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Transcrição:

IV-209 - ESTUDO DA QUALIDADE HÍDRICA DA BACIA DO RIO PIRAQUARA PARA ANÁLISE DA PROPOSTA DE ENQUADRAMENTO DO PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS DA REGIÃO HIDROGRÁFICA DA BAÍA DE GUANABARA Jana Lodi Martins (1) Engenheira Ambiental pela Universidade Federal do Espírito Santo. Mestre em Engenharia Civil - Ênfase em Meio Ambiente pela COPPE/UFRJ. Mestre em Tecnologias Geoespaciais pela Universidade Nova de Lisboa, Portugal e Universidade de Münster, Alemanha. Jose Paulo Soares de Azevedo Engenheiro Civil pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Mestre em Engenharia Civil pela COPPE/UFRJ. Doutor em Mecânica Computacional pelo Wessex Institute of Technology, Inglaterra. Professor Associado IV da UFRJ no Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente da Escola Politécnica e na Área de Recursos Hídricos e Meio Ambiente do Programa de Engenharia Civil da COPPE/UFRJ. Iene Christie Figueiredo Engenheira Civil e Mestre em Engenharia Ambiental pela Universidade Federal do Espírito Santo. Doutora em Engenharia Civil Tecnologia de Saneamento Ambiental pela COPPE/UFRJ. Professora Adjunta da Poli/UFRJ. Endereço (1) : Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós Graduação e Pesquisa de Engenharia. Laboratório de Hidráulica Computacional. Cidade Universitária. CEP: 21945-970 - Rio de Janeiro, RJ Brasil. Telefone: (21) 25627832 email: jana.lodi@gmail.com RESUMO Este trabalho objetiva diagnosticar e avaliar as condições atuais da qualidade da água da bacia do rio Piraquara/RJ, onde se tem verificado a existência de um processo contínuo de poluição das águas, sobretudo pelo lançamento de efluentes domésticos sem tratamento. A partir do levantamento de informações disponíveis, foi elaborado e implementado um plano de monitoramento de qualidade da água em um trecho do rio Piraquara, seguido pelo cálculo do Índice de Qualidade de Água do National Sanitation Foundation (IQANSF) no trecho monitorado. O resultado foi confrontado com a proposta de enquadramento do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara (RHBG) na área de abrangência. Os resultados indicaram que a maior parte do trecho monitorado encontra-se fora dos padrões ambientais preconizados para a Classe de enquadramento do rio. Os parâmetros DBO, N-amoniacal, Fósforo Total e Turbidez, analisados no plano de monitoramento, apresentaram, em muitas coletas, concentrações superiores até mesmo aos limites de águas doce Classe 3, ratificando a intensa poluição no rio Piraquara. Este estudo também destacou que a proposta de enquadramento do Plano de Recursos Hídricos da RHBG para a região está em desacordo com o conceito de preservação ambiental, pois recomenda classes em que o corpo hídrico já encontra-se em algum estado de degradação. Dessa forma, acredita-se que este estudo possa gerar relevantes contribuições para a melhoria da gestão ambiental da região, além de aprofundar a discussão sobre o enquadramento dos corpos hídricos, com vista a uma maior eficácia no planejamento do uso dos recursos hídricos. PALAVRAS-CHAVE: Bacia Hidrográfica, Enquadramento de Corpos Hídricos, Esgotamento Sanitário, Gerenciamento de Recursos Hídricos, Plano de Monitoramento de Água, Qualidade da Água, Saneamento, Sistemas de Informação Georreferenciada. 1. INTRODUÇÃO Há poucas décadas, o crescimento e desenvolvimento econômico e populacional do município do Rio de Janeiro acontecia na região litorânea da cidade. No entanto, esta realidade está se modificando. A zona oeste, região com longo histórico de falta de investimentos, sejam eles em saneamento básico, transporte, educação e segurança, vem recebendo nos últimos anos elevado crescimento industrial e populacional. Na última década, a população da zona oeste cresceu 150% (IBGE, 2010). Além desta região representar 49% da área do 1

