PERFIL SOCIODEMOGRÁFICO DOS CUIDADORES INFORMAIS DE PACIENTES ATENDIDOS EM AMBULATÓRIO DE TERAPIA OCUPACIONAL Aline Cristina Benedito Faculdade de Terapia Ocupacional Centro de Ciências da Vida aline.cb2@puc-campinas.edu.br Profa. Dra. Maria Luisa Gazabim Simões Ballarin Saúde Mental, Terapia Ocupacional e Perspectivas de Formação Centro de Ciências da Vida mlballarin@puc-campinas.edu.br Resumo: O objetivo deste estudo foi caracterizar o perfil sociodemográfico dos cuidadores informais que acompanham os pacientes atendidos no Ambulatório de Terapia Ocupacional. Trata-se de um estudo descritivo, exploratório e retrospectivo de natureza quanti-qualitativa no qual se pode ampliar a compreensão acerca do perfil sociodemográfico e clínico de CI através da aplicação de um questionário sociodemográfico. Os resultados obtidos demonstraram predomínio de 77% das mulheres como cuidadoras, no qual 63% eram casadas e 67% eram mães dos pacientes. Quanto à ocupação, 50% exerciam somente as atividades do lar e possuíam uma idade média de 44,5 anos, além de 97% apoiarem-se em alguma crença como uma maneira de confortar-se. Evidenciou-se ainda, aspectos relacionados à sobrecarga dos CI, como alterações físicas e psicossociais, além de abdicações de atividades extradomiciliares (trabalho e lazer), dificuldades na realização das Atividades de Vida Diária - AVD dos familiares, entre outras alterações no cotidiano. Por fim, constatou-se que fatores relativos ao papel que os CI desempenham durante o cuidado do familiar são descritos como tarefas desgastantes e complexas, todavia observouse também o sentimento de resiliência entre alguns CI, corroborando para a compreensão do porque estes indivíduos não apresentaram qualquer alteração no cotidiano. Além disso, buscou-se reafirmar a importância da inserção de ações e projetos governamentais direcionadas ao CI e também de intervenções multiprofissionais, como as dos terapeutas ocupacionais, que visam à reorganização do cotidiano e o cuidado psicossocial. Palavras-chave: perfil sociodemográfico, cuidadores, ambulatório de terapia ocupacional. Área do Conhecimento: Ciências da Saúde - Fisioterapia e Terapia Ocupacional CNPq. 1. INTRODUÇÃO Na atualidade, os Cuidadores Informais ou familiares são considerados como recursos a serviço do indivíduo adoecido, mas não necessariamente como um alvo de atenção da equipe de saúde. Neste sentido, faz-se necessário enfatizar a importância de seu o papel, considerando-o também, como uma pessoa que pode estar necessitando de auxílio e apoio para o desempenho de sua função de cuidar e, portanto se caracterizam como pessoas merecedoras de a- tenção e cuidados dos profissionais de saúde [1]. Alguns estudos [2, 3] apontam para o fato de que o CI deveria receber suporte, não apenas para aprender a cuidar do paciente, mas, sobretudo, para enfrentar, compreender e compartilhar a situação de doença e/ou deficiência, e conseguir lidar mais adequadamente com seus próprios problemas, conflitos, medo e aumento das responsabilidades, principalmente, por se observar que cuidadores de doentes crônicos apresentam prejuízos alarmantes. O termo Cuidador Informal - CI designa alguém da família ou não, que assumiu a tarefa de cuidar sem remuneração e sem possuir formação profissional específica e/ou preparo técnico para desempenhar atividades de caráter assistencial diário, caracterizando-se como figura principal no acompanhamento do paciente que, no caso, apresenta incapacidades temporárias ou definitivas. São inúmeras e extensas as atividades desempenhadas por Cuidadores no cotidiano, por isso mesmo, alguns estudos [4, 5] descrevem que os cuidadores vêm manifestando sintomas como: estresse, depressão, distúrbios do sono, entre outros, evidenciando sobrecarga. Esta sobrecarga pode acarretar problemas físicos, psicológicos, emocionais, sociais e financeiros que acaba por afetar o bem-estar do paciente e dele próprio. Assim, é evidente que as
