DETERMINAÇÃO DO COEFICIENTE VOLUMÉTRICO DE OXIGÊNIO EM BIORREATORES AERADOS E AGITADOS COM INDEPENDÊNCIA DA SENSIBILIDADE DO ELETRODO
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1 DETERMINAÇÃO DO COEFICIENTE VOLUMÉTRICO DE OXIGÊNIO EM BIORREATORES AERADOS E AGITADOS COM INDEPENDÊNCIA DA SENSIBILIDADE DO ELETRODO M. O. CERRI 1, R. M. M. G. P.RIBEIRO 1, M.P. A.RIBEIRO 2, M. ESPERANÇA 2, A. C. BADINO JUNIOR 2 1 Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" - Faculdade de Ciências Farmacêuticas 2 Universidade Federal de São Carlos, Departamento de Engenharia Química para contato: gribeiro.renata@gmail.com RESUMO - A taxa de transferência de oxigênio, fundamental em bioprocessos envolvendo o cultivo celular aeróbio, pode ser medida em biorreatores a partir da concentração de oxigênio dissolvido (OD) na fase líquida. O biorreator convencional é o mais empregado de todos os reatores, em todas as escalas de produção. Em especial, em cultivos aeróbicos onde aeração e agitação são essenciais para suprir a demanda de oxigênio por microrganismos, células ou vegetais. O objetivo é a proposta de uma nova metodologia para tratamento de dados de kla em biorreatores convencionais com independência de tempo de atraso do eletrodo de oxigênio ( e), assim evitar dificuldades encontradas na metodologia dependente da sensibilidade do eletrodo (ke), pois o método tradicional não é possível considerar a variação sofrida pela película estagnada na ponta do eletrodo de oxigênio no meio líquido, de acordo com o tipo de fluido, rotação do impelidor e vazão de gás imposta ao sistema. Com a nova metodologia empregada os resultados apresentam-se mais robustos, confiáveis e precisos. INTRODUÇÃO A maioria dos bioprocessos industriais com microrganismos são realizados de forma aeróbia ou aeróbia facultativa, sendo o oxigênio essencial no suprimento de energia para o metabolismo celular nesse tipo de cultivo. Por atuar em processos de reoxidação das coenzimas nas reações de desidrogenação da glicólise, no ciclo de Krebs e no processo de produção de energia química transformando as moléculas de adenosina difosfato (ADP) em moléculas de adenosina trifosfato (ATP), a sua presença é fundamental não apenas para o crescimento celular, mas também na síntese de produtos, transporte, e outras atividades celulares (Schimidell, 2001; Berg et al., 2007). Embora existam muitos modelos de biorreatores empregados em processos biotecnológicos, o biorreator do tipo tanque agitado e aerado é o mais empregado de todos os reatores, por isso é conhecido como convencional ou padrão, em todas as escalas de produção, desde os laboratórios de pesquisa até
2 as indústrias de bioprocessos. Esse reator apresenta características instrumentais e operacionais muito interessantes em cultivos aeróbicos onde a aeração e agitação são essenciais para suprir a demanda de oxigênio por microrganismos, células e/ou vegetais, permitindo as transferências de massa, calor, movimento e homogeneização das suspensões (Charles, 1985). A taxa de transferência de oxigênio em biorreatores com diferentes condições operacionais e geométricas, é determinada a partir do coeficiente volumétrico de transferência (kla), que pode ser obtido a partir de métodos químicos e físicos (na ausência de microrganismos) ou através de métodos biológicos (na presença de biomassa) (Kargi e Moo-Young, 1985; Moutafchieva et al., 2013). Dentre os diferentes métodos de medição de kla descritos na literatura, a técnica com entrada e saída de gases (método dinâmico) é a mais amplamente utilizada, devida a sua simplicidade. Esse método de determinação de kla proposto por (Taguchi e Humphrey, 1966)) parte de uma análise física na qual tem-se inicialmente a remoção do oxigénio dissolvido da fase líquida, pelo borbulhamento de algum outro gás no biorreator, como por exemplo o nitrogênio. Posteriormente, quando a concentração de oxigênio na fase líquida for igual a zero ou praticamente nula, inicia-se a aeração do meio com uma vazão conhecida de oxigênio gasoso, até a saturação do líquido e a alteração (aumento) sofrida na concentração de oxigênio líquido é medida, descrevendo a variação