CAPÍTULO 1 Os impactos do novo CPC nos atos processuais iniciais e expropriatórios da execução fiscal

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2 OS IMPACTOS DO NOVO CPC NOS ATOS PROCESSUAIS INICIAIS E EXPROPRIATÓRIOS DA EXECUÇÃO FISCAL CAPÍTULO 1 Os impactos do novo CPC nos atos processuais iniciais e expropriatórios da execução fiscal Bruno freire e Silva 1 e Marcela Melo Perez 2 SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1. PREMISSA METODOLÓGICA NA ANÁLISE DOS IMPACTOS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NA EXECUÇÃO FISCAL; 2. ATOS PROCESSUAIS INICIAIS DA EXECUÇÃO FISCAL: 2.1. REQUISI- TOS DA PETIÇÃO INICIAL (ART. 6 O ) E O DESPACHO INICIAL (ART. 7 O E 8 O ); 2.2. A LEGITIMIDADE PASSIVA (ART. 4 O ); 2.3. A GARANTIA DA EXECUÇÃO FISCAL (ART. 9 O ); 2.4. PARCELAMENTO; 3. ATOS PROCESSUAIS DE PENHO- RA, AVALIAÇÃO E EXPROPRIAÇÃO DE BENS: 3.1. PENHORA; 3.2. AVALIAÇÃO; 3.3. EXPROPRIAÇÃO; CONCLUSÃO INTRODUÇÃO A execução tem como fundamento e condição de admissibilidade um título executivo, que pode ser judicial ou extrajudicial. Entre os títulos executivos extrajudiciais há a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública, correspondente a créditos desta constituídos, conforme previsão legal, por meio de um processo administrativo 3 para apurar sua liquidez e certeza. 4 A certidão resultante dessa inscrição em dívida ativa, seja esta tributária ou não tributária, consubstancia o título executivo apto a iniciar a execução fiscal. 1. Advogado em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília. Bacharel em Direito na Universidade Federal da Bahia. Mestre e Doutor em Direito Processual na PUC Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor Adjunto de Teoria Geral do Processo da UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro e Professor Titular do Programa de Mestrado da UNAERP Universidade de Ribeirão Preto. Membro do Instituto dos Advogados de São Paulo e do Instituto Brasileiro de Direito Processual. 2. Advogada. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro PUC Rio e Mestranda em Direito Processual pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ. 3. Ressalve-se, no entanto, que, como já decidido pelo Superior Tribunal de Justiça, nos tributos com lançamento de ofício, a ausência de prévio processo administrativo não enseja a nulidade da CDA, porquanto cabe ao contribuinte o manejo de competente processo administrativo caso entenda incorreta a cobrança tributária, e não ao Fisco que, com observância da lei aplicável ao caso, lançou o tributo. (AgRg no AgRg no AREsp /MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 25/09/2014) 4. DIDIER JR., Fredie [et al.]. Curso de Direito Processual Civil, volume 5, 6a Edição. Salvador: Editora JusPodivm, 2014, p Eduardo_Heitor_Col_Reperc_Leg_Extrav_vol_9.indd 15 19/11/ :30:55

3 BRUNO FREIRE E SILVA E MARCELA MELO PEREZ A execução fiscal é regida pela Lei 6.830/80 ( LEF ) e tem procedimento próprio, 5 com disposições destinadas a conferir condições especiais para a cobrança do crédito público e, ao fim, para a defesa do interesse público. A despeito da existência dessas regras específicas da LEF, este diploma não regula exaustivamente o procedimento do executivo fiscal, devendo ser aplicável, na omissão dessa lei, subsidiariamente, as regras do Código de Processo Civil. É patente, pois, que a promulgação de um Novo Código de Processo Civil ( NCPC ) trará impactos no procedimento especial da execução fiscal. Nesse breve artigo nos propomos a analisar, sem pretensão de exaustividade, esses impactos nos atos iniciais da execução fiscal e atos expropriatórios. 