Ensino Jurídico e educação em direitos humanos:

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Transcrição:

Ensino Jurídico e educação em direitos humanos: Como o estudo de casos pode alavancar uma visão re alista e humanista para o Direito Samuel Mendonça 1 Resenha: BITTAR, Eduardo C. B. Introdução ao estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça. São Paulo: Saraiva, 2018. Seria desnecessário apresentar um autor renomado como é o caso de Eduardo Carlos Bianca Bittar se a Revista fosse da área do Direito, no entanto, considerando se tratar de periódico do campo da Educação, cabe uma brevíssima exposição para que se observe, de pronto, sua preocupação educacio- nal seja no que diz respeito ao Ensino Jurídico, seja em relação ao tema da Educação em Direitos Humanos, que influencia os sistemas de ensino, na medida em que há legislação precisa em relação a esta temática: a Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012, do Conselho Nacional de Educação, que Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos (Brasil, 2018). Na condição de Professor Associado do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de São Paulo, Bittar tem realizado um trabalho ímpar, justamente colocando em relevo a necessidade de se pensar o Direito a partir de outras bases. É Doutor e Livre-docente em Direito pela Universidade de São Paulo, pelo Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito, o que confere o olhar filosófico para o campo do Direito. 1 Professor Permanente do PPG Educação, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Bolsista Produtividade em Pesquisa/CNPq. samuelms@gmail.com RIDH Bauru, v. 6, n. 1, p. 251-255, jan./jul, 2018 (10) 251

Não se trata de um olhar filosófico contemplativo; mas, justamente combativo, o que fundamenta a sua mais recente Teoria do Humanismo Realista (THR), que nasce da Teoria Crítica da Escola de Frankfurt. A obra Introdução ao Estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça é constituída de 616 páginas e 24 capítulos. Apresenta um arcabouço necessário à formação do estudante de Direito; mas, vou além, seu conteúdo, que enfatiza o estudo de casos concretos com a temática dos Direitos Humanos, explicitados em cada um dos capítulos, é tão necessário a qualquer estudante e profissional com interesse e sensibilidade em se engajar a uma visão realista e humanista para o Direito, quanto o Direito é carente de humanizar-se. Aliás, trata-se de obra pertinente e adequada também para os sistemas de ensino, afinal, o Art. 11 da Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012, determina que os Os sistemas de ensino deverão criar políticas de produção de materiais didáticos e paradidáticos, tendo como princípios orientadores os Direitos Humanos e, por extensão, a Educação em Direitos Humanos (Brasil, 2018). É neste sentido que se trata de livro que ultrapassa os interesses do universo de cursos jurídicos. O Direito é consolidado como campo de construção de conhecimento dogmático. Assim, uma obra sobre Introdução ao Estudo de Direito, fundamental em todos os cursos de formação do bacharel em Direito do país, com enfoque em três categorias nucleares para se pensar o aprimoramento da sociedade o humanismo, a democracia e a justiça já revela singularidade suficiente para se re- -pensar o sentido do Direito na sociedade. O autor mescla discussões teóricas de fundo com problemas concretos do mundo da vida, tornando possível e urgente sua visão realista e humanista do Direito. Os capítulos introdutórios tratam da distinção entre Direito e Ciência e o Conceito de Direito, com ênfase na perspectiva habermasiana. São aspectos do humanismo, isto é, fundamentos da história e da cultura que norteiam a trajetória humana. Neste sentido, a Teoria do Humanismo Realista (THR) encontra lugar com cuidadosa fundamentação e aproximação à Teoria da Democracia Deliberativa. Avança o autor com o conceito de pessoa do Direito, com ênfase na questão da dignidade da pessoa humana. A partir desta preparação, enfatizam-se as relações humanas e relações jurídicas da sociedade. Essencial para a compreensão da sociedade é a retomada histórica, feita pelo autor, que parte do Direito Arcaico até o Direito na Pós-Modernidade, aliás, tema de sua tese de Livre-docência. No capítulo sobre o Direito e história brasileira, o Autor analisa as principais marcas do país, nos períodos do Brasil-Colônia, Império e República. É por meio deste arcabouço teórico, que contempla outros campos do saber, que o livro se mostra fundamental para se estabelecer uma visão realista e humanista do Direito. A discussão sobre a cultura brasileira no contexto de transformações 252 RIDH Bauru, v. 6, n. 1, p. 251-255, jan./jun., 2018 (10)

