O ESTÁGIO NO CURSO DE PEDAGOGIA COMO PESQUISA DA PRÁTICA PEDAGÓGICA FONTANA, Maria Iolanda 1 UTP - Curitiba miolandafontana@hotmail.com Eixo Temático: Práticas e Estágios nas Licenciaturas Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo Este trabalho apresenta dados da dissertação de mestrado realizada pela autora, que ao investigar concepções e práticas da pesquisa no curso de Pedagogia em uma IES de Curitiba, segundo a visão de alunos e professores, localiza o estágio como componente curricular que promove a atividade investigativa, desencadeadora da relação teoria e prática. O objetivo é destacar a contribuição do estágio, proposto e vivenciado na perspectiva de pesquisa da prática pedagógica, para o exercício da práxis educativa. Conjuga-se a esta análise dados de atuais pesquisas sobre o estágio no curso de Pedagogia, após aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso, que revelam as fragilidades e contribuições desta atividade para a formação profissional do pedagogo. Defende-se o estágio no curso de Pedagogia como atividade inter-relacionada e integrada às disciplinas do currículo, pelo eixo da pesquisa e pela relação teoria e prática dos conteúdos de ensino com os contextos da prática educacional escolar e não escolar. Utiliza-se como referência para compreensão da problemática que envolve as categorias de estudo - estágio - pesquisa relação teoria e prática, a produção das autoras André (2006), Pimenta (2004), Esteban e Zaccur (2002). A investigação é desenvolvida numa abordagem qualitativa, considerando a aproximação, a interpretação e descrição dos fenômenos observados em um estudo de caso. Os dados coletados por meio de entrevistas e questionários, com professores e alunos do curso, cruzados com o que prescreve o Projeto Pedagógico, revelam que o estágio realizado como pesquisa se efetiva nas práticas pedagógicas de alguns docentes e acontece de modo mais concentrado no último ano do curso, envolvendo o uso de procedimentos de pesquisa e a relação teoria e prática pela e para leitura crítica dos dados da realidade. Palavras-chave: Curso de Pedagogia. Pesquisa. Estágio supervisionado. Relação teoria e prática. 1 Mestre em Educação pela PUC-PR, doutoranda em educação pela UTP, pedagoga da Rede Municipal de Ensino de Curitiba, professora e coordenadora do Curso de Pedagogia da UTP.
15232 Introdução: problemas e perspectivas para o estágio no curso de Pedagogia As Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia (DCNP), expressas no Parecer CNE/CP n.º 5/2005, explicitam que os estágios devem se constituir como uma vivência intencional e sistemática, abrangendo estudo e interpretação da realidade, o desenvolvimento de atividades de docência e gestão e a avaliação dessa experiência. As DCNP orientam que a organização curricular do curso, deverá estruturar-se em três núcleos: núcleo de estudos básicos; núcleo de aprofundamento e diversificação de estudos e núcleo de estudos integradores. Estes núcleos devem refletir a formação a ser dada ao licenciado e devem proporcionar, conforme o Parecer CNE/CP n. 5/2005 além de aulas, estudos individuais e coletivos, práticas de trabalho pedagógico, as de monitoria, as de estágio curricular, as de pesquisa, as de extensão, as de participação em eventos e em outras atividades acadêmico-científicas, que alarguem as experiências dos estudantes e consolidem a sua formação (BRASIL, 2005, p.10). Portanto, as diretrizes não restringem a vivência profissional, somente as atividades de estágio. Esta perspectiva dada ao estágio suscita questões sobre o seu funcionamento no currículo dos cursos de Pedagogia, sobre seus objetivos, sua organização, desenvolvimento e acompanhamento. Nesse sentido, o relatório da Fundação Carlos Chagas, sobre a Formação de professores para o ensino fundamental: instituições formadoras e seus currículos, elaborado por Gatti e Nunes (2009), apresenta importante contribuição para análise da organização curricular do curso de Pedagogia em relação às novas diretrizes e como o estágio se configura nesse contexto. Os resultados apontam para os problemas de relação teoria e prática, que continuam dicotomizados