município, esta zona possui menor densidade populacional que as demais, o que possibilita sua expansão urbana. A despeito da importância da região, seus mananciais encontram-se altamente impactados, e o histórico de dados de monitoramento é demasiadamente restrito ou inexistente, bem como os estudos específicos e detalhados a respeito da qualidade da água dos rios, a capacidade de depuração e o real impacto causado pela falta de saneamento básico adequado. (MARTINS, 2015) Neste contexto, este trabalho tem como foco de estudo a bacia do rio Piraquara, localizada na zona oeste do Rio de Janeiro, e visa diagnosticar a qualidade atual do seu corpo hídrico e analisar a proposta de enquadramento existente para a região. 2. OBJETIVO Este trabalho tem como objetivo geral avaliar a qualidade da água atual e confrontar com a proposta de enquadramento concebido para a bacia do rio Piraquara, no município do Rio de Janeiro. Os objetivos específicos são: Definir e implementar um plano de monitoramento dos corpos hídricos da região de abrangência; Calcular e avaliar o Índice de Qualidade de Água do National Sanitation Foundation (IQA NSF) da área de estudo. Analisar a proposta de enquadramento do Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara (RHBG) na área de abrangência. 3. CARACTERIZAÇÃO GERAL DA BACIA 3.1 Hidrografia A bacia do rio Piraquara é parte da bacia hidrográfica do rio Acari, tributário do canal de Meriti que, por sua vez, deságua na baía da Guanabara. A bacia do rio Piraquara contempla as bacias dos rios Piraquara, Caranguejo e do canal Serra do Mar, ilustradas na Figura 1. O rio Piraquara tem sua nascente dentro do Parque Estadual da Pedra Branca. Inicialmente, ele escoa em leito natural por uma região de floresta, adentrando a área urbana em igual condição natural, a partir de onde passa a ser canalizado. Segue em canal aberto até as proximidades de sua foz, onde volta a escoar em leito natural até desaguar no rio Marangá. Figura 1: Mapa de sub-bacias pertencentes à bacia do rio Piraquara. (Autoria própria) 2

3.2 Esgotamento Sanitário O crescimento da população da bacia do rio Piraquara não foi acompanhado da infraestrutura de saneamento, com coleta e tratamento adequado dos efluentes. A Figura 2 ilustra a localização do sistema de esgoto sanitário na bacia do rio Piraquara, em 2014. Pode-se observar que há poucas redes de esgoto na bacia, e as mesmas encaminham seus efluentes para os rios, não havendo tratamento prévio ao lançamento. Em janeiro de 2012, a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro assinou um contrato de concessão de esgoto da Zona Oeste do Município, por um período de 30 anos. Serão construídos 2.100 km de redes e 10 estações de tratamento de esgoto na região, incluindo a área de abrangência da bacia do Rio Piraquara. Figura 2: Mapa de redes de esgoto existentes na bacia do rio Piraquara. (Autoria própria) 3.3. Enquadramento da Bacia do Rio Piraquara O Estado do Rio de Janeiro não possui legislação específica de classificação das águas e enquadramento de todos os seus corpos hídricos, utilizando, por isso, o sistema de classificação e as recomendações da resolução CONAMA 357/05, de 17 de março de 2005. (CONAMA, 2005) O Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara (RHBG) apresentou uma proposta de enquadramento dos rios da RHBG. A Figura 3 ilustra o resultado desta proposta para a bacia do rio Piraquara. (RIO DE JANEIRO, 2005) Pode-se observar que somente as nascentes dos rios Piraquara e Caranguejo, nos trechos anteriores à ocupação urbana, foram enquadradas na Classe 2, ou seja, cursos d água que devem ser preservados para utilização em abastecimento doméstico, com tratamento convencional; para irrigação de hortaliças e fruteiras e criação de peixes. Nessas áreas, admite-se a implantação de atividades econômicas, inclusive com lançamento de efluentes nos cursos d água, desde que respeitados os limites desta Classe. Figura 3: Proposta de enquadramento do Plano Diretor de Recursos Hídricos da RHBG. (Autoria própria) É possível observar também que grande parte do rio Piraquara e do rio Caranguejo foi enquadrada na Classe 3 que, segundo o Plano, representa trechos fluviais que atravessam áreas com ocupação urbana pouco intensa e que já apresentam um certo grau de degradação, cujas águas poderão ser utilizadas para finalidades menos exigentes, como dessedentação de animais, irrigação de culturas específicas e indústrias não alimentícias. O trecho final do rio Piraquara, posterior ao encontro com o rio Caranguejo, foi enquadrado na Classe 4, que, de acordo com o Plano, corresponde a um trecho fluvial que atravessa áreas com ocupação urbana intensa e que já apresenta um alto grau de degradação. A Classe representa cursos d água utilizados geralmente para assimilação e transporte de efluentes domésticos e de indústrias, e não têm previsão de uso como fonte de 3

