JESUS E A GALILEIA. Pr. Marcelo Carneiro. No século I Roma dominava toda a região palestinense.



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Transcrição:

JESUS E A GALILEIA Pr. Marcelo Carneiro No século I Roma dominava toda a região palestinense.

Roma tinha uma pratica tributária que oprimia o povo simples. Um tributo cobrado, por exemplo, tinha o caráter principalmente de despojo pela vitória e multa pela guerra, além do imposto anual do censo. Nesse contexto chegaram à terra da Palestina grande arrendatários romanos de impostos (publicani) que depois foram substituídos por cobradores nativos (os odiados publicanos). Os grupos políticos e religiosos judaicos Origens e motivações O povo judeu teve consciência de ser povo de Deus desde muito cedo. Isso indica sua marca, na vivência da Aliança. Na Aliança há duas dimensões que caminham juntas: a observância e a promessa. Apesar de estarem juntas, há uma tensão nas duas maneiras de viver a Aliança, o que provocou uma divisão em grupos.

Por um lado temos o grupo que enfatizou a observância da Lei (Torá) como garantia da Aliança. Eles tinham uma mentalidade separatista, de isolamento e pureza, pensando nos judeus que voltaram do exílio da Babilônia, e como exemplo encontramos Esdras e Neemias. Eram chamados hassidim (os piedosos). Deram origem aos fariseus, essênios e zelotas. Os essênios também estão próximos de grupos chamados apocalípticos. Por outro lado, temos os grupos que entenderam que a Aliança estava baseada na promessa de Deus, que não podia voltar atrás, como sinal entre os povos. Essa mentalidade estava presente entre os judeus da Diáspora, e também entre a classe sacerdotal e levítica. Mas a proximidade com o poder e a cultura helênica gerou uma ênfase na riqueza, no poder do Templo. Dentre os grupos que foram gerados por essa perspectiva temos os Saduceus e os Hasmoneus, sendo Herodes descendentes destes últimos.

Os grupos e suas características A seguir apresentaremos alguns grupos e duas principais características, para entender um pouco melhor o contexto sócio-político do tempo de Jesus. Movimentos religiosos Origem Crenças Relação com Jesus Fariseus Movimento leigo de resistência contra o esvaziamento dos ideais religiosos tradicio-nais do judaísmo por parte da realeza sacerdotal secularizada. Presença de Escribas Pureza e santificação Imortalida-de da Alma Ressurreição corporal Existência de anjos e demônios Ação de Deus na vida humana, não determinista É o grupo que mais confronta Jesus, apesar de compartilhar das mesmas crenças. Textos extrabíblicos confirmam o quanto eram questionados. Posturas de Jesus como andar com pecadores e tratar da graça eram interpretados como fraqueza. Movimentos religiosos Essênios Origem Crenças Relação com Jesus Grupo sectário, fechado, descendente de famílias sacerdotais descontentes com o rumo das coisas em Jerusalém, e que teria se retirado para o deserto ainda no século 2 a.c.completame nte separados do mundo Determinism o divino Imortalidade da Alma Vida em comunidade, com refeições e trabalho. Não são mencionados nos evangelhos, mas podem ter relação com o grupo de J.Batista. Sua mentalidade escatológica também está presente na pregação de Jesus.

Movimentos religiosos Origem Crenças Relação com Jesus Saduceus Classe sacerdotal que administrava o Templo. Conservado-res, só aceitavam o Pentateuco Contrários às crenças dos fariseus Livre arbítrio absoluto; teologia da retribuição Afastados do povo, consideraram Jesus um rebelde, e o atacaram sempre que puderam. Movimentos Religiosos Origem Crenças Relação com Jesus Escribas Intelectuais do antigo Israel, versados na escrita e interpretação de textos sagrados. O grupo se fortaleceu a partir do pósexílio. Em sua maioria, pertenciam ao grupo dos fariseus A relação com Jesus foi dúbia. Em geral eram criticados mas também elogiados. Eram muito legalistas e não aceitavam as interpretações de Jesus a respeito de algumas leis. Movimentos políticos Sicários Origem Crenças Relação com Jesus Surgiram em Jerusalém, depois de 50 d.c. O nome é derivado da lâmina que usavam para praticar assassina-tos políticos. Tinham um caráter de guerrilheiros terroristas, ou contraterroristas, tendo em vista o terror imposto por Roma. Desejavam a libertação de Israel das mãos dos sacerdotes corruptos. Não há nenhum registro literário que possa confirmar qualquer contato. Normalmen-te se associa Judas Iscariotes como sendo um sicário, mas isso é especulação.