na trajetória do curso de Pedagogia. A pesquisa analisa a composição das grades curriculares de 71 cursos de Pedagogia no Brasil. As autoras revelam com base na análise de 1.498 ementas, que a ênfase curricular está nas disciplinas teóricas, sendo apenas 30% da carga horária do curso dedicada às disciplinas de formação específica. Constatam que mesmo nas disciplinas voltadas à formação profissional, a relação teoria e prática não é priorizada. (GATTI e NUNES, 2009, p.23) Os dados encontrados por Gatti e Nunes (2009, p.21) sobre o estágio curricular mostram, que nos projetos e ementas dos cursos analisados não há especificação clara sobre como são realizados, supervisionados e acompanhados, como também, não estão claros os objetivos, as exigências, formas de validação e documentação, acompanhamento, convênios
15233 com escolas das redes etc.. Segundo as autoras os estágios são considerados totalmente à parte do currículo, o que é um problema, na medida em que devem integrar-se com as disciplinas formativas e com aspectos da educação e da docência, ou, sua realização é considerada como aspecto meramente formal. Os resultados indicam que os estágios restringem-se a observação das práticas pedagógicas nas escolas e não asseguram que estes envolvam práticas profissionais efetivas. (GATTI e NUNES, 2009, p.23) Um estudo realizado por Fontana, Pasqualotto e Machado (2009, p.8) sobre as matrizes curriculares de 14 instituições formadoras da cidade de Curitiba, confirma os dados encontrados por Gatti e Nunes (2008), referente a heterogeneidade na carga horária destinada ao estágio curricular, como também falta de especificação quanto ao nível escolar, no qual esta atividade seria realizada. A pesquisa mostrou que a carga horária destinada ao estágio para a maioria das IES ultrapassa o mínimo de 300horas, conforme define a Resolução CNE/CP nº.1/2006 e que algumas IES, atribuem menor carga horária para o estágio em docência da Educação Infantil, contrariando o que diz a mesma Resolução. A pesquisa mostrou que o estágio supervisionado, recebe, em algumas das IES investigadas a denominação de Pesquisa e Prática Pedagógica, sinalizando a possibilidade de uma proposta direcionada para a pesquisa da prática pedagógica. Para Pimenta (2004, p.46) a pesquisa permite a ampliação e análise dos contextos onde ocorrem os estágios e possibilitam aos acadêmicos desenvolverem postura e habilidades de pesquisadores a partir de situações concretas, elaborando projetos que lhes permitam ao mesmo tempo compreender e problematizar as situações que observam. A pesquisa realizada por Mira (2011) em três instituições universitárias da Cidade de Curitiba revela como problemática, a falta de entendimento sobre o papel e o significado do estágio na perspectiva da pesquisa e relação teoria e prática, tanto por parte dos profissionais das instituições formadoras, como dos profissionais da escola. A integração entre a escola e a universidade pouco avançou, a escola continua sendo o espaço para aplicação de teoria selecionada pela a academia, não há tempo para discutir e aprender com a escola o conhecimento que ela também produz. Destaca que as condições de trabalho nas escolas, principalmente do pedagogo, não permitem o acolhimento e orientação aos estagiários, pouco contribuindo para sua prática profissional. (MIRA, 2011, p.179) Os problemas anunciados por estas pesquisas revelam a diversidade de concepção e de tratamento que recebe o estágio no currículo dos cursos de Pedagogia. Entende-se que o
15234 estágio curricular é imprescindível para o exercício profissional do pedagogo e, por isso, é importante que as IES formadoras viabilizem a sua efetivação como atividade de pesquisa favorecedora da relação teoria-prática e construção do conhecimento pedagógico de professores e estudantes. Investir no consenso entre as IES formadoras, nesta abordagem de estágio curricular, demanda pesquisas e debates para que se encontrem as melhores alternativas para a organização desta atividade em coerência com finalidades formativas emancipadoras. Este trabalho tem o propósito de contribuir com a reflexão sobre o estágio curricular na perspectiva