1. PREMISSA METODOLÓGICA NA ANÁLISE DOS IMPACTOS DO NOVO CÓDI- GO DE PROCESSO CIVIL NA EXECUÇÃO FISCAL O NCPC não terá o condão de revogar a LEF. O parágrafo segundo do art do novo diploma processual é claro nesse sentido: permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente este Código. Mantém-se, portanto, hígida a Lei 6.830/80 que disciplina a execução fiscal, a qual dispõe, em seu art. 1o, que a execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. É digno de registro, ainda, que o art. 771 do NCPC estabelece que suas disposições aplicam-se, também, no que couber, aos procedimentos especiais de execução. 5. Antes de ser regulada pela Lei 6.830/80, a execução fiscal era disciplinada pelo Código de Processo Civil. Como ensina James Marins, com a consagração do reconhecimento do interesse público, ao menos no plano retórico, que envolve a cobrança dos créditos tributários, surge a necessidade de se dotar a Fazenda Pública de meios mais aptos a garantir a arrecadação tributária, adotando-se novamente um regime autônomo, fundado na ideia de maior eficácia. Em substituição ao regime executivo do Código de Processo Civil, no que tange aos créditos tributários, surge novo regime inaugurado pela Lei 6.830/80, Lei de Execução Fiscal (LEF), tendo por escopo tornar a execução fiscal mais célere e segura (MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro (administrativo e judicial). São Paulo: Ed. Dialética, 2002, p. 563). A própria exposição de motivos da LEF explica que, nos trabalhos para a elaboração de um projeto de lei, prevaleceu a ideia de adoção de anteprojeto de lei autônoma, contendo apenas normas especiais sobre a cobrança da Dívida Ativa, que, no mais, teria o suporte processual das regras do Código. Isso porque esse anteprojeto de lei autônoma disciplinaria a matéria no essencial, para assegurar não só os privilégios e garantias da Fazenda Pública em juízo, como também a agilização e racionalização da cobrança da Dívida Ativa (cf. Exposição de Motivos, Mensagem n. 87, de 1980 CN n. 232/80 na origem). Atualmente, diante da ineficácia dos correntes métodos de cobrança do crédito fiscal, discute-se a necessidade de edição de uma nova lei sobre o assunto, existindo, inclusive projetos de lei em andamento, como é o caso do projeto de lei nº 5.080/ Eduardo_Heitor_Col_Reperc_Leg_Extrav_vol_9.indd 16 19/11/ :30:55

4 OS IMPACTOS DO NOVO CPC NOS ATOS PROCESSUAIS INICIAIS E EXPROPRIATÓRIOS DA EXECUÇÃO FISCAL Destarte, faz-se imprescindível fixar, de logo, como premissa metodológica do presente trabalho, que a observância das normas do NCPC somente terá cabimento quando a LEF não contiver previsão sobre o tema, uma vez que, como se infere tanto do art. 1046, parágrafo segundo, do NCPC, como do art. 1º da Lei 6.830/80, essa aplicação é supletiva ou subsidiária, conforme os termos utilizados pelo legislador. Nesse diapasão, somente constatando-se omissão no procedimento especial previsto na LEF será possível a aplicação do NCPC. Conforme muito bem esclarece Iran de Lima, não se haverá de cogitar, nunca, de conflito entre os dois diplomas, o do CPC e o da Lei 6.830/80. Primeiro haverá de procurar a solução para o problema ocorrente na lei especial, e somente na ocorrência de verdadeira omissão é que se buscará o subsídio do direito processual comum. 6 A despeito de o NCPC não revogar a LEF, por não tratar especificamente do procedimento para cobrança dos créditos da Fazenda Pública inscritos em dívida ativa, relevante o impacto que o novel diploma traz para esse procedimento diante da necessária observância subsidiária de suas normas. Vejamos, então, os impactos do NCPC nos atos processuais iniciais e de expropriação da execução fiscal. 2. ATOS PROCESSUAIS INICIAIS DA EXECUÇÃO FISCAL 2.1. REQUISITOS DA PETIÇÃO INICIAL (ART. 6 O ) E O DESPACHO INICIAL (ART. 7 O E 8 O ) A petição inicial da execução fiscal é bastante simples, 7 exigindo a LEF tão somente que o exequente indique o juízo 8 ao qual é dirigida, o pedido e o requerimento de citação (art. 6º). A simplicidade da peça exordial da execução fiscal se deve à previsão de que a Certidão da Dívida Ativa (CDA) documento cuja juntada é obrigatória dela fará parte integrante, como se estivesse transcrita ( 1º), o que permitirá a apreensão da pretensão deduzida em juízo e o exercício do direito de defesa do executado LIMA, Iran de. A dívida ativa em juízo. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1994, p. 15/ Sob a égide do CPC/73, Humberto Theodor Júnior afirmava que a petição inicial não precisava conter todos os dados do art. 282 do CPC (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e jurisprudência. São Paulo: Ed. Saraiva, 2004, p. 71). 8. O art. 6º estabelece, em seu inciso I, que a petição inicial indique o juiz a quem é dirigida. Trata-se de uma impropriedade do legislador, pois, quando previu juiz, referiu-se ao juízo. 9. MARINS, James. Direito processual tributário brasileiro (administrativo e judicial). São Paulo: Ed. Dialética, 2002, p. 583/ Eduardo_Heitor_Col_Reperc_Leg_Extrav_vol_9.indd 17 19/11/ :30:55

5 BRUNO FREIRE E SILVA E MARCELA MELO PEREZ Outrossim, é desnecessário o pedido de produção de provas na inicial pela Fazenda Pública ( 2º), bem como a menção ao valor da causa, pois este será sempre o constate da CDA com os encargos legais ( 3º). A LEF nada menciona quanto ao juízo competente para processamento da execução fiscal, dispondo apenas que esta competência exclui a de qualquer outro Juízo, inclusive o da falência, da concordata, da liquidação, da insolvência ou do inventário. Aplicava-se, assim, a disposição específica do art. 578 do Código de Processo Civil de 1973 ( CPC/73 ), segundo a qual a execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado. Tal regra de competência restou mantida pelo art. 46, 5º, NCPC. Não há mais, contudo, a previsão contida anteriormente no parágrafo único do art. 578 do CPC/73, no sentido de que a Fazenda Pública poderá escolher o foro de qualquer um dos devedores, quando houver mais de um, ou o foro de qualquer dos domicílios do réu; a ação poderá ainda ser proposta no foro do lugar em que se praticou o ato ou ocorreu o fato que deu origem à dívida, embora nele não mais resida o réu, ou, ainda, no foro da situação dos bens, quando a dívida deles se originar. Embora o art. 781, inciso I e V, do NCPC, 10 mencione que a execução de título extrajudicial poderá ser proposta no foro da situação dos bens a ela sujeitos e no foro do lugar em que se praticou o ato ou ocorreu o fato que deu origem ao título, entendemos que essa disposição não é aplicável à execução fiscal. Isso porque o art. 46, 5º, NCPC, ao dispor sobre a competência para processamento da execução fiscal, foi taxativo ao elencar os foros em que pode ocorrer a sua propositura, tendo suprimido o conteúdo do parágrafo único do art. 578 do CPC/73, sem fazer qualquer remissão às disposições genéricas da execução de título extrajudicial. Prosseguindo-se, vale dizer que o pedido na execução fiscal será o de citação do executado para, no prazo de 5 (cinco) dias, pagar a dívida com juros, multa de mora e demais encargos indicados na CDA ou apresentar garantia à execução. Esse prazo permanece intacto, eis que norma específica de execução 10. Art A execução fundada em título extrajudicial será processada perante o juízo competente, observando-se o seguinte: I a execução poderá ser proposta no foro de domicílio do executado, de eleição constante do título ou, ainda, de situação dos bens a ela sujeitos; II tendo mais de um domicílio, o executado poderá ser demandado no foro de qualquer deles; III sendo incerto ou desconhecido o domicílio do executado, a execução poderá ser proposta no lugar onde for encontrado ou no foro de domicílio do exequente; IV havendo mais de um devedor, com diferentes domicílios, a execução será proposta no foro de qualquer deles, à escolha do exequente; V a execução poderá ser proposta no foro do lugar em que se praticou o ato ou em que ocorreu o fato que deu origem ao título, mesmo que nele não mais resida o executado. 18 Eduardo_Heitor_Col_Reperc_Leg_Extrav_vol_9.indd 18 19/11/ :30:55

