Cœlum Australe. Jornal Pessoal de Astronomia, Física e Matemática - Produzido por Irineu Gomes Varella

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Transcrição:

Cœlum Australe Jornal Pessoal de Astronomia, Física e Matemática - Produzido por Irineu Gomes Varella Criado em 995 Retomado em Junho de 202 Ano IX Nº 05 - Julho de 208 A OPOSIÇÃO DE MARTE EM 27 DE JULHO DE 208 Prof. Irineu Gomes Varella 208 - Direitos autorais reservados. Proibida a reprodução. O leitor deve, certamente, lembrar que no final do mês de agosto de 2003, tivemos a melhor ocasião para observar o planeta Marte de todo o século XXI. Marte esteve em oposição ao Sol em 28 de agosto e, no dia anterior, na sua menor distância à Terra dos últimos 73.000 anos (55,76 milhões de km). Seu brilho excepcional superou, naquela ocasião, o de todas as estrelas visíveis a olho nu no céu noturno. Figura Tamanho aparente do planeta Marte, para um observador terrestre, durante as oposições de 997 a 200. Os valores dos diâmetros aparentes, para cada oposição, estão expressos em segundos de arco. Em 208, o diâmetro aparente de Marte, na oposição, será ligeiramente menor do que em 2003. Marte estava localizado na constelação de Aquarius e, estando em oposição ao Sol, pôde ser observado na região mais alta do céu à meia-noite. A oposição repetiu, em condições muito mais favoráveis, a de 23 de agosto de 924 quando Marte esteve a 55,78 milhões de quilômetros da Terra. De acordo com o astrônomo belga Jean Meeus.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 2 AS OPOSIÇÕES DOS PLANETAS Todos sabemos que os planetas descrevem órbitas ao redor do Sol. As órbitas planetárias são elipses das quais o Sol ocupa um dos focos. As elipses que os planetas descrevem ao redor do Sol são muito próximas a uma circunferência, isto é, elipses de pequenas excentricidades (exceção ao planeta Mercúrio). Além disso, as órbitas planetárias são muito pouco inclinadas em relação ao plano da órbita da Terra (plano da Eclíptica). Podemos, para simplificar o raciocínio inicial, considerar, como no diagrama adiante (Figura 2), as órbitas da Terra e de Marte como se fossem circunferências concêntricas e coplanares. Há quatro posições relativas do Sol, de Marte e da Terra que merecem destaque especial: a primeira é chamada de conjunção, quando temos um alinhamento Terra-Sol- Marte, nessa ordem. Em uma conjunção, Marte estaria sendo observado na mesma região do céu onde se encontra o Sol e sua distância à Terra teria o maior valor possível. A última conjunção de Marte com o Sol ocorreu em 26 de julho de 207. Nessa ocasião, esteve a 397,8 milhões de km da Terra. Outras duas situações são as quadraturas leste e oeste, quando o segmento de reta que une a Terra ao Sol forma 90º com o segmento que une a Terra a Marte. Figura 2 - Posições relativas especiais dos planetas Terra e Marte durante o período 207-208.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 3 Por fim, nas oposições, situação que se dará no próximo dia 27 de julho, teremos o alinhamento Sol-Terra-Marte. Devemos observar que o plano da órbita de Marte ao redor do Sol não é coplanar com o plano da órbita da Terra. Desta maneira, no momento em que ocorre a oposição, os planetas não se encontram sobre uma reta que contém o centro do Sol, mas em um plano perpendicular ao plano da órbita terrestre. Este plano contém o centro da Terra, o centro de Marte e o centro do Sol. Deve-se ter sempre em mente que os termos conjunção, quadratura e oposição têm como referência o Sol: quando se diz que Marte encontra-se em conjunção, em quadratura ou em oposição, queremos dizer que esse planeta está em conjunção com o Sol, ou em quadratura com o Sol ou em oposição ao Sol. As situações representadas para o planeta Marte ocorrem, evidentemente, também para os demais planetas exteriores: Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Na situação real temos ainda que considerar o fato de que as órbitas dos planetas não são circunferências. Por isso, embora um planeta exterior esteja em oposição, isto não significa, necessariamente, que a sua distância à Terra tenha atingido o menor valor. O diagrama adiante (figura 3) ilustra essa situação para a presente oposição de Marte. Figura 3 Oposição e mínima distância Terra-Marte durante 208.