVENDO CRIANÇAS DE 0 A 10 ANOS. NO QUADRO ABAIXO, OS ESTUDOS ESTÃO CLASSIFICADOS DE ACORDO COM O SEU STATUS E ANO DE INÍCIO. OS DADOS DOS STATUS DOS ESTUDOS FORAM COLETADOS EM JULHO DE 2018 E PODEM SER ALTERADOS, CONFORME OS OBJETIVOS DE CADA PROTOCOLO CLÍNICO... QUADRO 04 - CLASSIFICAÇÃO DOS ESTUDOS CLÍNICOS DE TUBERCULOSE ENVOLVENDO CRIANÇAS NO SEU PRIMEIRO ANO DE VIDA (0 A 1 ANO) E O PRODUTO INVESTIGACIONAL DO PROTOCOLO CLÍNICO. OS ESTUDOS QUE CONTÊM O PRODUTO INVESTIGACIONAL COMO NÃO APLICÁVEL, DEVE-SE AO FATO QUE ESTÃO RELACIONADOS A PROJETOS INTERVENCIONAIS DE TRATAMENTO DA POPULAÇÃO DE UM LOCAL ESPECÍFICO... QUADRO 05 - CLASSIFICAÇÃO DOS ESTUDOS CLÍNICOS PEDIÁTRICOS QUE UTILIZAM AGENTES ANTI-TB, DE ACORDO COM A SUA FASE CLÍNICA... QUADRO 06 - VISÃO GERAL ATUAL E HISTÓRICA DO DESENVOLVIMENTO DE ESTRATÉGIAS E O PARADIGMA DE NOVAS PROPOSTAS PARA O DESENVOLVIMENTO DE NOVOS AGENTES DE TRATAMENTO PARA A TB INFANTIL... QUADRO 07 - ESTUDOS CLÍNICOS DE TUBERCULOSE ENVOLVENDO CRIANÇAS DE 0 A 10 ANOS DE IDADE. OS DADOS DOS STATUS DOS ESTUDOS FORAM COLETADOS EM JULHO DE 2018 E PODEM SER ALTERADOS, CONFORME OS OBJETIVOS DE CADA PROTOCOLO CLÍNICO... QUADRO 08 - ESTUDOS CLÍNICOS DE TUBERCULOSE ENVOLVENDO JOVENS DE 11 A 17 ANOS DE IDADE E ADULTOS MAIORES DE 18 ANOS DE IDADE. OS DADOS DOS STATUS DOS ESTUDOS FORAM COLETADOS EM JULHO DE 2018 E PODEM SER ALTERADOS, CONFORME OS OBJETIVOS DE CADA PROTOCOLO CLÍNICO... 15 16 22 25 27 31 37 41

SUMÁRIO Pág. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS... 08 1 INTRODUÇÃO... 1.1 EPIDEMIOLOGIA DA TUBERCULOSE NO MUNDO E NO BRASIL... 1.2 TUBERCULOSE NA PEDIATRIA... 1.3 TRATAMENTOS... 1.3.1 Resistência aos tratamentos antituberculosos... 1.4 ENSAIOS CLÍNICOS E TUBERCULOSE... 1.4.1 Ensaios clínicos na pediatria... 09 10 12 13 16 17 18 2 OBJETIVOS... 20 3 MATERIAIS E MÉTODOS... 3.1 COLETA DE DADOS... 3.2 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO... 4 RESULTADOS... 4.1 ANÁLISE QUANTITATIVA DOS DADOS... 4.1.1 mínima como critério de inclusão... 4.1.2 Fases dos estudos clínicos pediátricos... 4.2 ANÁLISE COMPARATIVA DOS DADOS... 5 DISCUSSÃO... 5.1 LEGISLAÇÃO E PERSPECTIVAS FUTURAS... 20 20 21 22 22 24 26 28 29 32 6 CONCLUSÃO... 33 REFERÊNCIAS... ANEXOS... APÊNDICE A - ESTUDOS CLÍNICOS PEDIÁTRICOS... APÊNDICE B - ESTUDOS CLÍNICOS EM JOVENS E ADULTOS... 34 37 37 41

8 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS Anti-TB E EMA FDA FIOCRUZ H MDR-TB MS NIH OMS PK R RR-TB SciELO TB USP Z Antituberculoso Etambutol European Medicines Agency Food and Drug Administration Fundação Oswaldo Cruz Isoniazida Tuberculose Multirresistente Ministério da Saúde National Institutes of Health Organização Mundial da Saúde Farmacocinética Rifampicina Tuberculose Resistente a Rifampicina Scientific Electronic Library Online Tuberculose Universidade de São Paulo Pirazinamida

9 1 INTRODUÇÃO A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa causada pelas bactérias pertencentes ao gênero Mycobacterium. O gênero Mycobacterium compreende cerca de 60 espécies, sendo o principal causador patogênico da doença, o Mycobacterium tuberculosis (TRABULSI et al., 2008). A via de infecção é majoritariamente inalatória, em que um indivíduo contaminado com os bacilos patogênicos ao tossir ou falar elimina na atmosfera gotículas de secreção contendo o bacilo. Estes ao alcançarem outro indivíduo podem ser inalados alcançando os alvéolos, local esse onde se estabelecem e se desenvolvem (COSTA et al., 2013). A doença apresenta-se clinicamente na forma pulmonar e extrapulmonar. A TB pulmonar primária é a que ocorre em indivíduos que ainda não tiveram contato com o bacilo. Já a forma secundária desenvolve-se a partir de uma nova infecção (reinfecção exógena) ou da reativação de bacilos latentes (reinfecção endógena) (CAPELLOZI, 2000). Na forma pulmonar, a infecção bacteriana contagiosa afeta, principalmente, os pulmões, local onde se desenvolve uma inflamação com a formação de um nódulo exsudativo. Esse é o primeiro tipo de defesa, seguido pela imunidade adquirida com a participação de linfócitos T e macrófagos, no caso de falha do sistema imune adaptativo. Os macrófagos ativados, ao alcançarem os alvéolos, aglomeram-se ao redor dos bacilos, transformando-se em células epitelióides, as quais originam as células gigantes multinucleadas. Essa reação produtiva constitui o granuloma, cuja função básica é a de barreira à disseminação do bacilo a outros locais do tecido normal (BOMBARDA et al., 2001). O quadro clínico-radiológico dessa manifestação consiste em febre, tosse intensa e contínua, adinamia, expectoração, emagrecimento, dificuldade para respirar, sudorese por mais de 02 semanas, adenomegalia hilar ou padrão miliar, condensação ou infiltrado (com ou sem escavação) inalterado por mais de 02 semanas evoluindo com piora ou sem melhora com antibióticos para germes comuns, entre outros (SANT ANNA, 2012).

