EXTREMOS TÉRMICOS E CONSEQUÊNCIAS NOS CONSUMOS ELÉTRICOS DE EDIFICIOS MUNICIPAIS EM CASCAIS
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1 EXTREMOS TÉRMICOS E CONSEQUÊNCIAS NOS CONSUMOS ELÉTRICOS DE EDIFICIOS MUNICIPAIS EM CASCAIS Nuno PESSOA 1, António LOPES 2 1) IGOT-UL, Aluno do Mestrado de Geografia Física e Ordenamento do Território npessoa@campus.ul.pt 2) IGOT-UL, CEG/CliMA - Clima e Mudanças Ambientais, Portugal antonio.lopes@campus.ul.pt Resumo Perante o provável aumento da temperatura para o concelho de Cascais, até ao final do presente século, será esperado um aumento do consumo de energia com fim à climatização de espaços interiores e consequente conforto térmico. Para evitar o consumo insustentável de energia é necessário um correto ordenamento do território. Para abordar esta questão, esta investigação teve três objetivos: i) conhecer a influência do ambiente atmosférico urbano nos consumos elétricos de edifícios municipais; ii) conhecer a relação entre os consumos de alguns desses edifícios e as temperaturas extremas; iii) definir orientações climáticas para o concelho que possam evitar o consumo insustentável em edifícios públicos. Identificados os extremos térmicos, foram desenvolvidos modelos de conforto térmico com base na PET e da distribuição da temperatura com base em variáveis inseridas em contexto urbano. São sugeridas medidas adaptativas multiescalares de forma a proporcionar um maior conforto térmico. Palavras-chave: Sensação térmica, PET, Temperaturas extremas, Consumos elétricos, Cascais. 1. Introdução As cidades são fortemente consumidoras de energia para satisfazer as suas necessidades de conforto, segurança, lazer e nas mais diversas áreas produtivas da sociedade. Para além disso, estão muito vulneráveis às alterações do clima (Madlener e Sunak, 2011). A linha de investigação entre o clima e o ordenamento do território procura sintetizar a importância das relações entre o ambiente atmosférico urbano e os elementos que compõem o espaço urbano, com o objetivo de fornecer aos decisores do planeamento e ordenamento urbano, orientações climáticas de forma a promover qualidade de vida à população (Alcoforado et al, 2005). Vários modelos estatísticos e geoestatísticos têm sido utilizados para obter os padrões térmicos observados localmente e para avaliar a influência que várias características urbanas e topográficas têm no conforto térmico (Matzarakis et al, 2006; Okeil, 2010) e Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
2 nas necessidades energéticas do edificado (Krese et al, 2012). Estes modelos são de grande utilidade na gestão da qualidade e conforto da população bem como na gestão de custos relacionados com a climatização de espaços interiores. De acordo com o projeto SIAM II, prevê-se para Portugal ao longo do século XXI, a redução da necessidade energética com fim ao aquecimento de espaços interiores, embora seja previsível o aumento do consumo para fins de climatização nos períodos tradicionalmente quentes, que podem prolongar-se até 8 ou 10 meses por ano, com impactos diferenciados conforme os hábitos sociais. No caso particular de Cascais, os cenários prevêem que em meados deste século, as temperaturas médias anuais poderão subir entre 1,7 C e 3,2 C, (2,8-5,0 C no verão), aumento esse que no final do século poderá atingir 3,4ºC a 6,5 C, mas que no Verão as temperaturas médias diárias poderão ser entre 5 C e 10 C (Santos e Cruz, 2010). 2. Objetivos Esta investigação procurou avaliar a influência do ambiente atmosférico urbano nos consumos elétricos de edifícios municipais de Cascais, nomeadamente através do reconhecimento da relação que existe entre esses consumos e os eventos extremos (dias frios e dias quentes), não só com base no valor médio da temperatura registada entre Janeiro de 2008 e Agosto de 2012 na ocorrência de extremos térmicos, mas também através de cenários previstos para o século XXI no Plano Estratégico de Cascais Face às Alterações Climáticas (PECAC). Após compreender estes fatores, foram definidas orientações climáticas para o concelho tendo em vista a necessária diminuição dos consumos elétricos para a climatização dos espaços interiores dos edifícios municipais e a redução dos custos energéticos associados. 3. Metodologia e dados Numa primeira fase deste estudo foram identificados os limiares dos extremos térmicos (dias frios e dias quentes), correspondentes aos valores dos percentis 20 e 80 das temperaturas máximas e mínimas registadas na estação meteorológica do Aeródromo Municipal de Cascais (Tires), entre 2008 e Considerou-se um dia frio, quando a temperatura máxima foi 15,2 C e a temperatura mínima 9,2 C, e um dia quente quando a temperatura máxima foi 25,0 C e a temperatura mínima 16,9 C. Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
