ANAIS TIPOLOGIA DE SISTEMAS DE LOGÍSTICA REVERSA BASEADA NOS PROCESSOS DE RECUPERAÇÃO DE VALOR: ESTUDO DE TRÊS CASOS EMPRESARIAIS



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Transcrição:

TIPOLOGIA DE SISTEMAS DE LOGÍSTICA REVERSA BASEADA NOS PROCESSOS DE RECUPERAÇÃO DE VALOR: ESTUDO DE TRÊS CASOS EMPRESARIAIS EMÍLIA MENDONÇA ANDRADE ( emilia.andrade@alcoa.com.br, emi.andrade@gmail.com ) ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS / UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ANA CAROLINA FERREIRA ( carol.loleta@gmail.com, almada@sc.usp.br ) ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÀO CARLOS / UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FERNANDO CÉSAR ALMADA SANTOS ( almada@sc.usp.br, almada@sc.usp.br ) ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS / UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Resumo Esta pesquisa propõe uma classificação dos sistemas de logística reversa baseada nos processos para recuperação de valor realizados pelas empresas, além de explorar esta questão em três estudos de caso, nos quais se avaliam a inserção da sustentabilidade e da logística reversa na visão estratégica das empresas. Os resultados obtidos permitiram concluir que à logística reversa competem diversas finalidades, como adequação ambiental, recuperação de valor e prestação de serviços diferenciados. A aplicação da teoria construída aos casos empresariais mostrou ser a classificação proposta um arcabouço para análise dos sistemas sob ótica dos processos realizados, recuperação de valor e adequação ambiental. Palavras-chave: gestão ambiental empresarial, logística reversa, níveis de recuperação do valor. 1. Introdução Primeiramente, o conceito de logística reversa referia-se aos produtos que retornam à cadeia de distribuição por diversos motivos: devoluções por problemas de garantia, avarias no transporte, excesso de estoques, prazo de validade expirado, entre outros. Tais motivos, geralmente, estavam relacionados a determinados aspectos como a qualidade do produto e do processo de distribuição, que norteavam a busca da satisfação do cliente/consumidor. Entretanto, em decorrência das mudanças ocorridas no cenário ambiental, a procura por empresas ambientalmente responsáveis cresceu, assim como as restrições legais quanto ao descarte de materiais que pudessem causar danos ao ambiente. É dentro dessa conjuntura de mudanças, principalmente àquelas relacionadas à legislação, que se tem um aumento da atuação e importância da logística reversa. Rogers e Tibben-Lembke (1998) definem logística reversa como: [...] o processo de planejamento, implementação e controle da eficiência e custo efetivo do fluxo de matéria-prima, estoques em processo, produtos acabados e as informações correspondentes do ponto de consumo para o ponto de origem com o propósito de recapturar valor ou realizar o descarte adequado (ROGERS e TIBBEN-LEMBKE, 1998, p.2). Stock (1998), em sua concepção do termo, engloba também aspectos ligados à redução e ao reaproveitamento de materiais: [...] o termo comumente utilizado para se referir ao papel da 1/17

logística no retorno de produtos, redução na fonte, reciclagem, substituição de materiais, reuso de matérias, disposição de resíduos, reforma, reparo e remanufatura. Pode-se dizer que as mudanças dos valores da alta gerência das empresas refletem mudanças nas seguintes esferas: mercado consumidor, agregação do aspecto ambiental ao processo, preocupação com a sustentabilidade, busca por diferencial competitivo e inclusão da variável ambiental nos processos decisórios. A logística reversa é uma das ferramentas que reflete a responsabilidade ambiental agregada à recuperação de valor dos produtos (GUARNIERI et al., 2006; LEITE, 2003; ROGERS e TIBBEN-LEMBKE, 2001). O avanço da tecnologia, a aceleração da obsolescência dos produtos, a redução do ciclo de vida dos mesmos e o maior giro dos estoques são alguns aspectos que contribuem para o aumento constante da descartabilidade de bens. O desequilíbrio existente entre as quantidades descartadas e reaproveitados torna o gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos um dos mais graves problemas ambientais da atualidade (GUARNIERI e LEITE, 2003). A logística reversa permite que as empresas sejam responsáveis pela destinação final adequada de seus produtos e/ou embalagens, evitando que estes sejam descartados de forma inapropriada pelos consumidores. Outro benefício trazido pela logística reversa é poder proporcionar a diminuição dos riscos associados ao descarte inadequado de produtos perigosos como lâmpadas, baterias e embalagens de agrotóxicos. A função de adequar a empresa às legislações e regulamentações ambientais vigentes também pode ser atribuída à logística reversa, quando os produtos ou seus componentes colocam em risco o meio ambiente e a saúde pública e existem normas e legislações para garantir o controle do descarte de tais substâncias. 2. Processos envolvidos na logística reversa Para melhor entendimento do processo logístico reverso, é possível sistematizar as etapas e atores que o constituem. A bibliografia consultada apresenta visões distintas do processo, resultando em diversas categorizações possíveis para o mesmo objeto. A destinação dos produtos e embalagens retornadas pode ser categorizada de acordo com os processos aos quais são submetidos e a finalidade deste processamento. Brito e Dekker (2002) tratam deste aspecto indicando alternativas de revalorização de bens, ou seja, recuperação de matéria, energia ou valor diretamente ou a partir do reprocessamento dos produtos retornados. Os autores indicam quatro principais processos envolvidos no canal reverso de revalorização: coleta, inspeção/seleção/classificação, reprocessamento ou recuperação direta e redistribuição. A Figura 1 apresenta uma esquematização destes processos. 2/17

