ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. POSSIBILIDADE. ENTES FEDERATIVOS.
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- Estela Vilanova Rodrigues
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1 Apelação Cível/Reexame Necessário - Turma Espec. III - Administrativo e Cível Nº CNJ : ( ) RELATOR : Desembargador(a) Federal ALCIDES MARTINS APELANTE : MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO E OUTRO PROCURADOR PROCURADOR DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO - RJ E : OUTRO APELADO : VANESSA DA ROCHA PIRES DEFENSOR PUBLICO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - CURADOR ESPECIAL ORIGEM : 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro ( ) EMENTA ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE. ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. TRATAMENTO MÉDICO. POSSIBILIDADE. ENTES FEDERATIVOS. SOLIDARIEDADE. HONORÁRIOS. 1. A devolução cinge-se à legitimidade passiva ad causam dos entes federativos, ao cabimento da condenação dos réus a prestar tratamento oncológico a autora, portadora de neoplasia maligna de mama com metástase óssea, bem como à razoabilidade do valor fixado a título de honorários advocatícios. 2. O art. 196 da Constituição da República assevera que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma do art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços que garantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. 3. Embora o Poder Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera das políticas públicas, deve buscar a efetividade da norma constitucional e a fiscalização do seu cumprimento, ainda que para assegurar o seu mínimo existencial, qual seja, as condições básicas da existência humana. 4. Dentro do critério da reserva do possível, ao Judiciário caberá determinar a efetivação da norma constitucional pelo Estado, dentro de sua viabilidade financeira e desde que este se encontre omisso. 5. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Agravo Regimental na Suspensão da Tutela Antecipada nº 175, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, assentou a possibilidade de, após a análise minuciosa das circunstâncias de cada caso concreto e a realização de juízo de ponderação, o Poder Judiciário garantir o direito à saúde por meio do fornecimento de medicamento ou tratamento indispensável para o aumento de sobrevida e a melhoria da qualidade de vida do paciente da rede pública de saúde. 6. Em se tratando de paciente com neoplasia maligna, a Lei nº /2012 prevê que paciente tem direito de se submeter ao primeiro tratamento de quimioterapia e radioterapia no SUS no prazo de até 60 dias. 7. Na hipótese vertente, a autora comprovou seu diagnóstico de neoplasia maligna de mama com metástase óssea (fl. 20) em unidade municipal vinculada ao SUS, assim como seu cadastramento no SISREG em 27/03/2014, com indicação de início de tratamento com urgência. 8. Em descompasso com a previsão ínsita no art. 2º da Lei nº /2012, somente obteve o agendamento da consulta, em razão da antecipação dos efeitos da tutela, em 02/05/2014, iniciando as sessões de radioterapia em 15/05/2014, de acordo com o ofício nº 477/DGHMS/RJ (fl. 69), não havendo, contudo, que se confundir a repercussão do fato consumado com a falta de interesse de agir e a consequente perda de objeto. 9. A parte não postula qualquer tratamento médico ou medida que não esteja ao alcance das disponibilidades 1
2 materiais e financeiras dos réus, sendo certo, ainda, que o cumprimento da tutela jurisdicional pleiteada não importa qualquer dispêndio adicional, alheio ao regular desempenho do serviço médico que já é regularmente prestado. 10. Não prospera a alegação do Município e do Estado no sentido de cabimento da reforma da sentença em relação aos honorários advocatícios, arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa atualizado (R$ ,00), a ser rateado entre ambos (excluída a União, não condenada em ônus de sucumbência) e revertido à Defensoria Pública da União, eis que em consonância com o art. 20, 4º, do CPC /73, em vigor na data da prolação da sentença. 11. Remessa e apelações improvidas. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas: Decidem os membros da 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, negar provimento à remessa e aos recursos, na forma do voto do Relator. Rio de Janeiro, de de 2017 (data do julgamento). ALCIDES MARTINS RIBEIRO FILHO Desembargador Federal Relator 2
