CONTEXTO EDUCACIONAL BRASILEIRO E OS ANOS INICIAIS DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DA UFSM



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Transcrição:

CONTEXTO EDUCACIONAL BRASILEIRO E OS ANOS INICIAIS DO CURSO DE LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DA UFSM Carla Vargas Pedroso - UFF e UFSM Sandra Lucia Escovedo Selles - UFF Agência Financiadora: CAPES Introdução O presente trabalho parte de uma pesquisa de mestrado, em desenvolvimento, cujo objetivo é compreender os projetos de formação docente que estavam em disputa, nos anos iniciais da trajetória do curso de Ciências Biológicas, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, Santa Maria-RS). Para tanto, investigamos artefatos sócio-históricos que atravessaram a construção da formação docente oferecida no curso de Ciências Biológicas, desde a sua fundação em 1965 até 1979, quando passam a coexistir os cursos de Licenciatura Curta em Ciências e Licenciatura Plena em Ciências Biológicas. Procuramos entender o curso como espaço em que circulavam disputas por visões de ensino e de formação, dos sujeitos sociais envolvidos em sua história sem, no entanto, desconsiderar a análise dos interesses políticos e educacionais mais amplos, que permearam a formação docente neste curso de graduação. Assim, particularmente, ao longo deste artigo, buscamos discutir como alguns acontecimentos da trajetória da Universidade atravessaram os anos iniciais do curso de Ciências Biológicas/UFSM, especialmente, no que concerne à formação docente. Para compreensão deste objeto no período, recuamos a discussão aos anos 1950, pois a partir deste momento torna-se evidente o processo de expansão das Universidades. A periodização do estudo inicia na fundação do curso, em 1965 e vai até a metade da década de 1970, quando pretendemos evidenciar podermos observar alguns desdobramentos da Reforma Universitária (Lei 5.540/68).

2 I. O CONTEXTO BRASILEIRO E UNIVERSITÁRIO E A LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS NA UFSM No início da década de 1950, houve a retomada do projeto de construção de uma nação desenvolvida e independente, guiada pelas palavras de ordem e progresso. De acordo com Romanelli (2007), a política nacionalista-desenvolvimentista deste período acelerou a expansão industrial e abriu cada vez mais a economia ao capital estrangeiro, gerando uma grande variedade de novos empregos no país. Entretanto, as possibilidades de ascensão a estes trabalhos estavam diretamente relacionadas a maior qualificação do trabalhador (maior escolarização e domínio das áreas científicas). A educação, então, ganhou papel importante neste processo político, aspecto que estimulou o rápido crescimento da rede escolar. Estes fatos endossaram a necessidade de expansão e modernização das Universidades, movimento que iniciou nos anos 1930 e ganhou destaque entre 1950 e 1970. A demanda pelo Ensino Superior foi atendida com a criação de novas instituições onde não havia, ou em locais que contavam apenas com unidades particulares, a gratuidade de fato dos cursos superiores das instituições federais, e a federalização de faculdades estaduais e privadas reunidas, em seguida, em Universidades (CUNHA, 2002). É neste contexto que a UFSM e o curso de Ciências Biológicas têm suas origens. A partir de 1964, a ditadura militar, no intuito de diminuir as tensões do momento (abafar a crise estudantil que se aguçou naquele ano, além de responder a pressão exercida pela classe média para ampliação da oferta de vagas), destacou ainda mais o projeto de modernização do ensino superior no Brasil, com o aumento substancial de ajudas internacionais. A busca de apoio internacional para modernizar a universidade, na década de 1960, trouxe à UFSM projetos de âmbito mundial como a Operação Oswaldo Aranha, desenvolvido entre 1968 e l974. Este foi o resultado de um pedido de auxílio feito pela UFSM ao Fundo Especial das Nações Unidas, em 1969. O objetivo era prover formas de estímulo ao desenvolvimento do setor agropecuário do Rio Grande do Sul (RS), especialmente, com relação às pequenas propriedades rurais da zona oeste do Estado. Além disso, em nível nacional, no estabelecimento do golpe militar foi assinado o convênio entre o Ministério da Educação e Cultura e a Agência Norte Americana para o desenvolvimento Internacional (MEC-USAID). Em tal acordo, o Brasil receberia apoio técnico e financeiro norte-americano para implementar as reformas. Este apoio cobriu todo o espectro

