O ENSINO JURÍDICO E OS MEIOS NÃO CONTENCIOSOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS



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Transcrição:

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 13 O ENSINO JURÍDICO E OS MEIOS NÃO CONTENCIOSOS DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS ANTÔNIO PEREIRA GAIO JÚNIOR WESLLAY CARLOS RIBEIRO Antônio Pereira Gaio Júnior Pós-doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, Doutor em Direito pela UGF, professor adjunto da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Jurista. Wesllay Carlos Ribeiro Doutorando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Mestre em Direito pela UNESA, professor assistente da Universidade Federal de Alfenas Campus Varginha

14 O ensino jurídico e os meios não contenciosos de solução de conflitos. Sumário: 1. Introdução; 2. Metodologia; 3. Do exame das matrizes curriculares; 4. Análise panorâmica e considerações; 5. Referências bibliográficas.

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 15 RESUMO O artigo analisa a oferta de disciplinas relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos nas matrizes curriculares dos cursos de graduação em Direito das trinta e uma maiores Instituições de Ensino Superior do País (dados do Relatório Técnico do Censo da Educação Superior 2008 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira INEP). Utiliza metodologia de estudo do tipo exploratório-descritiva e como estratégia a pesquisa documental. Como resultado observou-se que 53,8% das Instituições de Ensino Superior pesquisadas não oferecem disciplinas relacionadas à mediação, arbitragem e conciliação, 26,9% ofertam como disciplinas eletivas e apenas 19,2% ofertam alguma disciplina, como obrigatória, relacionada a temática da arbitragem, conciliação e mediação. A pouca oferta de disciplinas relacionadas ao mote apresenta-se em desacordo com o planejamento e estratégias traçadas para o Poder Judiciário pelo Conselho Nacional de Justiça CNJ. Palavras chave: Meios não contenciosos de solução de conflitos; Ensino jurídico; Mediação; Arbitragem; Conciliação.

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 17 1 INTRODUÇÃO As Diretrizes Curriculares Nacionais DCN para os curso de graduação em Direito, instituídas pela Resolução CNE/CES n.º 9, de 29 de setembro de 2004, além de estabelecer critérios para a implementação de eixos de formação fundamental, de formação profissional e de formação prática, dispõe, no art. 3º, que o curso de graduação em Direito assegure ao graduando adequadas condições de interpretar e valorizar os fenômenos jurídicos e sociais, por meio de uma atitude reflexiva e visão crítica e que tenha capacidade de contribuir para a prestação da justiça e do desenvolvimento da cidadania. O egresso do curso de graduação em Direito deve ter plenas condições de analisar os problemas e questões que impedem e dificultam o desiderato proposto pela DCN, além de ter condições de agregar ao ensino teórico a realidade vivenciada na militância jurídica. Neste ínterim, sabe-se que o maior problema da Justiça Brasileira é o grande número de processos que tramitam no Poder Judiciário, aliada a pouca ou quase nenhuma utilização pelas partes, antes de ingressar em Juízo (ou durante o desenvolvimento do processo), de métodos não contenciosos de solução de conflitos. Analisando os números do Poder Judiciário, segundo dados divulgados no Relatório Anual 2009, pelo Conselho Nacional de Justiça CNJ, somente na Justiça Estadual de primeiro grau há um acervo de 58.885.525 processos, o que demonstra um grande número de controvérsias aguardando alguma sentença judicial. O CNJ cuja função é o planejamento estratégico do Poder Judiciário (CRFB, 1988), tem apresentado mostras claras sobre a necessidade de fomento das iniciativas relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos. Neste sentido é o Movimento pela Conciliação (criado em 2006), que engloba todos os tribunais de Justiça, Federais e do Trabalho, com o objetivo de divulgar e incentivar a solução de conflitos por meio da cultura do diálogo, com vista a garantir maior celeridade e efetividade à Justiça. (CNJ, 2010, p. 186). A Recomendação n. 08 do CNJ (2007), est abelece que o Movimento pela Conciliação seja uma comissão permanente e define a necessidade de oferta de cursos de capacitação de conciliadores, magistrados e servidores, ressaltando a necessidade de uma educação jurídica voltada para a conciliação. Dentre as diversas ações apontadas pelo CNJ está a realização de parcerias com entidades representativas de classe, com empresas públicas e privadas e com órgãos públicos; criação de centrais de conciliação; realização de cursos técnicos e de