3 Apelação Cível/Reexame Necessário - Turma Espec. III - Administrativo e Cível Nº CNJ : ( ) RELATOR : Desembargador(a) Federal ALCIDES MARTINS APELANTE : MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO E OUTRO PROCURADOR PROCURADOR DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO - RJ E : OUTRO APELADO : VANESSA DA ROCHA PIRES DEFENSOR PUBLICO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - CURADOR ESPECIAL ORIGEM : 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro ( ) RELATÓRIO Trata-se remessa ex officio e de apelações interpostas pelo MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO e pelo ESTADO DO RIO DE JANEIRO objetivando a reforma da sentença (fls. 125/135) que, nos autos da ação ordinária ajuizada por VANESSA DA ROCHA PIRES em face da União Federal, do Estado do Rio de Janeiro e do Município do Rio de Janeiro, ratificou a tutela anteriormente deferida (fls. 44/45) e julgou o pedido procedente, para condenar os entes federativos, solidariamente, a viabilizar a parte autora a fruição do direito ao acesso à saúde, especialmente a radioterapia, bem como todo o tratamento oncológico adequado às suas necessidades, condenando o Estado e o Município ao pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa atualizado, a ser rateado entre ambos e revertido à Defensoria Pública da União, na forma dos arts. 20, 4º e 23 do CPC. Em suas razões (fls. 164/175), o Município do Rio de Janeiro aduz, em síntese, sua ilegitimidade passiva ad causam, ante a impossibilidade de realizar qualquer tratamento relacionado à oncologia. Sustenta, ainda, que a condenação em honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.250,00 (mil duzentos e cinquenta reais), é excessiva. Por sua vez, o Estado do Rio de Janeiro apela, às fls. 176/182, alegando, em resumo, o cabimento da redução do valor da condenação do Estado a título de honorários advocatícios. Contrarrazões, às fls. 188/199, pela manutenção da sentença. Parecer do Ministério Público Federal, às fls. 206/211, pelo improvimento dos recursos. É o relatório. Peço dia para julgamento. ALCIDES MARTINS RIBEIRO FILHO Desembargador Federal Relator 1
4 Apelação Cível/Reexame Necessário - Turma Espec. III - Administrativo e Cível Nº CNJ : ( ) RELATOR : Desembargador(a) Federal ALCIDES MARTINS APELANTE : MUNICIPIO DO RIO DE JANEIRO E OUTRO PROCURADOR PROCURADOR DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO - RJ E : OUTRO APELADO : VANESSA DA ROCHA PIRES DEFENSOR PUBLICO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO - CURADOR ESPECIAL ORIGEM : 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro ( ) VOTO Conheço da remessa e dos recursos, eis que presentes seus pressupostos de admissibilidade. Conforme relatado, a devolução cinge-se à legitimidade passiva ad causam dos entes federativos, ao cabimento da condenação dos réus a prestar tratamento oncológico à autora, portadora de neoplasia maligna de mama com metástase óssea, bem como à razoabilidade do valor fixado a título de honorários advocatícios. O art. 196 da Constituição da República assevera que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo, na forma do art. 197, primordialmente ao Poder Público, a execução das ações e serviços que garantam ao cidadão, em última análise, o seu direito à vida. O dever de desenvolver políticas públicas que visem à redução de doenças, à promoção, à proteção e à recuperação da saúde é de competência comum dos entes da federação, nos termos do art. 23, II, da Constituição. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios são responsáveis solidários pela saúde, tanto do indivíduo quanto da coletividade e, dessa forma, são legitimados passivos nas demandas cuja causa de pedir é a negativa, pelo SUS (seja pelo gestor municipal, estadual ou federal), de prestações na área de saúde. O fato de o Sistema Único de Saúde ter descentralizado os serviços e conjugado os recursos financeiros dos entes da federação, com o objetivo de aumentar a qualidade e o acesso aos serviços de saúde, apenas reforça a obrigação solidária e subsidiária entre esses. Tal entendimento encontra-se, inclusive, sedimentado no STF, in verbis: EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE RG, Relator(a): Min. LUIZ FUX, julgado em 05/03/2015, 1
