Dimensionamento de ensaios de não inferioridade para o caso de grupos paralelos e resposta binária: algumas comparações
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1 Dimensionamento de ensaios de não inferioridade para o caso de grupos paralelos e resposta binária: algumas comparações Introdução Arminda Lucia Siqueira Dimensionamento de amostras, importante elemento no planejamento de ensaios clínicos controlados, frequentemente é determinado por fórmulas fechadas, aproximadas ou não. Às vezes, processos iterativos são necessários, exigindo programação possivelmente trabalhosa, ou ainda as soluções podem ser obtidas por simulações. Embora fórmulas fechadas sejam práticas e convenientes, suas acurácias variam e podem às vezes ser questionadas. Assim, soluções alternativas podem ser preferidas. Para o caso de resposta binária, o cálculo do tamanho da amostra depende de muitos fatores, como a medida a ser usada (diferença de proporções, razão de chances (odds ratio ou OR), teste (Wald, escore, razão de verossimilhanças, Fisher), tipo de solução (exata, assintótica, com correção de continuidade) e método estatístico (clássico ou Bayesiano). Este trabalho é sobre o dimensionamento para ensaios de não inferioridade em que o planejamento é de grupos paralelos e a resposta é binária. Ilustramos a metodologia com exemplo de uma situação real e com resultados de um estudo de simulação. 2 Material e métodos Considere-se um estudo planejado em dois grupos em paralelo tal que os indivíduos foram aleatorizados em novo tratamento (T) ou no controle ativo (C). Sejam p T e p C as probabilidades de sucessos, respectivamente nos grupos T e C, que têm tamanhos n T e n C. A comparação entre os dois tratamentos pode ser feita pela diferença entre as proporções de sucesso dos dois grupos (p T p C ), pela razão entre elas (p T /p C ), ou ainda pela medida odds ratio, cuja definição é p T p T / p C p C, ou equivalentemente pelo logaritmo de odds ratio, θ = log{[p T ( p C )]/[(p C ( p T )]}. Para comparar os dois tratamentos em termos de odds ratio, testamos as hipóteses H 0 : θ = θ 0 versus H : θ > θ 0, sendo θ 0 um valor não negativo chamado de margem de não inferioridade. Alternativamente as hipóteses podem ser expressas como H 0 : δ = 0 versus H : δ > 0, com δ = θ θ 0 (Siqueira et al., 2008). Departamento de Estatística/ UFMG. arminda@est.ufmg.br
2 Na literatura existem vários trabalhos sobre tamanho de amostras para estudos de não inferioridade no contexto estudado (proporções, grupos paralelos). Julious (200) apresenta fórmulas para o caso de diferença de proporções com três métodos: usando respostas antecipadas ou as respostas sob as hipóteses nulas e alternativas e ainda levando em conta a correção de continuidade. Ainda para a comparação de dois tratamentos baseada em diferença de proporções e para grupos paralelos, Julious & Owen (200) destacam o método Bayesiano. Para a comparação baseada na medida odds ratio utilizando o teste de Wald, o número de indivíduos necessários no grupo controle é dado por n C = z α +z β θ θ 0 2 rp T p T + p C p C Wang et al., Na fórmula apresentada, θ 0 e θ são os valores de log(or) sob H 0 e H, r = n T /n C é a razão dos tamanhos dos dois grupos, p T = exp θ p C + exp θ p C, α e β são o nível de significância e o poder do teste da comparação dos grupos, respectivamente, e z α e z β são os correspondentes percentis da normal padrão. Dimensionamento de amostras usando métodos exatos para provar não inferioridade quando a resposta é binária foi proposto, por exemplo por Dunnett & Gent (977) e o método foi revisitado por Chan (2003). Wellek (200) apresenta o tradicional teste exato de Fisher para ensaios de não inferioridade em termos da medida odds ratio e fornece um programa Fortran para calcular o tamanho da amostra. 3 Resultados e discussão Para ilustrar a metodologia, adaptamos um exemplo apresentado por Rousson & Seifert (2008) comparando os resultados do tamanho de amostra quando utilizamos o teste de Wald e o teste exato de Fisher para a medida odds ratio. Evidenciamos também o impacto da escolha da margem de não inferioridade e da incerteza do conhecimento de parâmetros envolvidos nos cálculos (no caso, p C ). Apresentamos também os resultados de um pequeno estudo de simulação de Monte Carlo usando a mesma medida odds ratio. 3. Exemplo: ensaio de não inferioridade para tratamento de vaginose bacteriana Trata-se do planejamento de ensaio de não inferioridade que tinha como objetivo comparar o efeito de novo medicamento para tratar vaginose bacteriana, a mais prevalente causa de vaginite, com o efeito do uso de clindamicina creme vaginal, o medicamento de 2
