Análise das Condições Acústicas em Sala de Aula Climatizada de Ambiente Universitário. Thalita Christina Brandão Pereira (UFPB) thalitajp@ig.com.br Luis Bueno da Silva (UFPB) bueno@producao.ct.ufpb.br Antonio Souto Coutinho (UFPB) soutocoutinho@producao.ct.ufpb.br Maria Lúcia Oiticica (UFAL) mloiticica@hotmail.com Resumo Este trabalho analisa o nível de conforto acústico de uma sala de aula climatizada de uma instituição de ensino superior, verificando se os índices avaliados satisfazem a Norma Regulamentadora 10152 (NB 95). Para tanto foram medidas as variáveis acústicas, e avaliada a percepção dos alunos com relação à inteligibilidade do ambiente. Observou-se que o ambiente apresentou um nível acústico fora dos padrões requeridos pelas normas, possuindo apenas, o Índice de Discriminação da Fala dentro do valor estabelecido, implicando assim em uma má qualidade do som e conseqüentemente um prejuízo na qualidade do ensino. Palavra-Chave: Ruído e Inteligibilidade. 1. Introdução A Revolução Industrial é um dos grandes marcos da história mundial e nos permitiu uma série de avanços. Porém, o advento da moderna tecnologia também colocou o homem frente a frente com um dos muitos inimigos modernos: o ruído. O termo ruído é alvo de críticas já que, por definição, o mesmo significa sons desarmônicos desagradáveis, embora saiba-se que estes sons, como por exemplo a música, estão sujeitos a interpretações individuais e podem levar a comprometimento da saúde do indivíduo, ocasionando a surdez.(coimbra, 2003). Segundo o mesmo autor, o ruído é potencialmente capaz de levar a lesões graves e irreversíveis no aparelho auditivo. Os sintomas ocasionados pela exposição ao ruído podem ser auditivos, tais como a perda de audição, zumbidos (chiado no ouvido), dificuldade de entender as pessoas ( escuto, mas não entendo ), dificuldade de localização da fonte sonora (não sabe de onde vem um som) e irritabilidade com sons intensos (não suporta sons altos ou lugares com muitas pessoas falando); e não-auditivos, tais como alteração do sono (dificuldade para dormir), tontura, mudanças de comportamento (irritabilidade e dificuldade de concentração), hipertensão arterial, alterações gástricas e intestinais (azia e diarréia), entre outras. São inúmeras as fontes de ruído, sendo que uma das principais está relacionada ao trabalho. Além da indústria, o tráfego, a construção civil e outras obras públicas. Os ruídos domésticos, atividades de esporte e lazer podem ter seus efeitos prejudiciais. Em uma universidade, mais precisamente, ocorre o mesmo efeito que em um ambiente de trabalho. Os alunos se sentem prejudicados por ruídos externos, como por exemplo, conversas em corredores e em outras salas; e por ruídos internos, como conversas paralelas e o ruído do aparelho de ar-condicionado. Para poder analisar se o nível de ruído interfere realmente no entendimento do aluno dentro de sala de aula, e se o nível está dentro dos limites das Normas Regulamentadoras Brasileiras, ENEGEP 2004 ABEPRO 2562
realizou-se uma avaliação em uma sala de aula, com o intuito de obter uma análise desse ambiente. Pretende-se neste trabalho avaliar as condições ambientais físicas e perceptivas das pessoas em relação às variáveis de conforto acústico. 2. Ruído A preocupação com o meio ambiente e sua relação com a saúde não é recente. Com a revolução industrial, a produção se tornou prioridade, e o homem nunca mais conseguiu melhorar o ambiente em que habita. Com o desenvolvimento tecnológico, no século XX, ou seja, com a introdução do rádio e do amplificador, o aparecimento do automóvel e o desenvolvimento da aviação militar, houve um aumento do ruído na zona urbana. O ruído é um estímulo auditivo que não contém informações úteis para a tarefa em execução (IIDA, 1993). Pode ser ainda definido com sendo um som indesejável, ou seja, toda sensação auditiva desagradável ou insalubre. Um ruído é apenas um tipo de som, mas um som não é necessariamente um ruído. A distinção é feita pela pessoa que escuta, e isto é feito de maneira subjetiva. O ruído causa alguns efeitos sobre o ser humano: - Simples perturbação: quando se irrita com o toque do telefone durante o descanso; - Alterações temporárias na audição: quando se permanece por algumas horas em um local com música em alto volume, a audição fica diminuída (ouvido tapado) ou com zumbidos; - Alterações permanentes: normalmente ocorrem em pessoas que permanecem expostas diariamente a altos níveis de ruído. Os ruídos intensos dificultam a comunicação verbal. As pessoas precisam falar mais alto e prestar mais atenção para serem compreendidas. Isso tudo faz aumentar a tensão psicológica e o nível de atenção. Várias pesquisas mostram que os ruídos intensos tendem a prejudicar tarefas que exigem concentração mental, e outras que exigem atenção, como por exemplo, as