Artigo Científico/Scientific Article

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Transcrição:

Medicina Veterinária ISSN 1809-4678 Infecção por Demodex canis em cães dermatologicamente sadios e com dermatopatias, procedentes região metropolitana de Recife, Estado de Pernambuco [Demodex canis infection in dogs with healthy skin and dermatological problems from the city of Recife and Metropolitan Area Pernambuco State Brazil] Artigo Científico/Scientific Article LVA Silva 1, IM Santana 1, LC Alves 1, MAG Faustino 1 (*) 1 Departamento de Medicina Veterinária/UFRPE, Recife - PE, Brasil. Resumo Os ácaros do gênero Demodex são largamente encontrados na pele de mamíferos. D. canis pode ser encontrado parasitando o folículo piloso e glândulas sebáceas e sudoríparas apócrinas de cães e tem sido considerado componente habitual da microbiota acariana de cães normais. Contudo, apesar de a demodicose constituir-se em problema freqüente na clínica de pequenos animais, a avaliação da positividade para D. canis em uma população composta tanto por cães clinicamente sadios como por cães portadores de problemas dermatológicos raramente tem sido analisada. Objetivou-se neste trabalho estudar a frequência de infecção por D. canis em cães dermatologicamente sadios e em cães com dermatopatias, procedentes da região metropolitana do Recife. Foram utilizados 145 caninos domiciliados e 145 não domiciliados, de ambos os sexos, raças e idades variadas. Foi realizado exame parasitológico a partir de raspado de pele profundo, tratado com hidróxido de potássio (KOH) 10%. Para a análise estatística foi utilizado o programa SAS (Statistical Analysis System), obtendo-se distribuições absolutas e percentuais, e utilização do teste Qui-quadrado, ao nível de significância de 5,0%. Verificou-se ausência de infecção por D. canis entre os cães não portadores de dermatopatias e prevalencia de 17.2% (50/290) entre os portadores de dermatopatias. Não se observou associação estatisticamente significativa em relação ao sexo, raça e comprimento da pelagem dos animais. Palavras-chave: sarna demodécica, dermatite, fatores de risco, prevalencia. Abstract Mites of the genus Demodex are widely found in the skin of mammals. D. canis can be found residing in hair follicles, sweat glands, and sebaceous glands of dogs and has been considered a normal inhabitant of canine skin. However, despite demodicosis be a frequent problem in small animal clinic, the evaluation of positivity to D. canis in a population composed of both healthy dogs and for dogs with skin problems has rarely been analyze. This work had as objective to study the infection for D. canis on dermatological healthy dogs and in dogs with dermatological problems deriving from the city of Recife Pernambuco State - Brazil and Metropolitan Area. Samples of skin scrapings were obtained from 145 domiciled dogs, and 145 stray dogs, of both sexes, varied breed and length of the coat. This material was submitted to microscopical examination after treatment with 10% solution of KOH. The statistical analysis was performed by the Software SAS (Statistical Analysis System), using descriptive and inferencial statistical techniques, to the level of 5.0% of significance. There was no infection in the dermatological healthy dogs; however demodicosis were detected in 17.2% (50/290) of the total samples, all from dogs with dermatological problems. There was no significant association in relation to sex, breed and length of the coat of animals. Key-words: demodectic mange, dermatitis, risk factors, prevalence. Introdução As infestações por Demodex canis merecem atenção dentre as dermatopatias parasitárias, por suas características de patogênese aliadas às implicações relativas ao tratamento, que muitas vezes é (*) Autor para correspondência/corresponding author : Departamento de Medicina Veterinária/UFRPE, Recife - PE, Brasil. R. Dom Manoel de Medeiros, SNº - Dois Irmãos Recife PE, CEP 52.171-900. E-mail: magfaustino@hotmail.com Recebido em: 30 agosto de 2011 Aceito em: 25 de setembro de 2011

