Estudos bio-ecológicos de Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae) com ênfase



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Transcrição:

Estudos bio-ecológicos de Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae) com ênfase em seu controle biológico. Camila P Maioralli a*, Giovanna G Fagundes a, Mohamed Habib a a Laboratório de Entomologia Aplicada (LEA), Departamento de Biologia Animal, Instituto de Biologia, UNICAMP, Rua Monteiro Lobato, 255 Campinas, SP, CEP 13083-862, Brasil. * Autor para correspondência: +55 19 3521 6330. cmaioralli@hotmail.com Palavras-chave: manejo de pragas, Primavera, Bacillus thurigiensis Título abreviado: Controle Biológico ABSTRACT Significant amount of the farmers of Barão Geraldo, Campinas, SP, works with floriculture. Primavera, one of the produced species, has been attacked by Euscirrhopterus sp., an insect pest controlled by pesticides. As this is a known non-sustainable practice, we look for another strategies, more sustainable, for pest management. The objective of this work was developing a management plan for Euscirrhopterus sp. based on biological control, through the analysis of its population flotation, the survey of its natural enemies and evaluation of its susceptibility to B. thurigiensis var. kurstaki. The occurrence of the insect was concentrated along the year, the potential predators were classified as generalists, and the insect was susceptible to B. thurigiensis var. kurstaki. These results can be applied as strategies of control that make the satisfactory and sustainable management of Euscirrhopterus sp. possible, potentiating the use of Integrated Pest Management programs. RESUMO

Parte significativa dos agricultores do distrito de Barão Geraldo, Campinas, SP, atua no ramo da floricultura. A Primavera, uma das espécies produzidas, tem sido atacada por Euscirrhopterus sp., praga controlada através de agrotóxicos. Dada a insustentabilidade desta prática, buscam-se estratégias mais sustentáveis para o manejo desta praga. Assim, este trabalho objetivou construir um plano de manejo de Euscirrhopterus sp. baseado em controle biológico, através da análise da sua flutuação populacional, levantamento da sua entomofauna de inimigos naturais e avaliação da sua susceptibilidade a B. thurigiensis var. kurstaki. A ocorrência do inseto praga mostrou-se concentrada durante o ano, os potenciais predadores levantados classificam-se como generalistas, e a praga mostrou-se susceptível a B. thurigiensis var. kurstaki. Estes resultados podem ser aplicados em estratégias de controle que garantam o manejo satisfatório e sustentável de Euscirrhopterus sp., possibilitando o emprego de programas de Manejo Integrado de Pragas. INTRODUÇÃO Atualmente, a floricultura tem recebido grande destaque como atividade econômica no Brasil, tanto em relação ao mercado interno quanto ao externo, ressaltando-se o crescimento das exportações (Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios, 2009). Essa atividade movimenta uma grande parcela da economia de vários estados brasileiros (Matsunaga, 1995) e sua evolução resulta em maior desenvolvimento social e econômico, através da geração de empregos diretos e indiretos (Castro, 1998). Parte significativa dos agricultores do Distrito de Barão Geraldo, Campinas, SP, atua no ramo da floricultura (Fagundes et al., 2007). Entre as várias espécies produzidas, estão plantas conhecidas popularmente como Primavera, pertencentes ao gênero Bougainvillea (Nyctaginaceae). 2

Apesar destas plantas serem rústicas e exigirem poucos cuidados, áreas de produção de Primavera do Distrito de Barão Geraldo têm sido atacadas seriamente por larvas do inseto desfolhador Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae). O controle deste noctuídeo tem sido realizado através do uso intensivo de agrotóxicos, já que esta praga é altamente voraz e, mesmo estando em baixas densidades, pode causar danos expressivos. Inúmeros estudos apontam o impacto ambiental e na saúde humana da agricultura convencional, baseada no uso de fertilizantes químicos e agrotóxicos, entre outras práticas (Ferraz, 1999; Gliessman, 2000; Matson et al., 1997). Assim, agriculturas de base ecológica podem se traduzir em alternativas mais sustentáveis, já que geram menor quantidade de externalidades negativas. Além disso, diminuem os custos de produção, o que contribui para viabilizar as atividades do pequeno produtor. As práticas empregadas nestas agriculturas alternativas também podem contribuir para a manutenção de insetos benéficos no agroecossistema, os quais podem ser empregados, por exemplo, em estratégias de controle biológico de pragas. Deste modo, este trabalho teve como objetivo geral a construção de uma proposta de plano de manejo da praga desfolhadora de Bougainvillea sp. (Nyctaginaceae), Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae). Teve-se como objetivos específicos: a análise da flutuação populacional Euscirrhopterus sp.; o levantamento de sua entomofauna de potenciais inimigos naturais; e a avaliação de sua susceptibilidade ao entomopatógeno Bacillus thurigiensis var. kurstaki. METODOLOGIA Área de estudo 3

