VARIABILIDADE GENÉTICA ENTRE ACESSOS DE MANDIOCA COM POLPA AMARELA, ROSADA, CREME E BRANCA ACESSADA POR MEIO DE MARCADORES RAPD Eduardo Alano Vieira 1, Fábio Gelape Faleiro 1, Kenia Graciele da Fonseca 1, Graciele Bellon 1, Josefino de Freitas Fialho 1, Mário Ozeas Sampaio dos Santos Filho 1 ( 1 Embrapa Cerrados, BR 020, Km 18, Caixa Postal 08223, 73010-970 Planaltina, DF. E-mail: vieiraea@cpac.embrapa.br) Termos para indexação: Manihot esculenta Crantz, variabiliade genética, marcadores moleculares, mandiocas biofortificadas, melhoramento genético. Introdução A mandioca (Manihot esculenta Crantz) é uma das mais importantes fontes de calorias da dieta de vários países tropicais, estima-se que 700 milhões de pessoas, em especial na África e no Brasil, obtenham mais de 500 calorias por dia por meio da cultura (Cock, 1985). A cultura é importante em países em desenvolvimento, principalmente em função de sua rusticidade e da capacidade de produzir em condições em que outras culturas não sobreviveriam. Nos últimos anos, a mandioca tem se revelado uma fonte potencial de carotenóides, beta-caroteno, precursor da vitamina A, nas raízes de coloração amarela e de beta-caroteno e/ou licopeno, nas raízes de coloração rosada (Iglesias et al., 1997; Carvalho et al., 2000). Dessa forma, a cultura vem destacando-se dentre os vegetais como uma importante fonte de vitamina A, vitamina essa associada a diversos fatores de proteção a saúde humana, dentre eles a cegueira noturna e de licopeno que é um antioxidante que pode prevenir o câncer. Nesse contexto a possibilidade da mandioca não ser apenas uma fonte de calorias para as populações mais carentes do mundo e sim de calorias, vitaminas e antioxidantes é encarada como uma das formas de melhorar a nutrição dos habitantes de países em desenvolvimento. Entretanto, para que esses genótipos biofortificados cheguem a essas populações é necessário que os genes de qualidade nutricional sejam transferidos para variedades de mesa (baixo teor de HCN nas raízes), que evidenciem elevada produtividade de raízes, boa qualidade culinária (sabor, baixo tempo para a cocção, entre outras), resistência a pragas e doenças, entre outros.
Dessa forma, fica evidente a necessidade de se efetuar o melhoramento genético desses acessos. Entretanto, para isso, é necessário conhecimento a respeito da variabilidade genética desses acessos biofortificados. O objetivo do trabalho foi determinar a variabilidade genética entre variedades de mandioca com polpa amarela, rosada, creme e branca por meio de marcadores RAPD. Material e Métodos Foram analisados 20 acessos de mandioca mantidos no Banco Regional de Germoplasma de Mandioca do Cerrado (BGMC), sendo 10 acessos com cor polpa da raiz amarela, oito acessos com cor da polpa da raiz rosada, e dois acessos melhorados recomendados para o cultivo na região do Cerrado, desses um com cor da polpa da raiz creme e outro com cor da polpa da raiz branca (Tabela 1). Tabela 1. Acessos de mandioca analisados, respectivos nomes comuns e cor da polpa da raiz. Acessos Nome comum Cor da polpa da raiz BGMC 1415 Vermelha rosada BGMC 1228 Mirassol rosada BGMC 1222 Colorada rosada BGMC 1229 Vermelha Omar rosada BGMC 1218 Klainasik amarela BGMC 1221 Xingu amarela BGMC 1231 Não possui denominação amarela BGMC 1398 BRS Dourada amarela BGMC 1397 BRS Gema de Ovo amarela BGMC 1223 Oricuri amarela BGMC 1224 Surubim amarela BGMC 1226 AC Vermelha amarela BGMC 1227 Pretinha amarela BGMC 1354 Não possui denominação rosada BGMC 1225 Precoce amarela BGMC 1234 BRS Rosada rosada BGMC 1235 Não possui denominação rosada BGMC 1278 Patureba Vermelha rosada BGMC 753 IAC 12 (Mandioca brava) branca BGMC 436 IAC 756-70 (Mandioca mesa) creme
A DNA dos acessos foi extraído a partir de folhas em estágio intermediário de maturação, por meio do método do CTAB, com modificações (Faleiro et al., 2003), otimizado e validado (Bellon et al., 2007). As amostras de DNA de cada acesso foram amplificadas para obtenção de marcadores RAPD. As reações de amplificação foram realizadas em um volume total de 13 μl, contendo Tris-HCl 10 mm (ph 8,3), KCl 50 mm, MgCl2 3 mm, 100 μm de cada um dos desoxiribonucleotídios (datp, dttp, dgtp e dctp), 0,4 μm de um primer (Operon Technologies Inc., Alameda, CA, EUA), uma unidade da enzima Taq polimerase e, aproximadamente, 15 ng de DNA. Para obtenção dos marcadores RAPD foram utilizados 12 primers decâmeros: OPD (02, 08, 18), OPF (08), OPG (05, 08, 09, 15 e 16), OPH (10, 16 e 17). Foi utilizado um termociclador programado para 40 ciclos, cada um constituído pela seguinte seqüência: 15 segundos a 94 ºC, 30 segundos a 35 ºC e 90 segundos a 72 ºC. Após os 40 ciclos, foi realizada uma etapa de extensão final de seis minutos a 72 ºC, e posteriormente, a temperatura