6 OS IMPACTOS DO NOVO CPC NOS ATOS PROCESSUAIS INICIAIS E EXPROPRIATÓRIOS DA EXECUÇÃO FISCAL fiscal, não sendo aplicável o prazo para pagamento de 3 (três) dias da execução do título executivo extrajudicial do NCPC (art. 829). Quando a citação na execução fiscal for feita por correio, tal como previsto no art. 8o, incisos I e II, da LEF, observar-se-á o art. 248 do NCPC, 11 especialmente no tocante à disposição de que o carteiro deverá exigir do citando a assinatura do recibo da carta. 12 Veja, porém, que, muito embora o art. 8o, inciso I, da LEF, afirme que a citação será feita, como regra, por correio, proveitosa afigura-se a citação feita, de início, por oficial de justiça, na medida em que o juiz, ao deferir a inicial, além de determinar a citação, mandará que se proceda: i) à penhora, no caso de não pagamento da dívida ou de não garantida a execução, por meio de depósito, fiança ou seguro garantia; ii) ao arresto, se o executado não tiver domicílio ou dele se ocultar; iii) ao registro da penhora ou do arresto, independentemente do pagamento de custas ou outras despesas, observando-se o previsto no art. 14 da LEF; e iv) à avaliação dos bens penhorados ou arrestados. Nessa linha, um único mandado será expedido, a ser cumprido por oficial de justiça, mandado esse de citação, penhora e avaliação, com o intuito de tornar mais célere o ato de citação e, notadamente, os atos seguintes de expropriação como penhora e avaliação, sobre os quais falaremos adiante. 11. Art Deferida a citação pelo correio, o escrivão ou o chefe de secretaria remeterá ao citando cópias da petição inicial e do despacho do juiz e comunicará o prazo para resposta, o endereço do juízo e o respectivo cartório. 1o A carta será registrada para entrega ao citando, exigindo-lhe o carteiro, ao fazer a entrega, que assine o recibo. 2o Sendo o citando pessoa jurídica, será válida a entrega do mandado a pessoa com poderes de gerência geral ou de administração ou, ainda, a funcionário responsável pelo recebimento de correspondências. 3o Da carta de citação no processo de conhecimento constarão os requisitos do art o Nos condomínios edilícios ou nos loteamentos com controle de acesso, será válida a entrega do mandado a funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência, que, entretanto, poderá recusar o recebimento, se declarar, por escrito, sob as penas da lei, que o destinatário da correspondência está ausente. 12. Há doutrina que interpreta a disposição do art. 8o, inciso II, da LEF, no sentido de que a citação por via postal independeria de recebimento pessoal pelo citando da carta registrada. Assim, Humberto Theodoro Júnior, afirma que ao contrário, porém, do que determina a legislação codificada, para o aperfeiçoamento da citação postal na execução fiscal não é necessário que o ofício seja entregue em mãos do executado; basta que a entrega se dê no seu endereço (Lei n , art. 8o, II) (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de execução fiscal: comentários e jurisprudência. São Paulo: Ed. Saraiva, 2004, p. 78/79). James Marins, citando posição de Silva Pacheco, no sentido de que a citação pelo correio não é ficta, mas pessoal, posiciona-se contra o entendimento de Humberto Theodoro Júnior. Para Marins, como a LEF não menciona como deve ser feita a entrega da carta registrada, deveria ser adotado o art. 223, parágrafo único, do CPC/73 (MA- RINS, James. Direito processual tributário brasileiro (administrativo e judicial). São Paulo: Ed. Dialética, 2002, p. 587/588). De fato, entendemos que não há nada na redação do inciso II, do art. 8o, da LEF, a indicar a dispensa de que o executado assine documento certificando o recebimento do mandado de citação. Ao dispor que a citação pelo correio considera-se feita na data da entrega da carta no endereço do executado, a LEF está a afirmar que a data da citação é a data da entrega da carta no endereço, e não que a entrega da carta no endereço dispensa a ciência pessoal do executado. 19 Eduardo_Heitor_Col_Reperc_Leg_Extrav_vol_9.indd 19 19/11/ :30:55