Movimen tos políticos Zelotes Origem Crenças Relação com Jesus Historicamente só aparecem como grupo armado na guerra judaica (66 d.c.). Os grupos anteriores já alimentavam suas crenças, mas apenas como fiéis cumpridores da Lei (zelosos, daí o nome zelote). Ligados à tradição farisaica, tinham uma expectativa messiânica que estava sintonizada com os movimentos populares. Lutavam pela libertação de Israel e a manifestação do Messias da Justiça. Não há uma relação direta, mas a presença de discípulos denominados zelotes (Lc 6,15) pode indicar um grupo com postura similar àquela encontrada depois no movimento armado dos zelotes. Movimentos políticos Herodianos Origem Crenças Relação com Jesus Grupos de nobres ligados a família herodiana e que davam sustentação política por meio da colaboração com Roma. Em geral eram relacionados aos sacerdotes e saduceus, e por isso compartilhavam de suas crenças Opositores ferozes, até pelo receio do movimento de Jesus se tornar forte o suficiente para depor o rei. Foi provavelmente o grupo que manipulou o julgamento de Jesus para que ele fosse condenado. Outros grupos Samaritanos Origem Crenças Relação com Jesus Povo miscigenado que povoou o norte de Israel depois do exílio babilônico. Consideravam-se descenden-tes das tribos de Efraim e Manasses, a partir do patriarca José. Defensores da religião das origens, com cinco pontos fundamen-tais: Monoteísmo; Moisés como único profeta; só o Pentateuco é inspirado; o monte Garizim como lugar sagrado; a ressurrei-ção dos mortos no juízo. Há um movimento de oposição e simpatia, pois em Samaria há muita fé. Na verdade, os Galileus, mesmo sendo judeus autênticos, eram tratados com desprezo pelos judeus da Judéia, o que os aproximava dos samaritanos.

A Galileia O nome Galileia vem do hebraico galil, que significa um circuito ou um distrito. Já é citada assim em Js 20.7 e 1 Rs 9.11. A indicação de Is 9.1, Galileia das nações (gentios), pode indicar que lá foram assentadas, desde o século VIII a.c. um distrito povoado por vários povos estrangeiros, fruto da invasão Assíria. Compreende duas regiões principais, a Alta Galileia e a Baixa Galileia, que devem o seu nome ao fato de na primeira o relevo ser muito elevado do que na segunda. Na Alta Galileia os pontos mais altos chegam a 1.071 metros, enquanto na baixa Galileia chegam no máximo a 598 metros. Também apresentam diferenças no tipo de terreno e na quantidade de chuvas.

O Monte Meron, que domina a paisagem da Alta Galileia, cortando a área de norte a sul, impedindo a passagem de exércitos e garantindo a segurança dos galileus. O Monte Tabor, na Baixa Galileia, local onde os evangelhos relatam a transfiguração de Jesus (Mt 17.1-8)

O Mar da Galileia, ou Lago de Tiberíades, local de maior concentração do ministério de Jesus. Os evangelhos citam-no em diversas passagens, principalmente quando Jesus andou sobre ele (Mt 8.23-27). A região ao redor do mar concentrava a maior população daquela época na Galileia. Séforis e Nazaré As duas localidades ficavam a apenas 6 km de distância entre elas. Mas enquanto Séforis tinha luxo e riqueza, característica de uma cidade do rei, Nazaré era apenas uma pequena aldeia de camponeses. Séforis foi construída em cerca de 100 a.c. provavelmente quando os governadores transformaram esse espaço importante posto avançado do território recém conquistado. Foi capital da Galiléia até o início do reinado de Antipas, papel que passou a ser de Tiberíades. Mas as duas cidades continuaram a ter papel central no reinado herodiano da Galiléia.

Por ter muitos judeus habitando na cidade, Antipas utilizou a arquitetura greco-romana evitando, porém, o uso estátuas e imagens de deuses. Era servil a Roma, mas entendia a religião tradicional do país, guardando respeito tolerante para poder manter o controle da população. Uma característica da cultura judaica nesses lugares é o uso de utensílios de pedra, em vez de metal. Para os rabinos da época, a pedra era um elemento mais limpo que a cerâmica, por exemplo. Nazaré é uma pequena aldeia ignorada pela literatura do Antigo Testamento; só aparece no Novo Testamento. As escavações têm demonstrado se tratar de uma aldeia camponesa, onde as pessoas não tinham acesso e tempo para aprender a ler e escrever. No tempo de Jesus deviam viver ali entre duzentos e quatrocentos habitantes. Cultivavam a terra para ganhar o suficiente para pagar impostos e manter o sustento da família, com o método da policultura. As terras de Nazaré eram propícias ao cultivo das uvas, grãos e oliva.