10 Apesar de a TB atingir, principalmente, os alvéolos pulmonares, ela pode alcançar demais órgãos do corpo humano, como os gânglios periféricos, a pleura, os ossos, as meninges, entre outros. Essas manifestações de TB caracterizam a doença como extrapulmonar, a qual tem sintomas variados de acordo com o órgão acometido. De acordo com as Diretrizes para Tuberculose da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia de 2009, é mais frequente essa manifestação da doença em adultos (maiores de 18 anos) do que na infância (somente 20% dos casos totais são registrados). 1.1 EPIDEMIOLOGIA DA TUBERCULOSE NO MUNDO E NO BRASIL Apesar de ser uma doença descrita há milênios, a tuberculose continua sendo um dos principais problemas de saúde global. De acordo com o Global Turbeculosis Report (2017), existem aproximadamente 10 milhões de novos casos a cada ano, sendo uma das dez principais causas de morte em todo o mundo. Os indivíduos adultos, predominantemente em homens comparado a mulheres, são mais susceptíveis ao aparecimento da infecção e estão relacionados à imunossupressão causada por desnutrição, etilismo, idade avançada, Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), diabetes e uso de medicamentos imunossupressores (MADIGAN et al., 2016; COSTA et al., 2013). A epidemiologia mundial pode ser vista, de acordo com a figura 01, em que a doença se concentra, principalmente, nas regiões da Ásia e da África, e em alguns países da América do Sul, e da Europa Oriental. A baixa prevalência é, normalmente, em países de alta renda.

11 Figura 01 - Taxas de incidência estimadas de TB no Mundo em 2016. (Adaptado de Global Tuberculosis Report, 2017). O Brasil faz parte dos países considerados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como os que concentram 80% da carga mundial de TB. Dados mais recentes de 2017, segundo o Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde de 2017, apontam que em 2016 foram diagnosticados e registrados 66.796 casos novos e 12.809 casos de retratamento de tuberculose no Brasil. A figura 02 mostra que no período de 2007 a 2016, a incidência de casos no país diminuiu, entretanto, o ministério da saúde ainda possui como meta para a erradicação da doença como problema de saúde pública no país uma incidência de menor de 10 casos para cada 100 mil habitantes.

12 Figura 02 - Coeficiente de incidência de tuberculose no Brasil no período de 2007 a 2016 (Adaptado de Boletim Epidemiológico da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, 2017). 1.2 TUBERCULOSE NA PEDIATRIA A TB, em crianças menores de 10 anos, apresenta particularidades em elação a adultos e crianças maiores de 10 anos. Como exemplo, a severidade da doença para esse grupo de pessoas. A TB é mais grave em população pediátrica do que em adultos, uma vez que a progressão da infecção tuberculosa para a infecção ativa é maior em crianças menores. O risco de tuberculose ativa é maior em crianças com menos de 5 anos de idade, e evidências recentes sugerem que crianças podem se infectar após apenas 15 a 20 min de exposição ao Mycobacterium tuberculosis (ZOMBINI et al., 2013). Além disso, uma outra diferença entre a manifestação da doença entre os grupos populacionais está ligada ao fato que ocorre maior proporção de acometimento extrapulmonar em crianças. Dos órgãos que são atingidos estão com maior intensidade os gânglios cervicais unilaterais (podendo formar fistulas); a pleura e os ossos, principalmente da coluna vertebral (ZOMBINI et al., 2013). Em pacientes pediátricos, o diagnóstico é mais complicado do que em adultos, uma vez que a identificação dos bacilos por meio da bacterioscopia e cultura de escarro são prejudicados pela característica abacilífera da doença

13 nesse grupo de pessoas. Essa característica está associada ao pequeno número de bacilos nas lesões e também pela dificuldade técnica em se obter material nas crianças por meio de expectoração (DE ALBUQUESQUE et al., 2018). As manifestações clínicas da doença na população pediátrica podem também influenciar no diagnóstico. Os sinais e os sintomas são inespecíficos e que pioram com o tempo na tuberculose infantil. Dentre os sintomas presentes inclui febre, fadiga, sudorese noturna, perda de peso, perda de apetite, fraqueza muscular, febre, dor torácica e tosse (produtiva ou não produtiva). Outros sintomas que os acometidos pela doença apresentam são palidez, linfadenopatia, hepatoesplenomegalia, eritema nodoso, ceratoconjuntivite e dor articular em alguns casos (SANT ANNA, 2012). Segundo Anna Cristina Calçada Carvalho em seu trabalho no Jornal Brasileiro de Pneumologia, em 2018, a ocorrência de tuberculose em crianças está intimamente relacionada à prevalência de tuberculose entre os adultos. Em 2016, de acordo com a OMS no seu trabalho Global Tuberculosis Report de 2017, mostrou que os casos de TB entre crianças representaram 6,9% de todos os casos no mundo e estimou-se que houve mais de um milhão de casos novos da doença, o que corresponde a 10% de todos os casos novos de tuberculose no mundo. 1.3 TRATAMENTOS Segundo o Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil de 2011 do MS, a tuberculose, apesar de ser uma doença de preocupação global, é também considerada uma doença curável em 100% dos casos novos, desde que seja sensível ao tratamento e desde que sejam obedecidos os princípios básicos da terapia medicamentosa e a adequada operacionalização do tratamento. Sendo assim, a associação medicamentosa correta, a dose e o tempo de administração do fármaco são componentes imprescindíveis para uma eficácia do tratamento, evitando a resistência bacteriana e assegurando a cura do paciente.