Este estudo foi realizado numa propriedade rural do Distrito de Barão Geraldo, Campinas, SP (22º46 44.95 S, 47º03 22.53 O). A cada amostragem, tanto em relação à análise da flutuação populacional da praga como ao levantamento de sua entomofauna de potenciais inimigos naturais, foram consideradas somente as matrizes existentes na propriedade. Estas, por sua vez, não estiveram sob nenhum tratamento com inseticidas, sejam químicos ou biológicos, durante o período de estudo. Análise da flutuação populacional Euscirrhopterus sp. As amostragens foram realizadas quinzenalmente. A cada coleta foram sorteadas, de maneira aleatória, 20% do total de matrizes de Bougainvillea sp existente na propriedade, as quais já haviam sido previamente mapeadas. Cada uma destas teve um ramo amostrado em cada um dos quadrantes (Norte, Sul, Leste e Oeste), devido à diferença de radiação solar que incide sobre a planta em cada um destes pontos, o que resulta em crescimento diferenciado da copa em cada um deles (Tubelis, 1995). Em cada quadrante foi sorteado um extrato diferente (0 a 1 m; 1,01 a 1,4 m; 1,41 a 1,8 m) para a amostragem dos ramos, quanto à infestação por ovos e/ou larvas de Euscirrhopterus sp. Caso houvesse infestação no ramo amostrado, era realizada a contagem dos ovos ou larvas presentes no mesmo, possibilitando o cálculo da sua densidade. Os ramos amostrados correspondiam a ponteiros jovens, dada a observação da preferência do inseto praga por estes. Levantamento da entomofauna de inimigos naturais de Euscirrhopterus sp. Neste caso, também foram realizadas amostragens quinzenais. Os potenciais inimigos naturais foram coletados através de batidas de rede (45 cm de diâmetro) na vegetação espontânea ao redor das matrizes sorteadas, sendo mantido o esforço amostral a 4

cada coleta. Nas matrizes de Primavera também foi realizada coleta ativa, com frasco matador, baseada em observação visual. Em laboratório, foi realizada a triagem do material coletado e a separação dos insetos classificados como potenciais predadores, os quais foram conservados em frascos contendo álcool 70%. A identificação destes insetos foi realizada através do uso de chaves taxonômicas (Bland & Jaques, 1978; Borror et al., 1989; Buzzi, 2002) ao nível de família. Para o levantamento de parasitóides associados ao noctuídeo, foram coletadas larvas de Euscirrhopterus sp. em diferentes estádios de desenvolvimento, as quais foram mantidas em condições laboratoriais e observadas diariamente até atingirem a fase adulta. Oviposições também foram coletadas com tal propósito, sendo acompanhadas por todo o período de incubação até a eclosão larval ou emergência de espécimes desta categoria de inimigos naturais. Avaliação da susceptibilidade de Euscirrhopterus sp ao entomopatógeno Bacillus thurigiensis var. kurstaki. Por fim, a avaliação da susceptibilidade de Euscirrhopterus sp. a Bacillus thurigiensis var. kurstaki, proveniente do produto comercial Dipel PM, foi realizada para o estabelecimento dos valores de concentração letal mediana (CL 50 ) para larvas do último estádio. A partir da avaliação preliminar da susceptibilidade de larvas de Euscirrhopterus sp. realizada por Fagundes et al. (2006), foram estabelecidas concentrações separadas por um fator de progressão geométrica (q), para assim se estipular a faixa de concentrações a serem utilizadas nos bioensaios definitivos (Haddad, 1986). O cálculo da CL 50 foi baseado na metodologia proposta por Thompson (1947), adaptada por Habib & Andrade (1998), 5