Figura 1: Esquematização dos processos envolvidos na logística reversa. Fonte: Brito e Dekker (2002). A condição em que se encontra o produto retornado pode ser função da razão pela qual esse foi retornado. Ela geralmente determina se o produto pode ser reutilizado ou remanufaturado. Se não for o caso, apenas reciclagem e descarte final são considerados como alternativas (BRITO e DEKKER, 2002). Na Figura 2, na qual são indicadas as alternativas de revalorização de produtos indicadas pelos autores, os processos no topo da pirâmide recuperam maior valor, enquanto que as opções na base da pirâmide recapturam menos valor dos produtos. Figura 2: Alternativas de recuperação de produtos retornados, ordenados de acordo com a capacidade de recuperação de valor. Fonte: Adaptada de Brito e Dekker (2002). 3. Níveis de recuperação de valor A recuperação e agregação de valor aos produtos retornados podem ocorrer de diferentes formas, dependendo das características dos produtos e dos processos aos quais esses são submetidos. A literatura sobre o assunto é dispersa e conflitante. 3/17

Conforme descrito na Seção 2, os principais autores consultados dividem os processos necessários para a recuperação de valor com base em diferentes critérios. Porém, quando se leva em consideração os níveis possíveis de recuperação de valor de um produto, poucas são as informações disponíveis. O valor do produto recuperado varia de acordo com os processos pelos quais esse é submetido, sendo que, à medida em que o produto avança sobre os níveis de recuperação da Figura 2, maior é a revalorização do mesmo. Quando a etapa final do processo é a revenda, o reuso ou a redistribuição garante-se ao produto a sua função original, e, portanto, a sua máxima revalorização. Quando a alternativa encontra-se na base da pirâmide, a revalorização está associada à recuperação de materiais, energia ou ao descarte apropriado de resíduos. A recuperação é parcial, estando atrelada, normalmente, a razões legais e/ou ambientais em detrimento às econômicas. A revalorização, ou recuperação do valor, de bens e produtos adquire diferentes níveis de importância conforme o setor empresarial. Quando um produto possui alto valor agregado, o seu retorno ou descarte acarreta desperdício de matéria-prima, energia e tempo. Alguns setores dependem mais diretamente da recuperação de seus produtos, como é o caso da indústria fonográfica e editorial, que possuem políticas específicas que garantem a liberdade para a devolução dos produtos com baixa saída ou ciclo de vida muito curto. A classificação dos diferentes níveis de recuperação de valor tem o intuito de suprir a necessidade de um sistema que garanta a esquematização das etapas necessárias para o correto manejo dos bens e produtos retornados, assim como permitir a separação dos diferentes objetivos almejados com a implantação de um programa de logística reversa, permitindo elencar as barreiras e oportunidades vinculadas a cada sistema. A obtenção de um panorama claro e integrado dos processos envolvidos na logística reversa é imprescindível para a o bom desempenho do sistema como um todo. 4. Classificação dos sistemas logísticos reverso A classificação dos sistemas de recuperação de valor foi elaborada com base na pirâmide apresentada na Figura 2. Os critérios utilizados foram: o valor final recuperado, diminuição dos possíveis impactos ambientais e os diferentes níveis de processos realizados. A questão ambiental, assim como o valor recuperado, é mais influente conforme se aproxima do topo da pirâmide. O primeiro nível foi nomeado de Sistema Logístico de Descarte (S.L.D.), no qual o objetivo principal é a adequação às normas e legislações vigentes, o correto descarte dos produtos, principalmente os perigosos, assim como a internalização das externalidades negativas. O sistema logístico de descarte inclui a destinação final adequada de substâncias e produtos, assim como sua incineração, e, se possível, a recuperação de parte da energia liberada pela queima dos produtos. Os processos envolvidos incluem a coleta, transporte e inspeção dos bens retornados, etapas comuns a todos os níveis de recuperação, em seguida o produto pode passar por diferentes processos que variam de acordo com suas particularidades. Citam-se como exemplos a lâmpada fluorescente, as pilhas, e as embalagens de produtos fitossanitários (agrotóxicos). A periculosidade dos resíduos gerados por esses produtos contribuem para que o seu descarte seja efetuado sob a supervisão das empresas produtoras, garantindo o correto tratamento e destinação final adequada. O segundo nível recebeu o nome de Sistema Logístico de Reciclagem (S.L.R.), em que os objetivos principais são: a recuperação de matéria-prima, minimização dos impactos 4/17