3 Com estes dados foram construídos modelos que estimam a sensação térmica e a temperatura às 13:00 horas (quando os serviços que funcionam nos edifícios municipais estão em actividade plena e próximo da ocorrência da temperatura máxima). A sensação térmica, representada através da temperatura fisiológica equivalente (PET), foi obtida a partir dos dados de temperatura e humidade relativa da rede meteorológica de mesoescala instalada em Setembro de 2011 no concelho de Cascais e dos dados da velocidade do vento estação meteorológica do Aeródromo de Tires. Os dados de nebulosidade foram os registados no Instituto Geofísico Dom Luiz (IDL-UL). Para a espacialização da PET foi empregue a técnica geoestatística de cokrigagem correlacionada com a altitude. Uma regressão linear múltipla foi efectuada para estimar e espacializar a temperatura do ar às 13:00h. Como variáveis independentes foram utilizadas: a altitude; as distâncias sul, oeste e a menor distância à linha de costa; as áreas verdes (através do Normalized Difference Vegetation Index - NDVI); e variáveis de morfologia urbana, tais como a altura média dos edifícios, índices de rugosidade aerodinâmica (z 0 ), a relação entre a altura dos edifícios e a largura das vias (H/W) e índice volumétrico dos edifícios. Numa segunda fase, foram identificadas as relações entre os consumos elétricos de alguns edifícios municipais com as temperaturas máximas (altura em que os edifícios estão mais ocupados), observadas no período em estudo. Foram envolvidos nesta investigação quatro edifícios municipais: edifício de escritórios da Empresa Municipal de Ambiente de Cascais (), dos Paços do Concelho, Tardoz e Divisão Ambiente de Cascais (DAM). O primeiro edifício () está localizado a norte do concelho numa área bem ventilada e exposta aos elementos climáticos. Os restantes edifícios localizam-se próximo a Baía de Cascais. Enquanto os edifícios Paços do concelho e Tardoz estão inseridos na malha urbana, caracterizada por ruas estreitas e sinuosa, a DAM está inserido num parque urbano densamente arborizado (a densidade de ocupação também é muito menor que os restantes). Foi efetuada a análise per capita dos consumos elétricos, para efeitos de comparação entre os edifícios. Foram calculadas as médias diárias dos consumos elétricos de cada edifício, verificado entre as 9:00 e 17:00 horas dos dias úteis, entre 2008 e 2010, e não foram considerados hábitos sociais. Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
4 4. Resultados Os resultados respeitantes aos dias frios (fig.1a) mostram uma amplitude térmica elevada no território do concelho (aproximadamente 10 C), com três áreas em destaque: i) o noroeste, nas imediações da Serra de Sintra e nos setores de maior altitude do concelho; ii) a região central, caracterizada por altitudes mais baixas; e iii) as áreas de vale. No entanto, a sensação térmica estimada apresenta uma amplitude térmica pouco significativa em todo o concelho, com a PET a variar entre 10,5 C e 11,5 C. Figura 1 - Temperatura estimada às 13:00 horas nos dias frios (A) e nos dias quentes (B) obtida através de regressão múltipla. O mapa referente à temperatura estimada dos dias quentes (fig. 1B) sugere que em média, o setor mais ocidental se encontra mais fresco dos que as restantes áreas e que o gradiente térmico diminui com o aumento da distancia à linha de costa. A sensação térmica é bastante diferenciada no concelho, com destaque para três grandes áreas: i) setor ocidental a partir da localidade Birre; ii) setor norte a partir da localidade de Alcabideche e iii) a restante área do concelho com ligeiras diferenças da PET próximas à Baía de Cascais. Em relação às variáveis que melhor podem explicar a repartição térmica dos valores extremos destacaram-se o índice de rugosidade aerodinâmica (relação positiva) e a altura dos edifícios (relação negativa), (tabela 1). Noutro estudo (Pessoa, 2013), o autor mostrou que a outras horas (7:00, 10:00 e 16:00 horas) os índices H/W e NDVI demonstraram serem mais importantes. Temp Dias Frios = 14, ,7753Z 0-0,0809AltEdf - 0,0237Alt + 0,0004DSul (erro 0,6 C) Temp Dias Quentes = 26, ,3994Z 0-0,1155AltEdf + 0,0010DMar - 0,0006DSul (erro 0,8 C) Tabela 1 - Equações obtidas pela regressão linear múltipla que permitem estimar as temperaturas nos dias frios e nos dias quentes às 13:00 horas. Onde: Z 0 indice de rugosidade; AltEdf altura dos edificios; Alt altitude; DSul distância à costa sul; DMar menor distância ao mar Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