18 O ensino jurídico e os meios não contenciosos de solução de conflitos. mutirões conciliatórios no âmbito dos Tribunais. Para se ter uma idéia da importância desse movimento no ano de 2009 foi realizada a Semana Nacional de Conciliação no período de 7 a 11 de dezembro que resultou em mais 260 mil audiências e 120 mil acordos, e envolveram um total aproximado de 1 bilhão e cem milhões de reais. No mesmo ano, como parte do projeto Meta 2, foi organizada uma semana de conciliação específica compreendendo os processos distribuídos até 31/12/2005, obtendo como resultado mais de 69 mil audiências realizadas e mais de 25 mil acordos firmados, envolvendo 28 milhões de reais. Tais ações deixam evidentes a importância dos meios não contenciosos de solução de conflitos e como estes meios estão sendo utilizados pelo Poder Judiciário como estratégia para diminuir o número de processos. A atuação do profissional de Direito esta inegavelmente ligada à prática contenciosa que por sua vez se vincula à concepção intelectual de seus fundamentos conseguidos durante o curso de Direito. O ensino jurídico torna-se assim responsável, de certa maneira, pela cultura contenciosa disseminada na sociedade jurídica, e de maneira generalizada é ao ensino jurídico atribuído a ineficiência do processo de intelectualização dos profissionais focada em um elevado grau de abstração (FUX, 2000). A formação jurídica acadêmica do egresso do curso de Direito afeta a sua atuação na militância jurídica e neste caso perscrutando sobre o mote referido chegou-se a seguinte questão: as matrizes curriculares das Instituições de Ensino Superior que ofertam cursos de graduação em Direito estão contemplando disciplinas que estudem meios não contenciosos de solução de conflitos? A resposta a esta pergunta é de fundamental importância para que se possa analisar o cenário do ensino jurídico no país e para propor medidas e soluções para a alteração do cenário até aqui desenhado pelos egressos dos cursos de graduação em Direito. Outrossim, para responder a esta demanda tem o presente artigo o objetivo de analisar as matrizes curriculares dos cursos de graduação em Direito das trinta e uma maiores Instituições de Ensino Superior do Brasil, em número de alunos, conforme dados do Relatório Técnico do Censo da Educação Superior 2008 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP, para verificar se estão sendo oferecidas disciplinas que contemplem meios não contenciosos de solução de conflitos.

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 19 2. Metodologia Quanto à metodologia utilizada defineu-se a pesquisa desenvolvida como sendo de tipo exploratório-descritiva (APPOLINÁRIO, 2006). Tendo em vista o problema de pesquisa construído e considerando os objetivos deste artigo, caracteriza-se como exploratória pelo fato de ter como intuito principal a busca de um maior conhecimento sobre o oferecimento de disciplinas relacionadas a meios não contenciosos de solucação de conflitos, tais como mediação, arbitragem e conciliação. Para Gil (1999, p. 45), as pesquisas exploratórias visam proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Também caracteriza-se como descritiva quanto ao objetivo, uma vez que focaliza descrever o perfil do oferecimento de disciplinas, pelos cursos de graduação em Direito, relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos. Gil (1999, p. 70) afirma que a pesquisa descritiva tem como principal objetivo descrever características de determinada população ou fenômeno ou estabelecimento de relações entre as variáveis. O recorte escolhido (MARCONI, LAKATOS, 2006) para este estudo se serviu da definição do INEP, que no Relatório Técnico 2008, listou as trinta e uma maiores Instituições de Ensino Superior do País, levando em consideração o número de alunos matrículados. Como critério de inclusão utilizamos os seguintes parâmetros: estar entre as trinta e uma maiores instituições de ensino superior do Brasil, segundo o resumo técnico 2008 do INEP, que ofereçam curso de graduação em Direito e que disponibilizem os dados de suas matrizes curriculares em atendimento ao disposto na Portaria nº 2.864, de 24 de agosto de agosto de 2005, publicada no DOU, de 26 de agosto de 2005 do Ministério da Educação. Sendo assim foram analisadas, pelo aspecto nominal das disciplinas, as matrizes curriculares de vinte e seis Instituições de Ensino Superior. Por outro lado como critério de exclusão utilizou-se como parâmetro: Instituição de Ensino Superior que não ofereça curso de graduação em Direito ou que não disponibilize os dados de suas matrizes curriculares nos moldes da Portaria nº 2.864, de 24 de agosto de agosto de 2005, publicada no DOU, de 26 de agosto de 2005 do Ministério da Educação. Sendo assim não foram analisadas as matrizes curriculares de cinco Instituições de Ensino Superior, vez que quatro não disponibilizam as matrizes curriculares de seus