sociais encontra lugar no livro em capítulo que coloca em relevo o aspecto conservador e transformador da sociedade. Assim, passa-se a discutir as fontes do Direito com ênfase nas práticas contemporâneas de cidadania. É por meio desta marca que Bittar se distancia de construções jurídicas prontas e dogmáticas e assume o caráter transformador do Direito. Com um cuidadoso capítulo sobre as funções da legislação, o leitor encontra, de forma didática, modalidades de leis existentes no sistema jurídico brasileiro. Mas, são os casos práticos de cada capítulo que singularizam a obra e demonstram a possibilidade de se conceber uma visão realista e humanista do Direito. No que diz respeito à segunda categoria nuclear, isto é, a democracia, embora algumas discussões tangenciais já aparecerem nos capítulos anteriores, será a partir do capítulo intitulado Direito, democracia e participação social que o autor enfatizará o seu entendimento da democracia como base para a consolidação da Educação em Direitos Humanos. Assim, discussões propedêuticas em torno de princípios como o da legalidade ou mesmo da legitimidade encontram lugar de desenvolvimento. Por isso, consegue avançar no sentido de discutir a importância das instituições para a configuração da democracia justamente na medida em que viabiliza o acesso à justiça. Critica o aparelho burocrático do Estado, que se encontra em uma cultura igualmente burocrática na realidade brasileira. Avança para a problematização muito pertinente das normais jurídicas, enfocando o papel do legislador na formação democrática das normas jurídicas. Desenvolve ainda os atributos das camadas normativas com ênfase nos atributos jurídicos como a validade, a vigência, o vigor e eficácia. Passa então, o autor, para uma discussão central para se pensar o sistema jurídico, a partir de sua função social e da justiça, por meio da análise de teorias normativistas, de sistemas, do discurso e da semiótica. O sistema jurídico é, então, colocado em relevo com anúncio de suas antinomias e lacunas. Neste contexto, Bittar analisa os paradigmas positivista e pós-positivista, da mesma forma algumas categorias praticamente intocáveis do mundo jurídico: a segurança e a certeza; afinal, é comum o argumento em torno da necessidade de manutenção da segurança jurídica. Assim, o instituto da ponderação encontra lugar na discussão, no sentido de viabilizar a possibilidade de superação de antinomias jurídicas, da mesma forma que o papel do intérprete se justifica. Afinal, o que é o Direito no mundo complexo em que vivemos senão a possibilidade de interpretação da legislação a partir de casos concretos que consideram a estrutura normativa? O autor passa a investigar, na seara da interpretação, a importância da linguagem jurídica na aplicação do Direito, afinal, para a realização da terceira categoria nuclear, a justiça, o raciocínio jurídico ganha destaque. Assim, há RIDH Bauru, v. 6, n. 1, p. 251-255, jan./jul, 2018 (10) 253

