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Obituários de Ariano Suassuna e Umberto Eco: desafios e experiências da produção 1 Luiz Fernando Nascimento MENEZES 2 Jorge Kanehide IJUIM 3 Universidade Federal de Santa Catarina, SC RESUMO O presente artigo destina-se à análise da produção dos dois obituários desenvolvidos como exercício da disciplina Redação IV, ministrada pela professora substituta Valentina Nunes, durante o primeiro semestre letivo de 2014, no curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina. O objetivo dos produtos era conseguir homenagear dois famosos em um pequeno espaço de texto - média de quarenta linhas em curto espaço de tempo duas horas para os dois perfis. De uma lista de mais de cinquenta nomes, foram escolhidos os autores Ariano Suassuna e Umberto Eco. O resultado tentou ao máximo captar a experiência de leitura das principais obras desses escritores. PALAVRAS-CHAVE: Jornalismo; Obituários; Ariano Suassuna; Umberto Eco; Jornalismo Literário. 1 INTRODUÇÃO Obituário é um gênero pouco trabalhado no Brasil: dos poucos que existem, a maioria segue um modelo pronto do New York Times e não permite que o obituarista utilize de técnicas autorais ou até saia da redação para apurar, segundo Beatriz Marocco (2011). Valentina Nunes, professora substituta que ministrava a disciplina de Redação IV e que trabalhou os diversos gêneros jornalísticos com os alunos, utilizou-se dessa ideia para ensinar o estilo de texto que é quase sempre um ode à vida (SUZUKI JR., 2008) e propor o exercício. Foi colocada no quadro uma lista com cerca de cinquenta nomes de pessoas famosas tanto brasileiros quanto estrangeiros que ainda estavam vivos, mas já pareciam, de acordo com Valentina Nunes, perto da morte: seja por causa de uma doença ou por causa da idade avançada. Cada aluno deveria escolher dois personagens e produzir um obituário curto de cada um antes do final da aula. 1 Trabalho submetido ao XXII Prêmio Expocom 2015, na Categoria Jornalismo, modalidade Produção Jornalismo Literário e/ou de Opinião Conjunto. 2 Aluno líder do grupo e estudante do 6º. Semestre do Curso de Jornalismo da UFSC, email: luizfernandonmenezes@gmail.com. 3 Orientador do Trabalho. Professor do Curso de Jornalismo da UFSC, email: ijuim@cce.ufsc.br. 1

Antes de começar a produção dos textos, a professora utilizou um terço do tempo da aula para explicar técnicas de obituários e ler alguns exemplos retirados do Livro das Vidas: Obituários do New York Times e da imprensa brasileira, deixando que os alunos tivessem apenas duas horas para a realização da tarefa. 2 OBJETIVO O maior desafio do obituarista é conseguir dar um sopro de novas vidas, pelo curto espaço da leitura de suas peças, àqueles que acabaram de morrer (SUZUKI JR. 2008). Um obituário, então, deve servir como uma imortalização de pessoas pouco conhecidas ou uma homenagem de pessoas já imortalizadas. Como não havia tempo para apuração e todos os nomes da lista eram pessoas muito conhecidas, o exercício era utilizar a criatividade e as técnicas ensinadas durante as aulas anteriores para produzir um obituário que tentasse ao máximo chegar no sopro de vida de Matinas Suzuki Jr. Outro obstáculo é que a maioria dos textos desse gênero é produzido antes da morte do personagem, o jornalista deve fazer um texto atemporal e que consiga ser publicado com pequenas alterações. O aluno deveria reunir informações que não mudariam, não importando a data de óbito do perfilado. Como Redação IV é a disciplina introdutória do estudo da reportagem, os exercícios propostos pela professora Valentina Nunes estimulavam a qualidade do texto mais solto, com recursos literários como figuras de linguagem, narrador em primeira pessoa, descrições entre outras técnicas apresentadas anteriormente na leitura dos livros A arte de escrever bem e A arte da escrita: trinta dicas para você escrever como os grandes mestres. Era da liberdade autoral do aluno escolher como seriam estruturados os obituários e se seriam ou não escritos na forma clássica do New York Times ou de uma forma mais literária. 3 JUSTIFICATIVA Como o jornalista e documentarista João Moreira Salles expressou em entrevista para o programa Sempre um Papo da TV Câmara, hoje a informação perde o valor perante a experiência: você pode saber tudo sobre um autor procurando no Google e na Wikipedia. Walter Benjamin, por sua vez, se aprofunda ainda mais sobre o tema e diz que a informação só é válida como atualidade, enquanto a narrativa, a experiência, não tem validade (BENJAMIN, 1992). 2