5 A relação entre os consumos elétricos e as temperaturas representada por linhas de tendência e respetivos coeficientes de determinação (fig. 2A) demonstram que o consumo elétrico foi menor com as temperaturas máximas entre 15 C e 25 C (aproximadamente), mas com tendência de aumento do consumo perante temperaturas acima dos 25 C e abaixo dos 15 C. Na análise restrita aos extremos térmicos (fig. 2B), os edifícios estão mais suscetíveis ao aumento dos seus consumos perante à variabilidade térmica nos dias frios do que nos dias quentes, exceto o edifício, que tem um consumo mais equilibrado perante ambos os tipos de dias R² = Dias Frios Dias Quentes kwh per capita R² = R² = R² = Paços do Concelho Tardoz DAM DAM Tardoz Paços kwh per capita Figura 2 A) Consumos elétricos e temperaturas entre 2008 e B) Variação no consumo elétrico per capita quando a temperatura máxima varia em -1ºC nos dias frios e +1ºC nos dias quentes. Os modelos de resposta energética dos edifícios foram projectados para os cenários de alterações climáticas previstas para meados e fins do século XXI no concelho (fig. 3). Foram projetados os consumos de acordo com a média da temperatura máxima estimada para dois meses característicos dos extremos térmicos, com base no cenário A1 do SRES (Santos & Cruz, 2010). Assim, foram consideradas as temperaturas máximas de 15,0 C e 17,0 C (em fevereiro) e de 36,3 C e 42,2 C (Julho) para meados e finais do século respetivamente. Os resultados das projecções mostram que ocorrerá uma redução significativa dos consumos eléctricos nos dias frios e um aumento moderado nos dias quentes, exceto o edifício, que poderá ter uma necessidade superior (aproximadamente de 48,9%, quando comparado com a actual situação). Meados do século finais do século Meados do século finais do século 48.9% -11.6% -9.6% -17.2% -16.7% -22.2% -18.5% -31.8% -30.4% 26.4% 29.6% 19.9% 25.3% 11.0% 16.0% 13.5% Edificio da Paços do Concelho Edificio "Tardoz" Divisão do Ambiente (DAM) Edificio da Paços do Concelho Edificio "Tardoz" Divisão do Ambiente (DAM) Figura 3 - Projeção da variação do consumo elétrico (per capita) dos edifícios municipais para meados e finais do século XXI nos dias frios (à esquerda) e nos dias quentes (à direita). Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
6 5. Conclusão Os resultados obtidos mostraram as diferenças térmicas entre as áreas junto à costa e o interior do concelho, onde o índice de rugosidade aerodinâmica e a altura dos edifícios foram os parâmetros urbanos que mais influenciaram os contrastes, e que a necessidade energética dos edifícios monitorizados (exceto ) é maior nos dias frios do que nos dias quentes, mas que esta situação poderá inverter-se perante as projeções de consumo efetuadas para meados e finais do século XXI. Com base no aumento previsto das temperaturas máximas sugere-se a manutenção dos corredores de ventilação natural e a expansão da mancha verde em área urbana, sobretudo em áreas entre edifícios. À microescala, sugere-se a programação dos equipamentos de climatização para que iniciem o seu funcionamento quando a temperatura exterior (ou de um índice térmico como a PET), seja inferior a 15,0 C ou superior a 25,0 C. Para auxiliar nesta gestão dos consumos elétricos, deve ser ponderado a criação de um sistema de alerta, baseado numa rede meteorológica. Bibliografia Alcoforado M, Lopes A, Andrade H, Vasconcelos J. (2005) Orientações climáticas para o ordenamento do território em Lisboa.CEG-UL, Lisboa. Krese G, Prek M, Butala V. (2012). Analysis of Building Electric Energy Consumption Data Using an Improved Cooling Degree Day Method. Strojniški vestnik-journal of Mechanical Engineering, 58: Madlener R, Sunak Y (2011) Impacts of urbanization on urban structures and energy demand: What can we learn for urban energy planning and urbanization management? Sustainable Cities and Society, 1(1): Okeil A (2010) A holistic approach to energy efficient building forms. Energy and Buildings, 42(9): Pessoa N (2013). Estudo bioclimático dos extremos térmicos em Cascais e suas repercussões nos consumos elétricos de edificios municipais. Dissertação de mestrado, Universidade de Lisboa, Lisboa. Santos F, Cruz, M.(coord) (2010) Plano estratégico de Cascais face às alterações climáticas (PECAC).Câmara Municipal de Cascais, Cascais. Eixo V - Alterações climáticas e sustentabilidade
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