CARACTERÍSTICAS DOS TECIDOS PERIIMPLANTARES Characteristics of the peri-implant tissues



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R. Periodontia - Dezembro 2008 - Volume 18 - Número 04 CARACTERÍSTICAS DOS TECIDOS PERIIMPLANTARES Characteristics of the peri-implant tissues Maurício Araujo 1, Norberto Francisco Lubiana 2 RESUMO O objetivo da presente revisão foi descrever algumas características dos tecidos periimplantares que envolvem o implante e são compostos de uma porção de tecido duro, o osso, e uma porção de tecido mole, a mucosa periimplantar. A mucosa periimplantar clinicamente saudável apresenta-se firme e com coloração rosa. Histologicamente, a mucosa periimplantar é constituída de dois tecidos: epitelial e conjuntivo. Este epitélio cobre a porção marginal do tecido conjuntivo periimplantar separando-o da superfície do implante por uma extensão de 2 mm e termina a uma distância de 1-1,5 mm da crista óssea. O tecido conjuntivo que separa a porção apical do epitélio da barreira e a crista óssea está em íntimo contato com a superfície do implante e contém fibras colágenas organizadas paralelamente à superfície do implante que se estendem da crista óssea a margem periimplantar. O tecido ósseo compacto e trabecular e a medula óssea que ocupa o espaço entre as trabéculas sofrem agressões durante os procedimentos de colocação dos implantes e passam por processos de regeneração pós-cirúrgica pela ação das células ósseas e de componentes da matriz óssea e de outras células e substâncias que chegam ao local. UNITERMOS: implantes, mucosa, epitélio, tecido conjuntivo, osso. R Periodontia 2008; 18:08-13. 1 Professor Associado do Departamento de Odontologia, Universidade Estadual de Maringá 2 Prof. de Histologia e Embriologia da Universidade Federal do Espírito Santo Recebimento: 07/10/08 - Correção: 02/11/08 - Aceite: 28/11/08 INTRODUÇÃO Os tecidos que envolvem o implante são chamados de periimplantares. Estes são compostos de uma porção de tecido duro, osso lamelar e medular, e uma porção de tecido mole, a mucosa periimplantar. Esta mucosa é análoga à gengiva que circunda dente e tem como função primordial a proteção do osso subjacente. A formação da mucosa periimplantar ocorre após a instalação de implantes em um único estágio ou após a reabertura de implantes submersos e instalação do pilar ou conector intermediário. Em resumo, imediatamente após a instalação do componente transmucoso e sutura (quando necessário), uma camada de coágulo, contendo uma rede de fibrina, eritrócitos e neutrófilos, é formada entre a mucosa e a superfície do implante. Durante as duas primeiras semanas de cicatrização este coágulo é substituído primeiramente por tecido de granulação e depois por tecido conjuntivo. Concomitantemente, o epitélio começa a migrar apicalmente. Após oito semanas de cicatrização, a mucosa periimplantar está formada (Berglundh et al. 2007). A possibilidade de ancoragem de próteses sobre implantes foi demonstrada experimentalmente por Branemark e colaboradores. Aspectos relaciona- 8

Fig. 1. Fotografia ilustrando o aspecto clínico da mucosa periimplantar ao redor coroa protética no incisivo central superior direito. dos com as condições clínica e radiográfica e análise ultraestrutural das células epiteliais, conjuntivas, ósseas e medulares foram relatados, evidenciando a ausência de alterações dignas de nota (Branemark et al. 1969). Outras pesquisas mostraram as possibilidades dos implantes receberem cargas funcionais na reabilitação do edentulismo parcial e total, evidenciando os benefícios da osseointegração (Zarb et al. 2002). Mucosa periimplantar Características clínicas A mucosa periimplantar saudável pode variar de aparência de acordo com as características da mucosa do rebordo onde foi instalado o implante. Dessa forma, quando um implante é instalado em um rebordo que permita que mucosa queratinizada envolva o implante, a mucosa periimplantar apresenta-se firme e com coloração rosa. (Fig. 1). Por outro lado, o implante, quando instalado em uma área sem mucosa queratinizada, vai apresentar uma mucosa periimplantar mais avermelhada e com certa mobilidade. A presença de uma quantidade mínima de mucosa periimplantar queratinizada não parece influenciar as condições de saúde dos tecidos moles ou o nível ósseo (Wennström et al. 1994, Bengazi, et al. 1996). Por outro lado, pode-se especular que a presença de uma mucosa periimplantar não-queratinizada fina ao redor do implante pode contribuir para o surgimento de recessão tecidual quando exposta à inflamação provocada por acúmulo de placa ou escovação traumática ou ainda, causar desconforto durante a higiene bucal (Salvi & Lang 2004). Assim como o tecido gengival ao redor dente, a mucosa periimplantar também exibe um sulco