Sobre Teixeira, Francisco Elinaldo. Cinemas não narrativos : Experimental e documentário passagens

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Transcrição:

1 Sobre Teixeira, Francisco Elinaldo. Cinemas não narrativos : Experimental e documentário passagens. São Paulo: Alameda, 2013, 328 pp., ISBN: 978-85-7939-187-3. por Cássia Hosni * Cinemas não narrativos : Experimental e documentário passagens, de Francisco Elinaldo Teixeira, é uma importante publicação em que podemos acompanhar a reflexão e a análise aprofundada de um dos teóricos expoentes nos domínios do experimental e do documentário. Domínios estes que são pensados não como algo sedimentado, mas uma prerrogativa para considerar as especificidades de cada território junto à história do cinema. Contendo dezoito textos, o livro é dividido em três capítulos onde o autor destaca a criação cinematográfica como arte do pensamento. Em uma abordagem ora filosófica, ora histórica, mas sempre original, Teixeira traz para a discussão diretores, artistas e filósofos, que possibilitam pensar por meio de imagens envolvendo, assim, além das proposições teóricas sobre o cinema, a poética das obras, ambos sendo constantemente alinhavados entre os capítulos. O primeiro capítulo, Diagrama de uma constelação conceitual, é composto de cinco textos. Temos, nessa parte inicial, considerações como a necessidade da

2 criação cinematográfica estar longe dos modelos estruturalista ou semiológico, como visto no texto A propósito de um cinema não narrativo. Para Teixeira, entende-se que os processos devem ser imagéticos portando uma narratividade distinta dos modelos linguísticos. No caso, o entendimento de um cinema não narrativo, como indicado no título do livro, estaria, por exemplo, presente nas elaborações realizadas por Pier Paolo Pasolini, Gilles Deleuze, André Parente e também por Teixeira, respectivamente, nos conceitos como: cinema de poesia; cinema da imagemtempo; cine-olho, acinema, cinema-matéria; e cinema do terceiro olho. Para o cinema de poesia de Pasolini, é primordial o uso da subjetiva indireta livre, técnica imagético-narrativa que consiste em um ponto de indefinição entre a câmera e a subjetividade do personagem. Segundo Teixeira, a subjetiva indireta livre inova e vem contrapor dois procedimentos comuns no cinema clássico, como a objetiva indireta da câmera e a subjetiva indireta do personagem. Diante essa criação, o diretor italiano também propõe as pseudonarrativas, no que concerne aos estados e situações que vão além do contar histórias, permitindo assim um exercício estilístico para o cineasta. Partindo da subjetiva indireta livre de Pasolini, Deleuze traz para o cinema moderno a ideia de temporalização das imagens no conceito da imagem-tempo que, como ressaltado por Teixeira, trouxe-nos mais devires do que histórias. Ainda acerca do não narrativo, Parente irá partir dos conceitos de Pasolini e Deleuze para reiterar a sua não oposição ao fílmico, diante o imagéticonarrativo. Teixeira também retoma as análises pasolinianas e deleuzeanas para propor o cinema do terceiro olho, visto de forma extensiva no livro homônimo, lançado

3 em 2003, 1 em que examina o conceito nas obras dos cineastas brasileiros Mário Peixoto, Glauber Rocha e Júlio Bressane. De fato, ao longo dos capítulos, é na figura de Bressane que será referenciado não apenas pelo alto grau de experimentação, mas também quanto a sua postura diante a autoria no cinema. Em Arte e subjetividade: autor e estilo no cinema, Teixeira trata de aspectos sobre autoria, trazendo, na fala do cineasta carioca, a antítese do pensamento autoral, no sentido que o estilo é uma necrose a ser combatida. No último texto da constelação conceitual, Teixeira reflete sobre os rumos da obra do artista Hélio Oiticica e as linhas de pensamento povoadas pela superantropofagia, antiarte ambiental, ato experimental, incorporados ao conceito de estado de invenção. Ao preparar o leitor para o segundo capítulo, dedicado ao experimental, Teixeira abre para o desafio labiríntico de Oiticica de percorrer o trajeto sem buscar prioritariamente uma saída. O segundo capítulo, destinado ao domínio do experimental, traz reflexões sobre a investigação, a busca para a pesquisa e as inúmeras tentativas e erros que caracterizam esse território permeado de incertezas e subjetividades. Composto de cinco textos, o primeiro, Formas e metamorfoses do cinema experimental, é abordado de forma abrangente, analisando momentos-chaves na história do cinema. Dessa forma, Teixeira apresenta três modalidades: experimentar no cinema, em que traz o cinema das vanguardas históricas do entre guerras, ressaltando as características do primeiro cinema e a relação com as vanguardas como o Expressionismo e o Impressionismo; experimentar o experimental no cinema, concepção que trata das vanguardas do pós-guerra até a década de 1970 e a emergência de um cinema lírico e pessoal, beirando 1 Teixeira, Francisco Elinaldo (2003). O terceiro olho: ensaios de cinema e vídeo (Mário Peixoto, Glauber Rocha e Júlio Bressane). São Paulo: Perspectiva.