14 Para a questão de saúde pública e a fim de eliminar novos casos, o objetivo principal do tratamento é a quebra da cadeia de transmissão, ou seja, o tratamento está relacionado aos bacilos, os quais são os principais responsáveis pela transmissão da doença entre a população. O Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil de 2011 do Ministério da Saúde também comenta sobre o melhor tipo de esquema terapêutico antituberculoso e a sua necessidade de estar relacionado aos bacilos em três níveis. A primeira se relaciona com a capacidade do tratamento escolhido em matar o maior número de bacilos, o mais rapidamente possível, em seguida avalia-se a sua capacidade de prevenir a emergência de bactérias resistentes. E por último, o tratamento deve possuir uma alta atividade esterilizante, ou seja, eliminar virtualmente todos os bacilos de uma lesão. Desde 2009, a estratégia de tratamento padrão no Brasil segue o que foi proposto pela OMS, conforme indicado pelo quadro 01, em que se utiliza doses fixas e combinadas de comprimidos dos medicamentos Rifampicina (R), na dose de 150 mg, Isoniazida (H), na dose de 75 mg, Pirazinamida (Z), na dose de 400 mg e Etambutol (E), na dose de 275 mg. Esse esquema é indicado para todos os casos novos e para formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar (exceto meningoencefalite), bem como nos casos de recidiva e retorno após abandono de adultos e adolescentes (maiores que 10 anos de idade) (DALCOLMO, 2012).

15 Quadro 01 - Esquema básico para o tratamento da TB em adultos e adolescentes (maiores de 10 anos). Para a fase de manutenção permanece o uso das apresentações de RH em cápsulas ou comprimidos de 300/200 mg e 150/100 mg até que estejam disponíveis as apresentações de comprimidos em doses fixas combinadas de 300/150 mg e 150/75 mg (Adaptado de Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil de 2011 do Ministério da Saúde (MS), 2011). Regime Fármacos Faixa de Peso Unidade/Dose Meses RHZE 150 mg/ 75 20 kg a 35 kg 02 comprimidos 2 RHZE Fase Intensiva mg/ 400 mg /275 mg comprimido em dose fixa combinada 36 kg a 50 kg 03 comprimidos > 50 kg 04 comprimidos 02 Meses 1 comprimido ou cápsula de 20 kg a 35 kg 300/200mg ou 2 comprimidos 4 RH Fase de manutenção RH Comprimido ou cápsula de 300/200 ou de 150/100 ou comprimidos de 150/75 36 kg a 50 kg de 150/75 1 comprimido ou cápsula de 300/200mg + 1 comprimido ou cápsula de 150/100mg ou 3 comprimidos de 150/75 2 comprimidos ou cápsulas de 04 Meses > 50 kg 300/200mg ou 4 comprimidos de 150/75 Os protocolos farmacoterapêuticos para crianças com faixa etária abaixo de 10 anos consiste comumente em uma quimioterapia de curta duração de seis meses e/ou no Esquema RHZ, ou seja, na utilização dos fármacos: Rifampicina (10mg/kg), Isoniazida (10 mg/kg) e Pirazinamida (35mg/kg), conforme mostra o quadro 02 na fase intensiva inicial. Já na fase de manutenção que dura aproximadamente quatro meses, os medicamentos utilizados são Rifampicina e Isoniazida (SWAMINATHAN et al., 2010). Esse esquema é indicado para todos os casos novos e para formas de tuberculose pulmonar e extrapulmonar (exceto meningoencefalite), bem como nos casos de recidiva e retorno após abandono com doença ativa em crianças (DALCOLMO, 2012). O Brasil, mesmo que a OMS aprove, não introduziu o uso de Etambutol no regime terapêutico inicial para crianças menores de 10 anos, devido a dificuldade de se identificar precocemente a neurite ótica nesse grupo de faixa etária, além de

16 que não existem formulações pediátricas de RHZE em doses combinadas, até o momento (DALCOLMO, 2012). Quadro 02 - Esquema básico para o tratamento da TB em crianças (menores de 10 anos) (Adaptado de Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil de 2011 do Ministério da Saúde (MS), 2011). Regime 2 RHZ Fase Intensiva 4 RH Fase de manutenção Fármacos RHZ RH Peso do Doente Até 20kg >21kg a 35kg >36 kg a 45kg >45kg mg/kg/dia mg/dia mg/dia mg/dia 10 300 450 600 10 200 300 400 35 1000 1500 2000 10 300 450 600 10 200 300 400 1.3.1 Resistência aos Tratamentos Antituberculosos A questão da resistência aos antimicrobianos é uma ocorrência natural. Todo agente de tratamento, quando testado em laboratório possui uma pequena porcentagem de microorganismos que são capazes de sobreviver e se multiplicarem no laboratório (FALZON, 2011). A incidência crescente de tuberculose multirresistente - resistência da M. tuberculosis a pelo menos Rifampicina e Isoniazida - tem sido observada, em todo o mundo, desde o final da década de 1970. A OMS e organizações parceiras enxergam esse tipo de resistência como um dos grandes desafios para o controle da doença no mundo, pois se trata de resistência aos dois mais importantes medicamentos disponíveis para o tratamento da TB (WHO, 2004). Em 2016, foram 490.000 milhões de casos de TB multirresistente (MDR-TB) e mais 110.000 casos que eram suscetíveis à isoniazida, mas resistentes a rifampicina (RR-TB), a qual é a primeira linha mais eficaz contra a TB (WHO, 2017).