da concentração de oxigênio dissolvido ao longo do tempo, assumindo que kla permanece constante (Bandaiphet e Prasertsan, 2006; Cerri, 2009; Patel e Thibault, 2009). Nesta expressão, C é a concentração de oxigénio dissolvido (OD) na fase líquida e Cs é a solubilidade do oxigénio nessa fase: ln ( C C s ) = K L a. t (1) O valor de kla, por conseguinte, pode ser determinada a partir do declive de ln (1-C/CS) por tempo. Embora essa metodologia seja considerada adequada para o estudo de influências operacionais sofridas na transferência de oxigênio, deve-se considerar que o atraso no tempo de eletrodo ( e), pode ocasionar em valores não verdadeiros na determinação de transferência de oxigênio, especialmente em processos que remetem altos valores de e, que pode ser encontrado a partir da leitura do oxigênio dissolvido no meio. O valor de τe é o tempo necessário para a leitura para atingir 63,2% de saturação. Porém, nesse tipo de metodologia, a resistência do líquido não é levada em consideração, apenas a resistência interna do eletrodo, ocasionando em medições menos precisas. No método dinâmico, por exemplo, utilizar uma equação de primeira ordem por apresentar problemas, devido à dificuldade em avaliar ke e kla separadamente. A metodologia proposta no presente trabalho, permite a determinação da sensibilidade do eletrodo (ke) e coeficiente volumétrico de transferência de oxigênio (kla) em função do tempo simultaneamente a partir do método de entrada e saída de gases, eliminando erros causados pelo retardamento da sonda medidora da concentração de oxigênio dissolvido, sendo mais preciso e robusto. MATERIAIS E MÉTODOS Biorreator
3 Os experimentos foram realizados em biorreator comercial tipo tanque agitado e aerado, TEC- BIO-FLEX Tecnal, Brasil. O biorreator dispõe de volume total de 7,5 L, utilizando 5,0 L dos mesmos, com altura do líquido 0,205 m. O sistema dispõe de quatro chicanas opostas diametralmente com largura de 0,015 m, o diâmetro interno do biorreator é 0,190 m e diâmetro externo 0,217 m. O sistema foi montado utilizando dois impelidores do tipo turbinas Rushton, com uma distância de 0,045 m entre um e outro, com seis lâminas. A distância entre o aspersor e o fundo do recipiente é 0,030 m e a distância do impelidor inferior ao final do eixo 0,010 m. Fluido Para determinação do coeficiente volumétrico de transferência de oxigênio (kla), utilizou-se água destilada á 28 C como fluido Eletrodo de oxigênio dissolvido Utilizou-se o eletrodo de oxigênio In Pro 6800 da Mettler Toledo, com sensor de 12 mm, provido de membrana de silicone. Parâmetros operacionais Os experimentos foram realizados em triplicata, em sete diferentes condições de agitação (400, 500, 600, 700, 800, 900 e 1000 rpm) e em duas diferentes condições de aeração (2,5 e 5,0 L.min -1 ). RESULTADOS E DISCUSSÃO Como descrito na literatura, a concentração de oxigênio dissolvido no método de enriquecimento com gases é obtida a partir das equações: dc e = K e (C C e ) (2) e dc = K La (C s C) (3) Onde C é a concentração de oxigênio dissolvido, Cs é a concentração máxima de saturação de oxigênio no meio, Ce é a concentração de oxigênio inicial determinado pelo sistema de medição. A fim de garantir uma medição precisa, Ce é considerado nulo e C = Ce. Linearizando a Equação 3, tem-se: dln(c s C) = kla (4) Ou seja, a inclinação do gráfico de -ln(cs-c) versus tempo é constante e igual ao kla. Aplicando a função exponencial em ambos os lados da Equação 4, temos: C S C C 0 C S = e K La (t t 0 ) (5) C = C s + (C 0 C s )e kla(t t 0 ) (6)
