XVII ENCONTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA Universidade de Fortaleza 16 a 18 de outubro de 2017 O MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E AS ATRIBUIÇÕES DO CONSELHO TUTELAR NO PROCESSO DE ADOÇÃO NO BRASIL Beatriz Castro Alves de Lima¹* (PG), Simone Coêlho Aguiar² (PQ) 1. Aluna do Programa de Pós-Graduação em Direito e Processo Administrativo, Universidade de Fortaleza, Fortaleza-CE 2. Mestre em Direito Constitucional, Universidade de Fortaleza, Fortaleza-CE e-mail: biia.castro@hotmail.com Palavras-chave: Atribuições do Conselho Tutelar. Direitos fundamentais. Proteção da criança e do adolescente. Adoção no Brasil. Resumo No Brasil, de acordo com os dados do Cadastro Nacional de Adoção CNA (Estatística 2017), existe um total estimado de 7.835 crianças cadastradas, entre meninos e meninas, em condições de serem adotadas, e cerca 40.575 famílias pretendentes na fila de espera para adotar. Com esse número bastante expressivo de interessados e diante da realidade lenta e, por vezes, burocrática, decidiu-se por empreender pesquisa voltada ao exame das atribuições do Conselho Tutelar, a fim de investigar sua eficácia no instituto da adoção. Para tanto, inicialmente, apresenta-se um panorama constitucional dos direitos fundamentais aplicáveis à proteção da criança e do adolescente. Em seguida, explana-se como funciona o procedimento de adoção no Brasil, seu conceito, espécies e características. E, ao fim, empreende-se estudo acerca das atribuições do Conselho Tutelar relativas ao instituto, de modo a realçar a legitimidade do órgão para atuar no campo da adoção. A metodologia utilizada na elaboração deste trabalho constitui-se em um estudo descritivo-analítico, desenvolvido por meio de pesquisa do tipo bibliográfica, pura quanto à utilização dos resultados, e de natureza qualitativa. A partir das pesquisas realizadas, conclui-se que as medidas protetivas tomadas pelo Conselho Tutelar, tais como, acolhimento institucional e colocação em família substituta, têm papel substancial na observância dos direitos fundamentais da criança e do adolescente no processo de adoção. Introdução No Brasil, de acordo com os dados do Cadastro Nacional de Adoção CNA (Estatística 2017), administrado pelo Conselho Nacional de Justiça CNJ, existe um total estimado de 7.835 crianças cadastradas, entre meninos e meninas, em condições de serem adotadas, e cerca 40.575 famílias pretendentes na fila de espera para adotar. Ou seja, o número de interessados é bastante superior ao de crianças e adolescentes aptos à adoção. Então, diante desses dados expressivos, associados à realidade lenta e, por vezes, burocrática do processo de adoção, decidiu-se por empreender pesquisa voltada ao exame das atribuições do Conselho Tutelar nessa seara, a fim de investigar se e como este pode auxiliar no deslindo do referido processo, de modo a tornar o instituto da adoção mais célere, sem perder de vista a salvaguarda dos direitos fundamentais da criança e do adolescente. Para tanto, inicialmente, apresenta-se um panorama constitucional dos direitos fundamentais aplicáveis à proteção da criança e do adolescente, com o intuito de evidenciar os interesses desse segmento social que devem ser resguardados no processo de adoção. Em seguida, explana-se como funciona o procedimento 1
de adoção no Brasil, seu conceito, suas espécies e características, e seus atores principais. E, ao fim, empreende-se estudo acerca das atribuições do Conselho Tutelar relativas ao processo de adoção, com o fito de apresentar suas finalidades, de modo a realçar a legitimidade do órgão para atuar no campo da adoção, visando identificar se tal intervenção pode imprimir celeridade e eficácia ao instituto em comento. Metodologia A metodologia utilizada na elaboração deste trabalho constitui-se em um estudo descritivo-analítico, desenvolvido por meio de pesquisa do tipo bibliográfica, pura quanto à utilização dos resultados, e de natureza qualitativa. Resultados e Discussão A pesquisa em comento tem por escopo averiguar se o Conselho Tutelar, no âmbito do processo de adoção brasileiro, é capaz de resguardar os direitos fundamentais da criança e do adolescente diante de suas atribuições e investigar como esse órgão pode auxiliar no deslindo do referido processo, de modo a tornar o instituto da adoção mais célere, sem perder de vista a salvaguarda dos interesses desse grupo social. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 trata acerca da proteção integral da criança e do adolescente, consagrando o princípio da prioridade absoluta no que se refere aos seus direitos fundamentais, determinando à família, à sociedade e ao Estado o dever legal de salvaguardá-los. Além disso, o sistema de proteção integral compreende o melhor interesse da criança e o princípio da prioridade absoluta, enumerados no artigo 227 da CRFB de 1988, determinando que a criança seja protegida por todos que tenham a responsabilidade de assegurar os direitos inerentes ao texto constitucional, sejam eles, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. Assim, sob o aspecto da prioridade absoluta, tem-se que a garantia à convivência familiar surge como um direito da criança e do adolescente, sobretudo, para favorecer o desenvolvimento de suas personalidades e atender as necessidades essenciais, fazendo-se importante o engajamento em família substituta, quando faltar cuidado e orientação da família biológica, através do instituto da adoção. A adoção, nas palavras de Clóvis Beviláqua (1976, p.351), é o ato civil pelo qual alguém aceita um estranho na qualidade de filho. Na ideia de Pontes de Miranda (2001, p. 217), a adoção é o ato solene pelo qual se cria entre o adotante e o adotado relação fictícia de paternidade e filiação. As definições são várias e bastante amplas, mas todas com a mesma concepção de receber uma nova pessoa em seu lar, com a intenção de criar uma relação de parentesco semelhante a filiação de sangue, baseado no acordo de vontade entre as partes. É um vínculo afetivo que não se limita em apenas criar e educar uma criança, e vai muito além que um simples ato de caridade. É, antes de tudo, um ato legal, de consciência e responsabilidade, que vai tornar definitiva a filiação que foi concebida por outras pessoas, com a finalidade de criar relações jurídicas idênticas às resultantes de uma família biológica. O interesse principal dessa medida é garantir, à criança e ao adolescente, um desenvolvimento adequado em um ambiente devidamente estruturado, onde o mesmo não foi possível na filiação de sangue, para que a criança possa ter assegurado seus direitos fundamentais, inclusive o direito à convivência familiar. 2
Antigamente, a adoção tinha o intuito de atribuir filhos às famílias que se encontravam impossibilitadas de gerar naturalmente. Hoje, com a previsão legal no ECA, Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 39, a adoção confere um interesse maior a ser resguardado, ocorrendo o afastamento definitivo da família biológica e assegurando a proteção integral da criança e do adolescente. Assim, entende-se que o maior interesse do processo de adoção é o bem-estar da criança, buscando uma nova perspectiva de vida a ela e colocando-a em um ambiente capaz de proporcionar um equilíbrio emocional e intelectual, suprindo também necessidades afetivas, muitas vezes gerada pelo abandono e desamparo por parte da família biológica. Quanto à natureza jurídica do ato, a adoção não é apenas um simples acordo de vontade entre as partes, é necessário levar em juízo, com a necessidade de outorga do Poder Judiciário, culminando com a sentença judicial. No entanto, Lôbo (2014, p. 251) afirma que a adoção é ato jurídico em sentido estrito, de natureza complexa, pois depende de decisão judicial para produzir seus efeitos. Não é negócio jurídico unilateral. No processo de adoção, antes de serem formalizados todos os requisitos, existe um período de experiência, como dispõem o artigo 46 da Lei 8.069/90: ''A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária fixar, observadas as peculiaridades do caso.'' Onde o menor certifica está seguro de seus interesses e terá seus direitos protegidos. Quanto à formalidade do pedido de adoção, o artigo 50 do ECA estabelece que: a autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotadas e outros de pessoas interessadas na adoção. Então, para que se possa adotar uma criança é necessário preencher determinados requisitos, dentre os quais requerer a inscrição no registro de pessoas interessadas em adotar, o chamado Cadastro Nacional de Adoção, que tem o objetivo de recolher e cruzar os dados das pessoas interessadas em adotar e das crianças e adolescentes disponíveis para a adoção, de modo que cabe às unidades da federação manter esses dados atualizados, otimizando, assim, a concretização do ato. É importante lembrar que existe um cadastro de adotantes que segue uma ordem cronológica de inscrição, devendo essa ordem ser respeitada sempre que possível, para não acarretar nenhum prejuízo ao menor que se encontra cadastrado na fila de espera. Após deferida essa inscrição, será dado início ao processo formal de adoção. Após o processo de adoção ter sido concedido em juízo, será desligado todo o vínculo existente com os membros da família de origem, mantendo apenas os impedimentos para casamento, sendo a adoção um ato irretratável, pois somente assim seria possível garantir os direitos fundamentais da criança, respeitando sua transição de maneira digna, ainda