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 4 Como as órbitas não são circunferências concêntricas e nem coplanares, a oposição ocorre numa posição em que a distância Terra-Marte é ligeiramente maior que a distância entre eles cerca de quatro dias depois. Em 27 de julho, às 05h07m TU = 02h 07m BRT 2, instante da oposição, isto é, quando o centro da Terra, o centro Marte e o centro do Sol estiverem localizados em plano perpendicular ao plano da órbita da Terra, a distância Terra- Marte terá por valor 57.768.369 km (0,386577 UA). Quatro dias depois, em 3 de julho de 208 às 07h5m TU = 04h 5m BRT, essa distância terá se reduzido para 57.589.630 km (0,3849629 UA). O fato das órbitas serem elípticas e o Sol estar localizado em um dos focos da elipse nos leva a concluir que a distância de um planeta ao Sol varia ao longo do tempo. Há um ponto da elipse, chamado de periélio (P) em que o planeta, estando ali localizado, encontrase em sua mínima distância do Sol e outro, oposto ao primeiro, denominado de afélio (A), que corresponde à máxima distância do planeta ao Sol. Figura 4 - Órbita elíptica de um planeta hipotético ao redor do Sol. A excentricidade orbital encontra-se propositadamente exagerada para destacar as variações das distâncias do planeta ao Sol. A Terra, por exemplo, passa pelo periélio nos primeiros dias de janeiro e no afélio, nos primeiros dias de julho. Os demais planetas possuem períodos de translação que diferem do período da Terra e as datas de suas passagens pelo periélio e pelo afélio de suas órbitas não ocorrem em datas fixas quando referidas ao nosso calendário. 2 BRT (acrônimo de Brazilian Time) é a Hora Legal de Brasília que corresponde ao Tempo Universal Coordenado (TUC) subtraído de 3 horas, ou seja, BRT = TUC-3h.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 5 A situação peculiar que se deu na oposição de 2003 é que Marte estava muito próximo de sua passagem periélica, ou seja, em sua mínima distância ao Sol. Desta maneira, a distância de Marte à Terra teve o seu menor valor (55,76 milhões de km). O diagrama abaixo ilustra as oposições de Marte nos últimos 53 anos - no período de 950 a 2003. Figura 5: As oposições de Marte no período 950 a 2003. Diagrama do autor.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 6 PERIODICIDADES DAS OPOSIÇÕES DE MARTE O período de translação da Terra é de 365d 6h 09m 0s ou 365,256363 dias. Transcorrido esse intervalo de tempo, a Terra retorna ao mesmo ponto de sua órbita. O período de Marte é de 686,979 852 dias. O intervalo de tempo necessário para que um planeta descreva sua órbita ao redor do Sol é chamado de período sideral. Ao longo de seus movimentos ao redor do Sol, em diversas ocasiões, ocorrem oposições de Marte. O intervalo de tempo entre duas oposições consecutivas de Marte (ou de outro planeta) é chamado de período sinódico e corresponde a aproximadamente 780 dias (2 anos e 50 dias), em média. O período sinódico pode ser calculado pela expressão: na qual S é o período sinódico; T, o período sideral da Terra; e M, o período sideral de Marte. Substituindo-se os valores de T e M dados anteriormente, obtemos S = 779,936 096 dias. Entretanto, nota-se pela figura anterior, que duas oposições consecutivas não ocorrem com a Terra e Marte nos mesmos pontos de suas órbitas. Na literatura astronômica são citadas diversas periodicidades para as oposições Marte: 2 anos, 5 anos, 32 anos, 47 anos (entre outras) que podem ser verificadas pelo leitor analisando a figura 5. As oposições separadas pelo intervalo de 2 anos ocorrem em pontos muitos distantes uns dos outros. Note, por exemplo, as posições correspondentes às oposições de 97 e 973. À medida que consideramos intervalos mais longos, por exemplo, oposições separadas pelo intervalo de 47 anos (veja no diagrama as oposições de 950 e 997), notase que elas se dão em locais mais próximos entre si. Na oposição de 2003, Marte estava muito próximo da sua passagem periélica. Poderíamos, então, levantar a seguinte questão: de quanto em quanto tempo ocorre uma oposição como a que pudemos observar em agosto de 2003? A resposta a essa questão é simples e complexa ao mesmo tempo. O lado simples da resposta é: a cada 365,256 363 dias a Terra retorna ao mesmo ponto de sua órbita e, a cada 779,936 096 dias, Marte encontra-se em oposição ao Sol.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 7 Assim, após o transcurso de um intervalo de tempo que seja um múltiplo do período de translação da Terra e do período sinódico de Marte, uma oposição irá se repetir com a Terra e Marte nos mesmos pontos de suas órbitas. Devemos, então, encontrar dois números inteiros m e n que satisfaçam a seguinte relação: m.s = n.t ou m x 779,936 096 = n x 365,256 363 E aqui reside a parte complicada de nossa resposta: como encontrar os números m e n? A relação entre os números n e m é: S / T = n / m = 779,936 096 / 365,256 363 = 2, 35 3 46 Podemos obter dois números inteiros cuja razão se aproxima do resultado requerido utilizando o método das frações contínuas: n / m = 2 + 7 + 2 + + + 3 + +... As diversas reduzidas da fração em questão, nos darão, sucessivamente, aproximações racionais por falta e por excesso da relação procurada: ª aproximação: n / m = 2 (desprezando a parte fracionária); 2ª aproximação: n / m = 2 = 7 5 7 + = 2,42 857 43 3ª aproximação: n / m = 2 2 = 2 + = 2 + = 5/ 2 5 7 + 2 32 5 + = 2,33 333 333 e as aproximações seguintes nos darão: n / m = 47 / 22 = 2,36 363 636 n / m = 79 / 37 = 2,35 35 35 n / m = 284 / 33 = 2, 35 338 346 etc...