3 da educação nacional, além do treinamento de professores e a produção e veiculação de livros didáticos. Acordos, como o MEC-USAID, provocaram protestos que agravaram a crise educacional. Nesse contexto, segundo Aranha (1996, p.211), o governo para manter o controle do movimento estudantil organizou um aparato de repressão, que gerou inclusive mudanças no currículo acadêmico das instituições, como por exemplo, a inserção de disciplinas de caráter ideológico e manipulador, como Estudos de Problemas Brasileiros - EPB. As várias estratégias propostas para encaminhar a modernização da Universidade culminaram com a promulgação da Lei da Reforma Universitária (Lei 5.540/68). Esta teve diversos pontos modernizadores, dentre os quais, destacamos: a criação dos cursos básicos; a abolição da cátedra com a institucionalização da organização em departamentos; e definição de condições para a expansão da pós-graduação, visando à formação de pesquisadores de alto nível. Três anos após a promulgação da Lei 5.540, é aprovado o novo Estatuto da UFSM (Parecer 465/71), que substitui as Faculdades e Institutos por oito Unidades de Ensino. A instituição organizou um Centro de Estudos Básicos composto pelos departamentos de Filosofia, Sociologia e Psicologia, Química, Geociências, Letras, Física, História, Morfologia, Patologia, Biologia e Matemática. Ao lado deste, havia os centros de Tecnologia, de Ciências Biomédicas, de Artes, de Ciências Rurais e de Educação Física, conforme proposto no modelo da USAID. Já, as Ciências Pedagógicas, apenas com o departamento de Educação, tinham um centro só para elas. Nesta mudança, a responsabilidade pela formação biológica e docente do licenciado em História Natural, da UFSM, que era da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL), passou para o Departamento de Biologia, e a outros Departamentos, vinculados ao Centro de Estudos Básicos (CEB). As aulas das matérias básicas do curso que eram ministradas em Institutos distintos 1, em 1965, passaram a ser cursadas por docentes do Departamento de Biologia. Disciplinas referentes à Física, Química, Estatística, como também Geologia e Paleontologia oferecidas na FFCL, passaram a ser ministradas por docentes dos departamentos, respectivamente, de Física, Química, Estatística e Geociências. Por sua vez, as disciplinas pedagógicas e complementares do curso de História Natural passaram a ser responsabilidade do Departamento de Educação. 1 Disciplinas de Biologia era ministrada no Instituto de Histologia, Botânica no Instituto de Ciências Naturais, Zoologia no Instituto de Parasitologia e Mineralogia no Instituto de Solos e Culturas.