20 O ensino jurídico e os meios não contenciosos de solução de conflitos. cursos de graduação em Direito na forma preconizada pelo Ministério da Educação e uma não oferta o referido curso. 3. Do exame das matrizes curriculares Nas matrizes curriculares dos cursos de graduação em Direito das vinte e seis Instituições de Ensino Superior analisadas observou-se que a grande maioria -quatorze (53,8%) - não oferecem disciplinas relacionadas à mediação, arbitragem e conciliação. Trata-se de um número bastante significativo, pois demonstra que mais da metade das Instituições de Ensino Superior pesquisadas não tem nas matrizes curriculares dos seus cursos de graduação em Direito, disciplinas relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos. Vale relembrar que estas Instituições de Ensino Superior estão entre as maiores em números de alunos, com campi espalhados por diversos Estados do País e consequentemente colocando a cada semestre um número considerável de egressos no mercado de trabalho. Em sete (26,9%) das Instituições de Ensino Superior pesquisadas pode-se constatar a oferta de disciplinas eletivas relacionadas ao tema e em apenas em cinco (19,2%) das Instituições de Ensino Superior examinadas verificou-se a oferta de alguma disciplina, como obrigatória, relacionada à temática da arbitragem, conciliação e mediação. Dessas cinco que oferecem alguma disciplina relacionada a meios não contenciosos de solução de conflitos como obrigatória, três são Instituições de Ensino Superior privadas e duas públicas. GRÁFICO 1 Fonte: Relatório Técnico do Censo da Educação Superior 2008 INEP

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 21 Verificou-se também que nas Instituições de Ensino Superior que ofertam cursos obrigatórios relacionados a métodos de solução de conflitos o foco se mantém nas disciplinas relacionadas à Conciliação, Mediação e Arbitragem e apenas uma das cinco Instituições de Ensino Superior apurou-se a oferta de disciplina relacionada a Solução de Conflitos Trabalhistas. Já as Instituições de Ensino Superior que ofertam cursos optativos relacionados a métodos de solução de conflitos há uma variedade maior de abordagens de áreas com disciplinas como Arbitragem e Mediação, Mediação de Conflitos, Solução de Controvérsias Internacionais, Direito da Arbitragem, Métodos Alternativos de Solução de Conflitos e Arbitragem, Mediação e Conciliação. Quanto à localização geográfica das Instituições de Ensino Superior verificou-se que estão distribuídas por todo o País, sendo que o Sudeste concentra a maior parte com treze das vinte e seis pesquisadas, seguido pelo Sul onde se encontram sete Instituições, Nordeste com três, Norte com duas e Centro-oeste com uma. GRÁFICO 2 Fonte: Relatório Técnico do Censo da Educação Superior 2008 INEP