atribuições do CI decorrentes do ato de cuidar interfere em aspectos de sua própria vida pessoal, familiar, laboral e social, predispondo-os a conflitos e trazendo impactos no seu cotidiano e na sua qualidade de vida. Os estudos sobre o perfil de CI evidenciam que na maioria das vezes são mulheres, casadas, que convivem com o paciente no próprio domicílio, não exercem atividades remuneradas e possuem grau de parentesco com o paciente que assistem. Além disso, tais estudos demonstram que os cuidadores desempenham a função de cuidar, dirigindo a atenção para pessoas que apresentam diferentes problemas de saúde, tais como: doença pulmonar crônica obstrutiva, câncer em estado terminal, Alzheimer, paralisia cerebral, entre outras [1, 3, 6, 7]. Com base nos aspectos descritos, o presente estudo buscou caracterizar o perfil sociodemográfico dos cuidadores informais que acompanham os pacientes atendidos no Ambulatório de Terapia Ocupacional de uma Universidade do interior do estado de São Paulo. Partimos do pressuposto que a identificação do perfil dos CI pode subsidiar o planejamento de ações que atendam suas necessidades de saúde e minimizem o impacto que a função de cuidar pode acarretar em seus cotidianos. 2. MÉTODO Trata-se de um estudo descritivo, exploratório e retrospectivo de natureza quanti-qualitativa em que se buscou ampliar a compreensão acerca do perfil sociodemográfico e clínico de Cuidadores Informais que acompanham pacientes atendidos no Ambulatório de Terapia Ocupacional, um serviço vinculado à Faculdade de Terapia Ocupacional de uma Universidade do interior do estado de São Paulo. Em relação à coleta dos dados, esta se deu no período de novembro de 2013 a março de 2014 após aprovação no Comitê de Ética sob o protocolo nº 0489/11. Os dados foram obtidos a partir da aplicação do Questionário sociodemográfico que continha questões abertas e fechadas, que compreendia as seguintes variáveis: sexo, idade, estado civil, nível de escolaridade, religião, grau de parentesco com o usuário do serviço, tempo de envolvimento com a função de cuidador, ocupação, etc. A amostra contemplou 30 CI que responderam ao Questionário sociodemográfico e que acompanhavam pacientes no referido serviço. Ressalta-se que a Ambulatório de Terapia Ocupacional é um serviço que presta atendimentos de caráter docente assistencial aos pacientes conveniados do Sistema Único de Saúde - SUS, cujo objetivo é recuperar, habilitar e restaurar indivíduos que apresentam diferentes problemáticas que acabam comprometendo, em algum nível a funcionalidade e/ou a realização das atividades cotidianas. Os dados obtidos subsidiaram a elaboração de um banco de dados que foi construído a partir de uma planilha no Excel e, posteriormente, foram sistematizados e organizados, recebendo tratamento estatístico descritivo simples e análise do discurso, particularmente considerando os resultados obtidos a partir das perguntas abertas contidas no questionário aplicado junto aos sujeitos de investigação. Tal análise baseou-se no referencial teórico pertinente à análise de discurso, considerando os objetivos. A utilização da análise de discurso possibilita a compreensão da estrutura do texto e o significado incorporado nele baseado no contexto temporal e ideológico em que foi produzido e em uma exploração minuciosa de seus aspectos subjetivos e simbólicos [8, 9]. Assim, o objeto de análise no item que se segue consistiu na averiguação dos discursos dos CI obtidos por meio dos questionários sóciodemográficos, além de suas características embutidas. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO A análise dos resultados revelou diferentes aspectos em relação ao perfil dos sujeitos investigados tais como: gênero, estado civil, escolaridade, religião, ocupação, grau de parentesco, bem como aspectos relacionados ao cotidiano dos cuidadores e ao cuidado que prestam. 3.1. Perfil sociodemográfico dos Cuidadores Informais Os resultados obtidos demonstraram predomínio de 77% das mulheres como cuidadoras, onde 63% e- ram casadas e 67% eram mães dos pacientes. Quanto à ocupação, 50% exerciam somente as atividades do lar e possuíam uma idade média de 44,5 anos, além de 97% apoiarem-se em alguma crença como uma maneira de confortar-se e buscar apoio e suporte emocional. Quanto ao tempo em que já vinham desempenhando a função de cuidar de seus familiares e/ou parentes constatou-se que 53% exerciam esta a função de 3 a 4 anos, conforme Figura 1.