ambientais, reaproveitamento de insumos, e a posterior diminuição dos custos acarretados pela implantação de um sistema de logística reversa, objetivo alcançado por meio da venda ou reuso dos materiais reciclados. O sistema logístico de reciclagem inclui separação e identificação de materiais passíveis de reciclagem, destinação adequada dos resíduos gerados pelo processo, e a venda ou reaproveitamento dos materiais recuperados. As empresas do setor editorial, da construção civil, de papel e celulose e de alumínio são os principais exemplos. Por fim, o nível mais elevado na pirâmide é o Sistema Logístico de Recuperação (S.L.Rec.), no qual os objetivos principais são: revalorização dos bens, reaproveitamento de produtos, minimização dos impactos ambientais tanto advindos do descarte do produto como da fabricação de um novo bem em substituição ao retornado, inclusão da variável ambiental no design do produto, facilitando o seu posterior desmembramento e remontagem. As etapas deste sistema incluem os mais variados processos: restauração, remanufatura, reforma, reparo e a posterior revenda, reuso e redistribuição. Os produtos característicos desse sistema são considerados, normalmente, os semi-novos que retornam ao sistema devido a necessidades de pequenos reparos, ou a devoluções por parte dos clientes. No entanto, com as mudanças ocorridas no cenário ambiental, é cada vez mais comum a adoção de técnicas de manufatura que possibilitem às empresas receberem seus produtos em qualquer etapa do seu ciclo de vida, fator que impulsiona o desenvolvimento de tecnologia e produção que facilitem tal processo. Citam-se as empresas de fotocopiadoras, computadores, maquinário pesado, peças automobilísticas, entre outras. A Figura 3 ilustra os diversos níveis de recuperação de valor descritos no presente item. Figura 3: Níveis de Recuperação de Valor. Fonte: Os autores. 5. Barreiras e oportunidades à logística reversa A logística reversa, por se tratar de uma prática relativamente recente, carece de credibilidade por parte de muitas organizações e executivos. No entanto, são numerosas as oportunidades identificadas para a implementação da mesma. 5/17

5.1 Oportunidades ANAIS A implementação de um sistema de logística reversa está relacionada às características intrínsecas de cada setor que levam empresas a atentarem à necessidade de recuperar produtos ou embalagens. A motivação por razões econômicas está relacionada com a recuperação de ativos por meio da qual a empresa obtém ganhos econômicos diretos ou indiretos. Esta é atuante, principalmente, no sistema logístico de recuperação, já que o sistema de logística de reciclagem possui um retorno econômico menor e o sistema logístico de descarte não possui retorno e pode inclusive representar custos. Quanto às razões competitivas, uma empresa pode recuperar seus produtos com a finalidade de construir uma imagem positiva e desenvolver uma boa relação com o cliente. Além disso, ter uma atitude sustentável pode também ser parte de uma estratégia de relação com cliente, tendo em vista o aumento da preocupação com a sustentabilidade ambiental por parte da sociedade (BRITO et al., 2002). O fator legislação refere-se a qualquer jurisdição que indique a empresa como responsável pela recuperação de seus produtos ou embalagens. Tais leis geralmente dispõem sobre reciclagem obrigatória, proibição de descarte final, regulamentação comercial, normas de reciclagem, rótulos ambientais, incentivos fiscais e compra de produtos com níveis mínimos de reciclagem (KOPICKI et al., 2003 apud LEITE, 2005). A natureza dos sistemas logísticos de descarte e reciclagem, devido à baixa recuperação de valor, faz com que a existência de legislação específica, normalmente, constitua seu principal motivador. A responsabilidade sócio-ambiental diz respeito a uma série de valores ou princípios que, nesse caso, estimulam uma organização a se comprometer com a logística reversa. Estimulase a incorporação da sustentabilidade no planejamento estratégico da empresa e/ou a preocupação com o bem-estar social nas suas áreas de influência. Rogers e Tibben-Lembke (1998) apontam a logística reversa como uma ferramenta estratégica, ou seja, um elemento que possui impacto em longo prazo. Por fim, é possível apontar, na Tabela 1, as principais oportunidades à logística reversa abordadas pelos autores citados nessa pesquisa. Tabela 1: Síntese das oportunidades à prática da logística reversa. Fatores motivadores para implementação da logística reversa Legislação Razões competitivas Melhoria da imagem coorporativa Revalorização econômica Renovação de estoques Ganhos econômicos Responsabilidade Sócio-ambiental Recuperação de ativos e/ou de valor Prestação de serviços diferenciados Fonte: Os autores. 6/17

O quadro presente na Tabela 2 sintetiza os principais motivadores para a implantação dos sistemas logísticos descritos. A legislação não é um motivador para o sistema logístico de recuperação uma vez que seus objetivos agregam uma esfera maior de interesse do que a simples adequação às normas vigentes. Destaca-se que o sistema logístico de descarte não possui nenhum motivador econômico, podendo esse vir a ser inclusive uma barreira, uma vez que o sistema acarreta custos. O retorno, quando existente, tende a ser indireto, em conseqüência dos outros fatores motivadores, como a melhoria da imagem coorporativa e razões competitivas. Tabela 2: Fatores motivadores para a implementação dos sistemas logísticos. Fatores motivadores S. L. D. S. L. R. S.L.Rec. Legislação X X Razões competitivas X X X Melhoria da imagem coorporativa X X X Tabela 3: Continuação Fatores motivadores S. L. D. S. L. R. S.L.Rec. Revalorização econômica X X Renovação de estoques X X Ganhos econômicos X X Responsabilidade Sócio-ambiental X X X Recuperação de ativos e/ou de valor X X Prestação de serviços diferenciados X X X 5.2 Barreiras Levando em conta que em muitas organizações a prática da logística reversa não é bem sucedida, fica clara a existência de diversas barreiras para a execução da mesma. A Tabela 4 enumera as principais barreiras apontadas por Rogers e Tibben-Lembke (1998), bem como a porcentagem de empresas que indicaram tais barreiras como significativas para o gerenciamento da logística reversa. Barreira Tabela 4: Principais barreiras à logística reversa. Porcentagem Subestimação deste setor em relação a outros 39,2 % Política da empresa 35,0 % Falta de sistemas 34,3 % Razões competitivas 33,7 % Negligência administrativa 26,8 % Falta de recursos financeiros 19,0 % Falta de recursos humanos 19,0 % Legislação 14,1 % Fonte: Rogers e Tibben-Lembke (1998). 7/17