da pesquisa da prática pedagógica, apresentando os dados de um estudo de caso, que compõe a dissertação de mestrado da presente autora. A pesquisa foi realizada nos anos de 2005/2006 em um curso de Pedagogia, de uma instituição universitária da cidade de Curitiba, que mesmo antes da aprovação das atuais diretrizes curriculares para o curso, contemplava em seu Projeto Pedagógico a formação do pedagogo na relação ensino-pesquisa. O estudo de caso pode ser útil para revelar os dados de um contexto e ajudar na compreensão dos dados de outro contexto por similaridade ou por comparação. A análise de similaridades e de diferenças torna possível julgar em que medida os resultados de um estudo podem ser considerados hipóteses sobre o que pode ocorrer ou não em outras situações (ANDRÉ, 2005, p.64). Estudo de caso: revelando os dados de um contexto A análise que ora se apresenta tomou como referência a literatura específica, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia e o Projeto Pedagógico da IES investigada. Segundo Lüdke e André (2005, p. 39) a análise documental pode se constituir numa técnica valiosa de abordagem de dados qualitativos, seja complementando as informações obtidas por outras técnicas, seja desvelando aspectos novos de um tema ou um problema. É nesta perspectiva que foram analisados os documentos, interpretando a ideologia e políticas sobre a prática da pesquisa neles presentes e confrontando com os dados deparados em questionários e entrevistas 2. 2 A identidade dos participantes é omitida nas falas que são apresentadas e os nomes atribuídos são pseudônimos escolhidos por eles.
15235 Foram aplicados questionários para 27 alunos e realizadas seis entrevistas com alunos concluintes do ano de 2005. Para a obtenção de dados sobre a pesquisa na prática do docente formador, foram entrevistadas cinco professoras-pesquisadoras que atuam no Curso de Pedagogia, partindo do pressuposto de que estas profissionais teriam melhores condições de realizar a relação ensino-pesquisa. O propósito foi localizar, na instituição, professores que realizassem atividades de pesquisa em seu trabalho docente, a fim de obter informações sobre o papel didático desta prática na formação dos pedagogos. Os instrumentos utilizados para o levantamento dos dados (os documentos, entrevistas e questionários) forneceram significativos discursos escritos e falados devidamente registrados, para a análise da problemática da pesquisa na formação do pedagogo, cabendo a análise interpretativa dos conteúdos destas comunicações. Interpretar, em sentido restrito, é tomar uma posição própria a respeito das idéias enunciadas, é superar a estrita mensagem do texto, é ler nas entrelinhas, é forçar o autor a um diálogo, é explorar toda a fecundidade das idéias expostas, é cotejá-las com outras, [...](SEVERINO, 2002, p. 56). O estágio com pesquisa A análise que se apresenta é resultado do agrupamento de dados em categorias de análise, sendo elas: o estágio, a pesquisa e a relação teoria e prática. O Projeto Pedagógico do curso de Pedagogia, da instituição pesquisada, começou a vigorar no ano de 1996, e adotou as orientações emanadas pelo movimento de educadores e entidades representativas de pesquisadores brasileiros. O documento define a formação do pedagogo numa perspectiva sócio-histórica, para que compromissos com a democratização do acesso aos bens culturais sejam enfrentados no campo profissional, transformando a realidade e promovendo a emancipação de todos os indivíduos. Neste documento, o Estágio Supervisionado é proposto para os dois últimos anos do curso, constitui-se em possibilidade de ampliação do conhecimento sobre a realidade escolar, a possibilidade dos alunos estagiários desenvolverem atitudes investigativas sobre a prática observada e a elaboração de projetos de pesquisa. Estes projetos têm o objetivo de problematizar o contexto escolar e buscar referências teóricas para interpretar e compreender a natureza, a especificidade e as relações que se estabelecem no trabalho pedagógico. Os dados que serão apresentados mostram que essa perspectiva está presente nas práticas pedagógicas de alguns professores.