17 Essa resistência ao tratamento, a qual pode ser adquirida através de uma mutação ou transferência genética, ou até mesmo associada a uma determinada espécie, pode se tornar cada vez mais frequente entre os microorganismos alvos, devido ao mau uso dos agentes de tratamento, esquemas terapêuticos inadequados por dosagem e/ou posologia. Como é o caso dos regimes terapêuticos associados ao grupo pediátrico, os quais são extrapolados de dados farmacocinéticos de estudos clínicos intervencionais em adultos, uma vez que se tem uma escassez de estudos clínicos com a população pediátrica para a dosagem adequada e para o uso de formulações farmacêuticas corretas (MCILLERON et al., 2009). 1.4 ENSAIOS CLÍNICOS E TUBERCULOSE Durante a Assembleia Mundial de Saúde, em 2014, uma nova estratégia foi abordada como objetivo para a eliminação da tuberculose como um problema de saúde pública. O programa, denominado Estratégia pelo Fim da Tuberculose (End TB Strategy), tem a visão de Um mundo livre da tuberculose até 2035 (WHO, 2016). Os gráficos da figura 03 exibem o perfil de projeção das curvas de incidência e de mortalidade que se espera até o final do programa.

18 Figura 03 - Curvas projetadas da incidência (gráfico à esquerda) e mortalidade (gráfico à direita) que a OMS espera alcançar com a implementação do programa Estratégia pelo Fim da Tuberculose no intervalo de 2015 a 2035 (Adaptado de Global Tuberculosis Report, 2017). Com base nessa estratégia, o MS definiu três pilares, os quais são bases para o alcance das metas do programa, além de indicadores para o monitoramento do progresso das ações adotadas (WHO, 2016). Um dos pilares implementados refere-se a inovação e a pesquisa por novos tratamentos contra a TB com a aplicação de novos estudos clínicos (da fase I a fase III) buscando a avaliação da segurança e eficácia de novos diagnósticos, novos medicamentos ou regimes e vacinas (WHO, 2015). O mais atual Guidance for Industry Pulmonary Tuberculosis: Developing Drugs for Treatment, de 2013, define como população alvo para os estudos clínicos de TB, os adultos com tuberculose pulmonar. Enquanto a população infantil é considerada como população específica e algumas limitações são aplicadas quanto a esse tipo de população para participação nos ensaios clínicos. 1.4.1 Ensaios clínicos na pediatria A necessidade de estudos clínicos com o grupo pediátrico adequado é essencial para que as formas farmacêuticas apropriadas sejam testadas e sua

19 eficácia e segurança sejam comprovadas. As formas farmacêuticas líquidas (soluções e as suspensões orais) constituem as mais adequadas para o uso nesse grupo de pacientes, devido à dificuldade na deglutição de produtos sólidos. Como consequência da falta desses produtos na forma adequada é essencial que as farmácias hospitalares ou comunitárias preparem o medicamento para serem manipulados, sob a forma de um medicamento líquido, o que muitas vezes pode ocasionar o aparecimento de novos eventos adversos não registrados ou até mesmo desconhecidos (BARBOSA et al., 2008). O uso do procedimento de dose extrapolada, como ocorre para os casos pediátricos a partir de dados farmacocinéticos obtidos em estudos clínicos com adultos, segundo Johnson no trabalho The problems in scaling adult drug doses to children em 2008, deveria ser o último recurso. No caso da tuberculose, o uso de doses corretas é um pré-requisito essencial para a cura completa, uma vez que níveis plasmáticos do fármaco abaixo do ideal causam insuficiência do tratamento e também pode levar a maior preocupação atual relacionada a farmacoterapia da tuberculose que é a resistência ao medicamento (SWAMINATHAN et al., 2010). Apesar de ser clinicamente relevante, o tratamento para a tuberculose em pacientes pediátricos com idade inferior a dez anos é de uso off-label, uma vez que até o momento é desprovido de sustentação clinica baseada em evidência (BARBOSA et al., 2008). Tal fato é consequência de falha na legislação que está em constantes modificações. A Seção IV da Emenda de 2007 na Legislação do Food and Drug Administration (FDA) comenta as modificações e os incentivos de alguns órgãos às indústrias na aplicação dos estudos clínicos pediátricos no sentido de introduzir novos braços no ensaio clínico de uma nova molécula de forma a investigar as populações vulneráveis como aquelas de extremos de idade nos pacientes pediátricos e geriátricos. Enquanto essas mudanças na legislação internacional relativa a condução de ensaios clínicos não estiver consolidada e se tornar obrigatória no registro de uma nova molécula, esforços deverão ser realizados de forma a minimizar o problema nas populações vulneráveis. É devido a esse fato associado a outras dificuldades da condução e recrutamento de voluntários que

20 ocorre o desinteresse no desenvolvimento de estudos clínicos em pacientes pediátricos. 2 OBJETIVO(S) O presente trabalho tem por finalidade uma revisão bibliográfica sobre a frequência e a relevância que os estudos clínicos intervencionais possuem na padronização de protocolos farmacoterapêuticos para os pacientes pediátricos menores de 10 anos diagnosticados com tuberculose. 3 MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 COLETA DOS DADOS Esta revisão bibliográfica baseou-se nos dados coletados nas bases de dados eletrônicas PubMed, SciELO (Scientific Electronic Library Online), Micromedex e Web of Science em artigos científicos, diretrizes e relatórios da OMS e regulamentações de agências regulatórias para o embasamento teórico apresentado na Introdução e na Discussão. Alguns dos termos utilizados, isoladamente ou combinados, para busca foram "Tuberculosis", "Pharmacotherapy", "Pediatrics", "Pediatric Patient", "Clinical Protocol", "ClinicalTrial", "Clinical Trials in Brazil", "Clinical Trials in the World. Seus correspondentes em língua portuguesa também foram utilizados. As bases de dados escolhidas estão disponíveis para uso de toda a comunidade da Universidade de São Paulo (USP) no formato de texto completo. Para a coleta de dados dos estudos clínicos referente à seção de foi utilizado um dos sistemas que constituem as maiores e principais bases de livre acesso e registro voluntário de ensaios clínicos, o portal Clinicaltrials.gov, criado pelo Food and Drug Administration em 2007. O banco de dados é mantido pelo National Institutes of Health (NIH) americano. Atualmente o site conta com Estudos Clínicos conduzidos em 203 países e todos os Produtos Investigacionais em estudos intervencionais que buscam registro pelo FDA precisam ser inseridos no banco de dados.