através do uso do software Trimmed Spearman-Karber, versão 1.5 (U.S. Environmental Protection Agency, 2009). As larvas foram expostas ao consumo de folhas de Primavera tratadas previamente com o produto à base de Bacillus thurigiensis var. kurstaki, em potes plásticos, por 48 horas, nas concentrações estabelecidas. Estes foram mantidos em sala climatizada (25 ± 100C, 70 ± 10% U.R. e 12h de fotofase). Após este período, a mortalidade de cada estádio foi registrada, para posterior análise dos dados. Em todos os casos houve grupos controle, os quais foram alimentados com folhas de Primavera sem tratamento prévio com o entomopátógeno. RESULTADOS E DISCUSSÃO Análise da flutuação populacional Euscirrhopterus sp. Durante as amostragens, realizadas de maio de 2008 a maio de 2009, foram encontrados focos de larvas apenas em março e abril de 2009, enquanto no restante do ano não houve infestação por este inseto praga (Figura 1). A ausência de infestação durante grande parte do ano pode estar relacionada à diapausa, uma interrupção prolongada do crescimento dos insetos que ocorre sem levar em conta o ambiente, de modo que as condições ambientais favoráveis podem ou não prevalecer (Hickman et al., 2003). A diapausa é determinada geneticamente em cada espécie e é geralmente iniciada por um sinal específico, como o fotoperíodo. Estes sinais são uma previsão de que condições adversas irão surgir, fazendo com que o inseto entre nessa espécie de dormência, que só será finalizada por meio de outro sinal ambiental, como o retorno a uma temperatura favorável ou um evento de chuva após um período seco. Este 6

fato é reforçado por meio de dados preliminares, que apontaram ocorrência de infestação por este inseto praga apenas nos meses de março a abril de 2008. Densidade média de larvas de Euscirrhopterus sp. (número de indivíduos/planta) 250 200 150 100 50 0 mai/08 jun/08 jul/08 ago/08 set/08 out/08 nov/08 dez/08 jan/09 fev/09 Período de coleta (meses) mar/09 abr/09 mai/09 Figura 1. Flutuação populacional de Euscirrhopterus sp. em propriedade rural de Barão Geraldo, Campinas, SP, de maio de 2008 a maio de 2009. Além da flutuação populacional do inseto praga poder ter sido influenciada por fatores climáticos, ressalta-se também que, durante as amostragens, observou-se grande presença de vegetação espontânea no local de estudo, ao redor das matrizes de Primavera. A presença destas plantas pode contribuir para o aumento da biodiversidade na área produtiva. Deste modo, o inseto praga seria controlado não só pelos fatores climáticos, mas por uma ação conjunta entre eles e populações de inimigos naturais presentes nesta vegetação (Gliessman, 2000), sejam insetos ou outros grupos taxonômicos. Assim, seria interessante para o manejo da praga, uma certa manutenção da vegetação espontânea presente ao redor das matrizes de Primavera. A adoção desta prática, 7

ao menos no período em que há ocorrência de infestação, possibilitaria o favorecimento do controle natural de Euscirrhopterus sp. através de populações de seus inimigos naturais. Levantamento da entomofauna de inimigos naturais de Euscirrhopterus sp. Insetos predadores Os potenciais insetos predadores de Euscirrhopterus sp., coletados de março de 2008 a março de 2009, correspondem, em sua maioria, a insetos entomófagos generalistas (Tabela 1). Tabela 1. Potenciais predadores de Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae), coletados em propriedade rural de Barão Geraldo, Campinas, SP, no período de março de 2008 a março de 2009. Ordem Família Número de morfoespécies Pentatomidae 7 Hemiptera Reduviidae 3 Nabidae 2 Neuroptera Chrysopidae 1 Dermaptera Forficulidae 2 Mantodea Mantidae 3 Coleoptera Coccinelidae 6 A família mais representativa foi Pentatomidae (Hemiptera), seguida por Coccinelidae (Coleoptera). Nem todas as espécies de pentatomídeos são predadoras. As espécies entomófagas alimentam-se de lepidópteros e coleópteros. Já os coleópteros da família Coccinelidae tem como presas hemípteros, homópteros, lepidópteros, coleópteros e ácaros. Assim como os pentatomídeos, nem todos os coccinelídeos são predadores e, os que o são, atuam principalmente quando imaturos (Bland & Jaques, 1978; Parra et al., 2002). 8

Analisando as curvas de flutuação populacional das três morfoespécies mais abundantes de potenciais inimigos naturais de Euscirrhopterus sp. (Figura 2), de acordo com dados climáticos da região, pode-se observar que, considerando-se o número absoluto de indivíduos coletados, há maior ocorrência destes no período mais quente e chuvoso do ano, que compreende de setembro a maio. Isto é esperado devido à maior disponibilidade, nesse período, de alimento e abrigo, de modo geral, para estes insetos predadores, o que é representado pela vegetação espontânea. Pentatomidae (Hemiptera) MSP3 Número de indivíduos coletados 4 3 2 1 0 mar-08 abr-08 mai-08 Período de coleta (meses) Chrysopidae (Neuroptera) MSP1 Coccinelidae (Coleoptera) MSP1 jun-08 jul-08 ago-08 set-08 out-08 nov-08 dez-08 jan-09 fev-09 mar-09 Figura 2. Flutuação populacional das três morfoespécies de potenciais inimigos naturais de Euscirrhopterus sp. (Lepidoptera: Noctuidae) mais abundantes durante o período de março de 2008 a março de 2009. (MSP = morfoespécie) Foram observados, em laboratório, alguns inimigos naturais predando indivíduos de Euscirrhopterus sp. em suas diferentes fases do desenvolvimento. Adultos de Coccinelidae (Coleoptera) e larvas e adultos de Chrysopidae (Neuroptera) foram observados consumindo ovos de Euscirrhopterus sp., como já citado por Fagundes et al. (2006). Por 9