que se localiza entre a superfície do pilar intermediário ou prótese e a mucosa. Fig. 2. Fotomicrografia de um corte vestíbulo-lingual dos tecidos periimplantares. Note o epitélio oral em continuidade com o fino epitélio da barreira e o tecido conjuntivo subjacente em íntimo contato com a superfície do implante. Coloração; Ludewig; aumento original: 5x. Este sulco periimplantar pode variar muito em profundidade mesmo em condições onde o tecido está saudável. O local onde foi instalado o implante (região estética versus nãoestética), forma do implante, o tipo de superfície, a força utilizada e o design da prótese são fatores que dificultam o estabelecimento de uma profundidade padrão. Por outro lado, a extensão da penetração da sonda em tecidos periimplantares saudáveis quando realizada com força adequada (0,2N) indica o final da barreira epitelial e o início da barreira conjuntiva (Lang et al. 1994, Abrahamsson & Soldini 2006). Além disso, uma sondagem como força adequada também revela que a mucosa periimplantar saudável não sangra (Lang et al. 1994). Características histológicas As características estruturais da mucosa periimplantar foram descritas em diversos estudos e comparadas com o tecido gengival que existe ao redor de dentes (para revisão, consultar Berglundh 1993). Como ocorre no tecido gengival, a mucosa periimplantar é constituída de dois tecidos, epitelial e conjuntivo (Fig. 2). O tecido conjuntivo periimplantar é coberto na sua porção externa (voltada para a boca) por um epitélio pavimentoso estratificado queratinizado que está em direta continuidade com um fino epitélio não queratinizado com poucas camadas celulares voltado para a superfície do implante. Este último epitélio é análogo ao epitélio juncional que ocorre ao redor de dentes e é denominado barreira epitelial. Este epitélio está (i) ligado à superfície do implante via hemi-desmossomas (Gould et al. 1984), (ii) cobre o tecido conjuntivo periimplantar separando-o da superfície do 9

Fig. 3. Osso trabecular seco, mostrando espaços vazios entre as trabéculas que no indivíduo vivo são preenchidos por medula óssea adiposa ou hematopoiética. implante por uma extensão de 2 mm e (iii) termina a uma distância de 1-1,5 mm da crista óssea. A extensão de tecido conjuntivo que separa a porção apical do epitélio da barreira e a crista óssea é denominada barreira conjuntiva e é análoga a inserção a conjuntiva que ocorre ao redor de dentes. A barreira conjuntiva apresenta características diferentes da inserção conjuntiva. Enquanto no dente as fibras colágenas da inserção conjuntiva se inserem no cemento radicular, as fibras colágenas da barreira conjuntiva estão organizadas paralelamente a superfície do implante e estende-se da crista óssea a margem periimplantar. Estas dimensões da barreira epitelial e conjuntiva parecem representar dimensões biológicas mínimas que se estabelecem na mucosa periimplantar saudável (Berglundh & Lindhe 1996). Estas dimensões são independentes do sistema de implante e do tipo de instalação (um ou dois estágios) usado (Abrahamsson et al. 1999). A composição do tecido conjuntivo ao redor do implante difere da composição do tecido conjuntivo ao redor do dente pelo seu maior conteúdo de fibras colágenas e menor conteúdo de células e vasos sanguíneos. (Berglundh et al. 1991). Esta composição, no entanto, pode variar de acordo com o tipo de material e superfície do pilar ou conector intermediário com o qual o tecido conjuntivo está em direto contato (Abrahanssom et al. 1998, Wellander et al. 2008). Tecido ósseo O tecido ósseo é um tecido conjuntivo mineralizado cuja função principal é servir de suporte para estruturas como os músculos, cuja contração transforma os ossos em um sistema de alavancas, permitindo a locomoção. O tecido ósseo protege estruturas importantes como o cérebro, estruturas torácicas e armazena nos espaços entre as trabéculas do osso esponjoso a medula óssea vermelha, que produz células sanguíneas, ou a medula amarela ou adiposa. Nos ossos Fig. 4. Radiografia mostrando condensação óssea próxima ao implante após 8 meses de carga funcional, indicando remodelação óssea. maxilares na idade adulta prevalece a medula amarela entre os espaços trabeculares (Bhaskar 1989). Uma das funções mais importantes do tecido ósseo é a de servir como reserva de cálcio para o organismo, necessário para a contração muscular, adesão celular e a fisiologia de diversos sistemas orgânicos. A calcemia depende da liberação ou armazenamento de íons cálcio pela ação principalmente do paratormônio e calcitonina. Se a concentração de cálcio está baixa, o paratormônio é liberado, induzindo ação osteoclástica, aumentando os íons na circulação. Se as taxas estão altas, a calcitonina é liberada, estimulando osteoblastos