5 PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-050 DIVULG PUBLIC ) No mérito, sendo o direito à saúde bem constitucionalmente tutelado, não é possível que a norma programática do art. 196 da constituição seja interpretada de modo a tornar-se uma promessa constitucional inconsequente, pois além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas, representa consequência constitucional indissociável do direito à vida, intrinsecamente ligado, ainda, ao princípio da dignidade da pessoa humana, que é a razão, o centro gravitacional do sistema jurídico-constitucional em vigor. Na definição de Ingo W. Sarlet [1] : (...) Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano, que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e coresponsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. Assim, embora o Poder Judiciário não possa editar leis ou adentrar na esfera das políticas públicas, deve buscar a efetividade da norma constitucional e a fiscalização do seu cumprimento, ainda que para assegurar o seu mínimo existencial, qual seja, as condições básicas da existência humana. Neste sentido, dentro do critério da reserva do possível, ao Judiciário caberá determinar a efetivação da norma constitucional pelo Estado, dentro de sua viabilidade financeira e desde que este se encontre omisso. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Agravo Regimental na Suspensão da Tutela Antecipada nº 175, de Relatoria do Ministro Gilmar Mendes, assentou a possibilidade de, após a análise minuciosa das circunstâncias de cada caso concreto e a realização de juízo de ponderação, o Poder Judiciário garantir o direito à saúde por meio do fornecimento de medicamento ou tratamento indispensável para o aumento de sobrevida e a melhoria da qualidade de vida do paciente da rede pública de saúde. Em se tratando de paciente com neoplasia maligna, a Lei nº /2012 prevê que paciente tem direito de se submeter ao primeiro tratamento de quimioterapia e radioterapia no SUS no prazo de até 60 dias, conforme dispõe o art. 2º, in verbis: Art. 2º O paciente com neoplasia maligna tem direito de se submeter ao primeiro tratamento no Sistema Único de Saúde (SUS), no prazo de até 60 (sessenta) dias contados a partir do dia em que for firmado o diagnóstico em laudo patológico ou em prazo menor, conforme a necessidade terapêutica do caso registrada em prontuário único.(g.m). 2
6 Na hipótese vertente, a autora comprovou seu diagnóstico de neoplasia maligna de mama com metástase óssea (fl. 20) em unidade municipal vinculada ao SUS, assim como seu cadastramento no SISREG em 27/03/2014, com indicação de início de tratamento com urgência. Todavia, em descompasso com a previsão ínsita no art. 2º da Lei nº12.732/2012, somente obteve o agendamento da consulta, em razão da antecipação dos efeitos da tutela, em 02/05/2014, iniciando as sessões de radioterapia em 15/05/2014, de acordo com o ofício nº 477/DGHMS/RJ (fl. 69), não havendo, contudo, que se confundir a repercussão do fato consumado com a falta de interesse de agir e a consequente perda de objeto. A parte não postula qualquer tratamento médico ou medida que não esteja ao alcance das disponibilidades materiais e financeiras dos réus, sendo certo, ainda, que o cumprimento da tutela jurisdicional pleiteada não importa qualquer dispêndio adicional, alheio ao regular desempenho do serviço médico que já é regularmente prestado. Em relação aos honorários, em que pese repetitiva, este tipo de demanda exige dedicação do profissional de direito, eis que envolve o direito à saúde, sendo inegável que este deva atuar com elevado grau de zelo. Ademais, a ação só foi proposta ante a inércia dos entes federados em prover a população com um serviço público de saúde de qualidade, principalmente no que se trata de doenças e disfunções que afetam a própria existência dos cidadãos. Logo, não prospera a alegação do Município e do Estado no sentido de cabimento da reforma da sentença em relação aos honorários advocatícios, arbitrados em 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa atualizado (R$ ,00), a ser rateado entre ambos (excluída a União, não condenada em ônus de sucumbência) e revertido à Defensoria Pública da União, eis que em consonância com o art. 20, 4º, do CPC /73, em vigor na data da prolação da sentença. Ante o exposto, nego provimento à remessa e às apelações do Município do Rio de Janeiro e do Estado do Rio de Janeiro, nos termos da fundamentação supra. É como voto. ALCIDES MARTINS RIBEIRO FILHO Desembargador Federal Relator [1] SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004, pp
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