Nota-se que, para a maioria das empresas, a falta de atenção da gerência e políticas empresariais são problemas maiores que a falta de recursos humanos e financeiros. O problema que parece ter menor impacto são questões legais. Assim, é possível afirmar que as barreiras internas à logística reversa, como políticas empresariais, possuem um papel muito mais significativo que barreiras externas, como legislações desfavoráveis. Ao se confrontar as barreiras com os sistemas da classificação proposta, encontra-se dificuldade em relacionar barreiras específicas aos diferentes sistemas logísticos, já que as barreiras mencionadas nesta seção são, em sua maioria, barreiras internas, relacionadas aos valores adotados pelas empresas e às questões internas relativas a cada organização. Assim, devido a particularidades de diferentes políticas empresariais, não cabem generalizações na análise das barreiras mais significativas a cada sistema logístico. 6. Estudo de Casos Para a realização e desenvolvimento desta pesquisa, fez-se a avaliação de sistemas de logística reversa em empresas de diferentes segmentos por meio de estudos de caso qualitativos. Tratam-se de casos-exemplos (ROESCH et al., 1999) para ilustração de práticas e estratégias e para a exploração de teoria. Com o intuito de explorar os sistemas logísticos, selecionaram-se três empresas que permitissem vislumbrar as semelhanças e diferenças de cada sistema, assim como as barreiras e oportunidades concernentes a cada uma. A pesquisa realizou-se por meio de entrevistas com gerentes da área de interesse e por meio da observação do ambiente das organizações e do fenômeno estudado. As entrevistas foram conduzidas com base em questões previamente elaboradas com fundamento no referencial teórico apresentado no presente trabalho. 6.1 Estudo de Caso 1: Retorno de Embalagens Vazias de Agrotóxicos A instituição objeto deste estudo de caso Empresa 1 é uma entidade sem fins lucrativos, criada em 2002, dedicada a gerir o processo de destinação de embalagens vazias de fitossanitários no Brasil, dar apoio e orientação à indústria, aos canais de distribuição e aos agricultores no cumprimento das responsabilidades definidas pela legislação: Lei nº 9.974/00, que determina o compartilhamento da responsabilidade pela disposição final das embalagens, por parte de agricultores, dos revendedores, das cooperativas agrícolas e dos fabricantes. Embalagens de agrotóxicos, se manuseadas de maneira descuidada após sua vida útil, podem expor o ambiente a produtos tóxicos, causando sérios impactos à saúde humana (carcinogênese, mutagênese e neurotoxicidade) e ao meio ambiente (SPADOTTO, 2006). O instituto atua na condução do processo de destinação final das embalagens, articulando os elos da cadeia produtiva para assegurar sua máxima eficiência. O fluxograma simplificado do processo está representado na Figura 4. 8/17

Figura 4: Fluxograma do processo de logística reversa realizado pela Empresa 1. O transporte de embalagens dos postos de recebimento para as centrais de recebimento é efetuado de modo independente da logística direta, atuando em nível regional. O recolhimento direcionado para recicladores e incineradores compartilha da sinergia da logística direta, sendo que os caminhões que levam produtos (agrotóxicos), ao invés de voltarem vazios, são rastreados e utilizados para transporte das embalagens vazias. A porcentagem estimada de embalagens retornadas é de 90%, sendo que há uma economia média do custo de até 45% em relação à logística tradicional. No presente caso, o principal objetivo da realização da logística reversa é a adequação às normas vigentes. A recuperação de valor, embora ocorra como conseqüência da reciclagem das embalagens lavadas, não é o foco do processo. O sistema enquadra-se no primeiro nível de recuperação de valor, Sistema Logístico de Descarte, no qual os motivadores e barreiras influenciam a adoção da logística reversa como forma de adequação e diminuição de impactos ambientais advindos do descarte inadequado de produtos e embalagens. 6.2 Estudo de caso 2: Retorno de jornais A Empresa 2, objeto deste estudo de caso, é uma empresa do setor editorial de grande porte, cujos principais produtos são jornais de tiragem diária. A única unidade da empresa localizase na capital do estado de São Paulo. A distribuição dos jornais dá-se em território nacional, e é feita por meio de distribuidores locais. A cadeia de distribuição dos produtos é, portanto, extremamente complexa e ampla, envolvendo cerca de 2 mil colaboradores. Os produtos retornados à empresa e objetos deste estudo de caso são os jornais desatualizados não vendidos, que são retornados pelos varejistas, em sua maioria bancas de jornal, até a matriz da empresa. O descarte destes produtos no ambiente pode ser considerado de baixo impacto, já que o papel possui tempo de degradação relativamente reduzido, se comparado a outros produtos descartados em grande quantidade, como plásticos, por exemplo. No entanto, sua produção demanda quantidade significativa de energia e matéria-prima, o que agrega a este produto grande significância em termos de impacto ambiental, se avaliado todo o ciclo de vida do mesmo. Seu descarte, portanto, não apresenta riscos significativos de contaminação ambiental, mas deve ser minimizado devido ao grande volume de material, pois se trata de um bem com vida útil extremamente reduzida. 9/17