4 o ensaísmo; e experimentar o experimental na cultura audiovisual com as pós-vanguardas a partir de 1980, utilizando-se especialmente dos novos meios como as estéticas videográficas e numéricas. No âmbito nacional, Teixeira inicia Três balizas do experimental no cinema brasileiro questionando se há algum sentido em falar de cinema experimental ou de vanguarda no Brasil. Passando brevemente por uma bibliografia de estudiosos do experimental, o autor conduz seu pensamento por meio dos realizadores Mário Peixoto, Glauber Rocha e Júlio Bressane. Ao abordar o cinema de Mário Peixoto, utiliza o termo cinema de lepra tratando da criação do filme Limite (1931), marco do cinema brasileiro, influenciado pelas vanguardas europeias. A obra de Glauber Rocha e seu cinema arquegeneológico, como dado em definição por Teixeira, consiste na diversidade de filmes, em especial, Di (1977) e A idade da Terra (1980). Já nos filmes de Bressane, destrinchados mais profundamente no texto seguinte Da inatualidade do cinema segundo Júlio Bressane, são tratados os conceitos criados pelo próprio cineasta, como cinepoética e cinemancia. Ainda nesse território, o autor traz considerações sobre o único filme realizado pelo músico Caetano Veloso. O fato de O cinema falado exibido em 1986 ter causado grande descontentamento na recepção pelo público especializado é revisto, sendo defendido que sua crítica parte da incompreensão dos espectadores. De acordo com Teixeira, O cinema falado não pretendia apresentar grandes rompantes de novidade/modernidade, sendo que pode ser considerado como um longo discurso indireto livre, no sentido pasoliniano, onde tanto o cineasta quanto os personagens presentes não se distinguem por meio das imagens e sons apresentados. O último texto do capítulo, nomeado Sob signos poéticos-picturais, um cinema que viaja de trem, temos a interessante análise de quatro curtas de Joel

5 Pizzini, na época da publicação do texto, em 1998, ainda cineasta estreante. Trabalhando com diferentes meios, como bitolas 16 mm, 35 mm e vídeo, Pizzini retrata os poetas Manoel de Barros e Oswald de Andrade, e também os pintores Iberê Camargo e De Chirico. Realizando os filmes com ampla gama de experimentação e inquietude, Teixeira finaliza o capítulo com votos de que o cineasta continue sempre com seu caráter inovador, evitando assim um possível estilo e mostrando sempre outra forma de perceber e pensar cinema. No terceiro e último capítulo, o documentário e seus desdobramentos como o documentário expandido são investigados com toda a complexidade histórica e filosófica que são características desse território. Os oito textos que se seguem percorrem desde o cinema clássico, a criação etimológica do termo, às mudanças engendradas na passagem do clássico para o moderno, até a ampliação e hibridação dos meios audiovisuais. No que diz respeito ao cinema moderno, Teixeira detém-se cuidadosamente em Documentário moderno: de um cinema direto a um cinema indireto livre a embasar as mudanças tecnológicas e o pensamento de seus realizadores. Expondo desde o cinema clássico e os filmes de diretores como Robert Flaherty, Alberto Cavalcanti e Dziga Vertov, para a passagem do documentário moderno pós Segunda Guerra, são expostos os fatos que levaram a culminar, a partir da década de 1950, na proliferação de conceitos e grupos voltados a compreender o domínio. Ressaltam-se as polêmicas envolvidas em toda a trajetória do documentário e a relação com o cinema de ficção, a intenção de representação da realidade, o cinema direto e o cinema verdade, a problemática questão de dar a voz ao outro, a realização em primeira pessoa e a crítica das narrativas documentais. Diante dessas análises, Teixeira entende que o documentário tem a sua própria espessura, sendo que as obras não necessitam ser meras ilustrações das teorias.

6 No capítulo, retomam-se alguns conceitos discutidos anteriormente, como da narrativa indireta livre, inicialmente proposta por Pasolini e ressignificada para o cinema direto por Deleuze. Ao final, o texto Narrativa indireta livre em Serras da desordem e 500 almas retoma ao centro a análise dos filmes, 2 seguindo-se o último texto do capítulo com as tendências do documentário brasileiro contemporâneo. Dessa maneira, Teixeira nos deixa a modo de conclusão o cinema como arte do pensamento permitindo, assim, um panorama aberto das imensas possibilidades do cinema, até o aprofundamento nos territórios do experimental e do documentário. Os diversos textos nestes domínios estão entrelaçados pelos estudos minuciosos do autor, o que pode denotar em um primeiro momento à repetição. Porém, apesar da frequência de alguns realizadores e filósofos ao longo dos capítulos, o autor estrutura seu pensamento de forma autêntica, permitindo outras leituras e novos desdobramentos. O livro também permite que os dezoito textos sejam lidos de forma isolada, não necessariamente de maneira linear e progressiva. Assim, como importante publicação direcionada para os estudos e a pesquisa cinematográfica, o livro de Francisco Elinaldo Teixeira, contendo artigos já publicados e revisitados até 2012, vem trazer um profícuo e necessário estudo para o campo audiovisual, especialmente no que concerne ao cinema experimental e documentário. * Cássia Hosni é mestranda no Programa de Pós-Graduação em Multimeios da Universidade Estadual de Campinas - Unicamp. Bacharel em Artes Visuais pelo Centro Universitário Belas Artes de São Paulo, atua principalmente nas áreas do cinema, fotografia e vídeo. E-mail: cassiath@gmail.com. 2 Serras da desordem (Andrea Tonacci, 2006). 500 almas (Joel Pizzini, 2004).