sua vez, indivíduos adultos de Vespidae (Hymenoptera) e Mantidae (Mantodea) foram observados consumindo larvas de diferentes estádios Euscirrhopterus sp. Ressalta-se que o método de coleta utilizado - método de varredura - não é eficiente para coletar outros potencias e/ou prováveis predadores de Euscirrhopterus sp.: bons voadores, como vespas, por exemplo, além de aranhas e até mesmos aves. Estes espécimes também podem contribuir para o controle natural da população do inseto praga. Insetos parasitóides Neste estudo também foi detectada a ocorrência de uma espécie de díptero parasitóide explorando larvas de Euscirrhopterus sp. Esta foi identificada como pertencente ao gênero Lespesia (Diptera: Tachinidae). Não foi observado parasitismo em ovos e em larvas do primeiro estádio desse lepidóptero fitófago. Assim, somente larvas do último estádio de Euscirrhopterus sp. apresentaram-se parasitadas e permitiram o total desenvolvimento dos imaturos do parasitóide, indicando maior preferência e adequação das larvas hospedeiras nos seus estádios intermediários de desenvolvimento. (Tabela 2). Tabela 2. Taxa de emergência de parasitóides do gênero Lespesia (Diptera: Tachinidae) obtidos a partir de diferentes estádios de desenvolvimento de Euscirrhopterus sp. Estádio de Euscirrhopterus sp. Taxa de parasitismo (%) Oviposições 0 Primeiro estádio larval 0 Último estádio larval 63 Os taquinídeos constituem-se em uma das maiores famílias que compõem a ordem Díptera e são facilmente reconhecidos devido à presença de cerdas no abdômen. Atacam vários grupos de insetos e, enquanto alguns representantes apresentam especificidade em relação ao hospedeiro, outros possuem uma ampla variedade de hospedeiros (Bland & 10

Jaques, 1978; Borror et al., 1989). Estes endoparasitóides podem ter como hospedeiros indivíduos pertencentes às ordens Coleoptera, Dermaptera, Diptera, Hemiptera, Hymenoptera, Lepidoptera, Mantodea, Orthoptera, e até mesmo alguns crustáceos terrestres (Parra et al., 2002). Os taquinídeos depositam seus ovos sobre o corpo do hospedeiro. Após a eclosão, as larvas destes parasitóides penetram no hospedeiro e passam a se alimentar de seus tecidos internos, até estarem prontas para empupação, quando deixam o hospedeiro, provocando sua morte (Borror et al., 1989). A alta taxa de parasitismo observada expressa uma boa eficiência do parasitóide no controle de Euscirrhopterus sp. Assim, destaca-se novamente que o manejo adequado da vegetação espontânea pode contribuir para o controle natural de Euscirrhopterus sp., já que também pode propiciar a manutenção de parasitóides no agroecossistema, além dos outros inimigos naturais desta praga mencionados anteriormente. Avaliação da susceptibilidade de Euscirrhopterus sp. ao entomopatógeno Bacillus thurigiensis var. kurstaki (Btk). Os bioensaios realizados em laboratório indicaram a susceptibilidade de Euscirrhopterus sp. ao produto comercial Dipel PM, produto microbiano a base de Btk. A mortalidade no último estádio larval de Euscirrhopterus sp. variou em função da concentração do inseticida microbiano presente em folhas de Primavera oferecidas às larvas. As maiores concentrações foram responsáveis pelos maiores níveis de mortalidade, e todos os tratamentos ocasionaram efeitos letais superiores ao obtido no grupo não tratado com o produto à base de Btk (Figura 3). A concentração letal mediana (CL 50 ) foi calculada como 0,24 g/l, com intervalo de confiança de 0,19 a 0,29 g/l. 11