É importante ressaltar que ocorre o retorno apenas de parte dos jornais destinados à venda avulsa, na proporção de aproximadamente 30%. A Figura 5 representa esquematicamente os processos de distribuição e retorno de jornais na empresa. Figura 5: Processo logístico direto e reverso dos jornais na Empresa 2. Esse processo não implica custos adicionais significativos, pois os trajetos realizados na logística reversa são os mesmos da logística direta. Após o retorno dos jornais, esses são contados, pesados e armazenados em galpões. Os jornais são então vendidos, em sua maioria, à empresa de aparas, que realiza a reciclagem do papel. Por ser a reciclagem o único processamento objetivado pelo sistema de logística reversa, esse pode, portanto, ser caracterizado como Sistema Logístico de Reciclagem (S.L.R.), conforme a classificação de níveis de recuperação de valor proposta neste trabalho. 6.3 Estudo de Caso 3: Retorno de Impressoras e Toners A Terceira empresa a ser estudada é uma companhia multinacional com matriz nos EUA. Em todo o mundo, a empresa possui cerca de 61.000 funcionários. Suas atividades são a produção e comercialização de impressoras, sistemas multifuncionais e fotocopiadoras, além de acessórios relativos a esses produtos. Os produtos retornados a empresa podem ter três destinos diferentes: a remanufatura, a reciclagem ou descarte adequado dos resíduos. As etapas anteriores a destinação dos produtos ou componentes incluem a embalagem, inspeção, separação e desmanche. No parque industrial as máquinas são avaliadas, desmontadas, as peças são limpas, recuperadas e testadas, ganhando novo ciclo de vida. Estima-se que 10% dos produtos retornam para o processo, sendo que o custo da logística reversa equivale a 15% do valor da logística direta. Na Figura 6 está representado o fluxograma simplificado dos processos envolvidos na logística reversa da Empresa 3. 10/17

Figura 6: Fluxograma do processo de logistica da Empresa 3. A análise dos processos envolvidos no retorno de produtos da empresa permite a classificação dos mesmos como Sistema Logístico de Recuperação. A revalorização ocorre por meio da remanufatura, reciclagem e posterior revenda dos produtos. Infere-se a partir dos resultados que os objetivos do retorno de produtos realizado pela Empresa 3 são condizentes com aqueles apontados na classificação do sistema logístico de recuperação: revalorização dos bens, reaproveitamento de produtos, minimização dos impactos ambientais e inclusão da variável ambiental no design do produto. 7. Apresentação e discussão dos resultados O estudo dos sistemas logísticos das três empresas pesquisadas permite uma análise comparativa dos processos realizados por cada uma delas, bem como das principais barreiras e oportunidades enumeradas pelas mesmas à realização da logística reversa. Tendo sido escolhidas empresas com características distintas, cada qual apresentando um dos níveis de recuperação de valor, é possível relacionar esta classificação com as peculiaridades de cada caso, visando confrontar a teoria construída com o que se observa na prática. Na Tabela 5 encontra-se a síntese dos principais resultados obtidos no estudo dos três casos empresariais. Tabela 5: Síntese dos principais resultados obtidos no estudo dos 3 casos empresariais. Empresa Produto retornado Sistema Logístico Legislação Razão do retorno Principal Oportunidade Principal Barreira Incorporação da variável ambiental 1 Embalagens de agrotóxicos S. L. de Descarte Lei n 7.802/1989 Decreto n 4.074/2002. Fim de vida Legislação Melhoria contínua do sistema Destinação ambientalmente adequada de produtos 2 Jornais (venda avulsa) S. L. de Reciclagem - Encalhe Recuperação de ativos e valor Falta de Sistemas Reciclagem de materiais 11/17