tarefas desenvolvidas em salas de aulas. Segundo Iida (1993), em uma escola situada nos arredores de um aeroporto, observou-se uma mudança de comportamento de professores e alunos nos dias de maior movimento de aviões. Nesses dias, os alunos ficavam mais excitados, barulhentos e menos inclinados ao trabalho escolar. Nessas condições há uma perda da inteligibilidade da linguagem, a comunicação fica prejudicada, passando a ocorrer distrações, irritabilidade e diminuição da produtividade no trabalho. Para se avaliar o nível de ruído a que os alunos dentro de uma sala de aula estão expostos, é necessário analisar todos os sons existentes no local, saber distinguir o tipo de ruído e principalmente analisar a comunicação entre as pessoas. As normas responsáveis pelos limites de tolerância adotados para se avaliar o nível de ruído no ambiente e comprovar se o mesmo é insalubre ou não, variam de acordo com o ambiente analisado. A NBR 10152 é a norma de níveis de som para o conforto acústico em ambiente construído; especificamente para salas de aula, o nível registrado varia entre 40 db e 50 db. 2.1. Inteligibilidade A inteligibilidade é definida como a porcentagem de sons que um ouvinte consegue entender no ambiente. É uma grandeza que pode ser medida, dependendo de dois fatores: o nível de ruído interno e a reverberação da sala, que ocorre quando as múltiplas reflexões do som fazem com que os ouvintes escutem o som direto da fonte, causando um prolongamento no tempo de ENEGEP 2004 ABEPRO 2563
duração do som, o que dificulta o entendimento da linguagem. A diferença entre o nível de fala e o ruído é responsável pela inteligibilidade das palavras na sala de aula. O ideal é manter esta diferença (sinal/ruído) maior que 10 db em toda a sala. Toda vez que o ruído aumenta, a diferença sinal/ruído cai, diminuindo assim a inteligibilidade das palavras. Segundo Fernandes (2000) o conceito de inteligibilidade é muito genérico, podendo ser definido como a razão pela qual entende-se o som; pode ser aplicada a ambientes, a sistemas de comunicação, em testes de equipamentos de áudio, etc. Quando se refere à comunicação em um ambiente, a inteligibilidade é definida como inteligibilidade acústica da linguagem, sendo esta a principal característica acústica de um ambiente, pois reflete o grau de entendimento das palavras no interior do ambiente. A inteligibilidade pode ser calculada, predita e medida; é mensurada de várias maneiras, através dos métodos subjetivos e analíticos. O método subjetivo é aquele que se utiliza pessoas na avaliação. Consiste em distribuir pessoas com audição normal no ambiente a ser estudado e, através de um orador, pronunciar um lote de palavras normalizadas, que são anotadas pelos ouvintes. A porcentagem de acerto é chamada de Índice de Discriminação da Fala (IDF). E o método analítico se baseia em parâmetros acústicos do ambiente, buscando obter um índice que avalie a inteligibilidade. Neste trabalho analisou-se o método subjetivo para saber qual o IDF do ambiente, de acordo com o que foi respondido pelos alunos. Segundo publicação do Comitê Técnico em Acústica Arquitetônica da Sociedade Americana de Acústica, SEEP (2002), se a inteligibilidade da fala de uma sala for menor que 90%, devem ser adotadas medidas com relação à acústica do ambiente, a fim de reduzir a reverberação e/ou melhorar a relação Sinal/Ruído. 3. Caracterização do Ambiente Para fazer um estudo preliminar do problema em questão, escolheu-se uma sala de aula tendo uma área de 79,88 m 2, um volume de 254,40 m 3 ; paredes de alvenaria de cor escura, teto de laje, piso de cerâmica clara, janelas de vidro com película fumê e esquadria de alumínio. Nela estão instalados três aparelhos de ar condicionados, um quadro negro, cinqüenta carteiras acolchoadas e uma mesa. Durante a pesquisa, realizada no turno da manhã, havia 29 alunos, com idade variando entre 28 a 53 anos. Figura I: Ambiente Estudado Figura II: Ambiente Estudado 4. Metodologia A avaliação acústica do ambiente foi analisada através do estudo da inteligibilidade, ou seja, a diferença sinal/ruído e comparação dos níveis de ruídos coletados no ambiente em estudo com níveis da norma NBR 10152 (NB 95). ENEGEP 2004 ABEPRO 2564