Silva et al., Infecção por Demodex canis em cães dermatologicamente sadios e com dermatopatias...2 dispendioso e sem sucesso, fatores que geram grande preocupação tanto para os proprietários quanto para clínicos veterinários (LARSSON, 1989; NAYAK et al., 1997, SOUZA et al., 1999), apesar das atuais alternativas terapêuticas viáveis (DELAYTE et al., 2006). Os ácaros do gênero Demodex são largamente encontrados na pele de mamíferos (CHESNEY, 1999). D. canis parasita o folículo piloso, podendo ser encontrados nas glândulas sebáceas e sudoríparas apócrinas de cães. Este ácaro tem sido considerado componente habitual da microbiota acariana de cães normais (MULLER et al., 1983; KWOCHKA, 1986) e objeto de estudos no decorrer dos anos. Gaafar et al. (1958), estudando a incidência do gênero Demodex na pele de cães aparentemente normais, detectaram que 5,4% apresentavam ácaros em observações microscópicas de sedimentos de pele submetidos ao aquecimento em presença de hidróxido de potássio e posterior centrifugação. No entanto, apesar de ser problema clínico freqüente na clínica de pequenos animais, a avaliação da positividade para D. canis em uma população composta tanto por cães clinicamente sadios como por cães portadores de problemas dermatológicos raramente tem sido analisada. Portanto, objetivou-se neste trabalho avaliar a frequência de infecção por D. canis em cães dermatologicamente sadios e em cães com dermatopatias, procedentes da região metropolitana do Recife. Material e Métodos Utilizaram-se 290 caninos, selecionados por amostragem não probabilística de conveniência (COSTA NETO, 1977; REIS, 2003), de ambos os sexos, raças e idades variadas, provenientes da cidade do Recife, sendo 145 domiciliados, atendidos nos ambulatórios do Centro de Vigilância Ambiental da Prefeitura da Cidade do Recife e do Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco, e 145 não domiciliados, capturados pelo Serviço de Apreensão do Centro de Vigilância Ambiental da Prefeitura da Cidade do Recife. Dados de identificação dos animais e características referentes ao aspecto lesional cutâneo foram anotados em fichas individuais. Para os animais domiciliados, foi utilizada, ficha complementar, com informações sobre profilaxia e epidemiologia. A presença de dermatopatia foi notificada de acordo com a caracterização de forma localizada ou generalizada como descrito por Scott et al. (1996). O material para exame foi coletado por meio de raspado cutâneo profundo, sendo, em geral, seis raspados por animal. Após tricotomia nas áreas dorso cranial, dorso caudal, membros, cauda, orelha, focinho, em cães com dermatopatias ou não, realizando-se uma compressão digital da pele, nos referidos locais, procedeu-se a escarificação com o auxílio de lâmina de bisturi, até observar-se o sangramento capilar, sendo este material transferido para lâminas de microscopia e transportado, ao Laboratório do Centro de Vigilância Ambiental da Prefeitura da Cidade do Recife e ao Laboratório de Doenças Parasitárias dos Animais Domésticos da Universidade Federal Rural de Pernambuco. O material foi processado adicionando-se duas a três gotas de hidróxido de potássio 10% (BAKER, 1968), após 10 a 20 minutos e, sobrepondo-se uma lamínula, para exame ao microscópio óptico com objetiva de 10X. Os ácaros foram identificados segundo Nutting e Desch (1978). Os procedimentos metodológicos foram realizados de acordo com normas éticas, aprovados pela Comissão de Pesquisa do DMV UFRPE e respaldados pela Lei municipal do Recife nº 16.004-95. Para análise dos dados utilizaram-se distribuições absolutas e percentuais, e técnicas de estatística inferencial, envolvendo a utilização do teste Qui-quadrado (ou o teste Exato de Fisher quando as condições para a utilização do teste Qui-quadrado não foram verificadas). Os valores do Odds Ratio (OR) e intervalo de confiança (IC) para os parâmetros analisados foram também determinados. O nível de significância adotado nas decisões dos testes estatísticos foi de 5,0%, utilizando-se programa SAS