3 Impressoras e toners S. L. de Recuperação Pol. Nac. Res. Sólidos Fim de vida Responsabilidade Sócio-ambiental Falta de Recursos Financeiros Design do produto, reprocessamento, reutilização e descarte adequado de produtos Os processos envolvidos em cada sistema podem ser associados à proporção de produtos retornados em relação ao total produzido e ao reprocessamento pretendido. Os produtos com maior índice de retorno, embalagens de agrotóxicos (90%) e jornais (30%), são retornados com a mesma periodicidade e por meio das mesmas estruturas da cadeia de distribuição direta, o que possibilita a concepção de um sistema de logística reversa com custos relativamente reduzidos e simplicidade de operação. O sistema concebido pela Empresa 3, neste aspecto, distingue-se dos demais sistemas estudados pela pequena proporção de produtos retornados e conseqüente esporadicidade do retorno. Apesar dos custos totais da logística reversa serem estimados em apenas 15% dos custos da distribuição de produtos, cabe ressaltar que apenas 10% dos produtos são retornados, o que permite afirmar que, proporcionalmente, o sistema de logística reversa é mais dispendioso que a logística direta, e mais oneroso também que os sistemas das outras empresas estudadas. A classificação dos sistemas de logística reversa das empresas estudadas é feita principalmente com base no principal processo realizado descarte, reciclagem ou reprocessamento. No entanto, este critério isolado não fornece um enquadramento condizente com todas as condições relacionadas a cada sistema logístico. Em todas as empresas estudadas, realiza-se a reciclagem de produtos, mas apenas a Empresa 2 teve seu sistema de logística classificado como sistema de reciclagem. Isso porque na Empresa 3, por exemplo, a reciclagem ocorre como um processo secundário, sendo a revalorização econômica por meio da remanufatura e reaproveitamento do produto o foco principal do sistema de logística reversa, o que o caracteriza como sistema logístico de recuperação. Algo semelhante ocorre com a Empresa 1, que realiza a reciclagem de produtos, mas a característica principal de seu sistema é que este foi implementado primordialmente para adequação à legislação e minimização de impacto ambiental por oferecer destinação adequada às embalagens de agrotóxicos características peculiares do sistema logístico de descarte. Segundo os critérios empregados para classificar os níveis de recuperação de valor, a preocupação com a diminuição dos possíveis impactos ambientais está presente em todos os casos, em níveis diferentes. A Empresa 1 agrega esse conceito na adequação do descarte de embalagens de defensivos agrícolas, embora o processo tenha se iniciado em virtude da legislação. A instituição conseguiu agregar a questão ambiental na estratégia das empresas associadas. A conscientização dos agricultores quanto à importância do retorno das embalagens e o correto manejo das mesmas são preocupações constantes do instituto, que procura o aumento constante da eficiência de seu sistema. Quanto à recuperação de valor, a Empresa 1 o realiza de modo indireto. Exonerando o meio ambiente de um possível impacto ambiental e recuperando parte dos custos pela reciclagem das embalagens. A Empresa 2, no entanto, pratica a logística reversa como estratégia de venda de seus produtos, conforme explicado anteriormente. As características peculiares do setor editorial e a rápida obsolescência dos produtos transformam tal prática em necessidade competitiva. Sendo assim, a variável ambiental é agregada ao processo, entretanto, não é o objetivo 12/17

principal do mesmo. Essa particularidade faz com que os objetivos principais da adoção da logística reversa sejam o retorno econômico e a melhoria da imagem corporativa. Assim, a diminuição do impacto ambiental decorrente do descarte dos jornais é resultado de interesses diversos. Considerando a classificação proposta pode-se aferir que, apesar das discrepâncias relativas à importância da variável ambiental, a Empresa 2 enquadra-se no sistema proposto. Ressalta-se que os objetivos e os critérios utilizados para a separação de cada sistema logístico servem para nortear e simplificar seu estudo. Não se deve, portanto, tomá-los como regras rígidas, mas interpretá-los de acordo com as particularidades envolvidas nos processos de cada empresa. Na Empresa 3, a revalorização ocorre em seu nível mais completo, já que os equipamentos retornados tramitam por diversas etapas, desde o desmanche até a revenda, a reciclagem ou a disposição adequada. A recuperação pode ser completa, na qual o produto inicia um novo ciclo de vida, ou parcial, em que os componentes são reutilizados em aparelhos novos. As partes sobressalentes, que não podem ser reaproveitadas, seguem para a reciclagem, e podem regressar ao processo produtivo como insumo. As peças e equipamentos que não estão aptas a tais procedimentos são descartadas de acordo com as normas específicas. O enquadramento da mesma no sistema logístico de recuperação é pertinente, pois os principais objetivos são contemplados em seus processos. Quando analisadas as barreiras e oportunidades apontadas pelas empresas estudadas, é possível inferir que os casos relatados encontram-se de acordo com o que foi delineado para cada classe de sistema logístico. O sistema logístico de descarte existente na Empresa 1, segundo o entrevistado, teve como principal motivador para sua criação a adequação à legislação. Essa é uma característica fundamental deste sistema, já que ele se aplica a casos em que o bem retornado possui características que restringem o seu descarte no ambiente. Assim sendo, a segunda oportunidade apontada é a responsabilidade sócio-ambiental, já que os processos realizados visam à minimização de impactos ambientais e à saúde humana que podem ser provocados pelo descarte inadequado de produtos fitossanitários. Cabe aqui ressaltar que a prática da logística reversa em um sistema de descarte pode ser utilizada como ferramenta para a criação de uma imagem corporativa positiva, o que é exemplificado pelo estudo de caso quando se observa que a criação de imagem positiva surge como a terceira maior oportunidade à implementação do sistema. Por fim, neste caso, tem-se a revalorização econômica como a oportunidade menos relevante, tendo em vista que a reciclagem do produto não consiste no objetivo principal do sistema, e, além disso, é condicionada à avaliação do estado da embalagem quando retornada, e, freqüentemente, é inviabilizada. As barreiras relacionadas no caso do Empresa 1 consistem em desafios à melhoria contínua do sistema. Há que se ressaltar que o sistema de logística reversa é dependente da cooperação de diversos outros atores que fogem ao controle do instituto e das empresas de agrotóxicos. Assim, o maior envolvimento desses atores no processo é de fundamental importância para a melhoria do sistema. Também foram apontados proatividade, inteligência e atitude, que são, essencialmente, barreiras internas, encontradas dentro da organização empresarial. É possível então inferir que os desafios à implementação, ampliação e melhoria do sistema são, em sua maioria, relacionados à política empresarial e ao comprometimento das empresas ao constante aprimoramento do mesmo. O segundo caso estudado, da Empresa 2, difere-se do primeiro por se tratar de um sistema de reciclagem, cujo principal objetivo é a recuperação de ativos e de valor. Nesse setor, onde o 13/17