Figura 1: Distribuição dos CI quanto ao tempo de cuidado Alguns estudos [10, 11,12] referem relação entre o tempo de desempenho da função de cuidar com o elevado desgaste do cuidador. Coincidindo com os resultados obtidos neste estudo, onde foi possível observar desgaste emocional e físico, além de ruptura no cotidiano e alterações no desempenho ocupacional dos cuidadores investigados. 3.2. O cuidar e o cotidiano dos CI A análise minuciosa do questionário sóciodemográfico evidenciou diferentes aspectos quanto ao cotidiano e a atividade de cuidar. Alguns cuidadores não referiram quaisquer dificuldades na realização do cuidado ou não referiram sentir-se sobrecarregados. Os relatos que se seguem ilustram esta perspectiva ela não dá trabalho, eu faço as coisas pra ela quando eu posso e quando dá tempo CI 30. Estudos [13,14] sobre cuidadores informais também obtiveram relatos semelhantes, ou seja, alguns CI quando investigados não relatavam sobrecarregar-se com o cuidado. Em parte esta condição pode estar associada à resiliência dos cuidadores. O estudo [15] define a resiliência como sendo a capacidade humana para enfrentar, vencer e ser fortalecido ou transformado por experiências de adversidade. Com relação às tarefas cotidianas desempenhadas pelos CI investigados constatou-se que as Atividades de Vida Diária (AVD) foram descritas como desgastantes, particularmente o banho/higienização, alimentação e mobilidade. [1, 17] descrevem que as atividades referentes ao suporte básico e as necessidades humanas são de fato, relatadas como desgastantes, convergindo com os resultados obtidos neste estudo. Com relação às atividades do cuidado estressantes, o autocuidado do familiar (higiene) e as transferências/locomoções de um ambiente ao outro foram as que consumiram maior esforço físico e mental, conforme se constata no relato de CI: [...] toda quarta feira tenho que acordar cedo para trazer meu filho para o tratamento é duro e cansa demais porque moro perto de Limeira, andar com ele é difícil. (CI 21) Do ponto da qualidade de vida dos cuidadores investigados, pode se dizer que as atividades sociais e de lazer foram comprometidas com a diminuição na intensidade da realização das mesmas. No âmbito da Terapia Ocupacional tais atividades são importantes para estruturação e composição do sujeito por possibilitarem a sensação de prazer e satisfação. De modo geral às atividades de lazer são definidas como atividades não-obrigatórias, de interesse do indivíduo, escolhidas livremente, e para as quais se sente motivado. Compreende-se que o prejuízo nestas atividades pode interferir negativamente na vida do cuidador, uma vez que as atividades de lazer propiciam o desenvolvimento pessoal e social dos indivíduos, além de permitirem o restabelecimento físico e emocional ocasionado pelas obrigações da vida cotidiana [18]. O estudo [19] propõe que seja implementada ações governamentais que possibilitem que o CI receba suporte das redes de apoio disponíveis, visando desta maneira amenizar o prejuízo da falta de atividades de lazer no cotidiano dos CI. Por fim, no que se refere às possíveis intervenções e estratégias da Terapia Ocupacional em relação aos CI, tem-se como perspectiva fomentar espaços de escuta ativa que possibilitem a expressão de angústia, implementar orientações que viabilizem a melhora de sua qualidade de vida, bem como de seu familiar, a partir de treinamentos que facilitem a mobilidade, a transferência e a realização de atividades de suporte humano básicas como higiene, alimentação, comunicação, entre outras. 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este estudo evidenciou que os cuidadores informais investigados neste trabalho eram prioritariamente