Silva et al., Infecção por Demodex canis em cães dermatologicamente sadios e com dermatopatias...3 (Statistical Analysis System) na versão 6.12 para a análise estatística. Para efeito de análise estatística, devido ao grande número de raças com frequências muito baixas, os animais foram agrupados em animais sem raça definida (SRD) e animais com raça definida (Raça). A distribuição por faixa etária foi realizada apenas no grupo de animais domiciliados, segundo informações obtidas dos proprietários. Resultados e Discussão Dos 290 cães pesquisados, 162 (55,9%) eram animais portadores de dermatopatias e, 128 (44,1%) dermatologicamente sadios. Todos os raspados cutâneos analisados correspondentes aos animais dermatologicamente sadios foram negativos para D. Canis, verificando-se, portanto, 17,2% (50/290) de portadores de demodicose, constituindo-se apenas de cães com dermatopatias. Poucos estudos tem avaliado presença de D. canis em amostra composta por cães clinicamente sadios, desde o registro de Gaafar et al. (1958), que encontrou 5,4% de cães positivos. O resultado do presente estudo assemelha-se ao de Nicolucci et al. (2010) e Fondati et al. (2010), que examinaram cães assintomáticos e sintomáticos, e não obtiveram positividade no primeiro grupo. Recentemente, Ravera et al. (2011), utilizando técnica de PCR em tempo real, detectaram 17,6% (9/51) de positividade em cães sem qualquer tipo de lesão, proporção maior que as registradas até então, certamente devido à sensibilidade da técnica em comparação aos demais estudos, que utilizaram exame microscópico de pêlos, raspado de pele ou amostras de tecido digerido. Levando-se em consideração o número total de amostras analisadas no presente estudo, tendo em vista o número de raspados examinados por animal, as afirmações de que D. canis é comensal da pele normal deve ser interpretada com cuidado. Fondati et al. (2010) propuseram que, embora um pequeno número de D. canis possa habitar a pele de alguns cães sem lesões cutâneas, a probabilidade de encontrar esses ácaros em cães dermatologicamente sadios é baixa e, conseqüentemente, na maioria dos casos, a presença do ácaro D. canis na pele não deve ser considerada como normal. Comparando a proporção de positivos, 19,3% (28/145) e 15,2% (22/145), em cães domiciliados e não domiciliados respectivamente, verificou-se que não há diferença significativa entre os dois grupos. Analisando-se diferentes estudos, percebemse variações na frequência de animais parasitados. Assim, enquanto no nordeste brasileiro Souza et al. (1999), em Salvador, detectaram 16,67% de cães positivos e Rocha et al. (2008), em Mossoró, encontraram 16,99% (70/412), na região Sul do Brasil, Krychak et al. (1999) constataram positividade de 7,55% em Curitiba Paraná e Bellato et al. (2003) em Lages, Santa Catarina obtiveram 48,28% de positividade. Na Índia, em Bombaim, Varghese et al. (1994) registraram D. Canis em 15,66% dos cães e Nayak et al. (1997), Aujla et al. (2000) e Chhabra et al. (2000) reportaram frequencias de 3,0%, 6,04% e 5,2%, respectivamente. Além dos fatores hereditários e imunológicos das populações caninas, a diferença entre os percentuais obtidos nos estudos pode ser devida às condições climáticas das áreas em estudo. Particularmente, a temperatura (alta ou baixa) é citada por Scott et al. (1974) dentre os fatores predisponentes à demodicose canina. Dentre os animais positivos, 8,00% (4/50) apresentaram o ácaro ao exame de pele íntegra. Este achado corrobora com Ravera et al. (2011) que detectaram DNA de Demodex em pele não lesionada de quatro de seis cães com demodicose, deduzindo que tal achado, se confirmado em mais estudos, sugere que a demodicose é um fenômeno generalizado na pele canina, devido à proliferação extensiva de populações locais do ácaro, apesar de lesões macroscópicas só aparecem em determinadas áreas. A frequência de D. canis em cães segundo o sexo, definição racial e comprimento da pelagem encontra-se

Silva et al., Infecção por Demodex canis em cães dermatologicamente sadios e com dermatopatias...4 registrada na Tabela 1, não se comprovando, em qualquer dos grupos, a existência de Tabela 1 Frequência relativa (%) e absoluta de cães domiciliados e não domiciliados positivos para Demodex canis segundo o sexo, definição racial e comprimento da pelagem Grupo Domiciliado Não domiciliado Grupo total Parâmetro Pos. Neg. Pos. Neg. Pos. Neg. Sexo Macho 22,6 (19) 77,4 (65) 13,7 (11) 86,3 (69) 18,3 (30) 81,7 (134) Fêmea 14,7 (9) 85,3 (52) 16,9 (11) 83,1 (54) 15,9 (20) 84,1 (106) Valor de P P = 0,2362 P = 0,5963 P = 0,5887 OR e IC com 95,0% 1,69 (0,71 a 4,04) 1,00 0,78 (0,32 a 1,94) 1,00 1,19 (0,64 a 2,21) 1,00 Raça SRD 15,4 (10) 84,6 (55) 15,5 (17) 84,5 (93) 15,4 (27) 84,6 (148) Raça 22,5 (18) 77,5 (62) 14,3 (5) 85,7 (30) 20,0 (23) Valor de P P = 0,2804 P = 0,8667 P = 0,3134 80,0 (92) OR e IC com 95,0% 0,63 (0,27 a 1,47) 1,00 1,10 (0,37 a 3,23) 1,00 0,73 (0,39 a 1,35) 1,00 Pelagem Curta 23,4 (18) 76,6 (59) 16,5 (17) 83,5 (86) 19,4 (35) 80,6 (145) Longa 14,7 (10) 85,3 (58) 11,9 (5) 88,1 (37) 13,6 (15) 86,4 (95) Valor de P P = 0,1898 P = 0,4837 P = 0,2039 OR e IC com 95,0% 1,77 (0,75 a 4,16) 1,00 1,46 (0,050 a 4,26) 1,00 1,53 (0,79 a 2,95) 1,00 Pos. positivo Neg. negativo SRD sem raça definida OR Odds Ratio IC Intervalo de confiança. * - Associação significativa ao nível de 5,0%. associação significativa entre a ocorrência de D. canis e estes parâmetros. Segundo Larsson et al. (1989), é de consenso entre os autores que inexiste predisposição sexual na sarna demodécica canina. Em relação à pelagem, nenhuma explicação provável pode ser proposta para a observação de incidência mais alta da demodicose em cães de pelagem curta que em cães de pelagem longa, no entanto sugere-se que as glândulas sebáceas de cães com pelagem longa sejam pequenas e muito menos desenvolvidas que dos cães de pelo curto, portanto disponibilizando pouco alimento para o ácaro (BAKER, 1970), contudo não há qualquer evidência que comprove este fato pois, não se observou diferença na histologia da pele entre os dois tipos de pelagem (BAKER, 1966, citado por BAKER, 1970). Avaliando-se a raça, os presentes dados diferem dos apresentados por Nayak et al. (1997), os quais registraram maior positividade em cães de raça com 94,08% dos casos. Características da pele, inerentes à