4 Para Silva (2004, p.73), a Reforma Universitária, ao separar os cursos básicos de Ciências Exatas e Naturais dos cursos de Letras e Ciências Humanas, dando autonomia aos primeiros, apenas representou o desfecho de um processo em curso há algum tempo. Numa época em que as ciências já se desenvolviam em organizações de pesquisa, financiadas pelo complexo industrial-militar em franca expansão, esse modelo era incompatível com a permanência das ciências empírico-formais na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras. No âmbito da Pós-Graduação, é necessário destacar o acordo entre o MEC e a Organização dos Estados Americanos (OEA), para a instalação do sistema de Pós-Graduação em Educação, nível de Mestrado (Área Curricular), na UFSM, em 1969. Esta foi a primeira Pós-Graduação em Educação no Brasil a reunir educadores de todos os países latinoamericanos, com o objetivo de ensejar a oportunidade, às nações integrantes da OEA, de aperfeiçoar elementos docentes, tornando-os altamente capacitados no setor de Educação (UFSM, 1973, p.43). De acordo com Vieira (2009, p.103), outro desdobramento importante da Reforma é a determinação de que todos os professores do ensino de segundo grau, denominação utilizada no período, deveriam ser formados em nível superior. Contudo, naquele momento, a insuficiência de professores era tão grande, que normas complementares (Art. 16 do Decreto- Lei nº 464/69) argüiram que, não havendo professores e especialistas formados em nível superior, exames de suficiência 2 realizados em instituições oficiais de ensino superior, poderiam conferir esta habilitação. Entretanto, estes exames eram ineficientes, pois as taxas de reprovação eram elevadas e demonstravam a desqualificação destes profissionais. É nesse contexto que aparecem os cursos de Licenciatura Curta (ou de 1º Ciclo), na década de 1970 3. Estes tinham por objetivo substituir os exames de suficiência, formar docentes polivalentes 4 para suprir a insuficiência de professores, e atender a reivindicação de vagas no ensino superior, com uma formação rápida e menos custosa ao Estado (CUNHA, 2002, p.180). Com relação ao curso de Licenciatura em Ciências e Matemática de Curta Duração, a Resolução CFE 30/74 estabeleceu o Currículo Mínimo e tornou obrigatória a sua adoção como modelo único de licenciatura na área. Diante destas diretrizes, a UFSM adotou o curso de Ciências Licenciatura Curta a partir de 1977, e tornou extinto o curso de Ciências 2 Os exames de suficiência eram realizados pela Faculdade de Filosofia das instituições. Tinham por objetivo conceder licenças especiais para estudantes universitários exercerem o magistério enquanto faziam seus cursos, e licenças para portadores de diploma de nível superior ministrarem aulas de matérias cujos conteúdos fossem constatados em seus cursos específicos, de modo a atender a carência de professores. (TAVARES, 2006, p.55). 3 O curso de Licenciatura Curta foi criado, inicialmente, em 1965, mas em caráter emergencial. 4 A formação polivalente permitia aos professores ministrar aulas de Ciências Naturais, Biologia, Física, Química e Matemática.

5 Biológicas - Licenciatura Plena. Em 1979, a UFSM optou pelo retorno da Licenciatura Plena, mas não extinguiu a Licenciatura Curta que coexistiu até 1991. III. Considerações finais Neste breve trabalho, identificamos alguns elementos do contexto sócio-histórico, especialmente, do percurso da Universidade, os quais se entremeiam ao cotidiano do curso de Ciências Biológicas de forma não verticalizada. Frente às mudanças provindas com a Reforma Universitária (1968), a instituição fez opções e interpretações que consideraram suas especificidades, possibilidades e limitações. Além disso, é preciso considerar que o próprio corpo docente do curso de graduação prioriza alguns valores, saberes e concepções de formação, que tornam, por vezes, tornam algumas diretrizes nacionais pouco exitosas. Deste modo, na continuação desta pesquisa, realizaremos entrevistas com ex-docentes e ex-coordenadores do referido curso, na tentativa de compreender como as continuidades, rupturas e ambigüidades que ocorrem no interior da instituição universitária, e seus entrelaçamentos com processos externos ao estabelecimento, legitimaram determinados projetos de formação docente. Referências Bibliográficas ARANHA, M. L. A. História da Educação. 2 ed. São Paulo: Moderna, 1996. CUNHA, L.A. Ensino superior e universidade no Brasil In: LOPES, E.M.T., FARIA FILHO, L.M., VEIGA, C.G. (Orgs.). 500 anos de educação no Brasil. 3.ed, 1.reimp. Belo Horizonte: Autêntica. 2002, p.151-204. ROMANELLI, O. História da Educação no Brasil: (1930/1973). 36ed. Petrópolis: Vozes, 2010. SILVA, F.L. A universidade em tempos de conciliação autoritária. Rev. USP [online]. 2004, n.60, pp. 68-77. ISSN 0103-9989. VIEIRA, S.L. Reforma universitária: ecos de 1968. MANCEBO, D. et.al. (Orgs.). Reformas da educação superior: cenários passados e contradições do presente. São Paulo: Xamã, 2009, p.93-112. TAVARES, D.A.L. Trajetórias da formação docente: o caso da licenciatura curta em Ciências das décadas de 1960 e 1970. 2006. 193f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal Fluminense. Niterói, 2006.