que retiram cálcio da circulação para mineralizar o novo osso. Células ósseas Os osteoblastos, derivados de células mesenquimais, têm função principal de sintetizar e mineralizar a matriz orgânica do tecido ósseo (osteóide), composta de colágeno e proteínas não colagênicas. Osteocalcina, osteogenina, proteínas morfogenéticas ósseas, osteopontina e sialoproteina óssea são algumas das proteínas não colagênicas. Após a reabsorção óssea pelos osteoclastos algumas proteínas não colagênicas funcionam como fatores locais de indução para a formação de novos osteoblastos que irão produzir novo tecido ósseo. A implantação de matriz óssea desmineralizada em tecido subcutâneo e em tecidos musculares esqueléticos provocou a liberação das proteínas morfogenéticas ósseas induzindo formação de condroblastos nestas áreas, formando cartilagens que foram substituídas por tecido ósseo pelo 10

processo de ossificação endocondral (Urist et al. 1970). Osteoclastos são células multinucleadas formadas pela fusão de monócitos que, via corrente sanguínea chegam aos locais onde há a necessidade de reabsorção óssea. Os osteoclastos se unem à matriz óssea por meio de seu citoplasma periférico formando um compartimento fechado onde liberam substâncias que quebram as ligações químicas existentes entre o cálcio, fosfato e as hidroxilas da hidroxiapatita, e também as moléculas do colágeno e as proteínas não colagênicas da matriz orgânica, dissociando-as, provocando a desintegração do tecido ósseo. Os osteócitos são antigos osteoblastos que ficaram aprisionados dentro do tecido ósseo pela própria matriz. Apresentam prolongamentos citoplasmáticos formando uma rede de canalículos no interior do tecido ósseo. Os canalículos e os prolongamentos citoplasmáticos permitem a passagem de nutrientes e a drenagem dos produtos do metabolismo das células, sendo sua função a manutenção do tecido ósseo. As células osteoprogenitoras são derivadas de células mesenquimais indiferenciadas que irão completar a sua diferenciação em osteoblastos, quando necessário, para a formação de novo osso. Interface osso/implante A colocação de implantes requer o corte no tecido ósseo com instrumentos rotatórios gerando riscos de aquecimento e a destruição dos vasos sanguíneos existentes nos canais de Havers e de Volkman do osso cortical e de vasos existentes na medula óssea entre as trabéculas do osso esponjoso (Fig.3). Estes dois fatores levam sempre a formação de uma zona necrótica de osso que ficará em contato com a superfície dos implantes. Estudos revelaram que a exposição à temperatura crítica de 47 C durante 1 minuto é suficiente para causar necrose no tecido ósseo e que uma temperatura acima de 60 C poderá impedir a formação de tecido ósseo na interface osso-implante (Ericsson et al. 1994). Na clínica este problema pode ser evitado com o uso de irrigação copiosa com solução fisiológica durante o processo de perfuração óssea com as brocas utilizadas na implantodontia. Alem da área necrótica, haverá a formação de coágulo sanguíneo resultante do extravasamento de sangue devido ao corte dos tecidos. Uma rede de fibrina será formada pela ação de fatores da coagulação, por produtos liberados pelo sistema complemento, ativação das plaquetas, células inflamatórias e células endoteliais. Componentes liberados da matriz de fibrina iniciam o processo de reorganização e regeneração por meio do recrutamento de células inflamatórias e fibroblastos. As plaquetas liberam fatores de crescimento que contribuem para o recrutamento de osteoblastos. Monócitos e linfócitos presentes no local liberam leucotrienos, fatores de crescimento derivado de plaquetas e fator de crescimento transformador-â que também contribuem para o recrutamento de osteoblastos (Anderson, 1999). Fatores de crescimento liberados dos grânulos- das plaquetas são o sinal para atração de leucócitos, linfócitos, monócitos e macrófagos. O meio ambiente no local da ferida é caracterizado pela diminuição da tensão de oxigênio e do ph, condição necessária para a atividade dos polimorfonucleares e macrófagos. Inicialmente predominam os neutrófilos na área da ferida cirúrgica, porém em pouco tempo os macrófagos tornam-se as células mais numerosas. Estas células estão envolvidas com a degradação do coágulo por mecanismos de digestão fagocítica tanto extra como intracelular. Claramente os macrófagos podem alcançar a superfície do implante usando como apoio a rede de fibrina e podem ter um importante papel no desenvolvimento da interface osso-implante. A proliferação de novos vasos sanguíneos (angiogênese) traz os nutrientes e oxigenação necessários à diferenciação das células osteogênicas com a conseqüente deposição de tecido ósseo na superfície do implante denominada, osteogênese de contato. (Davies