aprofundamento em relação aos tipos de raciocínio que levam para a prática jurídica, isto é, das decisões político-administrativas, político-legislativas ou mesmo de uma decisão judicial. Na perspectiva da hermenêutica jurídica, a narrativa da segurança encerra o discurso jurídico; no entanto, atores da sociedade atual têm assombrado o mundo de decisões judiciais, de forma tácita porque o Direito é poder e sua estrutura regula a sociedade, sobretudo pelo papel que desempenha o poder midiático em decisões judiciais. Ora, que democracia sobrevive a um ambiente que mescla o raciocínio jurídico em decisões que se abrem ao arbítrio? É neste sentido que o autor enfatiza a importância da razoabilidade e da ponderação no raciocínio jurídico. Autores fundamentais para este debate são explicitados, como por exemplo, Ronald Dworkin, Jürgen Habermas e Robert Alexy. Essa seleção evidencia a atualidade de referências, reforçando a importância do livro. O autor demonstra a aporia existente entre a objetividade e a subjetividade em se tratando do raciocínio jurídico e, por isto, a necessidade da interpretação e da argumentação, que levem em conta a ponderação e razoabilidade. Todo este denso arcabouço é construído para o último e, na minha interpretação, o mais importante capítulo da obra, intitulado: Direito, injustiça e justiça. Considero o mais importante justamente porque a Educação em Direitos Humanos não busca outra coisa senão a realização da justiça que só é possível por meio do diagnóstico da injustiça. Desta forma, a discussão em torno da Teoria Tradicional e da Teoria defendida pelo autor, isto é, da Teoria do Humanismo Realista, implica a discussão sobre sentidos do termo justiça, principalmente sua tematização em torno de injustiças e violência. Assim, o esforço de se pensar o Direito por meio da justiça diz respeito ao encaminhamento oferecido pelo autor no sentido da demonstração clara e evidente de sua preocupação educacional, seja com o Ensino Jurídico, seja, também com os sistemas de ensino, demonstrando a importância da obra para todos os atores sociais que se incomodam com truculências sociais, como são casos discutidos pelo autor: População de Rua; a temática LGBT; Pessoas com Deficiência; Trabalho Digno; Comunidade indígena; Idoso; Migrante; Militar Aposentado, etc. Os casos ajudam o(a) estudante a pensar de forma situada, problemas concretos, geralmente referenciados a partir de casos reais, ocorridos na realidade braileira, e que favorecem a tomada de consciência sobre as pautas das diversas dimensões dos Direitos Humanos. Assim é que se faz Ensino Jurídico, fazendo-se também, Educação em Direitos Humanos. Entendo que se trata de leitura obrigatória para estudantes e profissionais de Direito, por certo; mas, além desses, trata-se de obra importante também para todas as pessoas que desejam uma sociedade com mais justiça social, equidade e democracia. O humanismo confere o aporte para isto, no 254 RIDH Bauru, v. 6, n. 1, p. 251-255, jan./jun., 2018 (10)

plano da compreensão. Afinal, é possível avançar em relação à Educação em Direitos Humanos e o livro Introdução ao Estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça, de Eduardo C. B. Bittar, por se tratar de texto didático e muito bem escrito, significa a possibilidade de acesso a um discurso complexo que é o discurso jurídico. No entanto, por ser acessível principalmente pelo método de análise de casos, numa visão dos problemas de injustiça da sociedade a partir da prática, e exatamente por isso pode auxiliar no sentido de alavancar uma visão realista e humanista, atualmente tão necessária, para o Direito, operando um importante giro teórico na compreensão da Teoria do Direito. Referências BITTAR, Eduardo C. B. Introdução ao Estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça. São Paulo: Saraiva, 2018.. A Teoria do Direito e a Teoria do Humanismo Realista. Conjur Consultor Jurídico. São Paulo, 7 de fevereiro de 2018. Disponível em: <https://www. conjur.com.br/2018-fev-07/eduardo-bittar-teoria-direito-teoria-humanismo- -realista#_ftn5m>. Acesso em: 21 abr. 2018.. Entrevista sobre a Teoria do Humanismo Realista ao jornalista Luiz Prado. Jornal da Universidade de São Paulo. 01/03/2018. Disponível em: <http:// jornal.usp.br/cultura/livro-defende-ensino-de-direito-humanista-e-interdisciplinar/>. Acesso em: 21 abr. 2018. BRASIL. Resolução nº 1, de 30 de maio de 2012. Estabelece Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos. Conselho Nacional de Educação. Disponível em: <https://prograd.ufg.br/up/90/o/rcp001_12.pdf>. Acesso em: 24 abr. 2018. RIDH Bauru, v. 6, n. 1, p. 251-255, jan./jul, 2018 (10) 255