A atividade patogênica de produtos a base de Btk já foi constatada em mais de 100 espécies de lepidópteros (Navon, 1993), Todavia, a susceptibilidade varia em função de uma série de fatores, como estágio de desenvolvimento, hábito alimentar, ciclo de vida, comportamento, contato prévio com o patógeno e variabilidade genética (Habib, 1968; McGaughey & Johnson, 1987; Amaral Filho & Habib, 1993; Navon, 1993; Ali et al., 2004). Média de mortalidade larval de Euscirrhopterus sp. (%) 120 100 80 60 40 20 0 te 0,01 0,04 0,16 0,63 2,5 Concentração de produto microbiano a base de Btk (g/l) Figura 3. Efeito da concentração de produto microbiano a base de Btk na mortalidade de larvas de último estádio de Euscirrhopterus sp. Barras verticais de cada ponto representam o erro padrão.(te = testemunha) CONCLUSÕES A ocorrência de Euscirrhopterus sp. apresentou-se concentrada durante o ano, seus potenciais predadores levantados foram insetos entomófagos generalistas, e o inseto praga mostrou-se susceptível a Btk. Estes resultados podem ser aplicados em estratégias de controle que garantam o manejo satisfatório e sustentável de Euscirrhopterus sp. Assim, seria possível o emprego de programas de Manejo Integrado de Pragas, caracterizado pela consonância dos métodos 12

de controle com princípios ecológicos, econômicos e sociais, visando interferir o mínimo possível no agroecossistema. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios. 2009. Floricultura: Exportações crescem 6%, para US$ 30,7 milhões. http://www.apta.sp.gov.br/noticias.php?id=3097 Ali MI, Young SY & McNew RC. 2004. Host plant influence on activity of Bacillus thuringiensis Berliner against lepidopterous pests of crops. Journal of Entomological Science, 39 (3): 311-317 Amaral Filho BF & Habib MEM. 1993. Efeito da variabilidade genética de Anagasta kuehniella na resposta de suas larvas a infecções causadas por Bacillus thuringiensis var. kurstaki. Revista de Agricultura, 68 (1): 89-98 Bland RG & Jaques HE. 1978. How to know the insects. McGraw-Hill Science, Dubuque, Iwoa: 432 p Borror DJ, Triplehorn CA & Johnson NF. 1989. An introduction to the study of insects. Saunders College Publishing, Philadelphia, Pennsylvania: 875 p Buzzi ZJ. 2002. Entomologia Didática. Ed UFPR, Curitiba, Brasil: 348 p Castro CEF. 1998. Cadeia produtiva de flores e plantas ornamentais. Revista Brasileira de Horticultura Ornamental, 4 (1/2): 1-46 Fagundes GG, Oliveira M, Heinrich JM & Habib MEM. 2006. Biologia e controle biológico de Euscirrhopterus sp (Lepidoptera: Noctuidae) em Bougainvillea sp (Nyctaginaceae) em Barão Geraldo, Campinas, SP [Resumo] 1º Congresso de Extensão Universitária da Unicamp, Caderno de Resumos. Campinas, Brasil: 79 13

Fagundes GG; Caraça RA, Lima AL, Lins DBS, Ferraz JMG & Habib MEM. 2007. Agricultura Familiar: Caracterização de agroecossistemas no Distrito de Barão Geraldo, Campinas, SP. Revista Brasileira de Agroecologia, 2 (2): 187-190 Ferraz JMG. 1999. A insustentabilidade da revolução verde. Informativo EMBRAPA Meio Ambiente, 26 (2): 3 Gliessman SR. 2000. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Ed. Universidade, Porto Alegre, Brasil: 653 p Habib MEM. 1968. Histophatological studies on the effect of Bacillus thuringiensis Berliner, on the mediterranean flour moth, Anagasta kuehniella Zeller. Dissertação de Mestrado em Entomologia da Faculdade de Agronomia da Universidade de Alexandria. Alexandria, Egito: 178 p Habib MEM & Andrade CFS. 1998. Bactérias Entomopatogênicas. In: Alves SB. (ed.). Controle microbiano de insetos. Editora ESALQ, São Paulo, Brasil: 383-446 Haddad ML. 1986. Análise de próbites. In: Alves SB. (ed.). Controle microbiano de insetos. Manole, São Paulo, Brasil: 374-383 Hickman CP, Roberts LS & Larson A. 2003. Princípios integrados de Zoologia. Ed Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, Brasil: 848 p Matson PA et al. 1997. Agricultural intensification and ecosystems properties. Science, 277 (5325): 504-509 Matsunaga M. 1995. Floricultura como alternativa econômica na agricultura. Informações econômicas, 25 (11): 94-98 McGaughey WMH & Johnson DE. 1987. Toxicity of differents serotypes and toxins of Bacillus thuringienis to resistant and susceptible Indianmeal moths (Lepidoptera: Pyralidae). Journal of Economic Entomology, 80 (6): 1122-1126 14

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