e Rosseini 1999). Uma micro camada de material amorfo, composto de glicoproteinas, e possivelmente também de proteoglicanas e fosfolipídios, medindo de 20 a 50 nanômetros é formada pelos osteobastos, entre o osso vivo e a superfície do implante (Albrektsson et al. 1986). Experimentos com cultura celular in vitro foram realizados para determinar os componentes desta camada amorfa. Difração elétrica de Raios X e espectrometria fotoeletrônica de Raios X revelaram a presença de cálcio, fosfato, oxigênio e sódio em sua composição. Estudos com eletroforese e auto-radiografias revelaram a presença de sialoproteina óssea e, em maior quantidade, de osteopontina. (Rosseini et al. 1999). Importante frisar que a presença de acúmulo bacteriano ao redor dos implantes ou na interface implante-abutment pode levar a inflamação e desorganização destes componentes teciduais e conseqüente perda de osso ao redor dos implantes.(duarte et al. 2006) Remodelação óssea A remoção de osso necrótico próxima ao implante é realizada pelos osteoclastos e novo tecido ósseo é produzido pelos osteoblastos. Quando a área de tecido necrótico e de coágulo é preenchida por novo tecido ósseo, é iniciado então o processo de remodelação que seguirá os parâmetros já bem conhecidos no tecido ósseo normal de todo o orga- 11

nismo. Osteoclastos promovem a reabsorção óssea na forma de túneis de reabsorção. Tecido de granulação prolifera acompanhando os osteoclastos, promovendo a limpeza dos produtos do metabolismo celular, o crescimento de vasos e a diferenciação de células mesenquimais em osteoblastos. Estes formam lamelas concêntricas de tecido ósseo por um processo incremental, até o fechamento do túnel. Permanecem no centro dos canais, vasos e endósteo, denominados de canais de Havers. Os sistemas de Havers, formados pelas lamelas concêntricas e canais de Havers, são uma constante no tecido ósseo compacto permitindo maior condensação do tecido ósseo para resistir às cargas nele aplicadas. Como as células ósseas necessitam de um alto gral de tensão de oxigênio e nutrientes para sobreviver, a remodelação tem também o papel de levar estes nutrientes à profundidade do tecido ósseo, por meio dos canais de Havers e também dos canais de Volkman que interligam os vasos dos sistemas de Havers. (Fig. 4). As finas trabéculas do osso esponjoso também sofrem remodelação, porém os osteoclastos fazem a reabsorção em forma de baias na superfície, sem a formação dos túneis de reabsorção já que a nutrição das trabéculas é possível apenas pela difusão dos nutrientes via canalículos ósseos formados pelos prolongamentos citoplasmáticos dos osteócitos (Ten Cate 2001). CONCLUSÃO Os tecidos periimplantares são constituídos de mucosa periimplantar e osso. Estes tecidos estão localizados ao redor do implante e tem como função primordial a proteção do osso subjacente (via mucosa periimplantar) e a sustentação do implante (via osso). A mucosa periimplantar é revestida de epitélio oral queratinizado em continuidade com um fino epitélio (barreira epitelial) lateral à superfície do implante. Entre o epitélio e o tecido ósseo, um tecido conjuntivo altamente colagenizado e pouco vascularizado se estabelece (barreira conjuntiva). O osso ao redor do implante é do tipo mineralizado e não-mineralizado. Este osso se liga a superfície do implante através de um processo chamado osseointegração que permite que o implante fique apto a sustentar a prótese e as cargas oclusais. ABSTRACT The aim of the present review was to describe some features characteristic of the peri-implant tissues. The periimplant tissues surround the implant and are made of hard tissue, bone, and soft tissue portions, peri-implant mucosa. Clinically, the healthy peri-implant mucosa is firm and exhibits a pink appearance. Histologically, the peri-implant mucosa is occupied by to 2 tissues: epithelial and connective. The epithelium covers the marginal portion of the peri-implant connective tissue which is separated from the implant surface by a length of 2 mm. The apical portion of the epithelium is located 1-1.5 mm from the bone crest. The connective tissue which separates the epithelium from the bone crest is in direct contact with the implant surface and contains collagen fibers running in a parallel course from the bone crest to the periimplant margin. The trabecular and compact bone tissue and the bone marrow which is located between the trabeculae are exposed to injury during the implant installation procedure. Subsequently, the bone tissue is regenerated through the action of bone cells and other cells, bone matrix components and, substances that penetrate the wound. UNITERMS: implants, mucosa, epithelium, connective tissue, bone. 12

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