4 Sabe-se que a concentração de oxigênio dissolvido (OD) também pode ser expresso como sendo: OD = C C S. 100% (7) No entanto a resposta do eletrodo de oxigênio refere-se à tensão gerada pelo oxigênio dissolvido, em termos de pressão. Assim sendo, o oxigênio dissolvido é exposto em função da tensão (ODe) por: OD e = C e C S. 100% (8) Dessa forma, reescrevendo as equações 2 e 3 como 9 e 10, respectivamente, e considerando CS= 100, temos o oxigênio dissolvido exposto em função da tensão lida. dod e OD = k e (OD OD e ) Com OD e (0) = OD e0 (9) = K La (100 OD) Com OD (0) = OD 0 (10) Resolvendo a Equação 10, tem-se o perfil da concentração de oxigênio dissolvido em função do tempo: OD = (OD 0 100) e k La (t t 0 ) (11) Substituindo a equação 11 em 9, temos a derivada do oxigênio dissolvido lido pela tensão em função do tempo: dod e = k e (100 OD e ) + k e (OD 0 100) e k La (t t 0 ) (12) Ao substituir, na equação 3, o valor de C exposto na equação 6, temos a variação da concentração de Ce em função do tempo. Assim: dc e = k(c s + (C 0 C s )e kla(t t 0 ) C e ) (13) Que pode ser reorganizada e reescrita como: dc e = k(c s C e ) + k(c 0 C s ) e kla(t t 0) (14) Multiplicando a equação acima pelo fator integrante exponencial (kt), tem-se a equação abaixo: C e = C e0 e ( k(t t 0 )) + C s [1 e ( k(t t 0 )) ] + k (C 0 C s ) (k kla) [e kla(t t 0) e k(t t 0) ] (15) Assim como feito anteriormente, reescrevendo a equação 15 em função da concentração de oxigênio dissolvido, e admitindo CS= 100, temos a equação geral de oxigênio dissolvido temporariamente em função da tensão
5 OD e = OD e0 e ( k(t t 0 )) [1 e ( k(t t 0 )) ] + (OD (k e k L a) 100)[e kla(t t0) e k(t t0) ] (16) Na qual t0 é o tempo em que a corrente de ar é aberta. H dois parâmetros ajustáveis na Equação 16, ke e kla. Porém, se assumirmos ke = 0,14 s -1 (medida experimental da sensibilidade do eletrodo), a partir de dados experimentais externos, o valor de kla estimado sofrerá erros em sua avaliação, uma vez que a transferência de massa na fase líquida depende do tipo de fluido, rotação, conformação dos impelidores e vazão de gás imposta ao sistema, variando consequentemente o tempo de resposta do eletrodo de oxigênio dissolvido. Assim, a suposição de que ke não depende da transferência de massa na fase líquida é claramente um fator que conduz a erros nos valores encontrados. Uma forma de diminuir os erros gerados é a regressão linear da Equação 11, assim: ln ( OD 100 OD ) = K La (t t 0 ) (17) Porém, observa-se que em um curto período de tempo, a leitura de oxigênio dissolvido levando em conta o tempo de atraso do eletrodo de primeira ordem torna-se linear em relação a leitura do oxigênio dissolvido. Dessa forma, a inclinação da reta obtida é o valor do kla, que pode ser equacionando a partir da derivada de primeira ordem abaixo. d ln (OD e 100) dod e = d ln (OD 100) k e = K L a (18) A relação acima pode ser facilmente resolvida a partir da Equação 12: 1 = k (100 OD e ) e [1 + ( OD ) e k La (t t 0 ) ] (19) 100 OD e Que ao ser destrinchada pode ser reescrita como: d ln (100 OD e ) = k e [1 ( OD o 100 OD e 100 ) e k la (t t 0 ) ] (20) Resolvendo a equação acima tem-se que a partir de uma certa região, ln (100 OD e ) passa a ser linear em relação ao tempo. Dessa forma: k e d [1 (OD o 100 OD e 100 ) e k la (t t 0 ) ] = 0 (21) Diferenciando o termo entre parênteses na Equação 21, tem-se de forma resumida: d ln (OD e 100) = K L a (22) Por conseguinte, uma vez que a Equação 20 é igual a Equação 22 (na região linear), pode-se correlacionar ke e kla por: k e = K L a [1 ( OD ODe 100 )e k L a (t t 0) ] (23)
6 k e instantâneo (s -1 ) k L a instantâneo (s -1 ) -ln (100 OD e ) Obtendo assim ke usando a Equação 23 acima. A fim de identificar uma região adequada do gráfico de -ln (100 OD e ) em função do tempo, para avaliar o kla instantâneo. Assim, a Figura 1 abaixo representa a curva de kla obtido a partir da Equação 19. 0,10 0, ,06 0,04 Faixa Escolhida ,02 20 Faixa Escolhida 0, Tempo (s) (a) Tempo (s) (b) Figura 1 kla instantâneo em função do tempo (a) e ln (100 OD e ) em função do tempo (b) Como mostrado anteriormente na Figura 1, a região onde a variação de kla foi a menor, não variando sistematicamente, sendo o mais constante e com baixo grau de ruído foi selecionada para o ajuste linear. Depois de usar Equação 18 para estimar kla, os valores de ke foram determinadas para cada ponto de dados na região linear, como mostrado na Figura 2. O valor ke foi calculado em cima da média dos valores de ke instantâneo dentro do intervalo selecionado, obtidos em um processo utilizando água á 28 C. 0,20 0,18 0,15 0,13 0,10 0,08 0,05 0,03 0,00 Faixa Escolhida Tempo (s) Figura 2 ke instantâneo (s -1 ) versus tempo (s)