foi reduzida para 4 ºC. Após a amplificação, foram adicionadas, a cada amostra, 3 μl de uma mistura de azul de bromofenol (0,25%) e glicerol (60%) em água. Essas amostras foram aplicadas em gel de agarose (1,2%), corado com brometo de etídio, submerso em tampão TBE (Tris-Borato 90 mm, EDTA 1 mm). A separação eletroforética foi de, aproximadamente, quatro horas, a 90 volts. Ao término da corrida, os géis foram fotografados sob luz ultravioleta. Os produtos das reações de amplificação (marcadores RAPD), foram classificados conforme presença (1) e ausência (0) e convertidos em uma matriz de dados binários, a partir da qual foi estimadais a similaridade genética entre os diferentes acessos, com base no coeficiente de similaridade de Jaccard. Com base na matriz de similaridade foi construído um dendrograma por meio do método de agrupamento da distância média (UPGMA). Para a verificação do ajuste entre a matriz de similaridade e o dendrograma foi calculado o coeficiente de correlação cofenética (r), conforme Sokal e Rohlf (1962), todas as análises estatísticas foram realizadas com o auxílio do programa NTSYS pc 2.1 (Rohlf, 2000). Resultados e Discussão Os 12 primers decâmeros utilizados no estudo geraram um total de 144 marcadores
RAPD, sendo que destas 120 (83%) foram polimórficas (Tabela 2), evidenciando a existência de grande variabilidade genética entre os acessos avaliados e a eficiência da técnica de RAPD na detecção da variabilidade genética presente nos genótipos estudados. A eficiência da técnica de RAPD na detecção de variabilidade genética entre acessos de mandioca já havia sido relatada por Zacarias et al., (2004); Asante e Offei, (2003). Dentre os primers utilizados o que evidenciou o maior número de bandas polimórficas foi o OPD-18 com 17 bandas e o que evidenciou o menor número de bandas polimórficas foi o OPH-10 com 04 bandas polimórficas (Tabela 2). A similaridade genética estimada evidenciou que os acessos mais similares foram BGMC 1231 e BGMC 1398 ambos com cor da polpa da raiz amarela e que os menos similares foram o acesso com cor da polpa da raiz amarela BGMC 1226 e a variedade melhorada de mandioca de indústria com cor da polpa da raiz branca que é recomendada para o plantio na região do cerrado BGMC 436. Tabela 2. Primers utilizados para obtenção dos marcadores RAPD e respectivo número de bandas polimórficas e monomórficas. Primer Seqüência 5 3 Nº de bandas polimórficas Nº de bandas monomórficas OPD-02 GGACCCAACC 6 0 OPD-08 GTGTGCCCCA 8 4 OPD-18 GAGAGCCAAC 17 4 OPF-08 GGGATATCGG 16 2 OPG-05 CTGAGACGGA 11 2 OPG-08 TCACGTCCAC 11 0 OPG-09 CTGACGTCAC 11 0 OPG-15 ACTGGGACTC 6 2 OPG-16 AGCGTCCTCC 7 3 OPH-10 CCTACGTCAG 4 3 OPH-16 TCTCAGCTGG 13 2 OPH-17 CACTCTCCTC 10 2 TOTAL 120 24 A partir da análise da Figura 1 foi possível dividir os acessos avaliados em 3 grupos: i) formado pelos acessos com cor da polpa da raiz rosada BGMC 1415, BGMC 1222, BGMC
1228, BGMC 1229, BGMC 1234, BGMC 1235 e BGMC 1278 e os acessos com cor da polpa da raiz amarela BGMC 1225 e BGMC 1218; ii) formado pelos acessos com cor da polpa da raiz amarela BGMC 1231, BGMC 1398, BGMC 1397, BGMC 1223, BGMC 1224, BGMC 1226, BGMC 1227, BGMC 1221 e o acesso com cor da polpa da raiz rosada BGMC 1354; iii) formado pelos acessos melhorados com cor da polpa da raiz creme BGMC 753 e com cor da polpa da raiz branca BGMC 436 (Figura 1). O coeficiente de correlação cofenética do dendrograma (r = 0,93), revelou o bom ajuste entre a representação gráfica da similaridade genética e a matriz de similaridade, o que justifica que sejam realizadas inferências por meio da avaliação visual da Figura 1. O resultados obtidos mostraram que existe grande diferenciação genética em nível de DNA entre os acessos melhorados BGMC 753 e BGMC 436 e os demais acessos avaliados, o que revela que o backgroud genético desses é bastante diferenciado dos demais acessos avaliados (Figura 1). Os acessos expressaram tendência de agrupamento em função da coloração da polpa da raiz, uma vez que dos oito genótipos com cor de polpa da raiz rosada sete formaram um agrupamento juntamente com os genótipos com cor da polpa da raiz amarela BGMC 1225 e BGMC 1218 (Figura 1). De forma similar oito acessos de coloração de polpa amarela formaram um grupo com um único acesso de coloração rosada da polpa da raiz BGMC 1354. Essa forte tendência de agrupamento dos genótipos em razão da coloração da polpa da raiz pode ser um indicativo que esses genótipos apresentam constituição genética diferenciada e que provavelmente tenham evoluído de forma independente (Figura 1). Do ponto de vista do melhoramento genético os resultados revelaram que existe uma ampla base genética entre os acessos avaliados e que essa pode e deve ser utilizada para fins de melhoramento.