mulheres, casadas e mães dos pacientes. Além disso, exerciam somente as atividades do lar e tinham idade média de 44,5 anos. Envolvidas nas atividades de cuidado e do lar, deixavam de lado, especialmente, atividades de lazer e sociais e destacaram as dificuldades relativas à higiene e locomoção dos pacientes que acompanhavam como as mais desgastantes. Por fim, depreende-se que há necessidade de se investir em ações e intervenções dos profissionais da saúde dirigidas aos cuidadores a fim de que os mesmos minimizem as dificuldades presentes em SUS cotidianos, melhorando assim não somente a qualidade de vida do cuidador como também do paciente que este acompanha. 5. AGRADECIMENTOS Agradecemos a FAPIC/ Reitoria pela oportunidade que possibilitou a realização desta pesquisa e a PUC Campinas pela confiança e apoio. 6. REFERÊNCIAS [1] Araújo, L. Z. S.; Araújo, C. Z. S.; Souto, A. K B. A.; Oliveira, M. S. (2009). Cuidador principal de paciente oncológico fora de possibilidade de cura, repercussões deste encargo. Rev. Bras. Enferm., Brasília, vol. 62, n. 1, p. 32-37. [2] Floriani, C. A.; Schramm, F. R. (2006). Cuidador do idoso com câncer avançado: um ator vulnerado. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, vol. 22, n. 3, p. 527-534. [3] Beck, A. R. M.; Lopes, M. H. B. M. (2007). Cuidadores de crianças com câncer: aspectos da vida afetados pela atividade de cuidador. Rev. Bras. Enferm., vol. 60, n. 6, p. 670-675. [4] Floriani, C. A. (2004). Cuidador familiar: sobrecarga e proteção. Revista Brasileira de Cancerologia, vol. 50, n. 4, p. 341-345. [5] Martins, T.; Ribeiro, J. P.; Garret, C. (2003). Estudo de validação do questionário de avaliação da sobrecarga para cuidadores informais. Psicologia, Saúde e Doenças, vol. 4, n. 1, p 131-148. [6] Domingues, M. A. R. C.; Santos, C. F.; Quintans, J. R. (2009). Doença de Alzheimer: o perfil dos cuidadores que utilizam o serviço de a- poio telefônico da ABRAz Associação Brasileira de Alzheimer. O Mundo da Saúde, vol. 33, n. 1, p. 161-169. [7] Yamashita, C. H. et. al. (2010). Perfil sociodemográfico de cuidadores familiares de pacientes dependentes atendidos por uma unidade de saúde da família no município de São Paulo. Mundo saúde (Impr.), vol. 34, n. 1, p.20-24. [8] Mendes e Silva, M. A. S. Sobre a Análise do Discurso. (2005). Revista de Psicologia da UNESP, vol. 4, n. 1. [9] Rocha, D.; Deusdará, B. (2005). Análise de Conteúdo e Análise do Discurso. Alea, vol. 7, n. 2. [10] Santos, G. S.; Cunha, I. C. K. O. (2013). Perfil sociodemográfico de cuidadores familiares de idosos residentes em uma área de abrangência da Estratégia Saúde da Família no município de São Paulo. Saúde Coletiva, vol. 10, n. 60. [11] Valente, L. et al. (2013). Autopercepção de saúde em cuidadores familiares e o tipo de demência: resultados preliminares de uma amostra ambulatorial. Rev Bras Neurol., vol. 49, n.1, p. 13-19. [12] Zambrano-Dominguez, E. M.; Guerra-Martin, M. D.(2012). Formação do cuidador informal: relação com o tempo de cuidado de pessoas dependentes maiores de 65 anos.aquichán, vol.12, n.3, p. 241-251. [13] Luzardo, A. R.; Gorini, M. I. P. C.; Silva, APS. (2006). Características de idosos com doença de Alzheimer e seus cuidadores: uma série de casos em um serviço de neurogeriatria. Texto & Contexto Enfermagem, Florianópolis, vol. 15, n. 04, p. 587-94. [14] Garrido, R.; Menezes, P. R. (2004). Impacto em cuidadores de idosos com demência atendidos em um serviço psicogeriátrico. Rev. Saúde Pública, São Paulo, vol.38, n.6, p.835-841. [15] Melillo, A.; Ojeda, E. N. S. (orgs.). (2006). Resiliência: descobrindo as próprias fortalezas. Trad. Valério Campos. Porto Alegre: ARTMED. [16] Gonçalves, L. H. T.; Alvarez, A. M.; Santos, S. M. A. (2000). Os cuidadores leigos de pessoas idosas. In: Duarte, Y. A. O.; Diogo, M. J. A. (org.). Atendimento domiciliar: um enfoque gerontológico. São Paulo: Atheneu. p. 102-110. [17] Laham, C. F.(2003). Percepção de perdas e ganhos subjetivos entre cuidadores de pacientes atendidos em um programa de assistência domiciliar. 154 f. Dissertação (Mestrado em Ciências) Faculdade de Medicina da USP, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2003. São
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