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 8 Nas diversas aproximações estão evidenciadas as periodicidades antes citadas: 2 anos, 5 anos, 32 anos, etc. Uma aproximação razoável é considerar S / T = n / m = 79 / 37 = 2,35 35 35 que permite considerar 79 períodos siderais da Terra aproximadamente iguais a 37 períodos sinódicos de Marte. intervalo de: Setenta e nove períodos de translação da Terra ao redor do Sol correspondem ao 79 x 365,256 363 dias = 28.855,25268 dias O calendário que utilizamos na prática cotidiana (denominado calendário Gregoriano) não reflete o período de translação da Terra, mas o período do retorno das estações do ano (ano trópico). Utilizamos em intervalos de tempo curtos, o valor médio de 365,25 dias para o ano. Setenta e nove anos correspondem a: 79 x 365,25 dias = 28.854,75 dias valor muito próximo do correspondente a 79 translações da Terra ao redor do Sol. Por outro lado, 37 períodos sinódicos de Marte equivalem a: 37 x 779,936 096 dias = 28.857,63555 dias intervalo que apresenta uma pequena diferença (cerca de 2,4 dias) com o período correspondente a 79 translações da Terra e com o período de 79 anos do nosso calendário (ao redor de 2,9 dias). A oposição de 2003 repetiu, portanto, a oposição periélica de Marte que ocorreu há 79 anos, em 924. A oposição de 208 repete a de 939, que não está representada nas figuras. QUE HOUVE DE TÃO ESPECIAL NA OPOSIÇÃO DE 2003? O Sistema Solar é um conjunto muito complexo do ponto de vista das ações gravitacionais. Cada planeta está sujeito à atração solar, muito intensa e, também, às ações gravitacionais, de menor intensidade, dos demais planetas constituintes do sistema. Se existissem apenas a Terra e o Sol formando um sistema isolado no espaço, nosso planeta descreveria uma elipse ao redor do Sol.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 9 Entretanto, face principalmente às ações gravitacionais de Júpiter, de Saturno e de Vênus, a órbita terrestre sofre pequenas deformações, resultado das ações dos planetas citados. As ações que os planetas exercem sobre os outros se constituem em forças adicionais cuja resultante, chamada de força perturbadora, provoca inúmeros efeitos nos movimentos planetários e na forma das órbitas que os planetas descrevem, como variações na excentricidade orbital, na inclinação do plano orbital, mudança na posição do periélio etc. Ao longo de milhares de anos, as perturbações sofridas pela Terra e por Marte têm produzido uma lenta diminuição na mínima distância entre eles, principalmente decorrente das variações de suas excentricidades orbitais. A ocasião em que se dá a mínima distância entre a Terra e Marte é muito próxima da oposição periélica. Em especial em 2003, tivemos a menor distância entre a Terra e Marte dos últimos 73.000 anos (55,76 milhões de km). Em 28 de agosto de 2287, Marte estará ainda mais próximo da Terra e, em 8 de setembro de 2729, ele atingirá a sua mínima distância à Terra de todo o III milênio: 55,65 milhões de quilômetros. Mas a diminuição da distância Terra-Marte não para por aí: próximo ao ano 25.000 ela terá atingido o menor valor do último milhão de anos: 54,05 milhões de quilômetros. O QUE PODEMOS OBSERVAR EM UMA OPOSIÇÃO? Em função do pequeno valor da distância Terra-Marte em uma oposição que ocorre nas proximidades do periélio de Marte, temos a ocasião adequada para a observação dos seguintes aspectos:. O brilho do planeta fica bastante intenso. Como sabemos, os planetas refletem a luz que recebem do Sol. O brilho que um planeta apresenta ao observador terrestre depende de vários fatores, entre eles, da distância do planeta ao Sol (r), da distância do planeta à Terra ( ) e da sua fase, isto é, da fração iluminada do disco do planeta que se encontra voltado para o observador terrestre (figura 6):