15236 A disciplina de Prática Pedagógica:Estágio Supervisionado foi citada pelos alunos, nas respostas abertas do questionário, como disciplina que trabalha com a aplicação de instrumentos de pesquisa e a elaboração de relatórios e projetos. São exemplos as respostas das alunas: Na disciplina de estágio fazíamos relatórios, colhíamos dados do campo de estágio e analisávamos. (Izabel). O projeto de pesquisa do 2º ano foi muito superficial, mas o relatório de estágio, no 4º ano foi aprofundado. (Cléo). A Prática pedagógica: Estágio em Docência como em Gestão, são disciplinas que usaram procedimento, de formulação de problema, encaminhamentos metodológicos, fundamentação teórica. Elaboramos relatório de estágio de docência e de pedagogia escolar. (Cleuza Luiza). Conforme define Pimenta (2004, p.46), a pesquisa no estágio é um método que permite a análise de contextos educativos e também se constitui em um método que possibilita ao estagiário desenvolver, a partir da vivência no campo de estágio a atitude e habilidades de pesquisar. Por essa razão, utilizar no Estágio os procedimentos da pesquisa para o levantamento de dados e interpretação das formas da docência e da organização do trabalho pedagógico na escola requer o domínio dos conteúdos teóricos destas áreas de atuação, como também dos instrumentos de pesquisa para conhecer e interpretar a realidade vivida. Dessa forma, para interpretar a realidade da escola é preciso considerar os elementos socioculturais, os valores e crenças, presentes nas relações e no trabalho dos profissionais da escola, buscar teoria para compreender os condicionantes que a determinam e, assim, construir novos conhecimentos relativos à realidade observada. Segundo a aluna Cleuza, quando o estágio serve apenas para constatar ou apontar os problemas da prática escolar não contribui para a aprendizagem dos alunos. Assim, a aluna diz: Se a pesquisa for para o campo de estágio para constatar uma leitura da prática com a teoria que eu tenho, eu acho que prejudica. Porque se você for para o campo de estágio para reafirmar aquilo que você leu, não vá. Eu acho que prejudica enquanto estrutura de pesquisa e conhecimento sobre a pesquisa, e prejudica enquanto conhecimento de formação. (Cleuza).
15237 Segundo Pimenta (2004, p.46) a pesquisa no estágio pressupõe que o conhecimento não é uma verdade absoluta e, portanto, capaz de explicar toda e qualquer situação observada. Essa compreensão supõe a construção de novos conhecimentos teóricos baseados nos dados que a realidade impõe e que são percebidos na postura investigativa do estagiário. Relação teoria e prática como princípio formativo As alunas entrevistadas destacam o Estágio como disciplina que trabalha com a pesquisa e estabelece a relação teoria e prática. Elas relatam a importância da integração entre as disciplinas de Organização do Trabalho Pedagógico com o Estágio Supervisionado na Organização Escolar, pois favorece a aprendizagem dos conteúdos da gestão escolar e do trabalho pedagógico pela relação teoria e prática. São exemplos as falas: O Estágio Supervisionado na Organização Escolar tem a disciplina de OTP - Organização do Trabalho Pedagógico - como aliada. Então, tem uma disciplina que, querendo ou não, acaba fazendo uma fundamentação teórica para que a gente vá ao campo do estágio utilizando. (Cleuza). Apesar da gente não ter ido atrás de muito referencial teórico para poder fazer esse projeto de intervenção, foi onde eu pude perceber a maior relação da teoria, das aulas expositivas da disciplina de OTP, com o que a gente estava vivendo no estágio mesmo. (Gabriela). A perspectiva de pesquisa no estágio da IES em questão tem como fundamento a indissociabilidade entre a teoria e a prática, superando, assim, o entendimento de estágio como atividade somente prática ou, instrumental. De modo diferente, o Estágio em Docência, na visão da aluna entrevistada, apresenta problemas para integrar o trabalho com outras disciplinas que ajudem a estabelecer a relação teoria e prática. A aluna Cleuza aponta para a necessidade de relações, teórico-práticas entre a disciplina de Estágio em Docência com as disciplinas de Didática e as Metodologias de Ensino. Assim, a aluna expressa: A disciplina de Estágio em Docência eu acho que fica mais vulnerável pelo fato de não ter uma outra disciplina aliada. É a mais isolada do currículo. Ela não tem uma fundamentação teórica que é assistente, que talvez fosse a Didática, mas que acontece no ano anterior. As Metodologias, que ocorrem concomitantes com o estágio, não têm ligação entre os professores. (Cleuza).