3 OR =,5 OR =,0 referência. Para mulheres não grávidas, a literatura relata percentual de cura variando de 80% a 85% após completar o tratamento com o medicamento de referência. A Tabela apresenta o número de pacientes por grupo para valores de p C variando de 80% a 85% com incremento de um ponto percentual, comparando dois testes. Tabela : Número de pacientes por grupo (n T = n C ) do ensaio de não inferioridade para tratamento de vaginose bacteriana Comparação de dois métodos: teste de Wald com fórmula e teste exato de Fisher Margem de não inferioridade Possíveis valores de p C (OR 0 ) 80% 8% 82% 83% 84% 85% Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Teste de Wald 0, Exato de Fisher 0, Nota: nível de significância: 2,5%; poder do teste: 80%; OR : odds ratio sob H. À medida que p C e a margem de não inferioridade aumentam, há necessidade de mais pacientes. Por outro lado, os tamanhos das amostras para OR =,5 são inferiores aos correspondentes se OR =. Em geral, à medida que o valor de OR aumenta, o tamanho da amostra diminui, mantendo os outros elementos envolvidos nos cálculos constantes. Para OR =,0, todos os tamanhos de amostra obtidos pelo teste exato de Fisher são maiores do que o de Wald (a diferença varia de 4 a 8) e para OR =,5, às vezes esse comportamento se repete ou se inverte, mas a diferença é sempre bem pequena (varia de a 4). 3.2 Estudo de simulação A determinação do tamanho de amostra a partir de simulações foi baseada nos testes de Wald e da razão de verossimilhanças com a medida odds ratio. O nível de significância nominal foi de 2,5% e o poder dos testes foi fixado em 90%. Assumiu-se igual alocação de 3
4 indivíduos aos tratamentos, isto é, n T = n C. Os cálculos de cada poder empírico foram baseados em simulações. A Tabela 2 apresenta resultados para casos selecionados. Tabela 2: Tamanho de amostra para ensaios de não inferioridade usando a medida odds ratio p OR 0 OR C = 0,8 p C = 0,5 W f F W S V S W f F W S V S, ,8 2, , , ,5 2, , Nota: nível de significância: 2,5%; poder do teste: 90%; OR 0 : odds ratio sob H 0 ; OR : odds ratio sob H ; W f : teste de Wald por fórmula; F: teste exato de Fisher; W S : teste de Wald por simulação; V S : teste da razão de verossimilhanças por simulação. Os resultados das simulações a partir do teste da razão de verossimilhanças (V S ) são muito semelhantes aos do teste exato de Fisher (F). A fórmula baseada no teste de Wald (W f ) parece fornecer bons resultados, quando comparado aos obtidos na simulação, tanto para o próprio teste de Wald (W S ) quanto para o teste de razão de verossimilhanças (V S ). À medida que OR aumenta, os tamanhos de amostras diminuem e o inverso vale para o valor da margem de não inferioridade (OR 0 ). Os valores de W f tendem a ser ligeiramente maiores que F. Os valores (mínimo e máximo) da diferença (W f F) são ( e 0) e (- e 4), respectivamente para OR 0 igual a 0,8 e 0,5. A diferença (W f V S ) vai de 2 a 2 e de zero a 5, respectivamente para OR 0 igual a 0,8 e 0,5, respectivamente. 4 Conclusões e considerações finais O cálculo do tamanho de amostras é atualmente exigência dos protocolos de ensaios clínicos controlados. Há várias opções para o dimensionamento de ensaios de não inferioridade no caso de grupos paralelos e quando a resposta é binária. Quando os grupos são comparados em termos de diferença de proporções, o tamanho da amostra é tipicamente bem menor do que o obtido quando a medida escolhida é odds ratio. Por exemplo, no ensaio da seção 3 sobre tratamento de vaginose bacteriana, usando a medida odds ratio, com margem de não inferioridade de 0,5 e p C = 0,80, o tamanho de amostra obtido foi n C = n T = 205. Se a comparação dos tratamentos fosse feita em termos de diferença de proporções, seriam necessários apenas 42 pacientes em cada grupo, ou seja, 4
5 haveria redução de 26 pacientes. Apesar dessa aparente vantagem, cresce o interesse pela utilização da medida odds ratio. De fato, existem vantagens discutidas na literatura (Tu, 998) e, por exemplo, aparece de forma natural na interpretação de modelos de regressão logística, tão usados na área da saúde. Para o contexto estudado, tamanhos de amostras calculados por vários métodos, usando fórmulas fechadas, processos iterativos e simulações podem ser programados e/ou obtidos por programas específicos, tal como Pass (Power Analysis and Sample Size Software). 5 Referências [] CHAN, I. S. F. Proving non-inferiority or equivalence of two treatments with dichotomous endpoints using exact methods. Statistical Methods in Medical Research. Sage. v. 2, p , [2] DUNNETT, C. W.; GENT, M. Significance testing to establishing equivalence between treatments, with special reference to data in the form of 2x2 tables. Biometrics. Blackwell Publishing. v. 33, p , 977. [3] JULIOUS, S. A. Sample Sizes for Clinical Trials. Boca Raton: Chapman and Hall/CRC p. [4] JULIOUS, S. A.; OWEN R. J. A comparison of methods for sample size estimation for non-inferiority studies with binary outcomes. Statistical Methods in Medical Research. Sage. v. 20, n. 6, p , 200. [5] TU, D. On the use of ratio or odds ratio of cure rates in therapeutic equivalence clinical trials with binary endpoints. Journal of Biopharmaceutical Statistics. Taylor & Francis. v. 8, p , 998. [6] WANG, H.; CHOW S. C.; LI, G. On sample size calculation based on odds ratio in clinical trials. Journal of Biopharmaceutical Statistics. Taylor & Francis. v. 2, p , [7] ROUSSON, V.; SEIFERT, B. A mixed approach for proving non-inferiority in clinical trials with binary endpoints. Biometrical Journal. John Wiley. v. 50, n. 2, p , [8] SIQUEIRA, A. L.; WHITEHEAD, A.; TODD, S. Active-control trials with binary data: a comparison of methods for testing superiority or non-inferiority using odds ratio. Statistics in Medicine. John Wiley. v. 27, p , [9] WELLEK, S. Testing Statistical Hypotheses of Equivalence and Noninferiority. Second Edition, Boca Raton: Chapman and Hall/CRC p. Agradecimentos: à Fapemig pelo apoio ao projeto de pesquisa intitulado Metodologia Estatística para o planejamento e a análise dos resultados de estudos especiais na área da saúde, Demanda Universal da Fapemig, Processo APQ-0865-, no qual o presente trabalho está inserido. 5
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