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 0 Figura 6 - Fase e brilho dos planetas. A fase e o brilho dependem da distância da Terra a Marte ( ), da distância de Marte ao Sol (r) e do ângulo φ, chamado ângulo de fase. Estando muito próximo ao Sol (passagem periélica) e muito próximo da Terra (em oposição) e, ainda, na fase de cheia, em 27 de julho o planeta Marte apresentará um brilho excepcional. Sua magnitude aparente será m = -2,8! Seu brilho será maior que o do planeta Júpiter (m = -2,) e superior ao das estrelas do céu noturno. Além disso, a coloração avermelhada que o planeta apresenta tornará Marte o astro de aparência mais destacada do firmamento (veja a figura 8 na página 3). A magnitude aparente de Marte pode ser calculada pela expressão: m = -,52 + 5 log (r ) + 0,06 φ com φ expresso em graus e fração, r e em unidades astronômicas. Substituindo-se os valores de φ, r e para o dia da oposição na expressão anterior, chegamos ao valor de m acima referido. 2. A ocasião será também adequada para a observação telescópica do planeta, pois, estando muito próximo da Terra, o seu diâmetro aparente, isto é, o ângulo sob o qual observamos o seu diâmetro geométrico, terá valor máximo cerca 24,3 para este ano. A observação de detalhes da superfície, a presença de tempestades de poeira, o aspecto da calota polar sul e outros, serão bastante facilitados.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella Figura 7 Aspecto de Marte durante a sua oposição. Vê-se, com clareza, a calota polar sul. Figura 8 Imagem maravilhosa de Marte obtida por John Chumack e publicada em Astronomy Picture of the Day em 09 de julho de 208 (https://apod.nasa.gov/apod/astropix.html). Embora a imagem tenha sido obtida em maio, fica evidente o grande brilho aparente do planeta, que deverá ser ainda maior no dia da oposição.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 2 INFORMAÇÕES SOBRE A OPOSIÇÃO 0. Oposição: 27 de julho de 208, às 05h07m TU = 02h 07m BRT; 02. Distância de Marte à Terra na oposição: 57.768.369 km = 0,386577 UA; 03. Diâmetro aparente no dia da oposição: 24,3 ; 04. Magnitude aparente: -2,8; 05. Mínima distância à Terra: 3 de julho de 208 às 07h5m TU = 04h 5m BRT; 06. Valor da mínima distância nessa data: 57.589.630 km = 0,3849629 UA; 07. Nascer de Marte em São Paulo no dia 27 de julho: 7h 26m (Azimute = 8º); 08. Passagem meridiana de Marte em São Paulo no dia 28 de julho: 00h 5m (Altura = 88º ou Distância Zenital de 2º ao sul do zênite); 09. Ocaso de Marte em São Paulo no dia 28 de julho: 07h 05m (Azimute = 242º); 0. Ocaso e Nascer do Sol em São Paulo nos dias 27 e 28 de julho: 7h42m/06h44m;. Tempo de permanência de Marte acima do horizonte em São Paulo: 3h 39m; 2. Ascensão Reta de Marte no instante da oposição: 20h32m40s; 3. Declinação de Marte no instante da oposição: -25 29'5 ; 4. Localização de Marte no céu na data da oposição: Constelação de Capricornus: Figura 9 Carta celeste com a localização de Marte no dia da oposição: Ascensão Reta = 20h32m40s e Declinação = -25º30. As coordenadas referem-se ao equador e ao equinócio verdadeiros da data.

Cœlum Australe Ano IX Nº 5 Julho de 208 Irineu Gomes Varella 3 RECENTES E FUTURAS OPOSIÇÕES DE MARTE Figura 0: As oposições de Marte no período 2003 a 203. Nas próximas oposições, Marte não estará tão próximo da Terra como em 2003 e na presente oposição. IRINEU GOMES VARELLA Astrônomo nascido em São Paulo em 07 de setembro de 952. É Bacharel em Física (IF,978) e Licenciado em Matemática (IME,996) pela Universidade de São Paulo, com Pós-Graduação em Astrometria pela Universidade de São Paulo (IAG,983), Especialização em Astronomia pelo Núcleo de Astrofísica Teórica da Universidade Cruzeiro do Sul (200) e Mestrado em Ciências pelo IAG-USP (207). Iniciou sua carreira no Planetário e Escola Municipal de Astrofísica de São Paulo em 968, tendo sido Diretor Geral da Instituição de 980 a 2002. Em 23 de fevereiro de 970, passou a integrar o corpo docente da Escola Municipal de Astrofísica de São Paulo. Ministrou centenas de cursos semestrais e palestras de Astronomia. Colaborou durante 2 anos (de 975 a 996) na edição do Anuário Astronômico do Instituto Astronômico e Geofísico da USP. Escreveu dezenas de textos de divulgação e ensino de Astronomia publicados pelo Planetário de São Paulo e por jornais, revistas e outros periódicos de vários lugares do Brasil. Aposentou-se, em 205, como especialista astrônomo da Escola Municipal de Astrofísica de São Paulo, após 47 anos de trabalho.