21 Dessa forma, a plataforma utilizada é considerada uma ferramenta confiável e extremamente relevante para traçar um panorama dos Estudos Clínicos realizados para Tuberculose e finalizados após 2007. 3.2 CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO A amostragem dos estudos clínicos encontrados foi delimitada, a partir da plataforma Clinicaltrials.gov, utilizando uma metodologia que visou encontrar dados de grande impacto e confiabilidade para que o tema proposto pudesse ser discutido com relevância. Na base de dados mencionada acima para buscar os estudos clínicos relevantes para o projeto, foram selecionados os estudos caracterizados como de intervenção, e que envolvam participantes de ambos os sexos com idade mínima entre 0 a 10 anos, utilizando o recurso de busca avançada em ambas as bases. Foram selecionados os estudos com os status de recrutamento ativo, estudo ativo e estudo completo (com ou sem análise de dados finalizada). Não foram considerados estudos que tiveram encerramento prematuro, ou que ainda estão em fase de Start-Up, ou seja, no início do estudo e não recrutando. Este levantamento foi feito em 25 de Julho de 2018 e um total de 26 estudos foram encontrados. E com o objetivo de otimizar a revisão bibliográfica, os resultados foram divididos e analisados por categoria, além de ser analisados comparativamente com outros estudos em crianças maiores de 10 anos e adultos maiores de 18 anos.

22 4 RESULTADOS 4.1 ANÁLISE QUANTITATIVA DOS DADOS De acordo com a metodologia descrita anteriormente, foram encontrados 26 estudos nas plataformas (vide anexo 01) que têm como população alvo inclusa, crianças entre 0 a 10 anos. O quadro 03 abaixo mostra os estudos classificados por seu status e ano de início. Os resultados encontrados referem-se a um cenário mais atual dos estudos clínicos pediátricos, já que para os estudos finalizados anteriores a 2007 não havia a necessidade de publicação dos resultados dos protocolos clínicos nos portais como o Clinicaltrials.gov. Quadro 03 - Estudos clínicos de Tuberculose envolvendo crianças de 0 a 10 anos. No quadro abaixo, os estudos estão classificados de acordo com o seu status e ano de início. Título do Estudo Safety, Immunogenicity, and Impact of MVA85A, on the Immunogenicity of the EPI Vaccines Universal Screening for Tuberculosis and Anemia With the CHICA System Status Data de Início 2006 2007 A Study of MVA85A in Healthy Children and Infants 2008 A Study of MVA85A in Healthy Infants 2009 Safety and Immunogenicity Study of a Candidate Tuberculosis Vaccine in Healthy Infants 2010 Study of AERAS-402 in Healthy Infants 2010 Study to Evaluate Safety and Immunogenicity of VPM1002 in Comparison With BCG in Newborn Infants in South Africa Vitamin D Supplementation Enhances Immune Response to Bacille-Calmette-Guerin (BCG) Vaccination in Infants 2011 2011 A Knowledge Translation Intervention for TB/HIV Treatment Adherence, in Zomba District, Malawi 2011

23 Título do Estudo A Trial in Subjects Suspected to Have Tuberculosis, Comparing the Diagnostic Performance of C-Tb to QuantiFERON, in Combination With a Safety Assessment of C-Tb Versus Tuberculin PPD RT23 SSI Comparison of Diagnostic Performance of C-Tb to QuantiFERON -TB, in Combination With a Safety Assessment of C-Tb vs Tuberculin PPD RT23 SSI Evaluating Accuracy, Impact, and Operational Challenges of GeneXpert Use for TB Case Finding Among HIV-infected Persons Phase 1/II, Safety and Immunogenicity Study of AERAS-404 in BCG-Primed Infants Study to Evaluate the Tolerability and Immunogenicity of Nyaditum Resae Probiotic Administered to Pediatric Population in Contact With Tuberculosis With or Without Latent Tuberculosis Infection Study to Evaluate the Safety and Immunogenicity of VPM1002 in Comparison With BCG in HIV-exposed/- Unexposed Newborn Infants in South Africa Vitamin D Suplementation in TB Prevention Dose-escalation Safety and Immunogenicity Study to Compare MTBVAC to BCG in Newborns With a Safety Arm in Adults Preventing Childhood Tuberculosis in Lesotho (PREVENT Study) Status Data de Início 2012 2012 Ativo (Não Recrutando) 2012 2013 Recrutando 2015 2015 Ativo (Não Recrutando) 2015 2015 Recrutando 2015 Quality of Tuberculosis Care in Mumbai, India 2015 Quality of Tuberculosis Care in Urban Patna, India 2015 Infant TB Infection Prevention Study Comparative Effectiveness/Implementation of TB Case Finding in Rural South Africa Evaluation of the Effect of 3HP vs Periodic 3HP vs 6H in HIV-Positive Individuals Trial of Vitamin D Supplementation in Cape Town Primary Schoolchildren Ativo (Não Recrutando) 2016 Recrutando 2016 Ativo (Não Recrutando) 2016 Recrutando 2017 Efficacy of Nyaditum Resae(R) Against Active TB in Georgia Recrutando 2017

24 4.1.1 mínima como critério de inclusão Destes 26 estudos, de acordo com a figura 04 é possível notar que as idades mínimas diferem, quando são consideradas como critérios de inclusão definidos pelos protocolos clínicos. Segundo a amostragem acima, há uma maior tendência a não ter idade mínima para os estudos que envolvem voluntários pediátricos ou então crianças recém-nascidas de até 01 ano de idade. Além disso, nota-se que não é tendência de os estudos utilizar somente crianças a partir de 08 anos como critério mínimo para inclusão em estudos clínicos. E quando comparamos esses estudos em que se enquadram as crianças até 1 ano de vida, normalmente, estão relacionadas a prevenção da doença, uma vez que são estudos que utilizam as vacinas contra a TB como produtos investigacionais, conforme mostra o quadro 4. Figura 04 - Gráfico para avaliação do intervalo de idade mínima utilizado como critério de inclusão nos protocolos clínicos de Tuberculose disponível até o momento.