7 k L a instântaneo (s -1 ) k e instantâneo (s -1 ) Os dados obtidos experimentalmente para as quatorze associações diferentes foram tratados na nova metodologia e são apresentados na Figura 3 abaixo: 0,05 0,07 0,045 0,065 0,04 0,06 0,035 0,055 0,03 0,05 0,025 0,045 0,02 0,04 0,015 0,035 0, , Rotação (rpm) a Rotação (rpm) b Figura 3 kla (a) e ke (b) instantâneos em água 28 ºC com aeração 2,5 L.min -1 ( ) e 5,0 L.min -1 ( ) Verifica-se através da Figura 3, que kla e ke apresentam o mesmo comportamento, aumentando com o aumento da rotação, deixando claro que utilizar ke fixo e igual a 0,14 s -1 superestima o valor verdadeiro, por não levar em conta alterações externas que ocorrem no sistema. Por exemplo, a resistência do líquido não é levada em consideração, apenas a resistência interna do eletrodo, ocasionando em medições menos precisas. O aumento de ke com o aumento do fluxo de ar comprova o esperado, pois um aumento na taxa de fluxo de ar leva a uma diminuição na resistência do meio líquido (RL). Pela Figura 3 observa-se que em menores rotações, como 400 e 500 rpm, os valores de ke são mais destoantes quando comparados ao de 900 e 1000 rpm. Assim sendo, em processos que é imposta uma maior rotação aos impelidores, diminui-se a chance de erro causada pelo tempo de atraso de leitura, reafirmando que o tempo de atraso do eletrodo varia de acordo com a rotação imposta ao sistema e o aumento na taxa de fluxo de ar leva a uma diminuição na resistência meio líquido, minimizando o erro de leitura do eletrodo. Ao contrário do valor superestimado de ke, o resultado que a metodologia antiga retorna de kla é um valor abaixo do verdadeiro. Na condição do sistema com água a 28 C, com rotação imposta de 400 rpm e vazão de 2,5 L.min -1, no modelo de cálculo com atraso do eletrodo fixo o valor de kla encontrado é 0,0103 s -1 enquanto na nova metodologia, independente da sensibilidade do eletrodo, o valor para o mesmo processo é 0,0147 s -1. Pois no novo cálculo, atribui-se a incorporação da resistência do líquido ao valor de ke e não no de kla. Esses resultados mostram-se coerentes ao longo de todos os experimentos, consolidando o novo método proposto.
8 CONCLUSÃO A nova metodologia, capaz de avaliar o kla e ke mostrou-se satisfatória perante a necessidade de estimar ke previamente obtido em ensaios correlacionados. Por levar em consideração a reologia do fluido, a rotação e a vazão de gás impostas ao sistema, a avaliação dos dados tratados a partir desse método é claramente mais confiável, robusta, simples e retorna menor chance de erros, superando as limitações relacionadas ao tempo de atraso do eletrodo de oxigênio, resultando em valores kla estatisticamente mais confiáveis e de acordo com os fenômenos envolvidos na transferência de oxigênio. REFERÊNCIAS BANDAIPHET, C.; PRASERTSAN, P. Effect of aeration and agitation rates and scale-up on oxygen transfer coefficient, k(l)a in exopolysaccharide production from Enterobacter cloacae WD7. Carbohydrate Polymers, v. 66, n. 2, p , Oct BERG, J. M.; TYMOCZKO, J. L.; STRYER, L. BIOCHEMISTRY CERRI, M. O. Hidrodinâmica e Transferência de Oxigênio em Três Biorreatores Airlift de Circulação Interna Geometricamente Semelhantes (Doutorado). Engenharia Química, Universidade Federal de São Carlos, São Paulo. CHARLES, M. Fermenter Design and Scale-up. In: (Ed.). Comprehensive Biotechnology 1st Edition The Principles, Applications and Regulations of Biotechnology in Industry, Agriculture and Medicine. USA, p KARGI, F.; MOO-YOUNG, M. Transport phenomena in bioprocess. In: PRESS, P. (Ed.). Comprehensive Biotechnology. 1, v.2, p MOUTAFCHIEVA, D. et al. EXPERIMENTAL DETERMINATION OF THE VOLUMETRIC MASS TRANSFER COEFFICIENT. Journal of Chemical Technology and Metallurgy, v. 4, n. 48, p , PATEL, N.; THIBAULT, J. Enhanced in situ dynamic method for measuring K(L)a in fermentation media. Bioch. Eng. J., v. 47, n. 1-3, p , Dec ISSN X. SCHIMIDELL, W. Biotecnologia Industrial. São Paulo: Edgard Blücher Ltda, TAGUCHI, H.; HUMPHREY, A. Dynamic method of the volumetric oxygen transfer coefficient in the fermentation systems. Journal of Fermatation Techonology, v. 44, p , 1966.
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