15238 Conforme define o Projeto Pedagógico sobre o estágio: A articulação desta disciplina com as metodologias de ensino e de áreas específicas é imprescindível para o acompanhamento efetivo dos alunos durante os momentos de planejamento, prática e análise crítica desse processo. (PP IES, 2006, p. 52, 53). Aluna Caroline relata a falta de articulação entre as disciplinas: Pior mesmo foram as Metodologias de Ensino. Elas são trabalhadas muito separadas! (Caroline). Infere-se que a estrutura do currículo do curso de Pedagogia da IES ao concentrar as disciplinas teóricas nos primeiros anos de formação, dificulta a articulação teoria e prática, principalmente se estas disciplinas não articulam ensino e pesquisa. Dessa forma, pouco contribui para a compreensão e reflexão dos alunos, sobre as relações entre a prática pedagógica e o contexto social em sua totalidade. A disciplina de Didática integrada ao Estágio, por exemplo, qualificaria a análise de projetos de intervenção no estágio, uma vez que a didática é o campo de conhecimento sobre o ensino e, assim, subsidiaria a reflexão sobre as melhores formas de ensinar e de aprender. Na tentativa de minorar estes problemas, as disciplinas de Organização do Trabalho Pedagógico e o Estágio Supervisionado na Organização Escolar são ministradas pela mesma professora. O objetivo é garantir a interdisciplinaridade entre os conteúdos da gestão e do trabalho pedagógico na organização escolar, favorecendo a relação teoria e prática dos conteúdos. Esta estratégia tem revelado resultados positivos para a aprendizagem dos alunos, conforme as falas destacadas anteriormente e a fala da professora Sogami abaixo registrada, que explica o encaminhamento da pesquisa e da integração de conteúdos presente na disciplina: Uma das disciplinas que tem mais crescido com essa perspectiva da pesquisa, e o aluno fazendo a pesquisa, é a disciplina de Prática Pedagógica na Organização Escolar. Ele já começa a fazer uma imersão naquele cotidiano, começa a entender algumas questões que vão se colocando, primeiro num nível mais documental, depois entre os atores com entrevistas e observações. Primeiramente o objetivo é fazer uma fundamentação teórica. (Sogami).
15239 Como explicam Esteban e Zaccur (2002) a teoria é um instrumento que ajuda a olhar e apreender o real. Nesse sentido, o aprofundamento teórico tem o sentido de busca da superação de limites encontrados, para intervenções mais eficazes. No estágio inicia-se um movimento em que a prática atualiza e interroga a teoria, que por sua vez interroga e atualiza a prática. (ESTEBAN e ZACCUR, 2002, p. 18). No sentido dado por Marx, como explica Vázquez (1977) não basta interpretar o mundo pela teoria, é preciso transformá-lo pela práxis. Práxis é a atitude teórico-prática desenvolvida pelo ser humano quando transforma a natureza e a sociedade. Assim, a relação entre teoria e práxis é para Marx teórica e prática: prática, na medida em que a teoria toma como guia da ação, molda a atividade do homem, particularmente a atividade revolucionária; teórica, na medida em que essa relação é consciente (VÁZQUEZ, 1977, p. 117). A professora Maires associa a pesquisa ao exercício da práxis educativa: Sem dúvida a pesquisa favorece a relação teoria e prática, não há nem como, é quase óbvio isso. A prática da pesquisa é exatamente um exercício práxico, se podemos inventar esse neologismo. (Maires). Isto quer dizer ter a prática como ponto de partida para dela emergir questões, refletir sobre ela, trabalhando com conhecimentos teóricos e práticos, tendo como princípio a ação e a reflexão numa relação dialógica e dialética. Na forma dialética a teoria e prática são consideradas como eixo articulador da formação do profissional, na medida em que os dois elementos são trabalhados de forma integrada, constituindo uma unidade indissociável. Assim, a teoria será permanentemente confrontada com o concreto social e escolar, e este será olhado a partir da teoria, recuperando-se a unidade dialética teoria-prática. A pesquisa e a relação teoria e prática A professora Sogami explica como faz a integração dos conteúdos teóricos e o direcionamento para a pesquisa nas disciplinas de Organização do Trabalho Pedagógico e de Estágio Supervisionado na Organização Escolar. No estágio a professora conta que realiza inicialmente a preparação para a pesquisa de campo, trabalhando a elaboração de instrumentos de pesquisa, e paralelamente na disciplina de OTP, trabalha os conceitos, os meios e modalidades de gestão.