Para medir o nível de inteligibilidade, calculou-se o tempo de reverberação, aplicou-se um questionário para verificar a percepção acústica dos alunos. Posteriormente aplicou-se um teste subjetivo para identificar o nível de inteligibilidade, onde o professor se posicionou na frente da sala e dezenove letras do alfabeto foram lidas aleatoriamente. E por fim realizou-se uma avaliação da diferença sinal/ruído, para saber se a mesma está acima de 10 db. Utilizou-se para tanto, um decibelímetro Entelbra modelo ETB 142, conforme a NBR 12179/1992. Questionários foram distribuídos com os alunos para que eles manifestassem sua opinião sobre as respectivas sensações. 5. Resultados No ambiente encontrou-se um sinal igual a 74 db(a) e o ruído de 66 db (A), obtendo-se assim uma relação Sinal/Ruído igual a 8 db(a), ou seja, uma situação inadequada para se obter uma boa compreensão da fala. 5.1. Percepção dos Alunos Através dos questionários, foi observado que, nos lugares mais distantes do professor compreendiam menos o que ele falava. Isto é, o maior índice de erros correspondia às últimas filas, principalmente aos lugares próximos a um aparelho de ar-condicionado. Mas a maioria revelou que entendia o que o professor fala em todas as partes da sala. Apartir dos questionários foram elaborados gráficos que expressam a qualidade de compreensão da fala no ambiente estudado. 3% 3% 17% ótimo bom regular nda 77% Gráfico I: Quais as condições de compreensão da fala na sala de aula? O gráfico I mostra que 77% dos alunos acham que o nível de compreensão da fala é bom; 17% acham ótimo e 3%, regular. 7% 0% muito compreensível 24% às vezes compreensível 38% frequentemente compreensível sempre compreensível 31% nda Gráfico II: Como você compreende o colega do seu lugar? Observa-se no Gráfico II que 24% dos alunos sentem que a compreensão é muito boa; 38%, freqüentemente compreensível; 31%, compreensível, às vezes; e 7% compreendem sempre o colega próximo. ENEGEP 2004 ABEPRO 2565
0% 0% 41% 59% nunca às vezes frequentemente nda Gráfico III: As conversas paralelas atrapalham a sua compreensão? O gráfico III revela que 59% expressaram que as conversas paralelas entre os alunos atrapalham às vezes o nível de compreensão e 41% se revelaram incomodados. Posição dos IDF (%) Alunos Última fila/perto 84,21 do ar cond. Última fila/perto 89,47 do corredor Meio da Sala 94,74 Frente/perto do 89,47 ar cond. Frente/corredor 94,74 Média 90,53 Tabela I: Resultado do Teste de Inteligibilidade A tabela I mostra a média da inteligibilidade no ambiente, está boa, pois atingiu um valor de 90,53%. Outro ponto importante foi que o menor valor, 84,21%, equivale ao valor na última fila/perto do aparelho de ar condicionado, revelando também uma inteligibilidade boa. 5.2. Tempo de Reverberação Segundo Oiticica (2003), o tempo de reverberação é um dos dados mais precisos sobre a qualidade do som em um recinto, sendo este o maior responsável pela boa comunicação entre alunos e professores e um mesmo ambiente. Na sala avaliada encontrou-se um tempo de reverberação do som com absorção, para 500 Hertz, igual a 0,97 segundos. Segundo o Comitê Técnico em Acústica Arquitetônica da Sociedade Americana de Acústica, o tempo de reverberação ótimo para uma sala de aula está entre 0,4 e 0,6 segundos. Com isso, percebe-se que no ambiente estudado, o som permanece mais tempo do que o necessário, gerando assim uma má qualidade do som, que prejudica a qualidade do ensino. 6. Conclusão Observou-se que o ruído do ambiente está superior ao que recomenda a NBR 10152/ABNT, implicando má qualidade do som, e conseqüente prejuízo da qualidade do ensino. Constatou-se através dos gráficos que os alunos compreendem o que é dito pelo professor, contrariando um pouco a relação sinal/ruído, que obteve um valor de 8 db (A), ou seja, inferior ao da norma que atesta para um bom nível de compressão da fala uma relação sinal/ruído igual ou maior que 10 db (A). ENEGEP 2004 ABEPRO 2566
Com relação ao teste subjetivo, pode-se perceber que os menores índices de IDF foram nas últimas filas próximas ao aparelho de ar condicionado. Conseqüentemente, nestes locais há baixa inteligibilidade. Porém a média ficou um pouco acima de 90%, valor ao qual se tem uma boa inteligibilidade. Por fim o tempo de reverberação do ambiente está acima do estabelecido pelo Comitê Técnico em Acústica Arquitetônica da Sociedade Americana de Acústica, ocasionando uma má qualidade no som e conseqüentemente no ensino. Em suma o ambiente estudado, apesar do questionário aplicado aos alunos expressar o contrário, necessita de interferência no que diz respeito ao conforto acústico. Referências COIMBRA, Cal. O Ruído e seus efeitos prejudiciais. www.acessa.com/viverbem/dicas Acesso em 20/05/03. FERNANDES, João Cândido (2000) - Inteligibilidade acústica da linguagem. Belo Horizonte: Apostila desenvolvida para o curso Inteligibilidade Acústica da Linguagem oferecida durante o XIX Encontro da SOBRAC, 54p. IIDA, Itiro (1993) - Ergonomia: projetos e produção. São Paulo: Edgard Bliicher. NBR 10152 (1987) - Níveis de ruído para conforto acústico. Rio de Janeiro: ABNT, 4p. OITICICA, Maria Lúcia (2003) Análise da inteligibilidade da fala de uma sala de aula em situaçoes diversas de climatização dentro do contexto acústico. Artigo submetido ao ENCAC 2003. TECHINICAL COMITTEE ON ARCHITECTURAL ACOUSTICS. Classroom acoustics. http://asa.aip.org/classroom/booklet.html. ENEGEP 2004 ABEPRO 2567