abastecimento para qualquer atividade humana e, portanto, devem ter a sua qualidade preservada apenas no sentido de manter sua harmonia paisagística. 4. METODOLOGIA 4.1 Plano de Monitoramento Não foi encontrado nenhum registro histórico de monitoramento de qualidade de água na bacia do rio Piraquara. Visando analisar a qualidade atual do rio Piraquara e a influência do canal Serra do Mar e do rio Caranguejo na qualidade da água do rio Piraquara, foram definidos 6 pontos de coleta, sendo 4 pontos no rio Piraquara (P1, P2, P4 e P6), 1 ponto no canal Serra do Mar (P3) e 1 ponto no rio Caranguejo (P5), como pode ser observado na Figura 4. As Figuras 5-10, numeradas da esquerda para a direita e de cima para baixo, retratam as condições dos rios nos locais exatos de coleta. Os seguintes parâmetros foram monitorados: temperatura, sólidos totais dissolvidos, turbidez, oxigênio dissolvido, ph, nitrato, nitrito, nitrogênio orgânico, nitrogênio amoniacal, fósforo orgânico e inorgânico, fosfato, DBO, bem como coliformes termotolerantes. Figura 4: Mapa de monitoramento da bacia do rio Piraquara. (Autoria própria) 4

Figuras 5 a 10: Pontos de monitoramento P1 a P6 da bacia do rio Piraquara. (Autoria própria) Ao todo, foram realizadas 12 coletas, que ocorreram semanalmente entre os meses de outubro e dezembro de 2014, período extremamente seco no município do Rio de Janeiro. A coleta e preservação de amostras seguiu a metodologia do Guia Nacional de Coleta e Preservação de Amostra. (CETESB, 2012) 4.2 Cálculo do IQANSF Para o cálculo do índice de qualidade de água, seguiu-se a metodologia do National Sanitation Foundation (NSF, 2007). Dessa forma, foi gerado um IQA NSF para cada uma das coletas realizadas, e os resultados do índice para cada ponto de monitoramento foram agrupados em gráficos de pizza que representam as categorias de resultados (excelente, boa, média, ruim e muito ruim). Em seguida, os gráficos foram dispostos em um mapa temático criado por meio do arranjo de dados e elementos no software ARCGIS 10.1. 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 Análise dos Dados Monitorados Para ilustrar o comportamento de alguns parâmetros ao longo das campanhas de monitoramento, foram gerados os gráficos da DBO, turbidez, fósforo total e nitrogênio amoniacal, representados nas Figuras 11 a 14. Nestes gráficos, as concentrações dos parâmetros são apresentadas para os pontos de monitoramento (P1 a P6) ao longo das 12 coletas (M1 a M12). 5

Figuras 11 a 14: Resultados das análises de DBO, Turbidez, Fósforo total e Nitrogênio Amoniacal Diante desses resultados, verifica-se claramente que o ponto 1 (P1) apresenta melhor qualidade para os parâmetros analisados. Este resultado é facilmente justificado, uma vez que o local de coleta é próximo à nascente e encontra-se a montante de qualquer interferência da ocupação urbana. Ao comparar os resultados obtidos com os limites estabelecidos pela resolução 357 do CONAMA para águas doces de Classe III e com as características típicas do esgoto bruto (VON SPERLING, 2005), observa-se que: Parâmetros como fósforo total e nitrogênio amoniacal apresentaram concentrações muito acima do limite estabelecido para a Classe III (0,15 mg/l e 13,3 mg/l, respectivamente) em todas as coletas dos pontos 2 a 6. Algumas amostras apresentaram inclusive valores superiores às características usuais do esgoto; As concentrações de DBO apresentaram valor muito superior ao limite de Classe III do CONAMA em todas as amostras, excetuando-se no P1; A turbidez apresentou valores mais altos nos tributários (P3 e P5) e no ponto monitorado do rio Piraquara entre os dois tributários (P4). 5.2 Análise do IQANSF A Figura 15 apresenta o mapa temático que ilustra os resultados da aplicação do IQA NSF ao longo do rio. O mapa associa a localização dos pontos de monitoramento e os resultados da aplicação do índice. Assim, é possível ter uma visão da variação espacial da qualidade de água ao longo do rio. Nota-se claramente a degradação do rio Piraquara ao longo do curso d água. Pode-se observar também que, mesmo num ponto anterior à ocupação urbana (P1), a qualidade da água do rio não é considerada Excelente. Em algumas coletas, o IQA NSF no ponto de monitoramento 1 (P1) apresentou resultados que classificam o trecho como Ruim. Os índices calculados nos pontos de monitoramento P2 e P4 podem sugerir que a qualidade da água nestes trechos do rio Piraquara já apresenta concentrações altas o bastante para comprometer integralmente o trecho de interesse, independente da interferência dos tributários. Estes também encontram-se em situação Muito ruim para todas as coletas, de acordo com o IQA NSF calculado. 6