índice de retorno de produtos é muito significativo, é essencial que se recupere o valor agregado da forma mais eficiente possível. A responsabilidade sócio-ambiental, como no primeiro caso, é apontada como a segunda oportunidade mais significativa, já que a reciclagem dos produtos resulta em diminuição da quantidade de resíduos e, conseqüentemente, em menores impactos ambientais no ciclo de vida do produto. O entrevistado da Empresa 2 indica a falta de sistemas como a maior barreira relacionada ao sistema de logística reversa. É evidente que a falta de controle do sistema logístico pode prejudicar o funcionamento do sistema de maneira muito significativa, afetando negativamente todos os aspectos relacionados aos fatores críticos para a operação eficiente dos fluxos reversos. Em se tratando de um produto com distribuição ampla e índice de retorno elevado, a complexidade dos sistemas logísticos direto e reverso demanda rigoroso controle, de forma que seja possível a operação do sistema de forma otimizada. Por ser o sistema de logística reversa aplicado somente à venda avulsa de jornais que representa cerca de 30% do total produzido há grande potencial para ampliação do sistema aos jornais destinados a assinantes. No entanto, não há previsão para tal ampliação, sendo que a falta de conscientização dos assinantes constitui a maior barreira para que seja efetuada a ampliação do sistema, segundo o entrevistado. Trata-se, portanto, de uma barreira externa, que, provavelmente, ocorre pelo desconhecimento dos clientes acerca do processo de retorno, além da inexistência de um plano que facilite a coleta e o encaminhamento desse material dos pontos de consumo aos distribuidores. Diferentemente dos demais casos estudados, o sistema logístico da Empresa 3 tem como principal oportunidade a responsabilidade sócio-ambiental. Por se tratar de uma unidade pertencente a uma empresa multinacional, deduz-se que muitos de seus valores organizacionais e culturais sejam condizentes com a política empresarial da unidade principal da corporação. Assim sendo, a visão de sustentabilidade empresarial consiste na principal razão para a criação de um sistema de retorno e recuperação de produtos. Sendo um sistema logístico de recuperação, esse permite grande revalorização econômica dos bens retornados, que consiste na segunda oportunidade apontada pelo entrevistado. Falta de recursos financeiros e de recursos humanos constituem as duas maiores barreiras à implantação da logística reversa na Empresa 3, seguidas pela subestimação desse setor em relação a outros. Essas razões estão associadas na medida em que a subestimação do setor de logística reversa limita a destinação de recursos financeiros e humanos para a realização das atividades relacionadas à logística reversa. As barreiras mencionadas como mais significativas pelo entrevistado conflitam com as afirmações feitas em resposta a outras questões levantadas no questionário, das quais se infere que a empresa tem a logística reversa como uma ferramenta estratégica para adequação ambiental e recuperação de valor. A análise dos resultados referentes à política empresarial possibilita a comparação das empresas estudadas quanto à inserção da questão ambiental na visão estratégica da empresa, de forma que se possa avaliar como a logística reversa se insere nesse contexto. A Empresa 1, por ser uma organização à qual estão associadas diversas empresas do setor de defensivos agrícolas, reflete a visão e política empresariais referentes a um conjunto de organizações quanto à destinação de seus resíduos e, conseqüentemente, com a análise do ciclo de vida de seus produtos. Apesar da principal razão para o retorno de embalagens e para a criação da Empresa 1 ser a necessidade de adequação à legislação, a prática da logística reversa encontra-se muito bem inserida na estratégia da empresa. A visão de responsabilidade sócio-ambiental é utilizada como ferramenta para melhoria da imagem corporativa por meio 14/17