Silva et al., Infecção por Demodex canis em cães dermatologicamente sadios e com dermatopatias...5 constituição racial, podem influenciar nas diferenças observadas em populações caninas Em se tratando da idade dos animais, registrou-se a maior ocorrência da infestação com cão na faixa etária de 7 a 11 meses (42,9%), seguida dos animais até 6 meses de idade (23,5%), e a menor ocorrência foi registrada em animais adultos, observando-se uma tendência à significância da associação entre faixa etária e a ocorrência de D. canis (Tabela 2). diversas. Os dados supracitados concordam com Nayak et al. (1997) os quais observaram demodicose em 60% dos cães até 1 ano de idade, 23% entre 1 e 2 anos e 17% acima de dois anos e Gomes Filho et al. (1997) quando observaram que 25% dos cães eram de faixa etária entre 0-6 meses, 21,83% de 6-12 meses e 10,42% de 12-24 meses com igual percentual nos animais acima de 24 meses Tabela 2 Frequência absoluta (n) e relativa (%) de Demodex canis em cães distribuídos domiciliados segundo a faixa etária Demodex canis Faixa etária Positivo Negativo Total n % n % n % Valor de P Até 6 meses 4 23,5 13 76,5 17 100,00 P = 0,0507 7 a 11 meses 6 42,9 8 57,1 14 100,0 1 a 3 anos 13 22,4 45 77,6 58 100,0 >3 a 6 anos 3 10,0 27 90,0 30 100,0 7 anos ou mais 2 7,7 24 92,3 26 100,0 Grupo total 28 19,3 117 80,7 145 100,0 Conclusões Nas condições em que se realizou este estudo, não se confirma a presença de parasitismo por D. canis em animais dermatologicamente sadios, constatando-se a presença do ácaro apenas em cães com dermatopatias, independente do sexo, comprimento da pelagem e raça, com tendência de maior frequência em animais jovens. Referências Bibliográficas AUJLA, R.S. et al. Prevalence and pathology of mange-mite infestations in dogs. Journal of Veterinary Parasitology, v.14, n.1, p.45-49, 2000. BAKER, K.P. Observations on demodectic mange in dogs. Journal Small Animal Practice, v.9, p.621-625, 1968.. Observations on the epidemiology, diagnosis and treatment of demodicidosis in dogs. Veterinary Record, v.86, n.4, p.90-91, 1970. BELLATO, V. et al. Ectoparasitos em caninos do município de Lages, Santa Catarina, Brasil. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária, v.12, n.3, p.95-98, 2003. CHESNEY, C. J. Short form of Demodex species mite in the dog: occurrence and measurements. Journal of Small Animal Practice, v. 40, n. 2, p. 58-61, 1999. CHHABRA, S. et al. Prevalence of ectoparasitic infestations on dogs in and around Ludhiana. Punjab Agricultural University. Journal of Research, v.36, n.3/4, p.263-266, 2000. COSTA NETO, P.L.O. Estatística. São Paulo: Edgard Blucher, 1977. 264p. DELAYTE, E. H. et al. Eficácia das lactonas macrocíclicas sistêmicas (ivermectina e moxidectina) na terapia da demodicidose canina generalizada. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.58, n.1, p.31-38, 2006. FONDATI, A. Efficacy of daily oral ivermectin in the treatment of 10 cases of generalized

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