O obituário é, então, um ótimo espaço para o jornalista deixar de lado o imediatismo, a objetividade e a carga de informações pedidas pelas redações e tentar exercitar mais o lado da experiência: o que ele (o próprio jornalista) sentiu enquanto apurava e escrevia sobre o personagem e na experiência, na vida, do protagonista. É uma chance, dentro de um jornal diário ou outra publicação, de escrever como o secretário de redação do New York Times pedia para seus repórteres: um mergulho mais profundo nas histórias de vidas vividas com um texto escrito pela mão de um artista (MAROCCO, 2011). 4 MÉTODOS E TÉCNICAS UTILIZADOS Para a produção dos textos foram utilizadas as técnicas literárias aprendidas nas aulas anteriores da disciplina. Das figuras de linguagem existentes, foram utilizadas a ironia ( Seguindo o quarto mandamento, Umberto fez filosofia e literatura medieval [mesmo que seu pai tivesse pedido para ele fazer direito] ) para dar o efeito de contradição entre as escolhas da vida de Eco e o seu sobrenome que, em latim, significa um presente vindo do paraíso, e o eufemismo ( Eco é o nome que está em cima das rosas, que inclusive é uma brincadeira com uma de suas principais obras literárias), como forma de amenizar o fato da morte dos dois autores, no mesmo estilo de texto dos obituaristas do New York Times. O eufemismo deixou de ser uma forma de amenizar e de evitar constrangimentos, e se tornou um jogo fe linguagem intencional dos obituários, um recurso estilístico bastante prezado pelos leitores. (...) A língua dos obits passou a ser uma espécie de brincadeira de esconde-esconde, um desafio à capacidade artesanal de cada obituarista e um momento para se servir aos cognoscenti ironias em bandejas de prata. (SUZUKI JR., 2008, p.300) Outras técnicas utilizadas devem ser ressaltadas: evitar o uso excessivo do verbo dizer nos diálogos, explorar ao máximo os recursos da pontuação (utilizando reticências, parênteses, ponto-e-vírgula e dois pontos), variar a ordem das frases, tentar utilizar o menor número de adjetivos possíveis e preferir as sentenças mais curtas e claras (KORYTOWSKI, 2008). Durante a escrita dos obituários, foi utilizada também o momento significativo, técnica de perfis expressa por Sérgio Vilas Boas no prefácio do livro Perfis: como escrevêlos, que é baseado na teoria fotográfica de Henri Cartier-Breson: utiliza-se alguma característica do personagem, seja física ou abstrata, para servir de base para o texto. Para os dois obituários, as principais obras dos autores (O nome da rosa e Auto da 3

Compadecida), lidas em um momento anterior da graduação, foram utilizadas como momento significativo. A ideia era, além de homenagear a vida dos dois, tentar levar ao leitor do texto de quarenta linhas a experiência, mesmo que bem resumida, de ler os escritores: Eco com sua fixação por símbolos e questões religiosas, e Suassuna com seu humor leve e teatro dinâmico. Os personagens dos obituários foram escolhidos no mesmo dia de produção e os dados levantados foram conseguidos em biografias, críticas e resenhas sobre os dois escritores encontradas na internet. 5 DESCRIÇÃO DO PRODUTO OU PROCESSO Cada um dos obituários é composto por um texto de cerca de quarenta linhas de uma página A4 escrita em fonte Times New Roman em tamanho 12. Os dois obituários foram produzidos no mesmo dia (25/06/2014) e, como forma de exercício, foram impressos para correção da professora mas não foram publicados. O primeiro obituário foi do escritor, filósofo e semiólogo Umberto Eco, que ainda está vivo; e o segundo do Ariano Suassuna, que morreu quase um mês depois da produção do texto. As informações sobre os dois autores foram coletadas em biografias disponíveis online e nas obras de cada autor, citadas no item 4. O texto que homenageia Umberto Eco (intitulado Ateu desde o paraíso ) foi estruturado em forma clássica de obituário, resumindo os pontos principais da vida e da obra do autor; ao mesmo tempo em que eram colocados alguns dos Doze Mandamentos da Lei de Deus entre parênteses para servir de contraponto às informações. Já no obituário de Ariano Suassuna (com o título de O advogado do diabo ) foi utilizada a estrutura de um roteiro de teatro: as informações principais do autor eram apresentadas nos diálogos cronológicos entre ele mesmo, Deus e o Diabo. 6 CONSIDERAÇÕES Produzidos durante uma das últimas aulas do semestre, os obituários serviram, além de desafio para a utilização das técnicas literárias aprendidas durante a disciplina, para mostrar que é possível aliar informação com a criatividade e atribuir tom autoral. Os dois textos foram produzidos em poucas horas, mas podiam muito bem terem sido trabalhados por mais tempo: o deadline desse gênero é a morte do personagem; até lá, é possível cortar, aumentar, mudar ou até produzir um texto completamente diferente. É, talvez, o gênero 4