22 O ensino jurídico e os meios não contenciosos de solução de conflitos. Oito das Instituições de Ensino Superior pesquisadas são públicas e a maior parte, dezoito, são privadas. Quanto à forma de organização vinte e quatro são universidades e duas centros universitários. Uma dificuldade encontrada na realização da pesquisa foi com relação ao acesso às informações sobre a matriz curricular nos cursos de graduação em Direito. Notou-se que as Instituições de Ensino Superior não seguem um padrão para disponibilizar os dados em suas páginas na Internet e em alguns casos as informações não são claras ou estão em locais onde o pesquisador leva algum tempo para descobrir. 4. Análise panorâmica e considerações Os dados apurados demonstram que os cursos de graduação em Direito, de maneira geral, não privilegiam disciplinas relacionadas à temática das formas não contenciosas de solução de conflitos, sejam eles provenientes de Instituições de Ensino Superior pública ou privada. Os dados analisados demonstram a pouca ou quase nenhuma importância dada pela maioria dos cursos de graduação em Direito para os meios não contenciosos de solução de conflitos. A grande maioria dos cursos analisados não dedica sequer uma disciplina específica para cuidar da temática, outras dedicam apenas disciplinas optativas, cujo oferecimento acaba sendo sazonal de acordo com a opção dos alunos o que, levando em consideração a cultura contenciosa que predomina na militância jurídica, deve ocorrer de forma bastante rara. Ainda quanto aos cursos de graduação em Direito que ofertam disciplinas relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos estas são tratadas de forma generalizada como Mediação, Conciliação e Arbitragem, não havendo disciplinas especificas relacionadas à solução de conflitos familiares (prática bastante comum nos Tribunais), solução de conflitos trabalhistas (a exceção de uma Instituição de Ensino Superior que oferece esta disciplina como obrigatória) ou solução de conflitos internacionais (exceção de uma Instituição que oferta como disciplina optativa), especialmente no âmbito do Mercosul. A cultura da educação jurídica praticada pelos cursos de graduação em Direito se apresenta dissociada da realidade planejada como estratégica pelos Tribunais de Justiça que, motivados pelo Conselho Nacional de Justiça, têm dado cada vez mais espaço e importância aos meios não contenciosos de solução de conflitos. A educação jurídica precisa se adaptar a essa nova realidade, pois como principal atriz da formação dos futuros profissionais da área jurídica, precisa despertar os seus alunos para este novo tempo. Sem conhecimento sobre a matéria, sem discipli-

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 23 nas relacionadas a meios não contenciosos de solução de conflitos estarão sendo levados ao mercado de trabalho profissionais despreparados e desconectados com o atual momento. Não há mais espaço para culparmos somente o Judiciário pela morosidade na definição das demandas e é necessário que todos e cada um faça a sua parte para que tenhamos uma realidade jurídica mais justa e um Poder Judiciário mais condizente com as necessidades das pessoas e para isso é necessário que a educação jurídica volte à atenção para os meios não contenciosos de solução de conflitos e desperte nos graduandos a cultura da mediação e da resolução de conflitos sem a necessidade de depender exclusivamente de uma sentença judicial.

24 O ensino jurídico e os meios não contenciosos de solução de conflitos. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA APPOLINÁRIO, Fábio. Metodologia da Ciência: Filosofia e prática da pesquisa. São Paulo: Cengage learning, 2009. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, 05 de outubro de 1988. BRASIL, Ministério da Educação. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira. Resumo Técnico. Censo da Educação Superior 2008. Brasília: Ministério da Educação, 2009. BRASIL. Ministério da Educação. Parecer CNE/CES nº 8, de 31 de janeiro de 2007. Dispõe sobre carga horária mínima e procedimentos relativos à integralização e duração dos cursos de graduação, bacharelados, na modalidade presencial. BRASIL. Ministério da Educação. Parecer CNE/CES nº 184, de 7 de julho de 2006. Retificação do Parecer CNE/CES nº 329/2004, referente à carga horária mínima dos cursos de graduação, bacharelados, na modalidade presencial. BRASIL. Ministério da Educação. Portaria nº 2.864, de 24 de agosto de agosto de 2005.Publicada no DOU, de 26 de agosto de 2005. BRASIL. Ministério da Educação. Resolução CNE/CES n 9, de 29 de setembro de 2004. Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Direito e dá outras providências.

Antônio Gaio Júnior e Wesllay Carlos Ribeiro 25 CNJ. Conselho Nacional de Justiça. Relatório 2009. Disponível em: <www.cnj.jus.br>, acesso em 25 de abril de 2010. CNJ. Conselho Nacional de Justiça. Recomendação n. 08, de 27 de fevereiro de 2007. Recomenda aos Tribunais de Justiça, Tribunais Regionais Federais e Tribunais Regionais do Trabalho a realização de estudos e de ações tendentes a dar continuidade ao Movimento pela Conciliação. FUX, Luiz. O Novo Ensino Jurídico. Revista da EMERJ: revista da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, v. 3, n. 9, p. 174-179, 2000. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1999. MARCONI, Marina de Andrade. LAKATOS, Eva Maria. Metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 2006.