15240 Primeiramente os alunos fazem uma fundamentação teórica. Por isso, que a disciplina OTP é ministrada junta, ela vai trabalhar desde a função social da escola, organização dos meios e modalidades de gestão, os conceitos de gestão, as manipulações que o estado faz desses conceitos, e o aluno vai trabalhando num estatuto mais teórico, estabelecendo relações com outras disciplinas. Constroem texto com base na concepção de escola que estão defendendo, e começam a construir os instrumentos da pesquisa em educação. Pegamos textos de Marli André, Lüdke, Ivani Fazenda. E depois disso, eles já conseguem trabalhar com os instrumentos de pesquisa de campo. Não é possível fazer pesquisa sem dar a voz àqueles que fazem parte do contexto pesquisado. Então eles estudam a metodologia de pesquisa, e isso vira um módulo inteiro do estágio, além de estar trabalhando na OTP os elementos de gestão. (Sogami). A professora Maires, explica que a pesquisa está sempre presente nos encaminhamentos metodológicos que utiliza para a disciplina de Estágio Supervisionado na Organização Escolar: São projetos de fato, são projetos de pesquisa, mas verificando aspectos da teoria. Na verdade, de ano a ano, eu faço modificações, de fato nunca é igual, mas uma coisa permanece, que é o fato de sempre a pesquisa está presente! (Maires). A professora Rose que também ministra a disciplina de Prática Pedagógica, Estágio Supervisionado na Organização Escolar explica que a pesquisa que os alunos desenvolvem no estágio se aproxima de um roteiro de pesquisa empírica. Assim ela fala: Na disciplina de organização e gestão, por exemplo, nós fazemos um trabalho de conhecimento inicial do funcionamento de uma escola. Eles vão para uma escola e vão ver como funciona, quais as equipes que trabalham lá, entrevistam professores, alunos para saber o que eles acham das aulas, dos professores, da metodologia. Então é um trabalho que poderia se enquadrar dentro de um roteiro de investigação empírica de uma pesquisa, mas eles fazem a pesquisa em uma escola e em um período muito curto. Então não dá para eles observarem se as informações dadas pelos diferentes profissionais correspondem à realidade. O objetivo não é só a iniciação à pesquisa, esses trabalhos todos têm uma relação direta com os conteúdos das disciplinas, principalmente. (Rose). As práticas relatadas pelas professoras entrevistadas demonstram que elas reconhecem o Estágio Supervisionado como atividade teórica e prática e utilizam os instrumentos da pesquisa para que o estagiário reflita, interprete e compreenda à luz de referencial teórico de disciplinas afins, a realidade observada em sua rede de relações e contradições. O estágio no formato trabalhado pelas professoras assume a perspectiva de pesquisa, visando à produção
15241 do conhecimento e o desenvolvimento da atitude investigativa do acadêmico, para que práticas pedagógicas voltadas ao atendimento das aprendizagens de todos os alunos ocorram. Assim como expressa a professora Sogami: Então o objetivo dessa prática é de que o aluno desenvolva sua autonomia de pesquisador, viva os dilemas que o pesquisador tem, faça escolhas e que fundamente essas escolhas, E você vai explicando essas contradições que estão sendo produzidas, e eles vão entendendo melhor o que é criar um fundamento teórico que seja coeso. (Sogami). Segundo a literatura específica, cabe ressaltar que a pesquisa no currículo favorece a relação teoria e prática, principalmente pelo conhecimento e reflexão-ação sobre as reais condições onde e como a prática pedagógica acontece. Dessa forma, o pedagogo é preparado para assumir uma postura investigativa diante dos problemas da prática pedagógica e atuar como produtor de conhecimentos, em vez de ser apenas consumidor e transmissor de conhecimentos acadêmicos. Autores que defendem a proposta de formar o professor