jornalístico que possui mais tempo para apuração; o problema é que muitas publicações atualmente não têm espaço nem jornalistas específicos para esse tipo de texto. Como apresentado no artigo de Beatriz Marocco (2011), quando o jornal possui uma seção de obituários, muitas vezes ela é alimentada por um estagiário ou assistente de conteúdo. Para um aluno que vinha aprendendo durante as três disciplinas anteriores de redação que o jornal diário possuía pouco ou quase nenhum espaço para textos mais soltos, fora o destinado à reportagem, o exercício foi muito estimulante. Mesmo na correria do dia a dia da redação, é possível produzir um texto de forma mais calma e mais inspirada do que as notícias cheias de informações duras. É possível fugir do lide, da estrutura que pede informações básicas do acontecimento (responder todas as perguntas o que, quando, onde, como, quem e por que ). O problema é que poucas empresas de comunicação estão dispostas a oferecer esse tempo ao jornalista. Os obituários serviram também para mostrar que a estrutura de texto baseada no momento significativo não só funciona com outros textos jornalísticos reportagem, perfil, crônica e obituário como também proporciona uma produção mais prazerosa do texto. É muito mais satisfatória a experiência de construir um texto individual e que traga a experiência única de quem escreve. Além disso, a produção dos dois obituários serviu para que os alunos conseguissem acionar a sua criatividade mais rapidamente e mostrar que é possível escrever dois textos distintos, tanto em conteúdo quando em estilo, mesmo com pouco tempo. Gosto de pensar que o intuito da professora Valentina era mostrar que os alunos podem, no futuro, utilizar a escrita criativa para dar brilho e aumentar a qualidade de um texto mesmo no ritmo frenético da profissão do jornalismo, o que não tem aparecido muito ultimamente na imprensa brasileira. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BENJAMIN, Walter. O narrador: reflexões sobre a obra de Nikolai Lesskov. IN:. Sobre arte, técnica, linguagem e política. Lisboa: Relógio D Água Editores, 1992. CULLER, Jonathan. Teoria literária: uma introdução. Tradução Sandra Vasconcelos. São Paulo: Beca Produções Culturais Ltda., 1999. ECO, Umberto. O nome da rosa. Rio de Janeiro: O Globo, 2003. 5

ECO, Umberto. O pêndulo de Foucault. Rio de Janeiro: Record, 1995. KORYTOWSKI, Ivo. A arte da escrita: trinta dicas para você aprender a escrever como grandes mestres. São Paulo: Ciência Moderna, 2008. MAROCCO, Beatriz. Fragmentos de vidas exemplares. Disponível em http://sbpjor.kamotini.kinghost.net/sbpjor/admjor/arquivos/9encontro/cc_07.pdf, acessado no dia 17/04/2015 às 15h18. SERVA, Leão (org.). Um dia, uma vida: seleção de obituários da Folha de S. Paulo. São Pualo: Três Estrelas, 2015. SODRÉ, Muniz; FERRARI, Maria Helena. Técnica de reportagem: notas sobre a narrativa jornalística. São Paulo. Summus, 1996. SQUARSI, Dad; SALVADOR, Arlete. A arte de escrever bem: um guia para jornalistas e profissionais do texto. São Paulo: Contexto, 2005. SUASSUNA, Ariano. Auto da Compadecida. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2005. SUZUKI JUNIOR, Matinas (org.). O livro das vidas: obituários do New York Times. Tradução Denise Bottmann. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. VILAS BOAS, Sérgio. Perfis e como escrevê-los. São Paulo: Summus, 2003. 6