25 Quadro 04 - Classificação dos Estudos clínicos de Tuberculose envolvendo crianças no seu primeiro ano de vida (0 a 1 ano) e o produto investigacional do protocolo clínico. Os estudos que contêm o produto Investigacional como Não Aplicável, deve-se ao fato que estão relacionados a projetos intervencionais de tratamento da população de um local específico. Título do Estudo Study to Evaluate Safety and Immunogenicity of VPM1002 in Comparison With BCG in Newborn Infants in South Africa Vitamin D Supplementation Enhances Immune Response to Bacille-Calmette-Guerin (BCG) Vaccination in Infants Study to Evaluate the Safety and Immunogenicity of VPM1002 in Comparison With BCG in HIV-exposed/-Unexposed Newborn Infants in South Africa Dose-escalation Safety and Immunogenicity Study to Compare MTBVAC to BCG in Newborns With a Safety Arm in Adults Comparative Study of Bacille Calmette Guerin (BCG) Delivery Via Disposable Syringe Jet Injector and Needle & Syringe Preventing Childhood Tuberculosis in Lesotho (PREVENT Study) Quality of Tuberculosis Care in Mumbai, India Quality of Tuberculosis Care in Urban Patna, India A Trial in Subjects Suspected to Have Tuberculosis, Comparing the Diagnostic Performance of C-Tb to QuantiFERON, in Combination With a Safety Assessment of C-Tb Versus Tuberculin PPD RT23 SSI A Knowledge Translation Intervention for TB/HIV Treatment Adherence, in Zomba District, Malawi Comparative Effectiveness/Implementation of TB Case Finding in Rural South Africa Evaluating Accuracy, Impact, and Operational Challenges of GeneXpert Use for TB Case Finding Among HIV-infected Persons Safety and Immunogenicity Study of a Candidate Tuberculosis Vaccine in Healthy Infants Safety, Immunogenicity, and Impact of MVA85A, on the Immunogenicity of the EPI Vaccines Produto Investigacional Vacina Suplemento (Vitamina D) Vacina Vacina Vacina Não Aplicável Não Aplicável Não Aplicável Diagnóstico Não Aplicável Não Aplicável Diagnóstico 02 Meses Vacina 02 Meses Vacina Infant TB Infection Prevention Study 06 anas Isoniazida A Study of MVA85A in Healthy Children and Infants 06 Meses Vacina

26 Título do Estudo Comparison of Diagnostic Performance of C-Tb to QuantiFERON -TB, in Combination With a Safety Assessment of C-Tb vs Tuberculin PPD RT23 SSI Phase 1/II, Safety and Immunogenicity Study of AERAS-404 in BCG-Primed Infants Produto Investigacional 06 anas Diagnóstico 64 Dias Vacina Study of AERAS-402 in Healthy Infants 112 Dias Vacina A Study of MVA85A in Healthy Infants 126 Dias Vacina 4.1.2 Fases dos estudos clínicos pediátricos Outra análise quantitativa que foi possível verificar, dentre os resultados encontrados é referente as fases dos estudos. Do total de estudo apresentado, 4 estão em Fase 1, 7 em Fase 2, 5 em Fase 3, somente 1 em Fase 4 e 9 estudos não possuem especificação quanto a sua fase. Os dados relativos são apresentados na figura 05. Figura 05 - Gráfico comparativo dos estudos clínicos pediátricos (0-10 anos) de Tuberculose classificados por fase e sua ocorrência relativa. Quando analisamos as fases dos estudos clínicos que possuem como produto intervencional agentes de tratamento antituberculoso (anti-tb) e não

27 vacinas ou outros componentes, verifica-se que estão ligados a protocolos clínicos de fase II e III, ou seja, estudos mais tardios que envolvem coleta de informações de eficácia e segurança, conforme mostra o quadro 05 abaixo. Quadro 05 - Classificação dos estudos clínicos pediátricos que utilizam agentes terapêutico anti-tb, de acordo com a sua fase clínica. Título do Estudo Study to Evaluate the Tolerability and Immunogenicity of Nyaditum Resae Probiotic Administered to Pediatric Population in Contact With Tuberculosis With or Without Latent Tuberculosis Infection Produto Investigacional Nyaditum Resae Fase Clínica dados disponível Efficacy of Nyaditum Resae(R) Against Active TB in Georgia Nyaditum Resae Fase II Evaluation of the Effect of 3HP vs Periodic 3HP vs 6H in HIV-Positive Individuals Rifapentina / Isoniazida Fase III Infant TB Infection Prevention Study Isoniazida Fase II Cada fase dos estudos clínicos possui sua particularidade. Os estudos Fase 01 são aqueles em que se utilizam voluntários sadios, exceto no caso de determinadas doenças, como oncologia em que os produtos investigacionais são citotóxicos. Além disso, nessa fase avaliam-se dados relacionados a farmacocinética com coletas pré e pós dose, como o escalonamento de dose, a fim de se estabelecer a posologia correta para se utilizar nas próximas fases dos estudos clínicos, meia vida do medicamento, sua biodisponibilidade, entre outros dados. Já a Fase 02, utiliza voluntários que possuem a doença e se tem o objetivo de identificar nesses estudos a eficácia do produto investigacional. Os resultados obtidos nas fases 01 e 02 são confirmados nos estudos Fase 03 em que se utiliza uma quantidade maior de pacientes com a comorbidade analisada e o período de tratamento também aumenta, a fim de se coletar os dados de eficácia e segurança da molécula antes de registro.