porque, retroagir um menor à sua família biológica acarretaria inúmeros prejuízos emocionais e psicológicos. Para a realização desses procedimentos e como um instrumento para a efetivação dos direitos da criança e do adolescente, o Conselho Tutelar foi criado a fim de desempenhar as normas estabelecidas no artigo 227 da CRFB de 1988, com legitimidade para exigir a observância da execução desses direitos com absoluta prioridade, cumprindo com suas atribuições e visando sempre a eficácia e celeridade em suas intervenções. O conselho tutelar atua de forma intermediária e meramente administrativa no procedimento da adoção, sendo prescindível qualquer trâmite pela via judicial, tendo em vista o caráter resolutivo que a intervenção desse órgão deve possuir. Considera-se que o poder de intervenção do Conselho Tutelar depende de sua atuação legítima nas causas relacionadas à criança e ao adolescente, estando ou não de acordo com a ordem jurídica estabelecida pelo Estado, dentro dos critérios legais e sociais dos menores com necessidade de proteção. Assim, a partir de 3
um sistema de garantias constitucionais, será legitima a atuação do órgão quando ameaçados ou violados os direitos à criança e ao adolescente, conforme previstos no artigo 98 do ECA. São atribuições do Conselho: atender crianças e adolescentes ameaçados ou que tiveram seus direitos violados e aplicar medidas de proteção; atender e aconselhar pais ou responsável; levar ao conhecimento do Ministério Público fatos que o estatuto tenha como infração administrativa ou penal; encaminhar a justiça os casos que a ela são pertinentes; requisitar certidões de nascimento e óbito de crianças e adolescentes, quando necessário; levar ao Ministério Público casos que demandem ações judiciais de perda ou suspensão do pátrio poder. Dessa forma, trata-se da competência para aplicar as medidas protetivas às crianças e adolescentes nos casos em que ocorrer violação por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, por falta, omissão ou abuso dos familiares ou responsáveis e em razão da própria conduta da criança ou do adolescente (art. 98, ECA). O Conselho Tutelar é um mecanismo administrativo de exigibilidade dos direitos constitucionais e estatutários das crianças e adolescentes, na qual deve cumprir com suas atribuições (previstas no artigo 136 do ECA), independente da burocracia do poder público, visando sempre buscar qualidade nas suas intervenções, com o objetivo de zelar e fazer cumprir os direitos da infância. Conclusão A partir das pesquisas realizadas, conclui-se que as medidas protetivas tomadas pelo Conselho Tutelar, tais como, acolhimento institucional, colocação em família substituta e inclusão em programa de acolhimento familiar, têm papel substancial na observância dos direitos fundamentais da criança e do adolescente no processo de adoção, quando estes se encontrarem violados ou ameaçados, sendo o Conselho Tutelar, um órgão encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento do melhor interesse desse grupo social na comunicação com as famílias pretendentes, buscando tornar o instituto da adoção mais acessível e os seus mecanismos menos burocráticos, tendo o intuito de atender as garantias fundamentais à luz da Constituição Federal de 1988. Referências ALBERGARIA, Jason. Comentários ao Estatuto Criança e do Adolescente. Rio de Janeiro: Aide Editora, 1991. BEVILAQUA, Clóvis. Clássicos da Literatura Jurídica. Direito de Família. Rio de Janeiro: Rio, 1976. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil (de 05 de outubro de 1988). Assembleia Nacional Constituinte. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 out. 1988, Seção 1, p. 1-32.. Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Legislativo, Brasília, DF, n.º 135, p. 13563-13577, 16 jul. 1990, Seção 1. BRAUNER, Maria; ALDROVANDI, Andrea. Adoção no Brasil: aspectos evolutivos do instituto no direito de família. JURIS, Rio Grande, 15: 7-35, 2010. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Cadastro Nacional de Adoção. Disponível em: <http://www.cnj.jus.br/cnanovo/pages/publico/index.jsf>. Acesso em: 07 ago. 2017. 4
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Agradecimentos Agradeço primeiramente a Deus por me permitir a oportunidade de estar dentro de uma das melhores Universidades do país, por me conceder valores como sabedoria e discernimento para atuar com tanta dedicação na minha área; agradeço a Universidade de Fortaleza pela experiência de explorar conhecimento e aperfeiçoar meu campo profissional através do desenvolvimento da pesquisa e do Programa de Pós- Graduação; Agradeço o apoio e paciência da minha orientadora, Simone Coêlho Aguiar, que acreditou, insistiu e enxergou em mim o melhor que posso ser. 6