Tinham uma dieta simples: pão, azeitona e azeite, vinho. Em ocasiões especiais, cozinhavam lentilhas com legumes, pão de fibra, nozes, frutas, queijo e iogurte. Algumas vezes comiam peixe salgado; carne vermelha era privilégio para as grandes festas. Expectativa de vida média era de 30 anos, em poucos casos se vivia até os cinqüenta ou sessenta anos. As famílias eram planejadas: filhos suficientes para ajudar na terra, mas não demais para não ter mais pessoas que comida. As filhas ajudavam no serviço doméstico. Eram pessoas sem mobilidade social. Quem perdia a família, tornava-se soldado, diarista, artesão ou pescador (no caso dos homens) ou esmoleiras ou prostitutas (no caso das mulheres).

Exemplos atuais de práticas do primeiro século: 1. Homem batendo cereal, para separar a palha 2. Homem levando uvas para serem pisadas nos tanques de vinho As casas tinham cavidades nas pedras para formar grutas, onde era fresco no verão e quente e seco no inverno, além de cisternas para armazenar água em tempo de seca ao lado de outras para armazenar grãos. As evidências arqueológicas apontam que a sinagoga de Nazaré (Lc 4) era um edifício público usado para reuniões comuns, sem utensílios domésticos, nem estrutura para habitação. Apesar de não tem a estrutura clássica de uma sinagoga (knesset) religiosa, não quer dizer que não pudesse ser usava para tal. Uma sinagoga com rolos da Torá e rabinos deveria existir em Séforis. Em Nazaré devia ter pequenos trechos das escrituras, considerando a dificuldade de ter cópias de livros naquela época.

Isso pode explicar porque a base de Jesus foi Cafarnaum, e não Tiberíades. Essa aldeia de pescadores às margens do Mar da Galiléia tinha cerca de mil habitantes na época de Jesus e sua única vantagem era a localização marítima, que facilitava o acesso a dezenas de cidades ao redor do mar, exatamente como narram os evangelhos. Em cafarnaum foram encontradas ruínas de uma antiga sinagoga, nos padrões mais sofisticados. Provavelmente foi neste lugar que Jesus ensinou, curou e libertou diversas pessoas. Era a igreja onde ele ia com os discípulos aos sábados (Mc 1. 21-28).

Em 1986, foi descoberto um barco de pesca do primeiro século, próximo a Magdala, cidade de Maria Madalena. Eram embarcações rudimentares, que podiam adornar debaixo de uma tempestade. Pedro e seus irmãos devem ter tido esse tipo de barco. O judaísmo na Galileia Os galileus tinham três grandes referenciais na sua religião: A circuncisão, a guarda do sábado com a leitura da Torá, e o Templo, como lugar de peregrinação. Mas a religião era praticada no cotidiano em pequenos lugares de adoração, cuja origem remonta ao exílio babilônico. Eram os knesset, chamados depois de synagogue, e que deram origem às sinagogas. Inscrições gregas do século 3 a.c. comprovam a existência delas em várias partes. Eram lugares simples, e com estrutura organizacional democrática, sem um aparato sacerdotal para dirigi-los.

A formação de Jesus Religiosidade e espiritualidade Jesus era um judeu observante da Torá Tradições que devem ter alimentado sua fé: história dos profetas, especialmente do Norte, a apocalíptica Era alguém que conhecia muito a Lei de Moisés A Bíblia de Jesus No tempo de Jesus havia duas grandes coleções já canonizadas: a Torá (Pentateuco) e os Nebîim (os Profetas) Os outros escritos, como os Salmos, Jó e outros, eram conhecidos e amados, mas não tinham ainda caráter canônico para os judeus

O judaísmo rabínico (fariseus) também desenvolveu a ideia da Torá Oral Eram comentários rabínicos a respeito da Lei. Existiam dois tipos: hallakah (comentários de textos jurídicos) e haggadah (comentários das histórias bíblicas) O conjunto dessas interpretações é chamada de midrash (pesquisar), em coleções conhecidas como Talmude (do verbo talmid, ensinar). Jesus fez uso dessa técnica (Mt 5-7, por ex.) A profissão de Jesus A profissão apontada na Bíblia, traduzida por carpinteiro, é tekton, seria mais apropriadamente traduzida por construtor, como um pedreiro e carpinteiro ao mesmo tempo Vivendo próximo a Séforis, certamente José e Jesus tiveram muitas oportunidades de trabalho Isso coloca Jesus no estrato inferior da sociedade, junto do povo humilde Esse é o contexto político, social e geográfico de Jesus e seus discípulos galileus, cujas narrativas são encontradas nos evangelhos.