pesquisador, explicam que é necessário desenvolver práticas crítico-reflexivas, que estabeleçam relação entre a teoria e prática, no processo de formação, sem a qual, é impossível a preparação para pesquisa. Pode-se inferir preliminarmente, a partir da análise dos dados levantados até aqui, sobre a relação entre o ensino-pesquisa no processo de formação dos alunos da IES investigada, que embora, esta relação não aconteça na totalidade do currículo, está presente na prática pedagógica de alguns professores. Também se verifica que esta prática está mais concentrada nas disciplinas do último ano do curso, principalmente no Estágio Supervisionado em Organização Escolar. Essa articulação é concretizada pela proposição de atividades que utilizam, conforme respostas dos alunos, os procedimentos de pesquisa de campo, levantamento de dados, elaboração de relatórios e fundamentação teórica para leitura dos dados da realidade. Também, quando utilizam a pesquisa como meio para a aprendizagem dos produtos e processos delas decorrentes. André explica que é preciso ensinar o aluno a pesquisar, ou seja, é preciso problematizar a realidade, o que requer um aprendizado de observação e análise da realidade, com apoio em conceitos e em referenciais - e um conhecimento de métodos e instrumentais para sua apreensão. (ANDRÉ, 2006, p. 223). O teor das DCNP direciona o trabalho com a pesquisa principalmente para intervenção do pedagogo nos problemas práticos de ensino, ou seja, a perspectiva da pesquisa ainda, é
15242 restrita, conserva um caráter principalmente instrumental. No entanto, os efeitos na formação pela pesquisa como eixo formativo podem ser mais amplos, como envolver nas atividades de estágios a participação do acadêmico em conjunto com os profissionais das escolas em pesquisas e produção do conhecimento voltado à melhoria das práticas pedagógicas direcionadas a objetivos sociais e políticos transformadores. Considerações finais A partir da análise realizada, pode-se dizer que o Projeto Pedagógico da IES concebe o estágio na perspectiva da pesquisa, visando à aprendizagem do instrumental da investigação científica e a compreensão crítica de práticas pedagógicas escolares. No que diz respeito aos dados levantados sobre a concepção de pesquisa, que têm alunos e professores da IES investigada, é possível inferir que esta abordagem é entendida como atividade curricular que promove a construção do conhecimento pela relação teoria e prática e envolve tanto a aproximação, investigação e reflexão sobre a prática pedagógica, como a aprendizagem dos procedimentos da pesquisa científica. Assim, as falas dos alunos e professores mostram um avanço na compreensão teórica sobre a concepção de pesquisa no campo do estágio para a aprendizagem do instrumental da pesquisa para compreensão e intervenção na realidade escolar. No entanto, cabe ressaltar que os dados levantados na investigação sobre as práticas de pesquisa na formação do pedagogo da IES revelam que, esta concepção não é consenso entre os acadêmicos, como também, não está presente na totalidade das práticas pedagógicas desenvolvidas pelos professores do curso. O princípio da relação teoria e prática suscita, para o coletivo de professores da IES, a reflexão sobre as melhores formas de garantir sua efetivação como um eixo de formativo, ou seja, presente nas atividades de estágio e demais componentes curriculares. REFERÊNCIAS ANDRÉ, Marli Eliza D.A. Ensinar a pesquisar... Como e para que? In: SILVA, Aida Maria M; et al (Orgs). Educação formal e não formal, processos formativos e saberes pedagógicos: desafios para a inclusão social. XIII Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino. Anais... Recife: ENDIPE, 2006.. Estudo de caso em pesquisa e avaliação educacional. Brasília: Líber Livro Editora, 2005.
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