Figura 15: Aplicação do IQANSF na bacia do rio Piraquara (Autoria própria) É possível verificar que no trecho final modelado (P6) as condições do rio Piraquara melhoram quando comparadas aos trechos anteriores, apresentando 33% das coletas na categoria Ruim. Isto pode ser justificado pelo maior volume de água no rio neste trecho, o que representa uma maior capacidade de diluição dos poluentes. 6. CONCLUSÕES A melhoria da qualidade da água fluvial requer adoção de políticas públicas de qualidade, que envolvem questões culturais, técnicas e econômicas complexas. A região em estudo não possuía nenhum histórico de monitoramento de qualidade de água, contudo um forte indício de degradação é observado, uma vez que grande parte dos efluentes domésticos é lançado sem tratamento nos corpos hídricos. O plano de monitoramento desenvolvido neste estudo permitiu ratificar que o rio Piraquara encontra-se fortemente poluído, com os parâmetros DBO, N-amoniacal, Fósforo Total e Turbidez apresentando, em muitas coletas, concentrações superiores até mesmo aos limites de águas doce Classe 3. Assim, definido como Classe 4, o rio pode destinar-se apenas à navegação e à harmonia paisagística. O cálculo do IQA NSF permitiu verificar claramente a degradação ao longo do curso do rio Piraquara. Até mesmo o ponto inicial, localizado a montante da ocupação urbana, apresentou o índice com classificação de Bom a Ruim. É importante ressaltar que a proposta de enquadramento do Plano de Recursos Hídricos da RHBG para a região vai de encontro ao conceito de preservação ambiental, uma vez que recomenda classes em que o corpo hídrico já encontra-se em algum estado de degradação. Sendo a baía de Guanabara o corpo receptor final dos rios pertencentes a esta bacia hidrográfica, tal proposta não contribui para os esforços de preservação já implantados e nem reflete a pressão da sociedade pela melhoria da qualidade da água da baía de Guanabara, que receberá esta carga poluidora. Assim, acredita-se que este estudo possa gerar relevantes contribuições não só para futuros trabalhos sobre a bacia do rio Piraquara ou outras bacias semelhantes, mas também para a melhoria da gestão ambiental da região. Este conhecimento é de fundamental importância para subsidiar políticas, estudos de concepção de sistemas de coleta e tratamento de esgotos e um planejamento eficaz do uso de recursos hídricos da bacia. 7

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. CETESB. Guia Nacional de Coleta E Preservação de Amostras. Águas, sedimento, comunidades aquáticas e efluente líquidos. Brasília/DF,2012. 2. CONAMA. Resolução 357, 17/03/05. Brasília/DF, Brasil. Conselho Nacional do Meio Ambiente, 2005. 3. IBGE. Censo Demográfico. Brasília: IBGE, 2010. 4. MARTINS, J.L. Avaliação do Impacto da Implantação do Sistema de Esgotamento Sanitário na Qualidade da Água da Bacia do Rio Piraquara no Município do Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado)- COPPE/UFRJ. Rio de Janeiro, 2015. 5. NSF. National Sanitation Foundation Consumer Information: Water Quality Index. Ann Arbor/MI, United States of America. NSF, 2007. 6. RIO DE JANEIRO. Plano Diretor de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica da Baía de Guanabara; Governo do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Brasil, 2005. 7. VON SPERLING, M., 2005, Princípios do tratamento biológico de águas residuárias, 3ª edição. Volume 1. Belo Horizonte, Brasil, Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental UFMG. 8