28 Após a aprovação pelas agências regulatórias são realizados os estudos pós registro, também chamados de Fase IV. Estes estudos possuem o objetivo de coletar novas informações de segurança a longo prazo, otimizar o uso da medicação, dar suporte ao Marketing da medicação nas empresas farmacêuticas, além de avaliar novas formulações com a molécula registrada. 4.2 ANÁLISE COMPARATIVA Quando comparamos os resultados apresentados acima com outros grupos populacionais, como os adultos, demonstrados no anexo 2, podemos notar que há uma grande diferença entre os números de estudos clínicos que estão sendo desenvolvidos atualmente, ou que foram realizados e concluídos tempos atrás. De acordo com as plataformas para busca de estudos clínicos utilizadas neste trabalho, encontramos um total de 155 estudos, que podem ser restritos somente aos grupos de faixa etária destacados abaixo, ou então abranger todas as idades. O gráfico abaixo da figura 06 indica a distribuição em volume dos estudos clínicos aos quais cada grupo participa. Figura 06 - Gráfico de comparação dos estudos clínicos que envolvam a população pediátrica de 0-10 anos, jovens com idade superior a 10 anos de idade e adultos (maiores ou igual a 18 anos de idade).

29 5 DISCUSSÃO A presente revisão bibliográfica, apesar de utilizar dados de um dos maiores bancos de dados mundiais como o Clinicaltrials.gov e nacional como o ReBEC, apresenta como limitação a possibilidade de uma análise atual e histórica, uma vez que apresenta resultados atuais, conforme previamente esclarecido. Entretanto, com os resultados obtidos pudemos analisar primariamente a questão do volume dos estudos clínicos, de acordo com o quadro 1, que envolvem a população alvo discutida nesse presente trabalho. Embora, as crianças representem cerca de um quarto do total de novos casos mundiais de TB, somente 2% dos recursos totais de pesquisas e desenvolvimento de novos tratamentos são destinados a estudos que as envolvam (MURRAY et al., 2015). Dentre os 26 estudos clínicos encontrados que envolvem crianças de até 10 anos de idade, foi possível verificar diferença na questão da idade mínima como critérios de inclusão para participação no protocolo clínico. Esses dados podem estar intimamente relacionados ao fato que existem diferenças fisiológicas e metabólicas entre as diferentes faixas etárias das crianças, porém é evidente ainda o maior número de estudos clínicos que descartam a idade mínima como seleção, conforme mostra a figura 04, em que 12 estudos clínicos não possuem idade mínima estabelecido. Ainda, é possível analisar dentre os grupos de faixa etária com maior participação nos protocolos clínicos, os quais são os sem idade mínima e os de até 01 ano de idade, de acordo com o quadro 02, que apesar de existirem, atualmente, pelo menos 20 novas plataformas de testes diagnósticos que foram descobertas e desenvolvidas nos últimos anos, 14 vacinas em testes clínicos, mais de 35 moléculas candidatas em desenvolvimento pré-clínico, e um total de pelo menos 14 novas moléculas em estudo, a população pediátrica faz parte de estudos em sua maioria do grupo de desenvolvimento de vacinas, com um total de 10 estudos (50% do total) (JAWED AHSAN et al., 2015). De acordo com a OMS, através do programa Estratégia pelo Fim da Tuberculose é esperado que a TB seja erradicada como problema de saúde mundial até 2035, e de acordo com o pilar 3 discutido previamente, uma das

30 estratégias utilizadas refere-se ao desenvolvimento de novas tecnologias e agentes para prevenir novos casos da doença na humanidade. Assim, o desenvolvimento de novas vacinas é extremamente excepcional para alcance do objetivo do programa, uma vez que elas estão sendo planejadas para induzir ou aumentar a imunidade protetora contra a infecção, principalmente em recémnascidos e lactantes, a fim de prevenir a progressão da infecção para a doença ou atenuar a doença da tuberculose em adultos, o que justifica a quantidade de estudos clínicos de vacinas contra a TB que envolvem crianças recém-nascidas. Em discussão aos resultados obtidos pela figura 05, podemos notar participação da população pediátrica em estudos de fase I, os quais são em sua totalidade estudos clínicos de desenvolvimento de vacinas com o intuito de verificar segurança, tolerância e imunogenicidade do produto investigacional, o que é diferente do objetivo dos estudos fase I com moléculas que irão agir como agentes de tratamento. Entretanto, quando analisamos os estudos que possuem agentes terapêuticos e não vacinas como produtos investigacionais dentre os 26 protocolos clínicos presentes, conforme quadro 05, notamos que eles estão relacionados a fases de estudos mais tardios (Fase II e Fase III). A ausência de estudos fase I em crianças com moléculas anti-tb pode estar associada ao risco desnecessário que essa etapa pode trazer, uma vez que não se tem todos os dados de segurança e eficácia confirmados até o momento, como afirma o ICH guidance for industry E11 Clinical Investigation of Medicinal Products in the Pediatric Population. Entretanto, a determinação de parâmetros farmacocinéticos, como administração, metabolismo e dosagem da medicação são coletados nessa etapa, o que causa uma perda desses dados para a população infantil. É dessa forma que muitos medicamentos acabam sendo administrados sem indicações específica em crianças, como relata o European Network for Drug Investigation in Children em que esses casos estão presentes em 2/3 de toda a população pediátrica (CONROY et al., 2000). Com a ausência de estudos fase I para crianças verifica-se, além do uso de dosagens excessiva, conforme discutido acima, mas também o uso dessas medicações sob formas farmacêuticas impróprias, ou seja, formas sólidas, como