BGMC1415r BGMC1222r BGMC1218a BGMC1228r BGMC1229r BGMC1234r BGMC1235r BGMC1278r BGMC1225a BGMC1221a BGMC1415r BGMC1231a BGMC1398a BGMC1397a BGMC1223a BGMC1224a BGMC1226a BGMC1227a BGMC1354r BGMC753c BGMC436b 0.32 0.47 0.62 0.77 0.92 Figura 1. Dendrograma resultante da análise de 20 genótipos de mandioca, obtido pelo método de agrupamento UPGMA, com base na matriz de similaridade genética obtida por meio do método Jaccard utilizando-se 144 marcadores RAPD. O valor do coeficiente de correlação cofenética (r) é de 0,93. Conclusões Os marcadores RAPD mostraram eficiência na determinação da variabilidade genética entre acessos de mandioca com cor da polpa da raiz amarela, rosada, creme e branca, diferenciaram os acessos melhorados dos demais acessos e revelaram elevada eficiência para a separação dos acessos com cor da polpa da raiz rosada dos com cor da polpa da raiz amarela.
Agradecimentos Os autores agradecem a Embrapa, Fundação Banco do Brasil, CNPq, FAPDF e ao Programa Biodiversidade Brasil-Itália pelo apoio financeiro. Referências bibliográficas ASANTE, I.K.; OFFEI, S.K. RAPD-based genetic diversity study of fifty cassava (Manihot esculenta Crantz) genotypes. Euphytica, v.131, p.113-119, 2003. BELLON, G.; FALEIRO, F.G.; FERREIRA, C.F.; KARIA, C.T. ; FONSECA, K.G.; SANTOS, E.C.; SANTOS, J.R.P.; TEIXEIRA, M.A; JUNQUEIRA, K.P. Validação e otimização de protocolo simplificado para extração de DNA a partir de tecido foliar. In: 4º Congresso Brasileiro de Melhoramento de Plantas, 2007, São Lourenço- MG. 2007. CARVALHO, L.J.C.B.; CABRAL, G.B.; CAMPOS, L. Raiz de reserva de mandioca: um sistema biológico de múltipla utilidade. Brasília: CENARGEN, 2000. 16p. COCK, J. Cassava. New potential for a neglected crop. Boulder: Westview Press, 1985. 240p. FALEIRO, F.G.; FALEIRO, A.S.G.; CORDEIRO, M.C.R., KARIA, C.T. Metodologia para operacionalizar a extração de DNA de espécies nativas do cerrado. Planaltina: CPAC, 2003. 6p. IGLESIAS, C.; MAYER, J.; CHÁVEZ, A.L.; CALLE, F. Genetic potencial and stability of carotene content in cassava roots. Euphytica, v.94, p.367-373, 1997. ROHLF, F. J. NTSYS-pc: numerical taxonomy and multivariate analysis system, version 2.1. New York: Exeter Software, 2000. 98p. SOKAL, R.R.; ROHLF, F.J. The comparison of dendrograms by objective methods. Taxon, v.11, p.30-40, 1962. ZACARIAS, A.M.; BOTHA, A.M.; LABUSCHAGNE, M.T.; BENESI, I.R.M. Characterization and genetic distance analysis of cassava (Manihot esculenta Crantz) germplasm form Mozambique using RAPD fingerprinting. Euphytica, v.138, p.49-53, 2004.