da divulgação de resultados positivos do programa, cujo desenvolvimento e melhoria contínua o caracterizam como um caso de sucesso e referência na área. Em se tratado de visão estratégica tanto da logística reversa quanto da inserção da variável ambiental em seus processos, pode-se afirmar que a Empresa 2 não se caracteriza como uma empresa proativa. Seu sistema de logística reversa tem como principal objetivo a recuperação de ativos, e, em conseqüência da realização desse processo, se obtém minimização de impacto ambiental. No entanto, verifica-se a ausência de um sistema de gestão ambiental, bem como a falta de planejamento da produção para melhor adequação ambiental, revelando que, estrategicamente, no que concerne à política e visão da empresa, a prática da logística reversa e a visão de ciclo de vida do produto não são valorizadas. A Empresa 3 difere-se dos demais casos pela prática do design for disassembly, planejado para facilitar e otimizar a desmontagem e reprocessamento do produto prática advinda de análise de ciclo de vida dos produtos. Contudo, trata-se de um processo ainda não totalmente consolidado. Além disso, é afirmado no questionário que a logística reversa é tida como um custo antes de ser vista como uma questão estratégica, o que permite deduzir que o processo ainda não se encontra devidamente inserido na visão e política ambiental da empresa. 8. Considerações finais Os estudos concernentes a logística reversa corroboram para a elaboração de um panorama a respeito das barreiras e oportunidades à pratica da mesma, ao entendimento da importância do fluxo reverso, das diversas formas de inclusão da questão ambiental ao processo produtivo e a relevância de tal inserção. A classificação dos sistemas logísticos configura uma tentativa de desemaranhar as confusões acerca das diversas classificações e denominações a respeito da pratica da logística reversa. Seu principal objetivo é a esquematização dos processos de maneira clara e didática, permitindo aos profissionais interessados a linearização das etapas e entendimento dos processos. Fica evidente que a implantação e manutenção de um programa de logística reversa constituem um desafio às empresas que buscam um diferencial competitivo. A adoção de políticas empresariais que incluem a sustentabilidade ambiental em suas prioridades é fator que pode dar destaque às empresas em seu meio corporativo, e a vantagem competitiva decorrente das práticas sustentáveis torna-se expressiva na medida em que o mercado torna-se mais competitivo. A logística reversa vem suprir tal demanda, criando um elo de confiabilidade, melhorando a imagem corporativa da empresa e contribuindo para o fechamento do ciclo de vida dos bens e produtos. A logística reversa pode, em muitos casos, constituir-se em uma ferramenta para que a empresa melhor compreenda o ciclo de vida de seus produtos, possibilitando uma análise de seus impactos ambientais na fase de fim de vida e descarte, de forma que se obtenham informações relevantes para a otimização do seu design e do processo produtivo no que concerne à minimização de impactos ambientais nas fases posteriores à manufatura e ao uso do produto. Observa-se por meio dos resultados obtidos com os estudos de caso que a classificação proposta deve ser interpretada de acordo com as peculiaridades de cada caso, não se constituindo em regras rígidas, mas em um arcabouço para a análise das etapas e processos concernentes a cada sistema sob a ótica das questões levantadas para a classificação: 15/17

processos realizados, recuperação de valor e adequação ambiental. Evidentemente, o presente trabalho não possui a profundidade necessária para o esgotamento da discussão de todos os parâmetros e características de cada sistema. É imprescindível que novos estudos sejam realizados e diversos processos de logística reversa sejam mapeados e interpretados. É possível afirmar que a logística reversa presta-se a diversas finalidades, sendo a adequação ambiental da empresa apenas uma dentre as possíveis vantagens que podem ser obtidas pela prática daquela. As barreiras e desafios constatados pela pesquisa são, em sua maioria, internos, revelando que a noção da importância estratégica da logística reversa não se encontra ainda consolidada na maioria dos ambientes empresariais. No entanto, as oportunidades à implantação de um sistema logístico reverso são numerosas e variadas, o que explicita a característica multifacetada de tal prática, podendo servir a vários objetivos: melhoria de imagem, adequação ambiental, recuperação de valor e prestação de serviços diferenciados. Por fim, constata-se que a classificação proposta mostra-se adequada aos fins para os quais foi elaborada, possibilitando um estudo sistemático de diferentes sistemas logísticos com enfoque na recuperação de valor e na inserção da visão de ciclo de vida ambiental do produto nas práticas empresariais. REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto 4074, 4 de janeiro de 2002. Regulamenta a Lei n 7.802 de julho de 1989. Diário Oficial da União. Brasília, DF. BRITO, M. P.; DEKKER, R. Reverse Logistics: a Framework. Econometric Institute Report EI. n.38, 19p, 2002. BRITO, M. P.; DEKKER, R.; FLAPPER, S. D. Reverse Logistics: a review of case studies. Erim report series research in management, 2003. BRITO, E. P. Z.; LEITE, P. R.; MACAU,F. R.; POVOA, A. C. Determinantes da estruturação dos canais reversos: O papel dos ganhos econômicos e de imagem corporativa. In: ENCONTRO DA ANPAD, Brasília, 2005. Publicações... 2005. 16p. CARTER, C. R, ELLRAM, L. M. Reverse logistics: A review of the literature and framework for future investigation. Journal of Business Logistics. 1998. GUARNIERI, P.; CHRUSCIACK, D.; OLIVEIRA, I. L.; HATAKEYAMA, K.; SCANDELARI, L. WMS Warehouse Management System: adaptação proposta para o gerenciamento da logística reversa. Produção, v. 16, n. 1, 2006. KOPICKI, R. (Org). Reuse and recycling-reverse logistics opportunities. Illinois: Council of Logistics Management, 1993. LEITE, P.R. Logística reversa: categorias e práticas empresariais em programas implementados no Brasil um ensaio de categorização. In: ENCONTRO DA ANPAD,2005. *. Logistica reversa: meio ambiente e competividade. São Paulo: Prentice Hall, 2003, 250p. *. Canais de distribuição reversos: logística reversa e a responsabilidade empresarial. Revista Tecnologistica. São Paulo, Dezembro, 8p, 2000. 16/17

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