31 comprimidos e cápsulas, o que dificulta a administração na pediatria, já que estes grupos etários são conhecidos pela dificuldade de deglutição. O uso incorreto das medicações por cálculo de dosagem, dispensação incorreta pela equipe farmacêutica no momento da diluição, entre outras causas continua a ser uma das principais causas de registro de eventos adversos na pediatria que podem levar a consequências mais severas como à resistência bacteriana ao tratamento disponível, à morte ou à uma internação prolongada nas instituições de saúde. E isso ocorre, pois no mercado, as únicas opções de medicações disponíveis envolvem dosagem desenvolvidas para adultos (KAUSHAL et al., 2011). Quadro 06 - Visão geral atual e histórica do desenvolvimento de estratégias e o paradigma de novas propostas para o desenvolvimento de novos agentes de tratamento para a TB infantil. (Adaptado de JAWED AHSAN et al., 2015). Histórico Atual Proposta Desenvolvimento Estratégico Nenhum desenvolvimento pediátrico específico; as crianças recebiam doses adultas, ou doses eram ajustadas de acordo com peso. O desenvolvimento pediátrico é geralmente iniciado uma vez que o agente ou regime de tratamento é aprovado para adultos, começando com adolescentes e gradualmente movendose para crianças mais novas. Estudos de farmacocinética em dose única começam assim que os estudos de fase II em adultos os estudos estão completos. Ou seja, estudos de coleta de dados de farmacocinética (PK) e coleta de dados de segurança em todas as crianças (sem idade de escalonamento) em paralelo com fase III (em adultos). Agentes de tratamento em regimes Desafios eram administrados usando comprimidos de tamanho adulto, Através de esmagamento, dispersão em líquidos, entre outros). A eficácia e a segurança Atrasos significativos da população pediátrica a agentes e/ou regimes novos de tratamento. Enfrentar questões envolvendo clínicas tradicionais e considerações éticas de como as crianças podem ser inseridas em protocolos clínicos. da dose eram desconhecidas.

32 O trabalho de 2015 de Mohamed Jawed Ahsan em Tuberculosis: current treatment, diagnostics, and newer antitubercular agents in clinical trials, discute algumas estratégias que poderiam melhorar a inserção da população pediátrica nos protocolos clínicos de desenvolvimentos de novos tratamentos para a Tuberculose, conforme quadro 06 acima adaptado do artigo. 5.1 Legislação e Perspectivas Futuras De acordo com o que foi proposto por Mohamed Jawed Ahsan no quadro anterior, um dos desafios que se poderia encontrar refere-se às questões éticas e, consequentemente legislativas. Desde 2007, o FDA vem implementando mudanças nos seus guidelines, a fim de que a pesquisa clínica envolvendo pacientes pediátricos mude no cenário mundial. Novas ações estão sendo realizadas para incentivar as indústrias farmacêuticas a realizarem este tipo de estudo com populações vulneráveis, já que são os órgãos que mais relutam para isso acontecer. Apesar dos incentivos regulatórios como a exclusividade de mercado aos patrocinadores dos protocolos clínicos, os resultados da figura 06 evidenciam o grande desinteresse da indústria na participação da população pediátrica em estudos de desenvolvimento de novas medicações para o tratamento da tuberculose, uma vez que mais da metade dos estudos clínicos do mundo registrados nos bancos de dados não envolvem crianças menores de 10 anos. Esse grande desinteresse está associado, principalmente, às dificuldades de aprovação ética, dificuldades no recrutamento destes tipos de voluntários, dificuldades técnicas, que, em certos casos, impedem a obtenção de medicamentos líquidos para administração oral com prazos de validade suficientemente alargados, compatíveis com a sua preparação em escala industrial, entre outros fatores. Apesar de os resultados ainda não demonstrarem os resultados esperados das modificações que as agências regulatórias estão promovendo, é possível verificar que as questões das populações vulneráveis estão cada vez sendo mais discutidas em comunicações do FDA e da European Medicines Agency (EMA), o que

33 ajudará na consolidação das regras aplicáveis a esses grupos populacionais para o registro das medicações por parte dos grandes interessados que são as indústrias farmacêuticas. 6 CONCLUSÃO Apesar de a tuberculose ser uma doença infecciosa que continua sendo uma das principais causas de mortalidade infantil em crianças com idade inferior a 10 anos de idade, esse grupo populacional continua sendo excluído dos principais estudos clínicos para desenvolvimento de novos tratamentos contra a doença. Foi possível verificar no presente trabalho que os estudos clínicos abertos ou que já foram concluídos para essa faixa etária representa pouco do total de estudos que existem anti-tb. A maioria desses estudos envolvem somente adultos (maiores de 18 anos), uma vez que em relação a questões éticas, de recrutamento, coleta de informações de PK, eficácia e segurança é mais fácil, o que permite um desenvolvimento mais rápido dos estudos e consequentemente do registro dessas medicações no futuro. O grande interesse das indústrias farmacêuticas, atualmente, em relação a população pediátrica está no desenvolvimento de vacinas somente, marginalizando o tratamento desse grupo populacional que tem sofridos consequências nas instituições de saúde, devido ao desenvolvimento de eventos adversos, resistência ao tratamento e toxicidade associada a dosagem e/ou a administração incorreta da medicação. É possível verificar que o principal motivo de resistência continuam sendo as indústrias patrocinadoras do desenvolvimento de novos produtos, uma vez que as agências regulatórias, vem demonstrando preocupação na inserção das populações vulneráveis (pacientes pediátricos e idosos) nos estudos clínicos e é esperado que em um futuro próximo com a consolidações das atuais estratégias legislativas e discussões que as agências regulatórias, as comissões de éticas e as indústrias farmacêuticas estarão alinhadas quanto a participação pediátrica nos protocolos clínicos.

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